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A relação do professor com o conhecimento

No documento Marta do Carmo Silva (páginas 36-42)

Como vimos, as escolas não são instituições isoladas no tempo e no espaço, mas estão inseridas em uma sociedade, na sua organização, sua estrutura, sua cultura e sua história. Sendo assim, o ensino que nela se pratica deveria servir para dar “sentido ao mundo que rodeia os alunos, para ensiná-los a interagir com ele e a resolverem os problemas que lhe são apresentados” (COLL; MONEREO, 2010, p.39). Ao professor, torna-se fundamental saber que tipo de indivíduo pretende formar, pois disso dependem as escolhas dos conteúdos que ensinam das metodologias e das atitudes que assumem diante dos alunos.

A sala de aula é um organismo vivo, complexo, imprevisível e mutante. Segundo Gómez (1998, p.74), “a base da eficácia docente encontra-se no pensamento do professor/a capaz de interpretar e diagnosticar cada situação singular e de elaborar, experimentar e avaliar estratégias de intervenção”. E não em adotar modelos universalmente válidos de como ensinar. Uma mesma estratégia de

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ensino pode provocar resultados completamente diferentes nos alunos da mesma sala, porque os alunos não são receptores passivos de conhecimento e os processos de aprendizagem são particulares, singulares e subjetivos.

Para Freire (1996, p. 52), ensinar não é transferir conhecimentos, mas criar possibilidades para sua própria produção ou a sua construção. Zabala (1998, p. 28) entende que os indivíduos não estão parcelados em compartimentos estanques, em capacidades isoladas. Hernández (2006, p. 43), por sua vez, defende que uma visão integrada de educação deve favorecer a criação de experiências de aprendizagem com sentido envolvendo a comunidade educativa5, apaixonadamente no processo de aprender6 ou ainda transformar uma aprendizagem rotineira em uma autêntica experiência de vida.

Zabala (1998, p.89) defende que a chave de todo ensino está nas relações que se estabelecem entre os professores, alunos e conteúdos de aprendizagem e que as atividades são o meio para mobilizar a trama de comunicações que pode se estabelecer em classe.

Tanto os alunos quanto os professores são ativos processadores de informação e subjetivos construtores de significados (GÓMEZ, 1998, p. 71) e precisam estar motivados para realizar o esforço necessário para alcançar as aprendizagens.

A sala de aula está repleta de situações de aprendizagem, cabendo ao professor lançar mão de várias estratégias para atender às diversas formas de aprender dos seus alunos. Nem todos aprendem da mesma forma, no mesmo ritmo e fazem as tarefas do mesmo jeito. Para atender a diversidade de uma sala de aula, o planejamento do professor precisa prever um leque amplo de atividades, intencionalmente planejadas, que ajudem a resolver as diferentes situações complexas que a sala de aula apresenta. É necessário diversificar as atividades,

5 A expressão Comunidade Educativa foi consagrada em 1998, no Documento Orientador do Ensino Básico português, em que o Ministério da Educação se propunha "Incentivar novas formas de parceria educativa com os pais e as comunidades educativas, quer através da sua efectiva participação e corresponsabilização na administração das escolas, quer através de formas de voluntariado sócio-educativo". À comunidade educativa, formada pelo conjunto dos actores nela intervenientes - alunos, professores, pais e encarregados de educação e pessoal não docente - atribui-se cada vez mais uma "participação e corresponsabilização na administração das Escolas". 6 Para o autor (p. 54), apaixonado quer dizer ser consciente do prazer de aprender, não como acúmulo, mas como uma exploração permanente que questiona a realidade além das aparências e busca o sentido para interpretar o mundo e a própria atuação.

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propor atividades com diferentes opções ou níveis possíveis de realização, assim como intervir de maneiras diferentes no auxílio às dificuldades dos alunos.

É importante que o aluno participe e entenda os objetivos das atividades, entenda o porquê das tarefas propostas e responsabilize-se pelo processo de construção do conhecimento. É preciso examinar a disposição, os conhecimentos prévios (Ausubel), esquemas de assimilação (Piaget), internalização de instrumentos e signos (Vygotsky), o conhecimento experiencial ou extraescolar que os alunos adquirem em sua vida paralela à escola (Gómez), enfim as capacidades de cada aluno em relação à tarefa proposta.

Quer dizer, apresentar os conteúdos com o que já sabem, com seu mundo experiencial, estabelecendo, ao mesmo tempo, certas propostas de atuação que favoreçam a observação do processo que os alunos seguem para poder assegurar que seu nível de envolvimento é o adequado. Sem esse ponto de partida, dificilmente será possível determinar os passos seguintes (ZABALA, 1988, p. 95)

Um aspecto central da teoria de Vygotsky (1987) é a importância de uma intervenção pedagógica deliberada e intencional, que considere o aluno como sujeito ativo, que se relaciona com um ambiente ativo e estruturada pela cultura, e que traz como contribuição a sua subjetividade para este ambiente. Para ele, o sujeito não percorreria caminhos de desenvolvimento sem ter experiências de aprendizagem e o papel do professor, como mediador dessas experiências, é de fundamental importância. A escola possui um papel fundamental para o desenvolvimento de formas mais elaboradas de pensamento, portanto, deve saber utilizar ao máximo os recursos que levem a esse fim.

Trabalhar a partir das representações dos alunos consiste em permitir que sejam valorizados. O importante é dar a eles regularmente direitos na aula, interessar-se por essas representações, tentar compreender suas raízes e sua forma de coerência, não se surpreender se elas surgirem novamente, quando as julgávamos ultrapassadas (PERRENOUD, 2000, p. 28).

Para poder lavar em conta as contribuições dos alunos, além de criar um clima adequado, é preciso realizar atividades que promovam o debate sobre suas opiniões, que permitam formular questões e atualizar o conhecimento prévio, necessário para relacionar uns conteúdos com os outros. Segundo Zabala (1998, p.

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28), os indivíduos não estão parcelados em compartimentos estanques, em capacidades isoladas.

A intervenção do professor precisa se apoiar na observação da necessidade de cada aluno. A interação entre professor e aluno tem que permitir ao professor, tanto quanto for possível, o acompanhamento dos processos que os alunos realizam em sala de aula, possibilitando uma intervenção diferenciada. Enfim, trabalhar com alunos oriundos de diferentes contextos sociais e culturais e com diferentes níveis de capacidade e ritmos de aprendizagem a fim de garantir a participação e a aprendizagem de cada um.

O ensino direto de conceitos é impossível e infrutífero. Um professor que tenta fazer isso geralmente não obtém qualquer resultado, exceto o verbalismo vazio, uma repetição de palavras pela criança, semelhante a de um papagaio, que simula um conhecimento de conceito correspondente, mas que na realidade oculta um vácuo (VYGOTSKY, 1987, p 72),

Segundo Zabala (1998 p. 127), “a aprendizagem por mais que se apoie num processo interpessoal e compartilhado, é sempre, em última instância, uma apropriação pessoal, uma questão individual”.

A aprendizagem é um processo de crescimento individual, singular, em que cada aluno avança com um ritmo e um estilo diferente.

A sociedade contemporânea impõe desafios para a prática educativa e exige um olhar atento do professor sobre sua ação pedagógica. O conhecimento não é o mesmo para alunos que interagem desde cedo com as tecnologias de informação e comunicação; os acessos que os alunos têm à informação são completamente diferentes de décadas passadas. Torna-se urgente e necessário uma ação docente que modifique a relação do aluno com a informação e com o conhecimento.

38 3 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA IMPLEMENTAÇÃO DA INFORMÁTICA EDUCACIONAL NO CENÁRIO BRASILEIRO

É de fundamental importância para a educação brasileira, a elaboração e implantação de projetos pelas instâncias governamentais que popularizem as tecnologias digitais, socializando os mecanismos de inserção do homem no contexto atual, para que a inovação tecnológica não seja mais um mecanismo de segregação social (VIEIRA, 2013, p.307).

As escolas privadas do Brasil, cada qual ao seu tempo, sua maneira e com os recursos financeiros que lhe interessa e pode empreender, investem em infraestrutura física, recursos humanos e capacitação da sua equipe para que as tecnologias digitais estejam presentes no seu cotidiano, seja ela no âmbito administrativo ou pedagógico.

Quanto às escolas públicas, para que as tecnologias cheguem até elas em um país com o tamanho e diversidade do Brasil, é fundamental que os governos realizem ações de democratização do acesso e que as escolas estejam conectadas ao universo das tecnologias digitais.

Dados do último Censo Demográfico, realizado pelo IBGE em 20107, mostram que das 59.565.188 pessoas que frequentavam escola ou creche, 46.520.408 estavam em escolas públicas e 13.044.780 em particulares, ou seja, 78% da população de estudantes está nas escolas públicas.

O poder público precisa “diminuir as diferenças de oportunidade de formação entre os alunos do sistema público de ensino e os da Escola Particular, esta cada vez mais informatizada” (PROINFO, 1997). Como afirma o Livro Verde8 (2000, p.45), pensar a educação na sociedade da informação exige considerar um leque de aspectos relativos às tecnologias de informação e comunicação, a começar pelo papel que elas desempenham na construção de uma sociedade que tenha a inclusão e a justiça social como uma das prioridades principais.

Estar inserido digitalmente passa a ser considerado um direito do cidadão e

7 Censo Demográfico 2010. Disponível em:

<ftp://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/Educacao_e_Deslocamento/pdf/tab_educaca o.pdf>. Acesso em: 10 mai. 2014.

8 Lançado em 2000 pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, o livro contempla um conjunto de ações para impulsionar a Sociedade da Informação no Brasil em todos os seus aspectos: ampliação do acesso, meios de conectividade, formação de recursos humanos, incentivo à pesquisa e desenvolvimento, comércio eletrônico, desenvolvimento de novas aplicações.

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inclui-lo à era da informação passa a ser um dever para os poderes públicos, já que inclusão digital é associada a uma forma de inclusão social.

Programas que garantam laboratórios, máquinas e conexão, enfim infraestrutura tecnológica nas escolas, sejam elas particulares ou públicas, não são suficientes se não estiverem alinhadas a um professor bem preparado para o uso das tecnologias.

Os programas de inclusão de tecnologias digitais nas escolas públicas são definidos em âmbito nacional, ficando a implantação a cargo dos estados e municípios por meio de suas secretarias de educação, já que o governo entende que “os benefícios decorrentes do uso da tecnologia para desenvolvimento de atividades apropriadas de aprendizagem e para aperfeiçoamento dos modelos de gestão escolar devem ser construídos em nível local, partindo de cada realidade, de cada contexto” (PROINFO, 1997).

Exemplo de como o governo pretendeu iniciar o processo de universalização do uso de tecnologia de ponta no sistema público de ensino pode ser encontrado nas diretrizes do Programa Nacional de Informática na Educação – ProInfo de julho de 1997 proposto pelo Ministério da Educação e Cultura - MEC:

O Programa abrangerá a rede pública de ensino de 1º e 2º graus de todas as unidades da federação. [...] Deverão ser beneficiadas, nesta primeira etapa (97-98) do Programa Nacional de Informática na Educação, cerca de 6 mil escolas, que correspondem, por exemplo a 13,40% do universo de 44,8 mil escolas públicas brasileiras de 1° e 2° graus com mais de cento e cinquenta alunos. Considerando-se utilização em três turnos, dois alunos por máquina e dois períodos de aula por semana, será possível, durante o período letivo, atender a 66 alunos por máquina (PROINFO, 1997).

O texto de apresentação do Programa mostra a importância da preparação das pessoas envolvidas no processo: “a garantia de otimização dos vultosos recursos públicos nele investidos, reside, em primeiro lugar, na ênfase dada à capacitação de recursos humanos, que precede a instalação de equipamentos e responde por 46% do custo total do programa”, seguido pela infraestrutura física, suporte técnico e implementação descentralizada “em respeito à autonomia pedagógico-administrativa dos sistemas estaduais de ensino” (PROINFO, 1997).

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Entendia-se que o sucesso do Programa dependia fundamentalmente de professores bem preparados. A filosofia do processo de capacitação contida no documento afirma:

[...] Capacitar para o trabalho com novas tecnologias de informática e telecomunicações não significa apenas preparar o indivíduo para um novo trabalho docente. Significa, de fato, prepará-lo para ingresso em uma nova cultura, apoiada em tecnologia que suporta e integra processos de interação e comunicação (PROINFO, 1997).

E ainda:

A capacitação de professores para o uso das novas tecnologias de informação e comunicação implica redimensionar o papel que o professor deverá desempenhar na formação do cidadão do século XXI. É, de fato, um desafio à pedagogia tradicional, porque significa introduzir mudanças no processo de ensino-aprendizagem e, ainda, nos modos de estruturação e funcionamento da escola e de suas relações com a comunidade (PROINFO, 1997).

Cabe fazermos uma breve retrospectiva da tecnologia educacional no cenário brasileiro para depois falarmos sobre como os principais programas do governo buscaram alcançar os objetivos idealizados no ProInfo.

No documento Marta do Carmo Silva (páginas 36-42)