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Capítulo 4: Autonomia ou rigidez orçamentária municipal?

4.3 A rigidez na estrutura orçamentária municipal

Diante modelo do pacto federativo e da própria engenharia fiscal, a rigidez orçamentária dos centros urbanos mais populosos e endividados prosseguiu, e dentro da mais pura legalidade. O resultado, no sentido exato, tem sido uma diferença entre o volume de recursos transferidos versus as atribuições descentralizadas ou assumidas.

Parte do hiato orçamentário e financeiro deve-se a falta de clareza da política, e financiamento tripartite incapaz de sustentar as políticas descentralizadas. Tudo isso tem ocorrido em meio a um processo de centralização e desvinculação de recursos de contribuições promovido pela União, e que deveriam financiar a saúde, assistência social e previdência.

Qualquer tentativa com intuito de revigorar as relações federativas precisa responder a seguinte pergunta: quem faz o que na federação? Com quais recursos? E para quem? A pactuação confusa permitiu que todos os níveis de governo permanecessem responsáveis por quase tudo. E, naturalmente, a conta das demandas são cobradas nas portas dos governos mais próximos à população.

De um modo geral, pode se dizer que o resultado da confusa relação federativa e ausência de cooperação financeira, tem aprofundado os problemas de ordem social e de infraestrutura nas regiões metropolitanas.

São questões que a nova disciplina fiscal, a pesar de prometer a transparência fiscal, não se preocupou em regulamentar, não definiu metas e muito menos exigiu a elaboração de relatórios que pudessem apurar indicadores para superarmos essas questões.

Ou seja, na maioria das cidades da amostra, os desafios federativos são iguais: esbarram na limitação da capacidade de investimento versus o estoque de endividamento, e carecem de cooperação financeira tripartite, imperiosa para a ampliação e manutenção das políticas municipalizadas.

Reconheço que a adesão dos governos subnacionais aos programas do governo federal e estadual nunca foi obrigatória, porém, o contexto de crise econômica e fiscal dos anos 1990, provocou não apenas um aumento da inadimplência dos contribuintes locais, decorrente do nível de desemprego, bem como contribuiu para aumentar as pressões sociais.

A falta de perspectiva de um plano nacional de desenvolvimento abriu espaço para que o gestor municipal percebesse a adesão aos convênios como uma oportunidade de

garantir um mínimo de incremento de recursos financeiros, fazendo com que as transferências discricionárias ganhassem participação na estrutura orçamentária. Ao mesmo tempo, as contrapartidas com recursos próprios evoluíram e contribuíram para reduzir a autonomia federativa local.

Apesar da importância das transferências intergovernamentais para federação brasileira, acredito que o sistema não consegue contemplar os desafios metropolitanos, em áreas e setores estratégicos para o desenvolvimento social e urbano.

A criação de um mecanismo para realizar uma avaliação periódica das variáveis: demandas; número populacional; recursos transferidos e disponíveis; e custos das políticas descentralizadas, frente ao endividamento contabilizado, poderiam auxiliar no enfrentamento dessas questões.

Nesse sentido, a configuração do atual pacto federativo restringiu e limitou a autonomia da esfera municipal, além de a impedir de elaborar e desenvolver políticas públicas enumeradas no artigo 30 da Constituição federal de 1988. Os orçamentos das capitais, atualmente, têm mais compromissos com as atribuições comuns das três esferas federativas, as responsabilidades municipalizadas, do que com as competências que lhes são exclusivas, mesmo mediante um processo de fortalecimento da cobrança e arrecadação da receita própria.

Em tempos de normas fiscais austeras, o ciclo do planejamento orçamentário democrático perdeu o seu proposito constitucional81, e, como já abordado no capítulo 3, priorizou apenas o cumprimento de metas do resultado82 primário e nominal.

Enquanto isso, desprovidas do diálogo e da cooperação técnica e financeira entre os entes federativos, o arranjo da nova ordem econômica dos anos 1990, favoreceu apenas a recentralização dos recursos financeiros na esfera federal e permitiu a sua omissão e/ou participação em diversas políticas públicas.

Conforme constatado nas tabelas 19 e 20, a evolução da participação dos recursos próprios no financiamento das políticas descentralizadas, saúde e educação, ocorreu em detrimento das políticas locais de competência exclusiva do poder local.

81 Sabemos que o texto constitucional de 1988 atribuiu ao ciclo orçamentário, à luz das três peças de

planejamento, Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)81 e a Lei Orçamentária

Anual (LOA), a possibilidade para construção de um Estado democrático. Ficou definido que os interesses da sociedade democrática seriam contemplados e assegurados no ciclo orçamentário constitucional, sob a perspectiva de que o executivo deveria planejar os programas e ações, ao mesmo tempo, fortalecer o papel do poder legislativo por meio da aprovação das ações priorizadas por meio da participação e decisão da sociedade.

82 A esse respeito, ver a metodologia no site da Secretaria do Tesouro Nacional: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/mcasp

Enquanto que os serviços de infraestrutura urbana, como lixo e transporte coletivo urbano, drenagem, cultura, esporte, entre outros, tiveram queda expressiva na participação média da estrutura orçamentária das 26 capitais.

Cenário que mostra a necessidade de ampla discussão federativa como objetivo de assegurar um controle social das responsabilidades de cada governo. Em praticamente todas as 26 capitais houve retração de recursos no âmbito da política das responsabilidades exclusivas municipais. A evolução do comportamento das despesas públicas destacadas nas figuras 3 e 4, sinaliza que as questões urbanas têm sido desprezadas ao longo do processo da descentralização em curso.

Figura 3- Evolução funcionais do gasto público: 1996-2001, em %

As despesas com a funcional transporte tiveram retração em 3 momentos: em 1996, a participação média alcançou 15 pontos percentuais das despesas totais; em 2001, logo após a promulgação da LRF, contabilizou apenas 5 pontos percentuais de participação no orçamento total. E conforme os dados da figura 4, em 2010, essa participação foi reduzida para apenas 4 pontos percentuais da estrutura do orçamento total. Vale observar que, nesse caso, não houve desmembramento da funcional da despesa.

Enquanto que as ações da funcional urbanismo e habitação totalizaram, em 1996, participação média de 16 pontos percentuais do orçamento total das capitais, em 2001,

15% 19% 16% 15% 19% 20% 14% 9% 20% 23% 14% 5% 0% 5% 10% 15% 20% 25%

Educação e Cultura Saúde Saneamento Habitação e Urbanismo Transporte

Evolução das principais funcionais da despesa pública para 26 Capitais Período 1996 - 2001 - Fonte: STN, Finbra vários anos

foi reduzida para 14 pontos percentuais. Podemos dizer que, diante desse comportamento, a aprovação da Lei do Estatuto da Cidade, Lei n. 10.257/2001, já nasceu com pouca possibilidade de aplicação. As palavras de Maricato (2011:03) resumem bem o descaso com as necessidades urbanas ligadas ao território:

(...) São mais de vinte anos sem política pública de habitação, saneamento e transporte. Isso passa pelo neoliberalismo e pela década perdida. São políticas ligadas ao território. Não estou falando de distribuição de renda. Distribuição de renda não basta para resolver o problema urbano. Aqui tem de distribuir ativo, que é cidade, é terra urbanizada. A questão da terra é central na política urbana, pois ela é dominada por esse mercado restrito, elitista e especulativo. O povo acaba tendo de se virar... o problema é que a base fundiária permanece a mesma. Lei nós temos, plano nós temos, mas não aplicamos a função social da propriedade. O que aconteceu na ditadura, na época do Banco Nacional da Habitação (BNH)? As fontes de financiamento eram o FGTS e o SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo), que é basicamente poupança privada e poupança dos trabalhadores. O governo colocou um subsídio para baixa renda, de recurso orçamentário federal. Mas se ninguém nos três níveis de governo – federal, estadual e municipal – mexeu na base fundiária. Aí houve uma maior desorganização no mercado de terras, com um impacto bárbaro sobre os preços.

A evolução média das mesmas funcionais entre 2002 a 2010, período após a vigência da LRF, permaneceu com a mesma tendência, educação e saúde ganharam participação na estrutura orçamentária total, e as demais funções do gasto público perderam orçamento. O avanço dos gastos com os dois setores se justificou em parte, pela municipalização das políticas, e em parte pela redução dos recursos direcionados ao orçamento da saúde ocorrido por meio desvinculação da receita da União promovida ao longo do período.

A alta prioridade conferida aos setores da saúde e da educação, mostrou um comprometimento de aplicação dos recursos orçamentários muito superior aos limites definidos constitucionalmente.

Dessa forma, o poder local vem assumindo parte crescente do custeio financeiro desses setores municipalizados, em meio a um descontrole da gestão, e da falta de recursos para investir em infraestrutura local, sendo que parte expressiva dos serviços acabaram sendo terceirizados, circunstância que gerou mais desafios, como por exemplo, assegurar parâmetros nos preços e na qualidade de cada serviço contratado.

Ou seja, mais vagas, mais leitos, mais exames laboratoriais, sem a gestão e controle da política pública, infelizmente, não podem ser considerados sinônimos de eficiência e qualidade a um bom atendimento ao cidadão. A figura abaixo nos permite

entender a precariedade da infraestrutura urbanística, da política de transporte, saneamento e habitação que os grandes centros administram.

Figura 4 - Evolução funcionais do gasto público: 2002-2010, em %

A figura mostra que os municípios capitais se comportaram como captadores passivos e apáticos dos recursos das políticas discricionárias dos programas federal e estadual, em uma circunstância de quase completa perda de autonomia e iniciativas que considerem e atendam as urgências locais. E a dificuldade da gestão das políticas descentralizadas e terceirizadas, tem colocado em risco não só a política pública, mas a vida da população. A única certeza que temos é quanto à necessidade de enfrentarmos essas questões, dando transparência ao custo e apresentando indicadores de cada política.

4.3.1 Novos Rumos?

Deveríamos todos estar voltados para um debate federativo, que considerasse as sincronias reproduzidas pelo arranjo atual, e criarmos mecanismos que garantissem uma verdadeira cooperação técnica e financeira das três esferas de governos na construção da gestão de cada política pública descentralizada, como forma de valorar e entender as necessidades de cada região e de cada localidade.

21% 20% 13% 8% 3% 3% 2% 23% 20% 12% 9% 3% 2% 1% 23% 20% 12% 9% 4% 3% 2% 0% 5% 10% 15% 20% 25%

Saúde Educação Urbanismo Encargos Especiais

Transporte Saneamento Habitação

Evolução das principais Funcionais da Despesa Pública das 26 Capitais Período 2002 - 2010 - Fonte: STN, Finbra vários anos

De um modo geral, os programas locais permanecem sem orçamento fiscal para enfrentarem: as enchentes; os congestionamentos que paralisam a rotina das cidades; o caos no transporte público; o aumento da violência e criminalidade; desmoronamentos; poluição do ar e da água; acúmulo de lixos entulhados por todos os cantos das cidades; violência contra o patrimônio público; especulação imobiliária; fazer drenagem; permanecem desprovidos de um planejamento de ordenamento territorial e regularização fundiária; carência de cultura; de esporte.

Enfim, o modelo vigente é engessado e permite o sucateamento de políticas que terminam por prejudicar o bem-estar de todos. Parece que as políticas públicas de responsabilidade municipal se tornaram sem importância e inalcançáveis, e o retrato é um só: o da precariedade social e urbana nas capitais.

Quando analisadas as informações da execução orçamentária, não mais pela média, mas por cada município capital, considerando o último ano do período, a realidade é ainda mais desequilibrada. Por exemplo, a cota orçamentária média da amostra para a funcional urbanismo foi de 12 pontos percentuais do orçamento total, conforme mostrado na figura 04. Essa participação é igual à dos municípios com menor população e que tendem a ter menor complexidade e custos nas intervenções urbanas.

Porém, conforme as informações da tabela 21, para as cidades economicamente fortes, como Belo Horizonte, essa despesa auferiu apenas 5 pontos percentuais dos recursos orçamentários com infraestrutura. Recursos que dificilmente seriam suficientes para enfrentar os impasses urbanos que o município contabiliza.

No caso da habitação, os valores mínimos destinados pelas cidades mais populosas e mais dinâmica economicamente do País, como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Fortaleza, os percentuais foram de apenas 3%, 2%, 0%, e 2%, respectivamente. Não foi diferente com a política de saneamento, as participações foram de 1%, 3%, 0%, e 0%, respectivamente.

Tabela 21 - Funcionais infraestrutura, e Encargos Especiais (despesas financeiras) das 26 capitais e por intervalos populacionais – ano 2010, em %

A política de transporte, para o conjunto das 26 capitais, teve uma média apenas de 4 pontos percentuais. Vale lembrar que todos os dias milhões de pessoas sofrem com a questão da mobilidade urbana, realidade que atinge todos os cidadãos, independentemente de renda e região. Cidades mais populosas, como Rio de Janeiro, Salvador e Belo Horizonte, alocaram na funcional transporte apenas 1, 3 e 2 pontos percentuais do orçamento total, respectivamente.

Enquanto que a média com o pagamento de juros e amortização do principal da dívida pública foi de 9 pontos percentuais, as cinco cidades mais populosas destinaram as maiores participações, 12, 15, 8, 4 e 6 pontos percentuais do orçamento total, respectivamente. Gastos que justificam a baixa capacidade de investimento dos centros urbanos mais populosos e endividados do País.

Em condições opostas, os municípios menores, favorecidos pelos critérios das transferências intergovernamentais e com baixo nível de endividamento, conseguiram

MUNICÍPIO População Urbanismo Habitação Saneamento Transporte Encargos Especiais São Paulo 11.253.503 9% 3% 1% 9% 12% Rio de Janeiro 6.320.446 13% 2% 3% 1% 15% Salvador 2.675.656 18% 0% 0% 3% 8% Fortaleza 2.452.185 14% 2% 0% 0% 4% Belo Horizonte 2.375.151 5% 4% 7% 2% 6% Manaus 1.802.014 24% 1% 0% 0% 4% Curitiba 1.751.907 27% 1% 3% 0% 3% Recife 1.537.704 16% 1% 1% 0% 2% Porto Alegre 1.409.351 3% 2% 21% 0% 6% Belém 1.393.399 19% 1% 2% 1% 9% Goiânia 1.302.001 1% 0% 8% 3% 3% São Luís 1.014.837 6% 1% 9% 7% 2% Maceió 932.748 4% 1% 9% 0% 2% Teresina 814.230 10% 2% 2% 0% 1% Natal 803.739 20% 1% 0% 0% 4% Campo Grande 786.797 9% 1% 0% 15% 0% João Pessoa 723.515 9% 1% 1% 2% 3% Aracaju 571.149 20% 2% 1% 0% 2% Cuiabá 551.098 12% 1% 0% 0% 9% Porto Velho 428.527 26% 3% 0% 1% 6% Florianópolis 421.240 9% 0% 12% 0% 2% Macapá 398.204 3% 2% 0% 2% 2% Rio Branco 336.038 27% 0% 7% 1% 4% Vitória 327.801 19% 3% 5% 0% 3% Boa Vista 284.313 17% 1% 10% 4% 3% Palmas 228.332 13% 1% 3% 1% 5%

Média das 26 Capitais 42.895.885 12% 2% 3% 4% 9%

registrar maior capacidade de investimento, mesmo com baixa arrecadação de recursos próprios.

Em quanto os municípios populosos, com alta capacidade de arrecadação de recursos próprios, porém, endividados e impedidos de realizarem operações de crédito, comprometeram parte expressiva dos seus orçamentos com as despesas financeiras, e, na maioria das vezes, permaneceram sobrecarregados pelas atribuições da municipalização dos serviços, por meio da terceirização.

Vale observar que para proteger algumas áreas de maiores intervenções e restrições federativas, muitas capitais criaram alguns fundos especiais na tentativa de assegurarem algum recurso do orçamento fiscal para suas responsabilidades exclusivas municipais, para as quais não haviam sido garantidos os recursos constitucionalmente, nem por meio de convênios ou de programas nacionais.

Apesar de a medida ter sido usada com frequência, as dificuldades econômicas restringiram a possibilidade de se reservar recursos próprios para esses fundos. Porém, muitos não cumpriram seus objetivos estabelecidos na lei orgânica municipal, pois não conseguiram planejar qualquer oferta de política pública por meio desse instrumento, frente à impossibilidade de reservar e efetivar o orçamento desses setores.

Dessa forma, o processo orçamentário caminhou no âmbito de transferir parte das responsabilidades das políticas descentralizadas para as organizações não governamentais (ONGs), e administração indireta – fundações, autarquias e empresas públicas.

As informações da tabela 22, apesar de não nos permitirem identificar quais ações dos programas foram executadas pelos centros urbanos mais autônomos, mostraram a execução por categoria econômica e natureza das despesas orçamentárias83.

As naturezas das despesas com pessoal e investimentos registraram queda nos dois intervalos de municípios mais populosos, onde se encontram mais da metade das capitais. Ao passo que os intervalos que reuniram os municípios com menor população obtiveram uma participação maior dessas despesas na estrutura orçamentária. Em parte,

83A categoria da despesa corrente recebeu o código 3 na Lei 4.320/64 e agrega três naturezas de despesas

com os respectivos códigos: 1. Pessoal e Encargos Sociais; 2. Juros e Encargos da Dívida; 3. Outras Despesas Correntes. Essas despesas são realizadas para garantir o funcionamento da administração pública e a oferta dos bens e serviços públicos. O código 4 é aplicado para a categoria econômica de capital e reúne três naturezas de despesas com os respectivos códigos: 4. Investimentos; 5. Inversões Financeiras; e 6. Amortização da Dívida.

o resultado da queda da participação dos gastos com pessoal e investimentos, nos permite compreender a causa do sucateamento da política pública nos grandes centros. Nos dois primeiros intervalos com maior número populacional, onde se encontram a maioria das capitais, é possível observar o crescimento da natureza Outras Despesas

Correntes, que agrupa os serviços da terceirização. Em 1998, a participação dessa

despesa no intervalo mais populoso representava 27 pontos percentuais, em 2010 a participação saltou para 46 pontos percentuais do orçamento total.

Tabela 22 - Participação média por categoria econômica e natureza de despesa, por intervalo populacional dos 5560 municípios, anos: 1998; 2004 e 2010 - em %

A escassez do quadro de servidores públicos, aliada às dificuldades com relação ao reajuste salarial e ao sucateamento da estrutura dos equipamentos públicos, dificultaram a reposição de diversas das carreiras, que tem se dado por meio da contratação dos serviços de terceiros de pessoa física, e, principalmente, pessoa jurídica, contabilizados na categoria econômica Outras Despesas Correntes.

Ou seja, acredito que a escolha pela terceirização tem se dado pelos limites fiscais definidos para as despesas com pessoal do executivo municipal, que poderiam representar 54 pontos percentuais da sua receita corrente líquida.

Alinhado, seguramente, com a escolha pela terceirização e pela baixa capacidade de investimento, limitadas pelo coeficiente de endividamento que impediu a realização de operações de crédito para realização de novos investimentos locais, as 26 capitais terceirizaram as políticas descentralizadas.

Acredito que as imposição fiscais interferiram na autonomia municipal sob muitos aspectos, desde a possibilidade de implantação de um plano de carreira pública, produtividade, realização de concursos públicos, e até mesmo de a promoção de um reajuste salarial garantido constitucionalmente, favorecendo uma tendência de queda do

1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 acima de 1 MILHÃO 23% 23% 20% 47% 43% 36% 3% 5% 4% 27% 40% 46% 8% 10% 8% 12% 2% 3% 500 MIL - 1 MILHÃO 8% 9% 8% 59% 44% 43% 2% 1% 1% 28% 42% 45% 9% 11% 9% 1% 2% 2% 300 MIL - 500 MIL 8% 9% 8% 59% 45% 41% 3% 1% 1% 27% 42% 43% 9% 10% 13% 2% 2% 2% 100 MIL - 300 MIL 17% 17% 17% 54% 44% 45% 2% 1% 1% 29% 40% 41% 13% 13% 12% 2% 2% 2% 50 MIL - 100 MIL 12% 11% 12% 55% 45% 48% 1% 1% 0% 29% 40% 40% 13% 13% 10% 2% 2% 2% 30 MIL - 50 MIL 8% 8% 9% 52% 44% 47% 1% 0% 0% 31% 41% 39% 13% 13% 11% 2% 2% 2% 795 - 30 MIL 25% 23% 24% 49% 44% 46% 0% 0% 0% 33% 44% 39% 16% 11% 13% 1% 2% 1% Média 100% 100% 100% 51% 44% 43% 2% 2% 1% 29% 41% 42% 11% 11% 11% 5% 2% 2%

FONTE: STN/FINBRA, anos: 1998, 2004 e 2010.

Despesas Correntes Despesas de Capital

População Intervalo

populacional dos 5560 Municípios

Amortizações/ Desp Total Pessoal / Desp Total Juros / Desp Total Outros Custeios /Desp Total Investimento/Desp Total

gasto de pessoal na maioria das capitais, ao mesmo tempo, assegurou a redução das despesas primárias, necessárias para financiar as parcelas da dívida renegociada.

Entretanto, observo que a gestão e controle dos contratos terceirizados, ainda aguarda métodos para serem fiscalizados com nitidez. Nem o ordenador da despesa pública, nem o cidadão conseguem de fato fiscalizar e mensurar o custo, quantidade, qualidade da maioria dos serviços terceirizados.

Com isso, o controle do dinheiro público não tem sido uma tarefa fácil de ser realizado, permitindo inclusive que os contratos, frente ao emaranhado de interesses que esse tema capitaliza, acomodassem interesses individuais e políticos, e que não necessariamente contribuem para a realização das demandas coletivas.

Os dados da tabela 23 mostraram que, em 1995, a natureza Outras Despesas Correntes, para metade dos municípios da amostra, comprometia em média 30 pontos percentuais do orçamento corrente; em 2010 atingiu mais de 48 pontos percentuais.

O crescimento da participação dessa natureza de despesa, pode ser considerado como um resultado do aumento dos gastos com as contratações de serviços de consultoria, serviços de terceiros pessoas física e jurídica, locação de mão de obra, transferência às instituições privadas, subvenções sociais84 e contribuições85. Comportamento que confirma a tendência da terceirização da política pública para a maioria das capitais.

Forçoso lembrar que a LRF não impôs nenhum limite e/ou restrição à terceirização, o que sugere que ela tenha sido elaborada mais para atender aos interesses do mercado do que propriamente para o ajuste das finanças públicas.

E, a gestão e fiscalização dos contratos, em muitos setores tem apresentado fragilidades, permitindo que o mercado se encarregasse de aferir seus interesses, sem dificuldade e ou sem restrição fiscal, a partir da solicitação de um realinhamento de preços durante a execução dos serviços.

Dessa forma, a responsabilidade constitucional do Estado para assegurar os direitos aos cidadãos tem sido de forma sistemática transferida ao mercado, sem um controle eficaz, dando a sensação de que a importância do Estado tem sido aniquilada

84 Subvenções Sociais: conforme portaria 163/2001, despesas orçamentárias para cobertura de despesas

de instituições privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa, de acordo com os artigos 16, parágrafo único, e 17 da Lei n. 4.320/1964, observado o disposto no art. 26 da LRF.

85 Contribuições: conforme portaria 163, de 2001, despesas orçamentárias às quais não correspondam

contraprestação direta em bens e serviços e não sejam reembolsáveis pelo recebedor, inclusive as destinadas a atender a despesas de manutenção de outras entidades de direito público ou privado, observado o disposto na legislação vigente.

em detrimento das próprias instruções normativas e das imposições fiscais da LRF, que, de certa forma respaldou o modelo, definindo limites de gastos com pessoal, por exemplo, e nenhum teto foi definido para as terceirizações.