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Em geral, ambos os filmes receberam uma apreciação positiva da crítica jornalística, algumas vezes até entusiástica. Já foi notado como, nesse período do início da Retomada do cinema brasileiro, a imprensa colaborou com a classe cinematográfica ao publicar matérias otimistas sobre a produção no país (MARSON, 2006). Não foi diferente com Menino

maluquinho. Interessante notar que esse apoio se dá mesmo em condições que são

aparentemente conflitantes: num primeiro momento, a questão nacional-popular dos filmes que combate uma estética e ética dominantes é exaltada, assim como, num outro momento, o caráter internacional-popular e sua aproximação ao cinema hegemônico.

Muitos jornalistas enalteceram a representação de temas nacionais, de personagens, histórias, paisagens e opções estéticas não só diferentes, mas algumas vezes superiores a exemplares de Hollywood. A indústria norte-americana é, assim, um dos pontos de referência cardinais das comparações feitas pela imprensa, que frequentemente a adota como modelo ou a rejeita, ou ainda faz ambos concomitantemente. Essa indústria é usualmente tratada, em termos comerciais, como um inimigo a ser combatido, como ocorreu nas já citadas

ser comemorada na visão desses artigos. Na época de Maluquinho 2, Guerini (1998, p. 1C) continua o tipo de registro e chama a atenção, na sua estreia, para a disputa com o “peso- pesado” da Disney, Mulan.

Outros aspectos levantados pela imprensa em geral foram a boa atuação do elenco infantil no filme, o esforço de produção, o respeito à criança que gerou um produto “honesto”, a relação dos filmes com Ziraldo, a distância dos filmes com relação a Xuxa e Trapalhões, frequentemente tachados de “infantiloides” e, principalmente sobre o primeiro filme, a apreciação da obra tanto por adultos quanto por crianças.

Bruno de André, quando da estreia da fita na TV, caracterizou na resenha intitulada “O brasileiro maluquinho” o que vem a ser uma película nacional digna de reconhecimento: “Filme brasileiro, para ser reconhecido e bem recebido, não precisa só falar o português daqui. Precisa ter cara, jeito e história de brasileiro, ter identidade” (ANDRÉ, 1997, p. 80). Para ele, “[...] o filme mostra uma gente e umas historinhas que Spielberg não conhece.” O filme nacional teria, assim, uma vantagem competitiva, ainda que simbólica, sobre o estrangeiro dominante: os conteúdos e o jeito “brasileiros”.

Também de forma a ressaltar essa vantagem, uma resenha da reprise do filme em 2001 na TV Globo afirma: “[...] seu principal atrativo é mostrar uma criança genuinamente brasileira, ao contrário dos estereotipados Pimentinhas, pestinhas e meninos esquecidos em casa que assolam nossa TV” (O BOM..., 2001, p. 13). Cabe notar a polarização que o texto promove entre uma brasilidade “genuína” de Maluquinho e a estereotipia de personagens infantis hollywoodianos. Com a brevidade do jornalismo diário, as reportagens muitas vezes não se estendem para explanar suas ideias. Giannini (2000), com espírito semelhante, diz que Maluquinho é “um menino de verdade. Não um estereótipo de filme americano” (p. D10) e tira essa conclusão após descrever as ações do garoto no filme: passar férias com o avô, brincar na rua, entre outras coisas. As ações cotidianas parecem, desse ponto de vista, conferir verdade ao garoto.

Sobre o primeiro filme, Oricchio discorre adjetivos estéticos e conclui que

Maluquinho é o “contraponto perfeito” para Batman eternamente. “Tudo o que o filme de Joel Schumacher tem de over, estridente, histérico, Maluquinho tem de terno, discreto, sensível.” A fita brasileira é tida como “antídoto” ao “cinema-videogame”, é considerado uma “opção sadia” (ORICCHIO, 1995b, p. D2). O consumo do filme brasileiro é associado, assim,

assemelha-se a uma campanha em prol do cinema brasileiro.

Assim como o cinema dominante é tomado como mau exemplo, ele é por vezes lembrado como modelo. A atuação das crianças, quase sempre elogiada pelos críticos, recebeu uma comparação desfavorável em relação aos americanos: “O filme tem altos e baixos (o pior é a direção das crianças que gritam e exageram horrivelmente. Dá saudade de criança de filme americano, sempre impecável)” (DIVIRTA-SE, 1995, p.12).

Já no segundo filme, Oricchio destaca também uma suposta abundante e “intacta” brasilidade: “Como acontece com todas as histórias de Ziraldo, esta também bebe generosamente na fonte da cultura popular brasileira. O interior de Minas, com sua gente e seu sotaque, está lá, intacto no filme.” (ORICCHIO, 1998, p. D15).

É interessante ressaltar que algumas dessas características foram também notadas pela imprensa na década de 1950 a respeito de um pioneiro longa-metragem infantil brasileiro: O

saci (Rodolfo Nanni, 1953), que também se passa num ambiente rural e utiliza elementos

folclóricos e populares. Rocha Melo (2010), ao analisar a recepção crítica do filme, aponta que “Em todos esses pontos destacados pela crítica, a noção implícita ou explícita de 'brasilidade' está presente. Em uma reportagem não assinada sobre o filme, a revista A Scena

Muda chega mesmo a falar que O saci indica um caminho, o da 'pureza nacional'” (MELO,

2010, p. 474). Há sem dúvida que se investigar se as características a que eles se referem são as mesmas, pois a “pureza” ou “genuinidade” brasileiras são construções ideológicas. O que todavia fica claro é como, desde a fundação do filão, algumas posturas de busca por um retrato nacional continuam semelhantes – e mais semelhantes ainda, o valor que a imprensa dá à “brasilidade”.

Paulo Vieira, no segundo filme, consegue já ver uma síntese dos aspectos de representação regionais e a busca por uma estética internacional. Demonstrando um nacionalismo exacerbado, ele enaltece o retrato regional (ainda que reconheça a caricaturização) e a estética internacional simultaneamente. O jornalista parece ter apreciado tanto a fita que chega a apelar diretamente aos pais para que abandonem o preconceito “natural” contra o cinema brasileiro e abusa dos superlativos.

Depois da compra do banco Real, o fato relevante da semana, senhores pais, é a estréia do filme “O Menino Maluquinho 2 – A Aventura”. Abandonem sua natural aversão por filmes brasileiros e submetam seus filhos a 92 minutos de honestíssima, competentíssima e inteligente, se é que é possível, diversão. […] Há nele alusões ao clássico “ET” [...], mas o que sobressai no filme é o aspecto boitatá, um caboclismo indisfarçável, até bastante estereotipado, mas que

“Caipira Picando Fumo”, o célebre quadro de Almeida Júnior, em versão animada. (VIEIRA, 1998, p. 5-22)

As características regionais são tão presentes para ele que evocou um ícone da representação da cultura caipira, Almeida Júnior. Não obstante, elogia “cenografia e direção de arte caprichadas, enquadramentos supreendentes e montagem nervosa […].” Para Vieira, esses aspectos são internacionais, mas faz uma ressalva, apontando uma falha nos efeitos estéticos com que o cinema brasileiro não estava acostumado a produzir: “ Para ficar mais 'internacional', só se a cena do trem causasse realmente medo.” (VIEIRA, 1998, p. 5-22)

Nesse artigo, não há uma polarização, mas é a combinação entre referências internacionais-populares e o conteúdo nacional o que merece destaque no filme. Um dos grandes méritos é o “'plot' de aventura num ambiente de costumes, fábulas e, acredite, política brasileiras.” (VIEIRA, 1998, p. 5-22). Uma visão semelhante da mistura entre duas estéticas aparece ainda sobre o primeiro filme em O Estado de Minas: Maluquinho é chamado de “um Macaulay Culkin bem brasileiro”, em referência ao ator mirim do sucesso Esqueceram de

mim.

Alguns jornalistas acreditam que o gênero de aventura do segundo filme agrada mais às crianças, assim como o produtor. Oricchio (1998) pensa que o objetivo do filme “é a diversão em estado puro. E, nesse sentido, deve funcionar para a garotada” (p. D5). Também é o caso de Guerini, para quem

o segundo foi estruturado mais de acordo com o paladar infantil. No lugar do formato de crônica original, em que o personagem foi simplesmente adaptado para a tela, sem o rigor de um roteiro, a sequência optou por adotar a narrativa típica do gênero aventura e ação – o que pode decepcionar os adultos que aprovaram a fórmula do primeiro, uma espécie de reflexão literária sobre a infância. (GUERINI, 1998, p. 1C)

Assim, pela reação da imprensa, fica a suposição de que os adultos tenham gostado mais da primeira película. Esta gerou uma repercussão bem entusiasmada, também por conta da época, em que praticamente não havia cinema brasileiro. O registro da opinião do embaixador Sérgio Rouanet por Luiz Carlos Merten serve de amostra:

Ainda não se sabe se O Menino agrada às crianças. O fato é que encanta 'coroas'. O embaixador do Brasil na Alemanha, Sérgio Rouanet, ex-Ministro da Cultura, assistiu ao filme aqui em Berlim, numa projeção no Mercado segunda à tarde. [...] No final, o embaixador estava encantado.

'Reencontrei minha infância', disse. [...] 'Capta aquela coisa do livro do Ziraldo, ou seja, o tempo passa, o menino vira um rapaz legal e aí todo mundo vê que ele não era maluco, era feliz', explica. 'O fato de ser embaixador na Alemanha, longe de

encante com o menino.' (MERTEN, 1995a, p. D2)

Da fala de Rouanet, depreende-se que o sentimento de nostalgia da infância e do país o afetou, como Krämer havia sugerido sobre os filmes-família. É possível, portanto, traçar a hipótese de que o primeiro filme tenha tido um desempenho melhor que o segundo porque, entre outros aspectos, conseguiu dialogar bem com a plateia adulta, mesmo direcionando a linguagem e o conteúdo para as crianças.

Entretanto, o primeiro filme também recebeu críticas negativas. José Geraldo Couto censurou a “timidez em assumir a fantasia como chave da narrativa. […] Na maior parte do tempo, prevalece um certo 'realismo adulto' que atravanca um pouco a narração. Acumulam- se dramas domésticos como a separação dos pais, a doença e morte do avô etc.” (COUTO, 1995a, p.5-5). É representativo que o jornalista reivindique mais fantasia para o público infantil e condene os dramas domésticos para as crianças, haja vista serem estas associações comuns. Ao formular o segundo filme, Tarcisio Vidigal e Ziraldo parecem ter se pautado por elas. Esses dramas, entretanto, podem ter sido uma das causas de atração para os adultos – e por que não, para os infantes também70.

Um dado que chamou de forma positiva a atenção da imprensa e de estudos acadêmicos é o baixo apelo dos filmes ao consumismo, uma vez que praticamente não há

merchandising voltada para crianças. A psicóloga Cláudia Amorim Garcia, em livro sobre

infância e cinema, nota que “Menino Maluquinho suscita uma reflexão sobre consumo justamente pela sua ausência” (GARCIA; CASTRO; SOUZA, 1997, p. 41). Sobre

Maluquinho 2, uma jornalista constata:

Mesmo com a realização de uma extensa campanha publicitária, não se vê no filme a intenção pura e simplesmente mercadológica. Ao contrário do que acontece com boa parte dos títulos estrangeiros para a molecada, o distribuidor de Maluquinho não está lançando aquela infinidade de produtos com a marca. O filme também não martela aquelas musiquinhas idiotas na cabeça das crianças, que mal saem do cinema e já pedem que o pai compre o CD. (GUERINI, 1998, p. 1C)

O crítico de cinema Oricchio (1998) também apontou como mérito secundário do filme o fato de não estimular o consumismo e de não colocar “goela abaixo” do espectador todo o “lixo costumeiro da sociedade de consumo” (p. D15).

Por fim, considero bastante significativo que Pedro Butcher tenha sugerido a 70

De algumas conversas informais que tive com pessoas que assistiram ao filme durante a infância, pelo menos uma delas me confidenciou que o filme proporcionou as primeiras lágrimas no cinema por conta do falecimento e enterro de Vô Passarinho.

criatividade do primeiro. Se o cinema dominante possui uma tecnologia sofisticada e “canções chorosas”, Maluquinho tem um “tabuleiro cheio da melhor mineirice” e criatividade. Ele elogia, por exemplo, a forma como a direção se utiliza da estética dos quadrinhos de forma melhor que os “filmes americanos”. Por isso, segundo ele, “ Menino

maluquinho é uma prova de que não há efeito especial que substitua a criatividade”

(BUTCHER, 1995, p. 24).

Nesses discursos da imprensa, é possível ter uma pequena dimensão das ansiedades sociais com as quais os filmes trabalharam. Merece destaque o incômodo da dominação de uma indústria cultural de massa (estrangeira e brasileira) com a qual uma parte da sociedade brasileira não se identifica. A representação de um tipo de cultura brasileira legitimada por esse grupo é motivo de prazer, ainda mais quando esses filmes nacionais têm capacidade para competir no mercado com o filme hegemônico.

Para concorrer com o filme estrangeiro e ganhar o público, os dois filmes investiram em qualidade técnica. Enquanto Maluquinho 1 adotou uma forma narrativa mais episódica e menos clássica, referenciando mais pontualmente alguns gêneros hollywoodianos,

Maluquinho 2 emulou algumas das mesmas estratégias do cinema dominante: vinculação a

uma matriz genérica de aventura e ação, efeitos especiais, investimento em grandes cenários e um grande lançamento nas salas de cinema. Ambas as posturas, embora diferentes, receberam apoio da imprensa.

Os instrumentos de defesa contra essa dominação propostos nos filmes são justamente algumas questões levantadas por nós ao longo do capítulo e também pela imprensa: (1) a imaginação ou a criatividade (no caso, a infantil); (2) a valorização das paisagens e tradições populares nacionais; (3) a valorização dos artistas brasileiros; (4) a produção de cultura brasileira; (5) a redução do consumo midiático, principalmente da televisão. Nesses filmes infantis, a oposição a um universo extremamente consumista e dominado pelo internacional- popular é feita pela proposição de um revés um tanto idílico. Praticamente não há consumo que não o cultural legitimado e os bens de destaque são quase todos artesanais.

Considerações finais

O filme infantil pode assumir formas as mais diversas. De crônicas cotidianas e singelas a épicas aventuras fantasiosas. Com foco narrativo em uma formiga ou com um que se divide em personagens de uma família toda. Pode ter baixo orçamento, com distribuição apenas em seu país de origem, até uma estética megaorçamentária, constituindo-se em filmes- evento globais. Cômicos, românticos, melodramáticos... A grande variedade de propostas cinematográficas tem como eixo comum uma preocupação especial com os espectadores infantes, seja ela de que natureza for (econômica, cultural, política...). No entanto, esses filmes geralmente não se preocupam apenas com as crianças, já que, nos cinemas, elas são acompanhadas por adultos. Ou seja, engana-se quem pensa que filme infantil é só “coisa de criança” - e isso em muitos aspectos.

O primeiro e mais óbvio deles é que, principalmente no espectro dos longa-metragens (o recorte desta dissertação), a grande parte da equipe envolvida é de adultos – as exceções ficam geralmente no elenco. A preocupação e execução da produção para a infância parte dos mais velhos. Um dos desafios enfrentados por essa equipe é, do ponto de vista temático e da construção da linguagem cinematográfica, elaborar uma obra que dialogue com o seu público, que normalmente é um misto de crianças e adultos.

Neste trabalho, a título de traçar algumas semelhanças e diferenças nas estratégias propostas por Menino maluquinho – o filme e Menino maluquinho 2 – a aventura para envolver a plateia como uma obra infantil, verificaram-se alguns parâmetros úteis para a análise e delimitação desses filmes, que não se pretendem exaustivos: a amplitude e profundidade da cognoscibilidade, comparando a atenção dada a personagens infantis e adultos, um alto grau de comunicabilidade, autoconsciência moderada, a seleção dos conflitos apresentados e o tratamento de temas espinhosos para adequação à faixa etária, a construção de marcas estilísticas infantis baseadas em convenções, o ritmo dado ao filme e a presença de um humor, geralmente mais físico e ingênuo.

O fato de os filmes infantis oferecerem geralmente múltiplos pontos de identificação entre personagens adultos e crianças dá opções de escolha diferentes para os espectadores.

e vice-versa. Isso permite para o público uma diversidade de olhares, que enriquece a experiência cinematográfica: tanto adultos como crianças têm a oportunidade de se identificarem com aquele que é semelhante, como com aquele que é o outro.

Outras características levantadas na análise, embora geralmente tenham o intuito de atingir um determinado público, podem ser igualmente apreciadas por adultos e crianças: a clareza da narrativa, as repetições, o humor ingênuo, o sentimentalismo são traços também presentes em muitos filmes populares direcionados para adultos. Mesmo algumas construções que são consideradas em princípio para a plateia adulta podem ser usufruídas pelas crianças de maneira distinta. Ainda que não compreendam inteiramente uma piada ou uma metáfora, por exemplo, seria possível identificar nelas uma certa sombra, um pequeno território desconhecido que pode aguçar a curiosidade da plateia infantil.

Um outro campo dos filmes infantis que envolve as crianças, mas não se restringe a elas, é a sua exploração econômica. É sabido que o mercado de bens culturais para a infância move vultosas quantias71, e que as diferentes propostas para o filão não estão igualmente distribuídas no mercado cinematográfico. A hegemonia do filme-família hollywoodiano é evidente. Este modelo busca atrair o maior número de espectadores possível, de diferentes idades e culturas. Alguns de seus artifícios são, como já vimos, a construção de múltiplos pontos de identificação na história, o alto investimento em novidades tecnológicas e efeitos especiais, o apelo a gêneros consagrados como comédia, aventura, fantasia ou musical, grandes lançamentos que dominam uma boa parte das salas, a exploração intensiva de mercados ancilares com produtos conexos como roupas, brinquedos, alimentos, entre outros. Apesar da aparência inocente, estes filmes visam cumprir algumas funções nada ingênuas. É notório o empenho da indústria de Hollywood na produção de filmes-família, que se deve não só à possibilidade de obtenção de altos rendimentos, mas também à formação e manutenção de um mercado cativo. Ir ao cinema ou consumir filmes não é obviamente uma atividade natural, devendo ser aprendida e estimulada. Da mesma forma, o gosto ou preferência por películas de estética hollywoodiana tampouco é natural. Os filmes-família, que conquistam espectadores desde a mais tenra idade juntamente com seus pais, são atualmente peças fundamentais da indústria de Hollywood para manutenção de sua hegemonia.

Filmes não são entretanto bens materiais comuns, como sabonetes. Eles possuem um 71Uma pesquisa compilada pela Nickelodeon estimou que, em 2006, a bilheteria de filmes infantis no Brasil foi de R$ 200 milhões e a de DVDs infantis, R$160 milhões (VIANNA; MELLO, 2007).

hollywoodiano não se restringir apenas à dimensão econômica. Filmes-família são, como apontados neste trabalho, uma das principais fontes para a construção e retroalimentação do imaginário internacional-popular. Situações, personagens, músicas, espaços, referências estéticas e éticas desse imaginário povoam a mente de uma grande parcela da humanidade. Esse imaginário acaba se constituindo como referência identitária para que as pessoas se situem no mundo, criando um espaço mundial de socialização que adota crianças e adultos com base na “solidariedade solitária do consumo” (ORTIZ, 1994, p. 144-145).

Além da concorrência do cinema estrangeiro, foram verificadas ainda algumas características dos filmes infantis nacionais no âmbito da distribuição que dificultam o negócio: muitas vezes, eles não possuem público no ano todo, nem na semana toda, nem no dia todo. São lançados usualmente em período próximo das férias escolares, costumam ser mais programados aos finais de semana e nos horários vespertinos. Seu preço médio do ingresso é mais baixo que o dos filmes não-infantis, já que as crianças pagam meia-entrada. E a distribuição no exterior é também mais custosa, pois preferencialmente o filme deve ser dublado. Essas dificuldades muitas vezes mant êm os filmes circunscritos ao país de origem.

Houve sucessos comerciais no país apesar dessas limitações do gênero. De forma a traçar o contexto da produção nacional em que os filmes analisados surgiram, verificou-se que, no Brasil, nas décadas de 1980 a 1990, os filmes infantis de Xuxa e de Trapalhões tiveram um êxito comercial que extrapolou a seara infantil - foram dos mais bem-sucedidos considerando a produção nacional como um todo. Aproveitando a fama de artistas de sucesso do universo televisivo (não só dos protagonistas, mas também dos convidados – atores, apresentadores ou músicos), esses filmes costumavam explorar bastante o merchadising para promover seus patrocinadores. É cediço que foram bastante criticados, na época, pela imprensa e uma parte da sociedade, em especial a elite cultural.

Os objetos de estudo deste trabalho em vários momentos dialogaram com as formas dominantes nacional e hollywoodiana, ora aproximando-se delas, ora opondo-se, ora modificando alguns significados. Apesar de serem produzidos pelo mesmo profissional – Tarcisio Vidigal – são evidentes as diferenças entre um projeto e outro.

Estas surgiram em virtude da adoção de propósitos e princípios distintos pelos realizadores dos filmes e pelo próprio Vidigal. Levando em consideração o contexto de produção desses filmes, os temas e formas trabalhados por eles e as falas dos agentes

brasileiro, sem filiação com o meio televisivo, e um outro desejo de imitação de algumas práticas do cinema dominante, constituindo maneiras distintas de se legitimar diante do público.

A comparação dos filmes mostrou que, enquanto o primeiro adotou uma estrutura dramatúrgica menos clássica, mais episódica, enfatizando cenas cotidianas e com cognoscibilidade bem mais restrita ao protagonista infantil, o segundo partiu para uma aventura de personagens com objetivos claros, com antagonistas e aliados, com uma cognoscibilidade mais ampla, envolvendo mais os núcleos de personagens adultos. A fotografia dos filmes e a direção de arte também variaram bastante. O primeiro filme