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A Tentativa de Leão XIII para a Concordata Brasileira

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CAPÍTULO I ± A POLÍTICA CONCORDATÁRIA ROMANA PARA O BRASIL

1.5. A Tentativa de Leão XIII para a Concordata Brasileira

A situação a Igreja Católica no Brasil não estava fora das preocupações do papa Leão XIII (1878-1903) no contexto internacional em que o catolicismo estava envolvido. Também noutras nações havia conflitos entre o poder civil e a religião, sobretudo na Europa. Neste contexto, o Papa Leão XIII (1878-1903) se tornou um hábil negociador. Segundo Anna Carletti:

Leão XIII teve que enfrentar uma situação difícil não apenas com o governo da Itália, mas também, com outros governos europeus. Os movimentos liberais surgidos na metade do século XIX em toda Europa eram vistos com desconfiança pela Santa Sé. As relações com a França, nação de tradição católica, considerada filha predileta da Santa Sé, estavam se tornando sempre mais conflituosas por causa de um forte radicalismo anticatólico que estava se enraizando entre a população. Isso provocou o ressentimento dos católicos que começaram a se opor ao governo da Terceira República, considerado como um dos responsáveis pela difusão da corrente anticatólica. Diante dessa ameaça de divisão, Leão XIII dirigiu-se aos católicos franceses convidando-os a abandonar a hostilidade em relação ao governo republicano e sugerindo que seria conveniente para a tranquilidade da Igreja e do Estado manter a concórdia entre o poder civil e religioso. As mesmas dificuldades eram encontradas por parte da Santa Sé na Alemanha de Bismark. O chanceler alemão não só colocou como base do império alemão a religião protestante, mas deu início ao projeto da Kulturkampf que visava reduzir a influência do catolicismo no seu império provocando com isso a oposição da Igreja de Roma. O Papa também não podia confiar nem na Rússia e menos ainda na Inglaterra. Mas a decepção maior veio do Império Habsbúrgo, tradicional defensor do Papado que se aproximou da Alemanha e da Itália, isolando ainda mais a Santa Sé do concerto europeu. Leão XIII, considerado um Papa prudente e realista, diante desse cenário, mesmo mantendo a posição oficial do seu predecessor de protesto contra a perda do poder temporal, adotou uma posição mais conciliadora, sem tons polêmicos e ásperos, pois compreendia que era importante reconstruir as relações com as potências europeias, evidenciando a disponibilidade da Santa Sé no confronto com os outros Estados e governos (CARLETTI, 2012, p. 88-89).

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do mais, as correntes liberais europeias influenciaram o tipo de república que aqui foi implantada.

Diante desse cenário, a autora vê boas credenciais no Papa Leão XIII (1878- 1903) para enfrentar a situação histórica:

O currículo desse Papa estava repleto de cargos significativos seja no âmbito diplomático ou no campo pastoral. De 1838 a 1841 ele foi delegado apostólico na cidade de Benevento; de 1841 a 1842 foi delegado apostólico na cidade de Spoleto e, depois, de Perugia; de 1841 a 1845 foi nomeado núncio apostólico na Bélgica [...]. Após retornar da Bélgica, o Papa o nomeou bispo de Perugia, onde permaneceu por mais de 30 anos, e onde se deparou com a perda do território de sua diocese, quando a região da Úmbria foi anexada ao Reino da Itália, em 1861. Uma das preocupações PDLRUHVGHVHXSRQWLILFDGRIRLDGHFRPRUHVROYHUD³TXHVWmRURPDQD´TXH ele herdara de Pio IX. Com a perda do poder temporal, o Papado temia também perder sua autonomia e a possibilidade de desempenhar livremente sua missão espiritual (CARLETTI, 2012, p. 87-88).

Tudo o que se refere à perda e renegociação entre a Igreja Católica e o poder Civil eram assuntos que lhe eram familiares. No entanto, pode ser que a mesma solução não se aplicasse a todos os lugares.

Estudiosa da política internacional da Igreja no final do século XIX, Lilian Rosa compreende que a linha mestra da política internacional de Leão XIII (1878-1903) era continuar um diálogo aberto com o governo republicano no Brasil por meio dos seus interlocutores da Santa Sé e do episcopado local. No período inicial, essa ponte era feita diretamente por Dom Antonio Macedo Costa. No entanto, a situação da Igreja Católica após a Constituição de 1890 não era estável. Assim:

Em 1892, a comunicação entre o Internúncio e a Secretaria de Estado evidenciou que a Cúpula do Vaticano permanecia pré-disposta à assinatura de uma concordata que, na política leonina, era considerada o mecanismo legal mais seguro para garantir a sobrevivência institucional da Igreja em Estados laicos. Para levar a cabo essa política era necessário fortalecer cada vez mais as relações diplomáticas com o governo brasileiro. Um passo importante nesse sentido foi a elevação da Internunciatura no Brasil à Nunciatura Apostólica. Em 1901, quando foi nomeado Giulio Tonti como primeiro Núncio (ROSA, 2015, p. 107).

Como já foi tratado no tópico anterior, o Papa Leão XIII (1878-1903) entendia que, se a Igreja quisesse sobreviver à onda de estabelecimento de Estados laicos, ela só tinha um caminho: a via concordatária. De fato, a concordata será o caminho legal para a Igreja Católica encontrar-se e situar-se num mundo em aceleradas mudanças político-sociais.

A política concordatária e de negociação foi reforçada com a nomeação de Pietro Gasparri, em 1901, como secretário da Congregação dos Assuntos Eclesiásticos Extraordinários, órgão da Secretaria de Estado responsável pelas relações internacionais entre a Santa Sé e os Estados soberanos. Gasparri trouxe para sua equipe como assistente Eugênio Pacelli, futuro Pio XII (ROSA, 2015, p. 108).

A chegada de Pietro Gasparri à secretaria de Estado é um passo importante para a consolidação da política concordatária da Santa Sé. Ele será o secretário de Estado no período das negociações e assinatura dos Tratados de Latrão.

Em 1903, morre o Papa Leão XIII (1878-1903). Com a eleição de Pio X (1903- 1914), houve o natural remanejamento do pessoal da Secretaria de Estado. Pietro Gasparri foi nomeado para chefiar a comissão que estava responsável pela redação do novo código de Direito Canônico. Para lá, ele levou toda a sua mentalidade concordatária e o pensamento de Leão XIII (1878-1903) codificado na Immortale

Dei. A partir de 1917, ano da promulgação do novo Código de Direito Canônico, no

pontificado de Bento XV (1914-1922), a Igreja Católica terá em seu ordenamento jurídico a prática milenarmente consagrada de negociação com os Estados: a Concordata. No entanto, a Igreja no Brasil não estava amadurecida o suficiente para negociar com Roma e com a República cláusulas de convivência pacífica. Para o episcopado brasileiro, a liberdade de culto codificada no Decreto 119-A, de 1890, era o suficiente para a sua reestruturação sem a proteção do Estado.

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