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A sociedade em rede e as organizações

No documento dissertacao final LÚCIA DA PIEDADE (páginas 96-102)

CAPÍTULO III Tecnologias sociais em rede e organizações

3.1 A sociedade em rede e as organizações

O processo atual de transformação tecnológica expande-se exponencialmente em razão da sua capacidade de criar uma interface entre campos tecnológicos, mediante uma linguagem digital comum na qual a informação é gerada, armazenada, recuperada, processada e transmitida. Vivemos num mundo que se tornou digital (Castells, 1999).

Castells define o conceito de sociedade informacional, global e em rede, para identificar uma nova forma de economia que, segundo ele, surgiu em escala global no último quartel do século XX, após a revolução da tecnologia da informação, fornecer a base material indispensável para sua criação.

Testemunhamos um ponto de descontinuidade histórica, pois “a emergência de um novo paradigma tecnológico organizado em torno de novas tecnologias da informação, mais flexíveis e poderosas, possibilita que a própria informação se torne o produto do processo produtivo” (Castells, 1999).

As sociedades serão informacionais porque tem um sistema produtivo que assenta na maximização da produtividade baseada em conhecimento o que implica o desenvolvimento e processamento das tecnologias de informação. A informação e o conhecimento, foram sempre elementos cruciais no crescimento da economia e da evolução da tecnologia, que determinou em grande parte a capacidade produtiva da sociedade e os padrões de vida, bem como, as formas sociais da organização económica (Castells, 2000).

É possível considerar toda a experiência humana como um conjunto de ligações uma vez que a conceção de que a tecnologia criou ela própria uma rede global é considerada algo simplista (Bragança de Miranda, 2002).

De acordo com Bragança de Miranda (2002), o fenómeno da implementação da tecnologia na comunicação, ou seja, o fenómeno da “tecnologização” da comunicação, não parece constituir novidade na medida em que os intercâmbios entre os indivíduos existem já sob a forma de outros parâmetros, como os económicos, políticos e estéticos, concluindo que a “aceleração técnica não produz o novo, é a própria aceleração que constitui a novidade”.

Segundo Castells (2011) o poder da sociedade em rede é exercido através das redes, e sob essas condições sociais e tecnológicas existem quatro formas de poder, que são elas:

Primeiro, o Networking Power, que o autor define como o poder dos atores e das organizações incluídos na rede que constituem o núcleo global da sociedade em rede, que suplantam os coletivos humanos e individuais que não estão nas tais redes globais; em segundo, o Network Power que é o poder resultante das normas exigidas para coordenar a interação social nas redes. Neste caso, o poder não é exercido por exclusão a partir das redes, mas pela imposição das regras de inclusão; em terceiro o Networked Power que se caracteriza pelo poder dos atores sociais em relação a outros atores sociais na rede, as formas e os processos de poder em rede são específicos para cada uma delas, e por último o Network-making Power que

consiste no poder programar redes específicas de acordo com os interesses e valores dos programadores, e o poder de mudar diferentes redes seguindo alianças estratégicas entre os atores dominantes de várias redes.

Ainda segundo Castells (2011), o contrapoder é exercido na sociedade em rede quando se luta para mudar os programas de redes específicas e pelo esforço para romper as opções que refletem interesses dominantes, substituindo-os com interruptores alternativos entre as redes. Os atores são seres humanos, mas os seres humanos estão organizados em redes e agem em redes através da programação e comutação de redes organizacionais.

As relações de poder são a base da sociedade, como as instituições e as normas são construídas para satisfazer os interesses e valores de quem está no poder. No entanto, onde quer que haja poder, há contrapoder, decretando os interesses e valores das pessoas em posições subalternas na vida social da organização. O poder social ao longo da história, mais ainda na sociedade em rede, opera principalmente pela construção de sentido na mente humana através de processos de comunicação (Castells,2011).

A informação e o conhecimento, foram sempre elementos cruciais no crescimento da economia e da evolução da tecnologia, que determinou em grande parte a capacidade produtiva da sociedade e os padrões de vida, bem como, as formas sociais da organização económica. (Castells, 2000).

Castells (2002) estuda a relação entre o informacionalismo, o capitalismo, a produtividade e lucro. Para ele, “as empresas estarão motivadas não pela produtividade, e sim pelo lucro e pelo aumento do valor das suas ações”, acrescentando, que uma nova economia global foi criada e moldada a partir da busca do lucro pelas empresas e a mobilização das nações a favor da competitividade, introduzindo novos arranjos variáveis na nova equação histórica entre a tecnologia e a produtividade.

De acordo com Castells (2002), um outro aspeto que mostra a complexidade política- económica da globalização é a internacionalização da produção, com os grupos empresariais multinacionais e redes internacionais de produção. Cada vez mais se fala em redes: sociais, de comunicação, digitais, de informação, etc., no entanto ter em atenção que todas estas possibilidades significam o compartilhar de identidades, a formação de laços sociais, a partilha de informação e conhecimento cultural.

Ainda segundo Castells, a estrutura, dinâmica e génese da economia global, que também é informacional, torna-se cada dia mais interdependente, o crescimento e a transformação do comércio internacional, acarreta uma verdadeira globalização dos mercados de bens e serviços.

Uma nova noção de empresa sustentada determina-se pelo sucesso da adaptação aos contextos, dependendo da capacidade de nos movermos de forma rápida, da flexibilidade e da capacidade de ajustamento.

Com a pressão da competição global e à medida que aumenta o uso das tecnologias de informação e comunicação, as organizações assumem contornos distintos e definem-se novos conceitos e novas abordagens (Pereira,2005).

Segundo Shell Holtz (2002) os princípios da comunicação estão em mudança e a dar lugar a uma nova organização da era da informação cujas características estão expostas no quadro que se segue:

Tabela 6:Economia industrial versus economia da informação

Fonte: Adaptado de Shell Holtz (2002)

De acordo com Shell Holtz (2002), as organizações terão de repensar as suas estratégias de comunicação, visto que agora terão de ter em conta vários aspetos como: compreender as novas noções de rede, o funcionamento das novas tecnologias como novos instrumentos de comunicação, os timings de produção de informação e o impacto destas novas tecnologias ao serviço de aspetos particulares da comunicação como a gestão de crise, entre outros.

Wellman (2001) afirma que as redes sociais complexas sempre existiram, mas recentemente com o desenvolvimento da tecnologia, estas tem emergido como forma dominante das organizações sociais. O desenvolvimento tecnológico das redes de comunicações informáticas e o florescimento social das redes sociais está a proporcionar o surgimento da " Networked Individualism”.

É nesta base que Wellman cria uma trilogia que consta de: em primeiro uma tipologia “over-generalized”, o que os sociólogos chamam de "tipos ideais". Os grupos têm clivagens e links para o exterior; as redes são irregulares como o universo, com regiões de alta e baixa densidade, de acoplamento e desacoplamento. Em segundo, os três tipos ideais não são mutuamente exclusivos em sociedades ou em pessoas, na prática, as sociedades e as vidas das pessoas são muitas vezes misturas de grupos e redes. Por último esta é uma tentativa de destacar fenômenos interpessoais relevantes para o investigador. A rede agora contêm um elevado número de pessoas que gostam de interagir umas com as outras, e também contem um número baixo de pessoas que são forçadas a interagir entre elas devido a um certo relacionamento, seja ele, mesma comunidade, grupo de parentesco, organização ou local de trabalho. A Internet fornece uma rampa de acesso à informação global e reforça as ligações locais dentro das comunidades, famílias e organizações.

A alta velocidade de comunicação “place-to-place” suporta a dispersão e fragmentação das organizações e da comunidade, a alta velocidade de comunicação de “person-

to-person” apoia a dispersão e fragmenta a função dos grupos de trabalho e famílias. Assiste- se a uma mudança num mundo personalizado, onde a wireless origina uma “Networked Individualism”, onde cada pessoa opera separadamente as suas redes para obter informações, colaboração, ordens, apoio, sociabilidade e um sentimento de pertença (Wellman, 2001).

A nossa ligação perpétua à rede dá-nos infinitas oportunidades para fazer parte do dar- e-receber na rede, temendo que este novo ambiente nos isole e nos torne solitários. Rainie e Wellman (2012) mostra-nos como círculos sociais de indivíduos em rede são grandes e pouco desenvolvidos, expandem as oportunidades de aprendizagem, resolução de problemas, tomada de decisão e interação pessoal. O novo sistema operacional social do "individualismo em rede" liberta-nos das restrições de grupos não coesos; obrigando-nos a desenvolver habilidades de rede, estratégias, trabalhos de manutenção de laços e equilibrar múltiplas redes sobrepostas. Rainie e Wellman (2012), ao delinear a "triple revolution" trouxeram sobre ela uma transformação: a ascensão das redes sociais, a capacidade da Internet para capacitar os indivíduos, e a conectividade always-on de dispositivos móveis. Com base na extensa evidência, examinaram como a mudança para o individualismo em rede ampliou as relações pessoais para além das famílias e dos bairros; transformou o trabalho em menos hierárquico e mais para a empresa, orientando-o para equipa com o intuito de incentivar indivíduos a criar e compartilhar conteúdo, assim como mudou a forma como as pessoas obtêm informações.

Segundo Rainie e Wellman (2012), as tecnologias atuais ainda estão longe de realizar qualquer possível futuro cenário na sua totalidade, no entanto, representam uma potencial evolução a partir de trajetórias atuais. O primeiro cenário assume um movimento em direção a mais individualismo em rede baseado num progresso tecnológico contínuo e de confiança. O segundo cenário assume mais limites, mais custos, é mais corporativo, exige maior concentração, e mais vigilância. Presentemente, no mundo ocidental a tendência é no sentido da primeiro cenário, mas seria ingénuo pensar que o segundo cenário não acontecerá. O trabalho de indivíduos em rede nunca é bem feito e as satisfações de netweaving (conceito mais abrangente para o compartilhar de informações, ferramentas, habilidades, recursos e oportunidades)estão sempre disponíveis.

Rainie e Wellman (2012), dizem-nos que há uma correlação entre os utilizadores que despendem muito tempo na internet, tendo assim, uma rede social mais alargada do que os utilizadores com uma taxa de utilização mais baixa, por isso, é possível supor que a Web aumenta a sociabilidade das pessoas, no entanto, levanta outras questões, tais como: serão os relacionamentos digitais influenciados pela preexistência de capital social, ou, é a Web que amplia as redes dos utilizadores.

Nenhum dos resultados relatados pelos autores na sua pesquisa de 2009 deve ser "interpretado como explicações de causa e efeito." Embora os resultados tenham mostrado que o uso da tecnologia é fortemente associada a "redes sociais mais amplas", a adoção das novas tecnologias muitas vezes vêm de classes mais altas, e o seu capital social é geralmente elevado, mesmo antes de aceder a web. A suposição é ambígua, por um lado, eles observam que apenas um pequeno segmento de utilizadores da Internet têm "amigos virtuais, que apenas se conhecem

online" e reconhecem que o capital social preexistente tem um papel na formação de experiências digitais. Por outro lado, eles sugerem uma relação virtuosa entre o uso da internet e a socialização.

As redes sociais são grandes e diversificadas, graças à maneira como as pessoas usam a tecnologia. Enquanto nos concentramos em redes, certamente podemos ganhar uma compreensão das práticas cotidianas, mas antes de ver as redes como um princípio fundamental da organização das nossas sociedades, deveríamos esperar que teorias mais sólidas sejam propostas (Rainie e Wellman, 2012).

Os rumores na comunicação por vezes podem ter um lugar “pertinente” na organização, especialmente aqueles que possam vir a influenciar direta ou indiretamente os resultados organizacionais. Doerr, Fouz, Friedrich, (2011), simularam um processo de propagação natural de rumores e analisaram este processo em diferentes gráficos com o intuito de representarem o mundo real das redes sociais e as várias tipologias clássicas de rede. Os estudos demonstraram que a propagação de rumores é extremamente rápida em redes sociais, sendo a observação na matemática, uma boa explicação para este fenômeno. Mesmo não sendo um processo organizado e centralizado a disseminação de informações é extremamente rápida, apesar de a rede não ser projetada de um modo inteligente. Crucial é a interação entre hubs que tem muitas ligações e uma média de utilizadores com poucos amigos, isto porque os hubs disponibilizam as notícias para um público amplo, enquanto a média dos utilizadores disponibiliza informações de um vizinho para outro.

Segundo os resultados dos estudos de Chierichetti , Lattanzi , Panconesi, (2010) é plausível que numa rede social exista um núcleo de pessoas que podem não ser importantes, mas quando entendidas coletivamente são capazes de chegar à maioria da comunidade onde estão inseridas em poucos tempo. Provaram ainda, que este núcleo de pessoas são apenas importantes para disseminação de informações e não como originadores de rumores, isto é, mesmo que nunca tenham iniciado uma comunicação ainda se espalharia através da rede, apenas por pessoas perguntando e dizendo-lhes o que eles sabem.

Nekovee, Moreno, Bianconi, Marsili, (2006), afirmam perante os resultados obtidos nos estudos realizados que as redes são propensas à propagação de rumores, assumindo que a rede subjacente é estática, ou seja, a time-independent network topology. No entanto, na realidade muitas redes sociais e de comunicação são altamente dinâmicas, um exemplo de tais redes sociais dependentes do tempo são os chatrooms, onde os indivíduos fazem continuamente novos contatos e quebram contactos antigos. Modelar processos de disseminação em redes dinâmicas é altamente desafiador, em particular, quando a escala de tempo em que a topologia de rede muda e torna-se comparável com a escala de tempo da dinâmica do processo.

Perante a constatação que os rumores se propagam rapidamente em rede, é necessário que os gestores de comunicação estejam atentos aos estudos realizados nesta área e que utilizem estes conhecimentos nas sua organizações, enfrentando os rumores e lidando com eles de forma a que dentro do aceitável e possível consigam minorar os seus efeitos negativos e potenciar os resultados positivos que possam advir.

No documento dissertacao final LÚCIA DA PIEDADE (páginas 96-102)