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A socialização na nova Sociologia da Infância: a reprodução interpretativa de

Foto 10 − Brincadeira de salão de beleza entre Graça, Nízia e Tereza

3. A EDUCAÇÃO INFANTIL NA MODALIDADE QUILOMBOLA (DO E NO CAMPO)

4.2. A socialização na nova Sociologia da Infância: a reprodução interpretativa de

Em meados da década de 1980 e no decorrer da década de 1990 surge uma quantidade significativa de produções acadêmicas voltadas para uma concepção renovada de socialização da criança, que consiste na crítica em relação às teorias tradicionais desse processo no campo da Sociologia, e mais enfaticamente no campo da Psicologia. Segundo Frones (1994,

apud MONTANDON, 2001), esses trabalhos – da nova Sociologia da Infância – concentram-

se na exploração de temáticas como: I. as relações entre gerações; II. as relações entre crianças; III. as crianças como um grupo de idade e; IV. os diferentes dispositivos institucionais dirigidos às crianças.

22 Para Wallon (2007) ao imitar, a criança é movida pela vontade de estar no lugar da personagem de referência,

como também pela admiração que esta personagem suscita nela, nos estágios ulteriores poderá prevalecer a vontade de tomar o lugar do outro ou a admiração amorosa. No entanto, atualmente, nos contextos de creches e pré-escolas, onde as crianças vivem longos períodos com grupos de coetâneos, pode-se levantar a hipótese de que elas têm maiores possibilidades de desenvolverem fortes vínculos entre si, assumindo o grupo um papel mais importante nesse processo de construção da sua identidade.

De acordo com Corsaro (2011), dois conceitos são fundamentais para a nova Sociologia da Infância, o primeiro refere-se a visão das crianças como agentes sociais que produzem cultura com características específicas e exclusivas da infância, ao mesmo tempo em que contribuem para a produção das sociedades adultas. O segundo conceito, a infância como uma categoria estrutural, afirma que esse “período socialmente construído em que as crianças vivem suas vidas” (CORSARO, 2011, p. 15) é exposto as mesmas variáveis sociais que os outros grupos geracionais (adolescência, juventude, idade adulta e velhice), como por exemplo, a classe social, o pertencimento étnico-racial etc.

Os conceitos supracitados alimentam a visão de que as crianças, mesmo as bem pequenas, são seres ativos que atribuem significados às suas experiências. Essa concepção ainda sofre resistência, sobretudo, pelo fato de a infância ser vista “exclusivamente como um período em que as crianças são preparadas para o ingresso na sociedade” (CORSARO, 2011, p. 16), ou seja, como “em vias de ser” (SARMENTO, 2008). Contrários a essa concepção, autores como Corsaro (2011) e Sarmento (2008) defendem a ideia de que a criança não é um dado fora da sociedade e que o processo de socialização não se trata apenas de adaptação ou incorporação de hábitos, mas, de um processo criativo de apropriação, no qual a criança reinventa e reproduz a cultura de forma interpretativa, construindo culturas da infância.

Corsaro (2011) aborda essa noção de socialização no seu modelo de teia global, metáfora construída pelo autor para apresentar a ideia de reprodução interpretativa: “o termo

interpretativo abrange os aspectos inovadores e criativos da participação infantil (...) [e] o termo

reprodução inclui a ideia de que as crianças não se limitam a internalizar a sociedade e a cultura, mas contribuem ativamente para a produção e mudanças culturais” (CORSARO, 2011, p. 31- 32) (grifo do autor). Para Cosaro (2011), as crianças são permanentes participantes de duas culturas complexas que estão interligadas, a cultura das crianças e a dos adultos; a primeira é acrescida de informações que as crianças selecionam e se apropriam criativamente da segunda, “para lidar com suas próprias e exclusivas preocupações” (CORSARO, 2011, p. 31).

É vivendo as suas infâncias, nas relações e práticas cotidianas, que as crianças conhecem o mundo e as pessoas, e nesse processo a rotina se torna um espaço de ampliação das curiosidades e inquietações desses sujeitos. A rotina é considerada como um dos elementos

principais para a noção de reprodução interpretativa, pois além de proporcionar às crianças “a

segurança e a compreensão de pertencerem a um grupo social” (CORSARO, 2011, p. 30), também fornecem “um quadro no qual uma ampla variedade de conhecimentos socioculturais pode ser produzida, exibida e interpretada” (CORSARO, 2011, p. 30).

Nessa dinâmica, as crianças produzem de forma coletiva as suas culturas de pares (CORSARO, 2011), que são um conjunto estável de vínculos construídos entre as crianças, nos quais não só o brincar está presente, mas, também as negociações e os conflitos. Segundo Corsaro, as culturas de pares “surgem e são desenvolvidas em consequência das tentativas infantis de dar sentido e, em certa medida, a resistir ao mundo adulto.” (CORSARO, 2011, p. 129). Por isso, permitir que as crianças sejam autônomas em suas brincadeiras, negociações, etc., contribui para a consolidação delas como agentes sociais, fator constituinte do processo de socialização.

Segundo Abramowicz e Oliveira (2012, p. 61), “fazer sociologia da infância, de

certa maneira, é ser contemporâneo”, pois é preciso pensar de quais formas e de quais aspectos

a criança se apropria do contexto no qual ela vive. No caso do cenário brasileiro, marcado pelo processo de escravização, exclusão, criminalização e discriminação dos sujeitos pertencentes ao grupo étnico-racial negro, é preciso, de acordo com Abramowicz e Oliveira (2011):

(...) pensar outras e novas formas de socialização para a produção de novas crianças e outras infâncias, no sentido de pensar outra forma de educação com crianças pequenas que podem ser informadas a partir de uma sociologia da infância que aborde aspectos de nossa realidade social, cultural, econômica e, sobretudo, racial (ABRAMOWICZ e OLIVEIRA, 2012, p. 62).

Se estes fatores se fizerem presentes nas propostas pedagógicas e na prática das instituições de Educação Infantil, estaremos diante de uma educação pós-colonialista (ABRAMOWCZ e RODRIGUES, 2011), da descolonização da criança, ou seja, quando no campo teórico/prático se rompe com a desigualdade de distribuição de posicionamento, de espaços e de valorização entre crianças de classes e de grupos étnico-raciais distintos, proporcionando que as crianças negras construam positivamente suas identidades, distantes de condutas que as inferiorizam.

4.3.O estudo psicológico e sociológico sobre a construção da identidade na