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A Regeneração de Espaços Urbanos Subutilizados: uma necessidade con temporânea

CAP 03 REGENERAÇÃO URBANA: UMA ANÁLISE DOS ESPAÇOS SUBUTILIZADOS EM CENTROS URBANOS

3.1. A Regeneração de Espaços Urbanos Subutilizados: uma necessidade con temporânea

De um modo geral, o que caracteriza as cidades brasileiras hoje, no que se refere aos parâ- metros adotados pelo planejamento urbano, não é simplesmente uma negação acerca do que é preciso ser realizado, mas uma aparente ruptura entre o reconhecimento do problema e as ações propostas para solucioná-los. Considerando que os parâmetros de sustentabilida- de e seu rebatimento no ambiente urbano não mais constituem uma discussão recente, uma questão que permanece é o real motivo de tais aspectos permanecerem ainda nos dias de hoje como um exercício predominantemente teórico em grande parte das cidades brasileiras. Sendo ainda tão pouco ou até mesmo desconsiderados como estratégia relevante de plane- jamento e projeto urbano.

No entanto, o que ocorre é que algumas regiões da cidade são aparentemente mais afetadas do que outras pela falta de projetos capazes de contribuir com os aspectos de sustentabilida- de. Sustentabilidade, não somente como forma de construir uma cidade mais ambientalmente consciente, mas como meio de promover um espaço urbano mais justo, atrativo, saudável e vivo. Por motivos diversos, sejam por questões econômicas, sociais, políticas ou até mesmo em consequência de decisões equivocadas de planejamento, consolidam-se em certas par- tes da cidade, núcleos problemáticos que exercem pouca ou quase nenhuma atratividade, representando uma espécie de mazela com a qual a sociedade urbana aprende a coexistir.

No entanto, estes, simbolizam verdadeiramente o retrato do extremo oposto do ideal que a sustentabilidade objetiva concretizar no espaço urbano.

A realidade é que estes espaços são pouco ou até mesmo nada atrativos, seja para o comér- cio, para a habitação ou para qualquer outra atividade, por vezes chegam até mesmo a exer- cer um efeito de repulsão sobre o pouco uso que por algum motivo ali permanece. De alguma forma estes espaços foram perdendo sua diversidade, sua heterogeneidade e seu dinamis- mo, tornando-se debilitados (seja por um ou vários aspectos) e carentes de vitalidade. Por vezes, estes locais podem ser até mesmo fáceis de acessar, mas que no geral representam um destino final no qual não se vale a pena chegar, quanto menos permanecer.

Aspectos como a violência, a insegurança, o esvaziamento em determinados horários ou ao longo do dia e a deterioração do espaço construído são características que permeiam tais lo- cais. Estes, podem até exercer algum tipo de atividade econômica rentável ou possuir alguma forma de moradia, no entanto, estas com toda certeza não estarão utilizando todo o potencial que poderiam, ou melhor, que deveriam utilizar para serem capazes de promover alguma me- lhoria dos aspectos urbanos. Portanto, estes espaços seguem na direção contrária daquela desejada para a cidade contemporânea ou para uma cidade verdadeiramente sustentável, onde pouco ou nada contribuem para sustentar o desenvolvimento urbano de maneira sus- tentável e duradoura, ou para melhorar a qualidade de vida da população urbana de modo geral. Caracterizando desse modo, juntamente de sua infraestrutura urbana, uma subutiliza- ção do seu potencial, representando um enorme desperdício para a cidade, ao mesmo tempo em que constituem uma cicatriz dos aspectos de insustentabilidade do ambiente urbano com a qual a sociedade aprende a conviver, bem como uma provável negligência dos gestores em buscar promover de fato a sustentabilidade.

No entanto, quando se observa atentamente os ditos espaços subutilizados que existem den- tro das cidades surge uma dúvida recorrente. Seriam estes, resultado de pura negligência do Poder Público ou seriam consequência de uma ação devidamente considerada? Se tomar- mos como base o discurso de Lefebvre (1961), onde o autor define que nas sociedades sob comando do capitalismo, as cidades acabaram sempre por refletirem os interesses de uma única e poderosa elite urbana a qual tudo na cidade se submete, talvez seja então possível afirmar que os espaços subutilizados refletem claramente os desejos e escolhas dessa elite. Segundo Lefebvre (1961) a elite dominante favorece certas partes da cidade as quais lhe convém, seja uma nova centralidade de negócios ou um novo bairro-jardim, grande parte do sucesso destas regiões se dará em consequência do direcionamento de investimentos e polí- ticas urbanas que por vezes acontecerão em detrimento de outras regiões consideradas me- nos atrativas. Estas, representarão a marginalização dos espaços abandonados, subutiliza- dos pelas elites e consequentemente apropriados pelas classes populares ou por atividades ilícitas.

Muniz (2010) reconhece que o protagonismo assumido pelas cidades na contemporaneidade, se deve tanto pela modificação dos padrões de urbanização mundial quanto como uma con- sequência dos efeitos da globalização. No entanto, Muniz (2010) afirma que contraditoria- mente, os mesmos fatores que contribuíram para o advento da cidades na rede mundial, também foram responsáveis por provocar o declínio de certas áreas urbanas, afetando dire- tamente sua vitalidade e funcionalidade, o resultado é a materialização de espaços urbanos deteriorados na cidade e consequentemente um desinteresse do Poder Público e de agentes privados em investir nestes locais, tornando-se assim espaços deteriorados e subutilizados ou, como são definidos por Muniz (2010, p.85), "espaços de desvalia".

Os espaços subutilizados na cidade dividem-se em tipologias as quais possuem característi- cas e dinâmicas particulares, no entanto, nada impede que tais tipologias ocorram de forma sobreposta em uma mesma área ou bairro, isso somente dependerá dos aspectos históricos responsáveis pela construção do ambiente urbano e das decisões de planejamento tomadas ou pela falta delas. Muniz (2010, p.87, grifo nosso) apresenta as 4 principais tipologias carac- terísticas dos espaços subutilizados na cidade contemporânea como sendo,

as frentes hídricas, espe i i amen e aquelas de zonas por uárias em de- l nio, áreas industriais/urbanizadas desativadas, centros de cidades degradados/subutilizados, estruturas subutilizadas ou de uso inde ido, omo ai as de dom nio de áreas indus riais, de erro ias, de redes de rans- missão de energia el ri a, o upaç es inde idas ao longo dessas e de ou ras ai as, omo aquelas ne essárias à preser ação de re ursos na urais. Existem, no entanto, algumas localidades aparentemente mais estratégicas, seja por sua lo- calização privilegiada, por seu aparente potencial de transformação e/ou regeneração ou ain- da pelo provável retorno social e econômico que podem fornecer à cidade. Segundo Vargas e Castilho (2009, p.44), as “orlas mar imas e de rios, lei os erro iários, en ros his ri os, áreas por uárias e edi i aç es indus riais desa i adas são as primeiras elei as no pro esso de in er enção”. Em cidades como São Paulo, portadoras de um espaço edificado já consolida- do, estas áreas representam uma oportunidade de estimular estratégias de desenvolvimento sustentável dentro o ambiente urbano e também podem contribuir para reduzir a expansão urbana sob os recursos naturais existentes. São locais dotados de um considerável valor es- tratégico e econômico, onde o uso do solo não se encontra plenamente funcional, tornando espaços que oferecem boas oportunidades para promover a regeneração urbana direcionada aos aspectos de sustentabilidade.

Caldana (2015) defende que, atualmente, na cidade (capitalista) contemporânea não se deve simplesmente valorizar a localização da terra ou o valor financeiro agregado à ela. Tão impor- tante quanto à localização e melhorias adicionais no entorno (públicas ou privadas), é a valo- rização do todo, reconhecendo nesse quadro a importância de adicionar ao território aspectos como a infraestrutura existente, bem como os objetos edificados (sejam eles patrimônio histó- rico ou outra produção arquitetônica), mas sobretudo as redes e os potenciais, valorizando os aspectos materiais tão quanto os imateriais. A construção dessa forma de cidade deve bus- car não apenas estratégias físicas que valorizem um terreno ou uma gleba específicos mas um tipo de intervenção capaz de "agregar valor à fragmentos de cidade, numa escala ainda pouco explorada e difícil de ser compreendida" na realidade urbana brasileira (CALDANA, 2015, p.X). As intervenções devem associar juntamente do ideal capitalista de valorização, rentabilidade e lucratividade aspectos qualitativos e essenciais para o fortalecimento da soci- edade urbana, como a relação entre moradia e trabalho, lazer e educação, saúde, mobilida- de, segurança e acima de tudo sustentabilidade social e ambiental urbana. É nesse cenário de transformação que entram os Centros Urbanos como objeto e como instrumento de rege- neração urbana em prol da sustentabilidade.

Se observarmos os Centros Urbanos através da ótica dos interesses da cidade contemporâ- nea e do cidadão, os espaços subutilizados em áreas centrais são antes de mais nada im- próprios à ida urbana caso permaneçam do modo em que estão, representam, conforme atesta Muniz (2010, p.87-88) um considerável "ônus para a sociedade local e para o Poder Públi o, produzem impa os nega i os, não somen e no seu en orno, mas para oda a idade, onsiderando-se seu ará er sis mi o". Se deixados de lado ou caso a sociedade simples-

mente aprenda a conviver com tais espaços e com a situação que estes representam, as consequências podem ser extremamente danosas para o conjunto da sociedade urbana. Portanto, os espaços subutilizados em regiões centrais representam a tipologia eleita por es- ta pesquisa para explorar uma aplicação dos ideais da sustentabilidade no ambiente urbano. Considerando não somente o seu grande potencial para isto, como também justificando esta escolha através de uma análise empírica dos aspectos urbanos presentes na região eleita para o estudo de caso, o bairro da Santa Ifigênia em São Paulo.

Ainda sobre estes espaços subutilizados em áreas centrais, Muniz (2010, p. 88) destaca que por diversas vezes,

são onsiderados omo áreas de ris o (urban s i o, e onômi o, ambien al, ul ural e so ial), al m de gerarem omprome imen o da qualidade de ida lo al, de orren e da de erioração das edi i aç es, da degradação ambien al, da es agnação e onômi a e do desemprego e, sendo espaços dominados por ra i an es e usuários de drogas, são áreas perigosas, de grande in i- d n ia de assal os e dos mais di ersos epis dios de iol n ia urbana.

Caldana (2015, p.XI) corrobora a escolha dos espaços subutilizados em áreas centrais, assim como seu potencial para se desenvolver ações voltadas à sustentabilidade urbana (social, ambiental, econômica e/ou cultural) ao afirmar que:

ui o se em alado em idades para pessoas, idades in eligen es, idades ompa as e idades globais, odas essas a e as de um mesmo obje o de in eresse, a organização da ida do homem e suas relaç es om a pr pria idade. Cada ez mais polis, urbis e civitas se undem num amálgama de possibilidades e desa ios, ujos resul ados apenas agora omeçam a se deli- near. E por meio da elaboração e da implan ação de proje os de in er en- ção e resga e de en ros urbanos que esse pro esso se orna is el.

3.2. Centros Urbanos Subutilizados: Caracterização do Objeto e do Estudo de