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Centros Urbanos Subutilizados: Caracterização do Objeto e do Estudo de Caso

CAP 03 REGENERAÇÃO URBANA: UMA ANÁLISE DOS ESPAÇOS SUBUTILIZADOS EM CENTROS URBANOS

3.2. Centros Urbanos Subutilizados: Caracterização do Objeto e do Estudo de Caso

Através de seu livro "A poética do espaço" o filósofo francês Gaston Bachelard (1993) argu- menta que a definição do "lar" ou do "lugar onde se habita", ultrapassa a simples definição de "espaço físico onde se vive", passando a representar também um estado psicológico de seus habitantes. Uma vez que as cidades constituem hoje o principal habitat do ser humano, qual seria então o estado psicológico de uma sociedade que habita um espaço urbano onde sua própria centralidade (ou a representação do coração urbano) é caracterizada por espaços desvitalizados, degradados e/ou marginalizados? Se relembrarmos a afirmação de Levebvre (1961), para quem "as cidades refletem uma sociedade", como seria então o retrato dessa sociedade?

A resposta para tais questionamentos é extremamente difícil, no entanto, a reflexão originada a partir deles se faz necessária para compreender o significado e o forte apelo simbólico que os Centros Urbanos tem - ou deveriam ter - para sua cidade e para a sociedade. Uma vez constatado que as características que definem a cidade contemporânea devem ser valoriza- das e que esta deve acima de tudo ser planejada adequadamente. A fim de que os futuros projetos que por ventura sejam implementados possam de fato garantir o bem-estar e a qua- lidade de vida dos seus habitantes ao mesmo tempo em que a cidade busca minimizar os impactos originados a partir de sua simples existência. Torna-se então possível, destacarmos a tentativa de regeneração e (re)valorização das áreas centrais dessas cidades como um im- portante marco no caminho para se conseguir os inúmeros benefícios sociais, ambientais, econômicos e culturais provenientes da sustentabilidade.

Inicialmente é necessário que a própria população compreenda que a regeneração em prol da sustentabilidade nas áreas centrais não é apenas um ideal utópico ou estético. Mas sim, como defende Speck (2012), de uma ação relativamente simples, considerando que é capaz de ocorrer por meio de diversas estratégias, algumas mais onerosas e outras bem menos. Consiste, portanto, em uma solução prática e direta que pode auxiliar no enfrentamento de uma série de problemas urbanos com os quais se depara a sociedade contemporânea, pro- blemas que prejudicam tanto sua competitividade econômica, quanto o bem-estar público e também sua sustentabilidade ambiental.

Nas cidades brasileiras, o Centro Urbano, foi provavelmente um dos primeiros setores da ci- dade contemporânea a sofrer com os efeitos da degradação e deterioração da qualidade do ambiente urbano, visto que geralmente estas regiões constituem o núcleo mais antigo na ci- dade. É preciso que aja uma ruptura desse gradativo processo de desvalorização e que tais áreas sejam vistas como protagonistas no processo de construção e/ou regeneração da ci- dade. Ao observar o cenário urbano da cidade de São Paulo percebe-se que sua área central não constitui uma exceção à regra.

Na cidade de São Paulo, percebe-se que houve ao longo do tempo uma modificação de pa- drões relativos à sua área central, uma transformação que abrange diversas esferas, desde o tipo de público frequentador, caracterização dos seus aspectos econômicos, tipologias de habitação, qualidade do espaço edificado, qualidade dos espaços públicos, presença de es- paços verdes, caracterização dos usos, índices de violência, atratividade, poluição, dentre ou- tras mais. Inicialmente, o que se percebe - não somente em São Paulo como também em vá- rias outras capitais brasileiras - é que quando a classe dominante, que antes controlava aquele espaço, opta por deixar a região central em busca de um ideal ocidental de urbaniza-

ção periférica de predominância monofuncional - os ditos subúrbios ou bairros não-centrais - ela leva consigo diversos usos importantes para a vitalidade do espaço urbano. O vazio dei- xado por essa classe e pelos usos que as seguiram até novas e mais modernas centralida- des é então ocupado por outras classes que se encontram na base da pirâmide social urba- na, o comércio popular se desenvolve rapidamente, dividindo espaço com o que restou do setor terciário, todos estes aproveitando-se dos espaços públicos bem como das edificações vazias.

Para intervir em um Centro Urbano, deve-se, além de se estudar seu processo histórico de formação, suas edificações, seu patrimônio, sua(s) identidade(s), as atividades encontradas ali e sua localização, precisar o porquê aquela intervenção se faz necessária e buscar identi- ficar os principais beneficiados com a mesma. São as velhas perguntas que até mesmo um estudante de arquitetura e urbanismo já está cansado de repetir. Intervir por quê? Para quê? e Para quem? A consequente falha em responder adequadamente qualquer uma dessas questões pode significar uma fragilidade na proposta de intervenção e uma dificuldade em defender sua importância.

A intervenção parte principalmente do princípio de que foram identificados um ou mais nú- cleos de deterioração/degradação urbana dentro daquela região, visto que o Centro em si pode vir a sofrer com diferentes aspectos de deterioração devido à diversidade de atividades e usos abrigados pelo mesmo durante o crescimento da cidade. Segundo Vargas e Castilho (2009, p.3) os conceitos de deterioração e degradação urbana são associados à perda de função, ao dano estrutural ou ao rebaixamento do nível do valor das transações econômicas de um determinado lugar. Esse processo de deterioração/degradação intensificou-se no Bra- sil após os anos 1950 e foi provocado principalmente pelo rápido crescimento e expansão do

espaço urbano (VARGAS; CASTILHO, 2009). Déak e Schiffer (2010) nos apresentam um rá- pido cenário dessa rápida expansão urbana:

Em pou o mais de uma geração a par ir dos meados des e s ulo, o Brasil, um pa s predominan emen e agrário, rans ormou-se em um pa s ir ualmen- e urbanizado. Em 1950 inha uma população de 33 milh es de amponeses, om 19 milh es de habi an es nas idades, ao passo que hoje [ano 2000] em a mesma população no " ampo" e a população urbana se upli ou para mais 120 milh es. ( EÁK; SCHIFFER, 2010, p.11).

Se considerarmos as projeções das Nações Unidas (2014), veremos que esse crescimento continua, visto que hoje, no ano 2015, existem 172 milhões de pessoas vivendo em cidades no Brasil, e esse número continuará a crescer pelo menos até o ano de 2050, quando então 91% da população brasileira estará vivendo nas cidades (UNITED NATIONS, 2014). O mer- cado imobiliário buscando comportar essa crescente expansão investe em novos e modernos subúrbios a preços atrativos, bem mais baixos que o preço médio praticado em regiões mais centrais, atraindo assim os novos moradores vindos do campo bem como a população já sa- turada do aglomerado em que se tornaram esses locais ou do processo de deterioração de- vido à falta de investimento adequado. Assim, consolidam-se também as chamadas novas centralidades dentro da cidade e começa então o já conhecido processo de êxodo dos cen- tros urbanos, onde diversas atividades e instituições importantes e essenciais começam junto com a população a deixar essas áreas em busca de novas regiões mais interessantes e prósperas tanto socialmente como economicamente.

Para Paiva (2005), a consequência disso é uma redução da parcela de moradores do Centro, que agora sendo ocupado pelo comércio popular, sofre com o trânsito caótico, o intenso fluxo de pessoas no horário comercial e o esvaziamento durante o período noturno e fins de se- mana. A decadência torna-se mais evidente e com isso, o poder público acaba por muitas

vezes concentrar seus investimentos em outras áreas onde existe uma maior concentração habitacional e populacional, as chamadas novas centralidades. O centro, tomado pelo co- mércio (seja ele formal ou informal) pode vir a sofrer com deficiência de serviços como limpe- za, segurança, manutenção de infraestrutura, manutenção do patrimônio construído e tam- bém dos espaços públicos.

Em locais mais periféricos ou não-centrais da cidade, novos bairros começam a surgir e com eles novos shoppings, edifícios comerciais, complexos de entretenimento, entre outros vários exemplos. Com isso, existe uma certa tendência da população em buscar essas novas áreas, agora dotadas de infraestrutura e comodidades urbanas, modernas e longe da lotação da re- gião central. Em alguns destes locais, a força de atração será ainda mais intensa, seja por estímulo do mercado imobiliário ou por estratégias próprias de planejamento urbano (usos do solo, infraestrutura, sistema de transporte, etc.), essa nova força de atração consolidará den- tro da área urbana as chamadas novas centralidades. Para Correa (1995) a descentralização e os núcleos secundários aparecem como uma medida das empresas visando eliminar as di- ficuldades geradas pela excessiva centralização da área central. Isso, juntamente com o apa- recimento de fatores de atração em áreas não-centrais, estimula esse processo de descen- tralização.

Correa (1995), apresenta também fatores importantes que podem ser apontados como prin- cipais responsáveis por esse processo de repulsão que ocorre nas áreas centrais, são alguns deles:

1. O aumento constante do preço da terra, impostos e aluguéis, afetando certas