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A síndrome do pânico

No documento Imagens da metrópole no cinema brasileiro (páginas 131-161)

A cidade se fecha sobre André e se mostra a partir das relações que este estabelece com o seu entorno. O mundo de André é limitado pelo que a sua condição social lhe permite. Na rua, deixa escapar seu estado de espírito quando, encolhido e cabisbaixo, exterioriza seus pensamentos: “existem pessoas que não saem nas ruas, nunca! Chama-se síndrome do pânico. Acho que era um trabalho de faculdade. Elas fi cam em casa porque não conseguem sair na rua. O problema é que tu acaba fi cando velho”.

Essa seqüência, iniciada no momento em que ele sai de casa, se estrutura em pequenos pedaços de imagens produzidas por uma câmera no ombro. A preocupação com a velhice, associada à necessidade de estar nas ruas, adquire um signifi cado diferenciado com a repetição da cena no exato instante em que André cruza com um homem velho que se locomove com o auxílio de um andador. A aproximação entre os dois ocorre em ritmo normal. O homem vem em direção a André que se volta para ele discretamente com um leve girar de cabeça. O encontro quebra o tempo da ação e, imediatamente, em câmera lenta, a cena é repetida em um ângulo lateral, levemente diferente do anterior. Duas vezes o encontro, duas imagens, dois ritmos, pontos de vista ligeiramente modifi cados.

A repetição, somente no âmbito da imagem, não interrompe o fl uxo do pensamento. Ela está ali para intensifi car a força do narrador que apenas aparentemente se associa à voz de André. É este narrador fílmico que defi ne como necessária essa reiteração do destino do homem, fadado à decrepitude e à fi nitude do corpo. Um novo corte retoma o ritmo anterior e André conclui: “Melhor enfrentar a rua”.

A câmera lenta52 é um dos recursos do

cinema para interromper o fl uxo do tempo. No cinema, o tempo adquire o ritmo exigido pela proposta estética do autor, podendo se estender ou se comprimir, na medida do necessário. No limite, o próprio fragmento de um fi lme é um recorte de tempo/espaço cu- ja continuidade se dá pela invisibilidade do espaço negro inserido entre os fotogramas.

Todo corpo, todo gesto, todo lugar, toda efusão, em resumo, toda continuidade e toda unidade fi lmada são (impiedosamente) cortadas em fragmentos descontínuos (os fotogramas) separados por fi tas negras, intervalos cegos (…) não vetores do visível, mas que não deixam de ser partículas de tempo, de duração do sensível (COMOLLI, 1995, p. 151).

A decisão anunciada, de enfrentamento, apresenta a rua como um lugar pouco

52 Outro momento de repetição em câmera lenta mostra Sílvia passando seminua diante da janela do quarto,

acolhedor. É explícito o mal-estar, e o protagonista se protege do mundo criando uma redoma em torno de si, resguardando- se com um fone de ouvido transformado em prótese orgânica, capaz de criar um ambiente privado e inviolável.

André não demonstra nenhuma disponi- bilidade para a troca e aparentemente nada do que acontece ao seu redor lhe interessa. Enfrentar a rua torna-se necessário não como possibilidade, mas como fatalidade, assim como quase tudo o que faz. Sua passividade esconde práticas e posicionamentos nada compatíveis com a vida em sociedade. André engana, agride, assalta e mata como se esti- vesse vivendo em uma história em quadrinhos, sem sofrer nenhum tipo de punição.

Se contra ele, supostamente, nada poderia pesar, sobre a cidade também não. Ela adquiriu vida própria, indiferente à sua população que, em troca, retribui na mesma moeda. A esfera pública como esfera da liberdade aqui transcende qualquer prática de civilidade, tendo se transformado em um espaço para indivíduos anônimos sem vínculos ou ação política de qualquer espécie e quiçá sem nenhuma vida social.

Hannah Arendt, ao discutir o homem como animal social ou político, reconstrói a trajetória desses conceitos no mundo

ocidental, apontando para o fato de que a vida humana ativa sempre vai estar relacionada com outros homens ou com coisas feitas por eles.

As coisas e os homens constituem o ambiente de cada uma das atividades humanas, que não teriam sentido sem tal localização; e, no entanto, este ambiente, o mundo ao qual viemos, não existiria sem a atividade humana que o produziu (…) Nenhuma vida humana, nem mesmo a vida do eremita em meio à natureza selvagem, é possível sem um mundo que, direta ou indiretamente, testemunhe a presença de outros seres humanos. (ARENDT, 1997, p. 31)

André pode ser pensado como alegoria de uma vida social empobrecida, como um eremita do centro urbano, inserido no mecanismo de consumo capitalista – ainda que isto lhe seja proibido –, destituído do seu poder de produção, afastado das esferas de decisão. O espaço público, para ele, pouco signifi ca; as ruas não são o lugar da rebelião (VIRILIO, 1996a) ou da expressão. A ação política não faz parte de seu imaginário e a cidade onde vive pode ser substituída por outra a qualquer momento.

A distinção entre família e polis na cidade- estado, onde a primeira estava diretamente associada às necessidades e carências que levavam os homens a viverem juntos, e a

segunda ao espaço da liberdade onde todos eram iguais, situações possíveis pela condição social do homem grego, de acordo com Arendt, aqui não encontra vez. Não somente porque “a privatividade53 moderna, em sua

função mais relevante – proteger aquilo que é intimo – foi descoberta não como o oposto da espera política” e sim da esfera social (1997, p. 48), como destaca Arendt, mas também porque a ação na esfera pública se transformou, quase exclusivamente, no direito ao consumo como signifi cado de participação.

André está alijado dessa possibilidade, o que ganha no trabalho não lhe dá direito nem mesmo de assumir uma posição social. Operador de fotocopiadora, o jovem se apresenta como desenhista de história em quadrinhos, afi nal “que guria namoraria um operador de fotocopiadora?”, ele se pergunta. Ainda no prólogo do fi lme, fi ca clara a sua insatisfação com a mecanização de seu trabalho e com o que ele signifi ca simbolicamente. “Grande merda” ser operador de fotocopiadora, afi rma em pensamentos. Mas é o que ele diz para as garotas por quem se interessa. Mas só se elas perguntam.

Em um dos fragmentos do fi lme, uma voz feminina vinda de fora do quadro anuncia o diálogo que ele acabara de comentar. A

imagem ainda é a de André na papelaria e a moça já lhe pergunta: “E o que que tu fazes?” “Eu, eu sou operador de fotocopiadora”, responde André. “E o que que é isso?” “Eu opero uma máquina de fotocópia”. “Tipo xerox?” “É, mas só que de outra marca”. “Ah, tu trabalha numa xerox de uma fi rma”. “Não, não, numa loja”. “Legal!”, é a resposta dela. A conversa acaba assim. A moça não sabe mais o que dizer e André, humilhado, se retrai. De volta à papelaria, ele questiona o esforço intelectual para desenvolver sua tarefa e conclui: “É uma merda!”. Fala que se realiza no tempo e no espaço do encontro com a menina, imagem que retorna ao quadro. “É só pra ganhar uma grana. Eu, na verdade, trabalho com ilustrações, mandei até um material pra uma revista”, diz com um ar mais animado, logo substituído pelo reconhecimento de que sua explicação não modifi cou a impressão que causava naquele momento. A voz over encerra a questão: “Material… acho que ela não caiu nessa. Gurias são espertas”. A câmera, na lateral, se fecha sobre eles destacando a decepção da garota e a tristeza de André.

André não convence, e nem poderia, uma vez que nem ele mesmo está convencido disto. Goffman (2007) explica que a expressividade de um indivíduo, como sua capacidade de impressionar, envolve

53 “O que hoje chamamos de privado é um círculo de intimidade cujos primórdios podemos encontrar nos

a expressão que ele transmite baseada nos símbolos verbais ou seus substitutos e a expressão que ele emite que se apóia em ações que não estariam estritamente relacionadas com a informação, mas com os seus gestos e seu comportamento como uma expressão de “tipo mais teatral e contextual”.

O cenário do encontro – uma calçada de um prédio em ruínas construído quase na beira do rio que aparece ao fundo –, o corpo pouco à vontade, a expressão facial e a fala parecem negar o que diz, desvalorizando a informação. Esses elementos, somados, negam de toda forma a imagem que ele desejaria transmitir para a garota. Ainda, segundo Goffman,

em presença dos outros, o indivíduo geralmente inclui em suas atividades sinais que acentuam e confi guram de modo impressionante fatos confi rma- tórios que, sem isso, poderiam perma- necer despercebidos ou obscuros. Pois se a atividade do indivíduo tem de tornar-se signifi cativa para outros, ele precisa mobilizá-la de modo tal que expresse, durante a interação,54 o que ele

precisa transmitir (2007, p. 36 e 37).

O tom de desculpas e de justifi cativa afi rmando a atividade de operador de fotocopiadora como provisória acaba por tirar da informação, que para ele seria a

mais importante – o fato de trabalhar com ilustrações –, qualquer possibilidade de ser encarada como verdadeira.

André desenha e se refere ao seu desenho como algo que não serve para nada. “É divertido porque não serve pra nada! Só pra dizer pras gurias. Mas não tem dado muito certo. Gurias são muito espertas. Gurias reconhecem um operador de fotocopiadora em poucos segundos. Gurias não sonham em passar a vida do lado de um operador de fotocopiadora. Viajar pelo mundo com um operador de fotocopiadora. Ter fi lhos de um operador de fotocopiadora. Pelo menos, eu, até agora não encontrei nenhuma guria que sonhasse isso”.

Todorov, em seu livro A vida em comum (1996), ao tratar das relações humanas a partir do reconhecimento mútuo, recorre à Teoria dos sentimentos morais de Adam Smith, destacando que, para este autor, a atenção do outro é fundamental para a construção da identidade. “A descrição de Smith de nossa dependência dos outros está impregnada de termos visuais: mostrar, dissimular, notar, fi tar, observar, ignorar, consideração, vista, olhos, atenção, olhar…”, diz Todorov, completando que para o fi lósofo escocês, “as riquezas materiais não são um fi m em si mesmas, mas um meio de nos assegurar a consideração dos outros” (1996, p.

29). André não tem o que mostrar, não vê perspectiva nenhuma em deixar de ser operador de fotocopiadora ou se tornar um ilustrador. Um dos seus sonhos era ser jogador de futebol: querido pelas mulheres, adorado pela torcida e famoso. Mas desse sonho já desistira havia muito tempo.

O protagonista de O homem que copiava não vislumbra nenhuma possibilidade de ascensão social por via coletiva. Nem ele, nem nenhum dos outros personagens do fi lme. A ação individual se sobrepõe e o que se vê é um esforço em resolver problemas através de saídas que benefi ciam somente a eles próprios, através de atitudes antiéticas ou propiciadas pelo acaso ou pela sorte, confi rmando o que Bauman descreve como uma inversão no campo da prática social:

O auto-engrandecimento está toman- do o lugar do aperfeiçoamento social- mente patrocinado e a auto-afi rmação ocupa o lugar da responsabilidade co- letiva pela exclusão de classe. Agora, são a sagacidade e a força muscular individual que devem ser estirados no esforço diário pela sobrevivência e aperfei- çoamento. (BAUMAN, 1998, p. 54)

Quando ele cita a necessidade de enfrentar as ruas é possível pressupor que essa fala esteja se referindo a um lugar perigoso, mas

não é o que acontece e nenhuma seqüência confi rma essa constatação. Nenhuma sirene, nenhum acontecimento fora da ordem, nada que altere a normalidade, exceto as ações do próprio André que, apesar de violentas, não chegam a modifi car a rotina da cidade ou a ele próprio, como se acontecessem em um mundo paralelo com uma lógica própria e independente da vida real. A atmosfera que envolve algumas dessas ações, como a do assalto, é exemplar em relação a isto.

No dia marcado, André espera a chegada do carro-forte em uma locadora de vídeo. Lá encontra um dos vizinhos55 que ele espionava

de sua janela. Curioso, se aproxima e pergunta que tipo de música o sujeito gosta. A resposta vem meio antipática, mas enfática: rock. Banda preferida: Creedence. Era essa a deixa para o clima do assalto se apresentar como uma aventura quase cômica, algo que mesmo na dimensão com que se apresenta não altera o caminhar da vida. Não há nenhuma tensão, nenhuma expectativa que dê a dimensão do ato que André irá cometer dentro de instantes. A ação de André vai ser neutralizada pelo prêmio da loteria, que o deixa em uma situação confortável, livrando-o da necessidade de usar o dinheiro do assalto.

Cuanto más “aventurera” es una aventura, es decir, cuanto más pura- mente responde a su concepto, más “soñada” resulta para nuestro recuerdo (…) La aventura, por contra, en su sentido específi co, es independiente del antes y del después; sus límites se determinan sin referencia a éstos. Justo cuando la continuidad con la vida es rechazada tan por principio, o cuando no necesita siquiera ser rechazada porque existe de antemano una extrañeza, una alteridad, un estar- al-margen, es cuando hablamos de aventura. (…) Es como una isla en la vida, cuyo comienzo y fi nal viene determinados por sus propias fuerzas confi guradoras (…) (SIMMEL, 1988, p. 12 e 13).

E é ao som56 da banda americana que o

assalto se desenrola. O carro chega, os planos se multiplicam em ângulos e pontos de vista diversos. A cidade que até então era vista como um espaço fechado se abre para a ação, como se quisesse fi nalmente compor o entorno, localizando personagem e receptor em um lugar identifi cável. O jogo de quebra de eixo confunde a percepção do movimento que leva André em direção ao carro. A câmera mais captura em pedaços o que acontece do que acompanha propriamente. Ela mantém uma distância segura, porém atenta, chegando a dar uma virada brusca em direção ao veículo, quando André, que

parecia ter desistido ao passar direto, se volta e confi rma o assalto.

Tudo acontece como um rompante, um sobressalto. A voz de André quase some, coberta pela música, e nada dá errado até o momento em que, ao pegar a sacola de dinheiro no chão, ele é desmascarado pelo pai de Sílvia, segurança do banco. Assustado, atira no pé do homem, deixa a arma cair e sai correndo com a sacola na mão. A cidade aparece borrada. Ninguém se volta para ele, ninguém liga para o que está acontecendo. André entra em uma galeria escura que o leva para outra rua. Tira o casaco e cobre com ele a sacola. Do outro lado encontra Cardoso com quem tinha combinado fugir de carro, mas este parou em lugar proibido e um guarda de trânsito está próximo. A saída é pegar um ônibus.

André e Cardoso, sem dinheiro para a passagem, são obrigados, ali mesmo dentro do ônibus, a abrir a sacola com o dinheiro roubado. Eles tiram uma nota de cem reais que é recusada pelo cobrador. Mais uma vez têm de recorrer à sacola de onde tiram cinqüenta reais para fazer o pagamento. Nenhum dos passageiros estranha o que acontece na catraca. O ônibus cruza o quarteirão e passa em frente ao local do assalto. Lá estão alguns transeuntes socorrendo o segurança ferido. Entre eles, o

vizinho que gosta do Creedence. Ele e André se reconhecem. Momento ímpar no fi lme. A ausência de relacionamentos no espaço urbano, neste caso, aparece como uma ferramenta de segurança. O assalto se deu na esquina da casa de André. O prédio do banco pode ser visto da janela de seu apartamento. Enquanto ele corre com o dinheiro, a gôndola que fi ca em frente à sua janela é vista do alto.

Esse estado de não-relacionamento entre pes- soas que habitam um mesmo bairro, uma mes- ma rua, pode levar a se pensar em sujeitos urbanos como os descritos por Richard Senett:

(...) sobreviventes e autômatos da metrópole de quem são solicitados uma postura de isolamento e de indi- vidualidade, os habitantes ou os traba- lhadores de uma estrutura urbana de alta densidade são inibidos ao sentirem qualquer relacionamento com o meio no qual está colocada essa estrutura (…); assim como alguém pode se isolar em um automóvel particular para ter liberdade de movimento, também deixa de acreditar que o que o circunda tenha qualquer signifi cado além de ser um meio para chegar à fi nalidade da própria locomoção. (1988, p. 29)

Para André, as calçadas são para serem transpostas como um corredor que liga sua

casa ao trabalho ou o leva até Sílvia. Prédios e equipamentos urbanos só ganham sentido quando associados ao uso imediato ou quando, na falta do que fazer, são transformados em objetos de entretenimento, como ocorre com o Clube Gondoleiros e com os vizinhos que são observados todas as noites por André através de seu binóculo, fruto da economia de um ano. “Onze horas eu pego o binóculo. Ainda tem muita gente acordada. Uma coisa que eu descobri olhando os vizinhos é que gordos dormem tarde. Eu não sei por quê. Deve ter uma estatística. Entre os últimos caras a dormir sempre têm pelo menos um gordo (…) Outra coisa importante que eu descobri, além do fato dos gordos dormirem tarde, é que se tu quer ver uma coisa de binóculo não adianta fi car pulando de uma janela pra outra atrás de ação. Tu tem que se fi xar numa janela e esperar. É como pescar”. Essa postura carrega então uma técnica sobre como se apropriar da vida dos outros, traz um olhar paciente se deixando capturar pelo que lhe aparece à frente. Obviamente como uma decisão de voltar-se para fora estando dentro, uma prática vouyerística justifi cada em função da falta de opção, dada pela falta de possibilidades fi nanceiras, sobretudo, que lhe permitam uma vida mais participativa. Olhar é o que resta a André e esse olhar não pode ser reconhecido como existente. Daí as pessoas serem espionadas à noite. A luz

tênue da noite é mais facilmente controlada do que a luz diurna.

Com Sílvia, no entanto, ele fugiu a essa regra. André se apaixonou em uma espiada diurna. O binóculo não esperou pacientemente como na pescaria. Ao contrário, parecia estar procurando algo, tal seu movimento desordenado. Ela tomava café na sacada do prédio, vestida com um pijama de fl anela. A cidade também é capturada pelas lentes do binóculo: “Daqui dá pra ver a ponte, todo dia ela sobe pra passar algum navio. É divertido fi car bem de longe e ver uma pessoa bem de perto”. Ele cria estratégias para ver sem ser visto; mantém a cidade distante, ainda que tenha plena consciência daquilo que a conforma. Nada, aparentemente, faz diferença. André é parte de tudo, mas também não é, como um sujeito que se coloca como espectador, mantendo-se no limite da participação.

Cidadão e cidade necessitam um do outro, po- rém a ambos é dado o direito ao esquecimento de que essa relação é indissociável e ninguém assume a responsabilidade sobre o processo.

Não há culpados, somente esquecidos ou distraídos.57 Walter Benjamin, em 1935/

1936, ao discutir a obra de arte na era da reprodutibilidade técnica, traz para o debate

57 “A distração e o recolhimento representam um contraste que pode ser assim formulado: quem se recolhe

um homem que se defronta com um tipo de arte pública e coletiva cuja recepção está baseada no “critério da dispersão”, em substituição ao recolhimento exigido diante de uma obra de arte.

Trata-se da arquitetura, diante da qual é impossível recolher-se e ou entregar-se sob o risco de não dar conta dos estímulos por ela propiciados ou, mais concretamente, sob o risco de ser atropelado pelo fl uxo de pedestres ou de veículos. Se a recepção da pintura exige concentração e contemplação baseada na percepção ótica, a arquitetura requer uma recepção que se dá de modo duplo: pelo uso e pela percepção. O uso está relacionado com a percepção tátil que, segundo Benjamin, está associada muito mais ao hábito do que à atenção.

O protagonista de O homem que copiava representa esse sujeito distraído que anda

No documento Imagens da metrópole no cinema brasileiro (páginas 131-161)