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A Sustentabilidade: História e Conceituação

CAP 01 A CIDADE CONTEMPORÂNEA E A SUSTENTABILIDADE

1.4. A Sustentabilidade: História e Conceituação

De certo, conceituar o termo sustentável ou até mesmo o desenvolvimento sustentável tem sido tarefa árdua ao longo dos anos, visto que tais definições permanecem em constante mudança, para melhor se adequarem às necessidades de uma época ou sociedade específi- ca e carregam consigo um amplo espectro de significados e conceitos.

Nas últimas décadas do século XX e início do século XXI, praticamente todas as populações do globo enfrentaram ou vivenciaram de algum modo as consequências de um modelo de ur- banização disperso, focado no deslocamento através do automóvel e de desenvolvimento econômico que priorizava a exploração ilimitada dos recursos existentes. A urbanização dis- persa e o mito do crescimento econômico ilimitado contribuíram para uma ocupação espacial preocupante e desequilibrada das áreas urbanas, resultando em uma pressão excessiva so- bre o ambiente natural e gerando impactos diversos nas condições sociais da vida urbana.

Acselrad (2009) destaca que neste contexto, a incerteza quanto ao futuro torna-se preocu- pante e destaca-se a necessidade de uma discussão ambiental envolvendo as questões ur- banas na busca por estratégias que reconfigurem os espaços urbanos como forma de pre- servar a espécie humana de maneira saudável e duradoura.

Sustentabilidade significa dar o devido suporte a alguma condição, a algo, a alguém ou a al- gum processo particular. O termo é bastante utilizado na atualidade para caracterizar uma coexistência saudável entre o ambiente natural e o artificial, bem como o uso consciente dos recursos naturais, como a água, as florestas, etc. A sustentabilidade normalmente está rela- cionada a um modo de pensar, de agir ou a algum tipo de estratégia que é vista como sendo ecologicamente correta e viável, seja no âmbito econômico, ambiental ou ainda da justiça so- cial, esta, no entanto tende a sofrer certas variações de acordo a diversificação dos aspectos culturais locais.

É preciso considerar que o termo sustentabilidade está intrinsecamente ligado à aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais, os quais podem vir a sofrer certa variação de acordo com sua localização geográfica, época ou sociedade onde estão sendo abordados, fato este que contribui para a dificuldade encontrada até os dias atuais para desenvolver um modelo geral e estático que represente o ideal de sustentabilidade. Compreendendo que, pa- ra cada população, habitando uma região específica e em um determinado tempo histórico, poderão haver entendimentos diversos desse conceito, logo que, as necessidades de um po- vo poderão variar conforme tais aspectos. Entretanto, independente do modelo de sustentabi- lidade que uma sociedade busque desenvolver, o mesmo deve ter como objetivo prioritário permitir a conservação da vida de forma qualitativa para as futuras gerações.

O termo sustentabilidade surge com força na literatura à partir de 1970, quando se começa a observar e analisar os danos e problemas gerados pelas estratégias do modelo de desenvol- vimento urbano praticado no período. Estas, direcionavam a sociedade para uma realidade de crise tanto no aspecto social como ambiental. Foi nessa época que as questões relacio- nadas à sustentabilidade originaram o termo desenvolvimento sustentável, o qual começou a ser associado à todas as formas de desenvolvimento que buscavam diferenciar-se das estra- tégias praticadas até então, com o objetivo de suprir as necessidades do presente garantindo a conservação do ambiente natural e da vida futura (WHEELER, 2009, p.19). Entretanto as discussões referentes ao desenvolvimento sustentável datam de um período anterior à pró- pria definição do termo. No intervalo compreendido entre as décadas de 1930 e 1970, o críti- co Lewis Mumford faz referência a questões relacionadas com a insustentabilidade urbana, abordando temas como a urbanização em larga escala, o desenvolvimento tecnológico das sociedades, as guerras e disputas entre povos, alertando sempre para os perigos da "pólis" onde os avanços tecnológicos tornam-se "anti-humanos", passando a funcionar de forma ne- gativa para a humanidade uma vez que as consequências desse avanço poderiam gerar mais prejuízos do que os benefícios prometidos. (MUMFORD apud WHEELER, 2009, p.21). De acordo com Wheeler (2009), o crítico e pesquisador do espaço urbano Mumford demons- tra um inédito e extraordinário conhecimento das questões urbanas quando antecipa o deba- te sobre a sustentabilidade. Em seus livros, Mumford, reflete sobre temas urbanos contempo- râneos, como por exemplo o ideal de cidade voltada para a comunidade, abrindo espaço para o projeto que priorizasse a escala humana e voltada para as necessidades da sua população. Uma cidade onde as ruas sejam sempre repletas de pessoas e não de automóveis, onde a economia prospere de forma saudável no meio urbano e que este seja cercado por um ambi- ente natural resguardado. Esse ideal de cidade pode ser comparado aos conceitos contem-

porâneos de cidade compacta sustentável, de passagem e permanência no espaço público, assim como a importância da pedestrianização, defendidos hoje por autores como Rogers (2012), Gehl (2013) e Farr (2013).

Ao final da década de 1960 as relações diretas e indiretas entre o ambiente construído e o ambiente natural, tornavam-se pauta indispensável nas discussões sobre o futuro da civiliza- ção. Compreender o impacto da urbanização e do crescimento populacional no ambiente na- tural tornava-se uma preocupação recorrente. Entre os anos de 1968 à 1971 é desenvolvida por Meadows (1972) e colegas pesquisadores do MIT a pesquisa intitulada "Limits to

Growth". Solicitado por um grupo de cientistas conhecidos como o Clube de Roma, o relatório

tinha um tom intencionalmente pessimista, visto que buscava influenciar a reflexão acerca da questão ambiental em uma sociedade comandada pela industrialização, tinha por objetivo apresentar modelos capazes de realizar projeções futuras, para analisar o crescimento popu- lacional mundial, o consumo dos recursos naturais frente à esse crescimento e como minimi- zar os impactos ambientais resultantes. As projeções desse estudo, tentavam suprir uma de- ficiência originada do individualismo do ser humano que o impede de visualizar certas ques- tões em longo prazo (MEADOWS, 1972, p.9-16). Em sua conclusão o relatório atestava que caso novas estratégias de desenvolvimento sustentáveis não fossem implantadas, o resulta- do seria um colapso desastroso da civilização humana durante o século XXI. Fatores como o crescimento populacional, produção agrícola insuficiente, industrialização descontrolada, jun- to com a escassez e degradação dos recursos naturais seriam os principais limitantes do crescimento humano sustentável. Entretanto, Meadows (1972) também abre espaço para vis- lumbrar um futuro de esperança, ao afirmar que se a sociedade optasse por modificar as ten- dências apontadas a fim de atingir uma "estabilidade ecológica e econômica", ainda seria

possível alcançar um futuro de equilíbrio (MEADOWS, 1972, p.20). Para o Clube de Roma, os resultados apresentados no relatório não tinham por função tornarem-se uma premonição matemática, mas sim expor tendências atuais e suas prováveis consequências, advertindo sobre uma necessidade de reflexão, havendo sido eficaz neste objetivo (MEADOWS, 1972, p.182). Em 1972 após sua publicação, acontece a Conferência de Estocolmo, foi nesse en- contro onde pela primeira vez a questão ambiental e o impacto do ser humano no meio ambi- ente foram discutidos com a seriedade necessária. Na Suíça, reuniram-se 113 países para discutir a questão ambiental, as consequências do desenvolvimento industrial e da rápida ur- banização.

Apesar da iniciativa, o debate estava em fase inicial. Durante a Conferência, os países dividi- ram-se entre os que defendiam o "desenvolvimento zero" e o "desenvolvimento a qualquer custo", o primeiro representado pelos países "desenvolvidos" e o segundo pelos países de- nominados "subdesenvolvidos" (OLIVEIRA, 2012, p.81). Mesmo com o evidente conflito de interesses, o encontro promoveu princípios importantes como, por exemplo: o direito absoluto do ser humano à liberdade e igualdade; abolição dos processos de segregação e dominação; promover a qualidade de vida; regular as taxas demográficas; implantar órgãos de gestão ambiental; respeitar a soberania de cada país mas também respeitar o coletivo; dentre outros princípios capazes de tornar viável o desenvolvimento das naç es respei ando as ques es ambien ais (UNEP, a esso abr. 2015). uran e o deba e em Es o olmo " poss el onside- rar que a união entre desenvolvimento e sustentabilidade estava sendo desenhada" em uma época onde o conceito de desenvolvimento sustentável ainda era apenas embrionário e sus- tentabilidade uma palavra pouco conhecida no vocabulário mundial (OLIVEIRA, 2012, p.81). Torna-se perceptível naquele momento, uma preocupação no mundo científico e político

acerca da busca por equilíbrio, para garantir o futuro da sociedade nos quesitos referentes ao meio ambiente e sua gestão. Essas reflexões acabaram por nortear os documentos ambien- ais organizados pela ONU, espe ialmen e o “Our Common Future” e a Agenda 21, omo também contribuiu para diversas Constituições nacionais que viriam a ser desenvolvidas nos anos seguintes. Durante a década de 1980 acontece uma onda de publicações em defesa dos critérios de sustentabilidade, como o Relatório "Our Common Future". O relatório tinha o objetivo de "propor estratégias ambientais de longo prazo para o desenvolvimento sustentá- vel", buscar novas formas de "cooperação entre diversos países em estágios diferentes de desenvolvimento no que se refere à preservação de recursos naturais, gestão do meio ambi- ente e desenvolvimento", contribuir para a definição de uma "noção comum relativa a ques- tões ambientais" e por fim estabelecer quais seriam "os esforços necessários para tratar com êxito os problemas da proteção e melhoria do meio ambiente" (BRUNDTLAND, 1991, p.XI). Diferentemente de "Limits to Growth", em "Our Common Future", Brundtland faz questão de ressaltar que não deseja abordar apenas as questões ambientais como também fatores econômicos e sociais, pois:

O meio ambien e não e is e omo uma es era des in ulada das aç es, am- biç es e ne essidades humanas, e en ar de end -lo sem le ar em on a os problemas humanos deu a pr pria e pressão "meio ambien e" uma ono a- ção de ingenuidade em er os r ulos pol i os. (BRUN TLAN , 1991, p. XVIII).

O Relatório torna-se uma ferramenta na busca do equilíbrio desejado entre economia e eco- logia, buscando através de um discurso otimista demonstrar que o problemas ambientais es- tão diretamente relacionados à questões sociais e econômicas tendo o meio urbano como palco principal. Sendo assim, não era uma profecia de decadência, pelo contrário, tratava-se da possibilidade de uma nova fase de crescimento econômico apoiado em práticas de con-

servação do ambiente natural, o desenvolvimento sustentável. O termo já era discutido na década de 1980, mas a definição de Brundtland (1991) viria a tornar-se a mais aceita e refe- renciada até os dias atuais.

O desen ol imen o sus en á el aquele que a ende às ne essidades do presen e sem omprome er a possibilidade de as geraç es u uras a ende- rem a suas pr prias ne essidades. (BRUN TLAN , 1991, p. 46).

Ainda segundo Relatório Brundtland (1991, p.57-58, grifo nosso) para se atingir o desenvol- vimento sustentável de fato, é preciso que exista:

Um Sistema Político que assegure a par i ipação e e i a do idadão no pro- esso de is rio; Um Sistema Econômico apaz de un ionar a ra s de ba- ses on iá eis e pre is eis; Um Sistema Social que possa resol er as en- s es urbanas ausadas por um desen ol imen o não-equilibrado; Um Siste- ma de Produção que respei e a obrigação de preser ar a base e ol gi a do desen ol imen o; Um Sistema Tecnológico que busque ons an emen e no as soluç es; Um Sistema Internacional que es imule padr es sus en á- eis de om r io e inan iamen o; Um Sistema Administrativo le el e a- paz de au o orrigir-se.

O desenvolvimento sustentável é visto através do Relatório Brundtland como uma estratégia para promover um futuro sustentável através do trabalho conjunto entre economia, gestão e ecologia. Compreendendo que independente das particularidades de cada nação, a única forma de tentar assegurar um futuro é se todos trabalharem juntos para a construção de uma realidade social-urbana equilibrada, levando em conta que o "crescimento e desenvolvimento econômicos produzem mudanças substanciais no ecossistema físico" assim como na estrutu- ra social de uma sociedade e que tais impactos devem ser controlados (BRUNDTLAND, 1991, p.48). Foi a partir deste pensamento que as nações viriam a aderir ao documento co- nhecido como Agenda 21. O documento foi gerado em 1992 durante a Conferência sobre

esse evento consiste na celebração mundial do desenvolvimento sustentável e busca estabe- lecer objetivos a serem alcançados para o século XXI. Para os países desenvolvidos ou em desenvolvimento, a Agenda 21 estabelece que o consumo e produção excessivos são res- ponsáveis pela deterioração ambiental, como também agravam a pobreza e os desequilí- brios. Ela estabelece a necessidade de uma maior eficiência energética, do estimulo ao uso racional dos recursos naturais, controle dos dejetos gerados e o fortalecimento de valores que apoiem o consumo sustentável. No quesito planejamento, defende a promoção de siste- mas sustentáveis de transporte, buscando estratégias inovadoras na área do urbanismo ca- pazes de abordar tanto questões sociais como ambientais. O estímulo ao desenvolvimento de uma rede urbana sustentável, capaz de auxiliar no processo de rápida urbanização tam- bém está presente no documento (FRANCO, 2001, p.161-162). Finaliza atestando que ou a sociedade se mobiliza para alterar a forma de desenvolvimento praticada, trabalhando os problemas sociais e preservando o meio ambiente, ou mantém o modelo potencializando as disparidades econômicas e sociais, promovendo a pobreza e o desequilíbrio do ecossistema mundial.