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A restrição à censura e aos limites do exercício da liberdade de expressão

Capítulo 2. DO DIREITO DE INFORMAÇÃO E DA ERA DIGITAL

2.1 LIBERDADE DE EXPRESSÃO

2.1.3 A restrição à censura e aos limites do exercício da liberdade de expressão

expressão e informação é essencial que os membros que compõem uma sociedade possam exprimir aquilo que pensam ou, ainda, divulgar acontecimentos, sem sofrerem quaisquer tipos de impedimentos ou ingerência por parte dos poderes públicos352. Além disso, é necessário proporcionar às pessoas a possibilidade da

existência de uma vasta disseminação de informação com diferentes pontos de vista353.

Como já mencionado, o direito à liberdade de expressão não pode ser alvo ou sofrer qualquer tipo ou forma de censura. Entretanto, o referido direito estabelece limites a esta liberdade, pois a livre manifestação do pensamento não poderá ofender a dignidade e a honra de outras pessoas. Cada um possui o direito de externar aquilo que pensa a respeito de determinados assuntos ou pessoas, porém não podem denegrir a imagem alheia por meio de suas convicções e opiniões. Ou seja, a proibição da censura não confere um direito absoluto na liberdade de expressão por meio da livre manifestação do pensamento, pois é necessário respeitar a dignidade e os direitos alheios.

O fato do art. 37.º da CRP impor que a liberdade de expressão não pode sofrer impedimentos ou discriminações ou, ainda, limitações por qualquer tipo ou forma de censura, não devem ser confundidos por liberdade de expressão sem limites ou sem um alcance das exceções previstas na própria Carta Magna354. O

próprio texto constitucional ao tratar dos direitos e deveres fundamentais, preconiza em seu art. 18.º, n.º 2, que a lei poderá restringir direitos quando houver uma previsão expressa para tal355, desde que essas contenções visem tutelar outros

352 Cfr. EDILSOM PEREIRA DE FARIAS, Liberdade de expressão e comunicação, cit., p. 76. 353 Ibidem.

354 Cfr. J.J. GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, op. cit., p. 573. Para os autores, há que se levar

em consideração que “dentro dos limites do direito (expressos ou implícitos), não pode haver obstáculos ao seu exercício e, fora as exclusões constitucionalmente admitidas, todos gozam dele em pé de igualdade”.

355 Dentro desse contexto, JÓNATAS E.M. MACHADO, op. cit., p. 709, aponta que “a doutrina

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direitos ou interesses também constitucionalmente protegidos. Nesse sentido, o art. 270.º da CRP estipula algumas restrições ao exercício de direitos e dentre eles situam-se as restrições ao exercício dos direitos de expressão por militares e agentes dos serviços e das forças de segurança356.

Necessário se faz enfatizar que, concernentemente, a censura a que se refere à legislação pátria, esta diz respeito a um conceito mais alargado de censura357. Essa conceituação ampliada abarca tanto a censura prévia como a

censura póstuma, em que a primeira importa no cerceamento da expressão ou informação originária e enquanto que a segunda concerne no impedimento da sua propagação358.

Nesse sentido, JÓNATAS E. M. MACHADO ao abordar o debate doutrinal quanto ao conceito amplo de censura, afirma que a censura prévia “consiste na sujeição a um controlo preventivo das mensagens cuja comunicação se pretende

constitucionalmente autorizados”. Quanto aos limites constitucionalmente expressos, o autor assevera que estes “resultam de uma ponderação de bens realizada pelo legislador constituinte na própria configuração definitiva do âmbito de protecção dos direitos fundamentais”. De forma diversa é o que acontece com os limites constitucionalmente autorizados, pois “aqui, o legislador constituinte prevê a necessidade de proceder a uma ponderação de bens que conduza a uma restrição de direitos, liberdades e garantias”.

356 A exemplo do ordenamento jurídico brasileiro, três são as hipóteses de restrições

expressas à liberdade de expressão e comunicação. A primeira diz respeito à vedação ao anonimato, em que o art. 5.º, inciso IV, da Constituição da República Federativa do Brasil estabelece que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, ou seja, todo indivíduo possui a liberdade de manifestar seu pensamento, entretanto, não poderá ser de forma anônima, pois numa possibilidade de se ocasionar danos a terceiros em virtude de abusos no exercício desta liberdade, é necessário identificar o autor das ofensas. A segunda hipótese encontra-se prevista no inciso VIII do art. 5.º da CRFB, dispondo que “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”, isto é, concernentemente à liberdade de expressão de crença religiosa, filosófica ou política, EDILSOM PEREIRA DE FARIAS, Liberdade de expressão e comunicação, cit., p. 248, afirma que “a Constituição indica expressamente duas restrições a essas espécies de liberdades de expressão: a impossibilidade jurídica de alegá-las para justificar inadimplemento de obrigação legal a todos impostas e para recusar-se ao cumprimento da prestação alternativa”. A terceira e última hipótese, consta do inciso X, do art. 5.º, da CRFB, ao determinar que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”, isso quer dizer que a livre manifestação do pensamento por intermédio da liberdade de expressão não poderá afetar a honra, a intimidade, a imagem ou a vida privada de outras pessoas.

357 De acordo com JÓNATAS E.M. MACHADO/IOLANDA A.S. RODRIGUES DE BRITO, op. cit., p. 29, a

proibição da censura a que se refere o n.º 2, do art. 37.º da Constituição da República Portuguesa, “reveste-se do maior relevo teórico e prático, convidando a doutrina e a jurisprudência à adoção de um conceito amplo de censura, na medida em que a simples proibição de censura política e administrativa prévia de pouco ou nada valerá se o exercício da liberdade de expressão e informação abrir as portas às mais variadas formas de retribuição e retaliação política, jurídica, social e económica e à aplicação de hipóteses e estatuições de responsabilidade civil e penal excessivamente dilatadas”.

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realizar”359, enquanto que a censura ex post facto “consiste na condenação a uma

sanção penal, civil ou de mera ordenação social, ocorrida num momento previsível, posterior à comunicação”360.

De acordo com a jurista MARIA DA GLÓRIA CARVALHO REBELO, no que se refere à censura prévia, a conceituação mais apropriada é de que esta forma de censura “define-se como qualquer outra medida limitativa de elaboração ou difusão de uma obra intelectual, especialmente ao fazê-la depender do extremo exame oficial do seu conteúdo361.

Sem mais delongas, a proibição da censura resume-se em fazer valer o direito à livre manifestação do pensamento, seja pela palavra, pela imagem ou qualquer outra forma de exteriorização, sem que o titular do pronunciamento sofra represálias por suas ideias ou convicções. De mais a mais, a vedação da censura consiste em limitar a interferência do Estado no “livre mercado das ideias”362. Isto é,

os titulares do direito à livre manifestação do pensamento têm a autonomia de fazer prevalecer tal faculdade, sem que o exercício deste direito sofra ingerências ou cerceamento das autoridades públicas.

Além disso, as pessoas coletivas também estão compelidas a respeitar a liberdade de expressão dos indivíduos. Com efeito, o Poder Público pode vir a ser responsabilizado pela omissão na proteção da garantia constitucional de liberdade de expressão, porque é sua obrigação assegurar o direito à liberdade de expressão contra ofensas praticadas por essas pessoas coletivas363.

Unida à liberdade de expressão está a liberdade de informação, conforme se depreende no contido do art. 37.º da CRP. Tais liberdades não beneficiam apenas as pessoas singulares, pois as pessoas coletivas também se valem delas. Destaca-se

359 Op. cit., p. 491.

360 Idem, pp. 491-492. Contudo, o autor aduz que “a luta pela liberdade de expressão

consistiu, durante séculos, no combate à censura prévia, a única considerada como censura propriamente dita. Nos nossos dias, a ausência de censura prévia é vista como um dos traços fundamentais de um regime político liberal”.

361 Op. cit., p. 35.

362 JÓNATAS E.M. MACHADO, op. cit., pp. 488-489. O autor ainda frisa que “a proibição da

censura é um dos domínios em que ela se manifesta de forma mais premente, devendo sublinhar-se que o mesmo pretende evitar a existência de uma autoridade que controle e administre selectivamente as estruturas e os procedimentos comunicativos, tolerando as perspectivas ortodoxas ou convencionais e silenciando as heterodoxas ou inconvencionais. Numa ordem constitucional livre e democrática, a única censura admissível é a que o povo dirige ao Governo e não a que o Governo dirige ao povo”.

363 Cfr. IRENEU CABRAL BARRETO, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada, 4.a

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que a censura era a principal maneira de limite e controle da liberdade de expressão364. A batalha pela liberdade de imprensa aconteceu justamente pela luta

ao combate a censura prévia, uma vez que a noção tradicional de censura remete diretamente a uma censura preventiva365.

Porém, essa liberdade de imprensa que auxiliou e deu maior enfoque à proibição da censura deve conter limites, porque por mais importante e necessária que seja a liberdade de expressão e informação para o contexto social, esta não pode conflitar e ferir outros direitos e garantias fundamentais. Logo, é de se deduzir que a informação tem grande relevância para a sociedade, mas a preservação dos direitos inerentes à dignidade humana possui valores imensuráveis para seus titulares.

2.2 DO CONFLITO ENTRE A LIBERDADE DE EXPRESSÃO E O DIREITO À HONRA E

AO RESGUARDO DA INTIMIDADE DA VIDA PRIVADA

2.2.1 O caminho percorrido entre a liberdade de imprensa e os limites da liberdade

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