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2 O TOPÔNIMO COMO MARCA NA PROPAGANDA TURÍSTICA

2.1 A teoria de Lencastre aplicada às Águas de São Pedro

Pode-se aplicar o modelo de Lencastre42 ao nome da cidade turística como marca principal que possui vários produtos/serviços como atrações, hotéis, restaurantes, entre outros. Na verdade, o maior responsável pela marca principal, que é o nome do município, seria o governo que representa os cidadãos. Ele não detém a propriedade de todas as “marcas múltiplas” que estão fixadas na cidade, pois algumas são públicas e outras privadas. Alguns desses “produtos” utilizam o nome da cidade (marca original), ou parte dele, em sua “marca”. Ex.: Pousada Águas de São Pedro e Hotel Portal das Águas. Loteamentos de chácaras, que já estão fora dos limites do município, usam parte do nome da cidade visando valorizar o espaço a ser comercializado que está próximo a esta estância hidromineral. Ex.: Os loteamentos Águas do Campo, Terra das Águas e Vertente das Águas (Cf. Quadro 13).

Como se pode perceber, a extensão da marca atinge outros segmentos. Para Lencastre43 em produtos/objetos comerciais, com marca registrada, “a extensão da marca abarca tudo que exceda os complementos da gama em que, nem a natureza física ou técnica do produto, nem o benefício específico ligado ao seu uso, sofrem uma ruptura significativa”44 Ex.: A BIC deixou de ser sinônimo de caneta e desenvolveu outros produtos na linha descartável como isqueiros, aparelhos de barbear, etc.; a “YAMAHA é simultaneamente a marca da organização e de seus múltiplos produtos”.45 O prefixo “NES-” de NESTLÉ para NESCAFÉ, “funciona como um vestígio que testemunha sua origem e sua pertença à família [da marca-mãe]”. 46 41 CORREA; ROSENDAHL, 2004, p. 11. 42 LENCASTRE, 2007b, p. 44. 43 Ibidem. 44 Ibidem, p. 46. 45 Ibidem, p. 47 46

A Nestlé, por exemplo, é uma empresa que afirma ter como missão promover a “saúde alimentar”. Ela possui vários produtos que representam esta missão. No caso de uma estância hidromineral, pode-se dizer que a missão da “marca” representada por seu nome é atrair turistas oferecendo “saúde, descanso, lazer e cultura”. Lencastre montou um gráfico para explicar seu conceito de “marketing mix” 47 e, seguindo sua teoria, montou-se um gráfico para Águas de São Pedro, que se encontram no Apêndice 1. No gráfico sobre o marketing mix, a marca-mãe “Águas de São Pedro” tem a missão de proporcionar saúde, tranquilidade e lazer. As marcas-filhas ou marcas cobertas estão sempre associadas à identidade da marca- mãe. A marca Águas de São Pedro (que tem como suporte um objeto, uma organização, uma pessoa jurídica, no caso do município)48 procura fazer com que as outras marcas estejam mais ou menos próximas de sua própria missão. Nesse caso, a marca Águas de São Pedro tem que gerir um marketing mix de atividades, progressivamente dispares, sem perder a unidade, a coerência de sua missão. “[...] A missão é o benefício oferecido por uma marca”.49

Águas de São Pedro é uma marca (topônimo) centrada no referente, pois identifica o produto “águas” (três fontes de águas minerais) que estão dentro do território que fazia parte do município de São Pedro. Para toponímia é um nome descritivo, na classificação de Steward,50 baseada no mecanismo da própria nomeação. Na classificação de Dick51 o topônimo é considerado um hidrotopônimo, isto é, um topônimo relativo aos acidentes hidrográficos e cursos d’água em geral, que faz parte da taxeonomia de natureza física. Já a cidade de São Pedro, da qual o território de Águas de São Pedro fazia parte, é considerada por Dick52 como um topônimo de natureza antropo-cultural, um hierotopônimo, pois está relacionado a um nome sagrado e um hagiotopônimo, pois está relacionado a um nome de santo (grifo nosso).

Na comunicação, as pessoas têm um duplo papel: uns são receptores e outros são emissores da marca, dos sinais. Assim como na comunicação, o marketing só existe se houver troca. Na tradição peirciana, o signo é “um sinal, é qualquer coisa, que está no lugar de

47 LENCASTRE, 2007b, Cf. Apêndice “1”. 48 Ibidem, p. 41. 49 Ibidem, p. 52. 50

STEWARD, George, 1954 apud DICK, M.V.P.A. Toponímia e antroponímia no Brasil: coletânea de estudos. 3. ed. São. Paulo: FFLCH-USP, 1992. p. 25.

51

DICK, 1992, p. 33. 52

qualquer coisa, para ser interpretada por alguém”.53 Para Lencastre:54

Transpondo para a marca, o interpretante é a imagem (interpretação) que a marca tem junto a um determinado indivíduo (intérprete) e por extensão junto a um determinado segmento-alvo ou público. Diferentes públicos (clientes, pessoal, accionistas, fornecedores,..., o public mix da marca) terão da marca diferentes imagens, porque têm com a organização diferentes relações de troca, e logo têm face a ela diferentes expectativas. Por sua vez, mesmo ao nível de cada indivíduo, o conceito de imagem é múltiplo, englobando reações de tipo cognitivo, afetivo e comportamental, que se traduzem em variáveis, como associações posicionadoras, notoriedade, estima, intenção de compra, fidelidade..., que constituem no seu conjunto o image mix da marca.

No turismo e no marketing turístico a troca se dá na relação de serviços (hotéis, restaurantes, venda de "souvenirs”, entre outros), mas também na troca cultural. Como é o caso, do conhecimento de um lugar (geográfico, histórico e social), onde o turista tem contato com alguns aspectos da cultura de um povo, seus costumes, tradições, que nem sempre envolvem o marketing, mas envolve o deslocamento, a viagem em si própria. O turista poderá usufruir dos benefícios que não estão nos anúncios, mas fazem parte do conhecimento do novo lugar, ou mesmo num lugar já conhecido, ao encontrar diferentes pessoas, eventos e paisagens. Dessa forma o turismo propõe-se a afastar as pessoas da rotina de seu cotidiano.

O nome da cidade turística nos remete a uma paisagem própria, serviços, atrativos turísticos, costumes, característicos daquele local. O discurso publicitário procura passar uma imagem através dos "sites”, jornais, folders, para conseguir atrair os turistas, mas cada pessoa cria a sua própria imagem do lugar. Uns gostam, outros não, uns apreciam em determinada estação do ano, outros preferem as festas como “Carnaval de Rua”, no caso de Águas de São Pedro. Enquanto isso, os profissionais do turismo (gerentes de hotéis, Secretaria de Turismo, Agências de Viagens e outros), procuram estabelecer uma programação cultural e de lazer para os hotéis e para a cidade a fim de atrair seu público alvo, os turistas.

Lencastre55 mostra três sinais admissíveis como marca, apresentados no glossário da American Marketing Association, quais sejam: a) o nome da marca/ “brand name” (o vocábulo), o grafismo da marca/ “brand mark” (um símbolo, um desenho, um logotipo) e a

53

LENCASTRE, op. cit. p. 40. 54

LENCASTRE, 2007b, p. 41. 55

marca registrada/ “trade mark” (parte da marca que tem a proteção legal, seja ela nome e/ou grafismo).

Hoje, ao lado de seu nome, sua “marca”, Águas de São Pedro possui um logotipo, lançado em 2009, que não é uma marca registrada (“trade mark”). Como os municípios são gerenciados a partir da política local, podem ter seu logotipo e “slogan” alterados a cada administração municipal, mas dificilmente terão seu nome alterado. Águas de São Pedro teve, em sua evolução como estância hidromineral e como cidade turística, diversos “slogans”, tais como:

a) “A maravilha hidroclimática do Brasil” (Década de 1940); b) “Um presente da natureza à saúde da humanidade” (1959); c) “Especial por natureza” (de 2005 a 2008); e

d) “Saúde e tranquilidade para todos” (a partir de 2009).

A identidade de uma marca pode ter vários componentes, sendo que o nome próprio é a sua “identidade central”, sem ele não há referente. O logotipo, juntamente com seu desenho, sua cor, tipo de letra, aparece em seguida, como “identidade tangível” e o “slogan”, jingle, sabores, odores, rótulos, representam a “identidade alargada”. Tudo isso é chamado por Lencastre56 como “identity mix”. Segundo o autor,

em termos mais alargados, e mais dificilmente susceptíveis de proteção jurídica, fazem parte do identity mix da marca todos restantes elementos do programa de identidade corporativa a nível nominal a nomenclatura das atividades e produtos, a nível figurativo as formas de aplicação da identidade visual (códigos decorativos, cromáticos tipográficos...), para não falar das identidades sonoras ou mesmo olfativas e até táteis.57

Como componentes da identidade de Águas de São Pedro, pode-se destacar:

a) Nomenclatura: ao lado do nome da cidade, o nome de seus atrativos - Balneário Dr. Octávio de Moura Andrade, Igreja Matriz Nossa Senhora da Imaculada Conceição, Capela Nossa Senhora Aparecida, Torre Ballone, Relógio do Sol, entre outros; b) Identidade Visual: o logotipo; a foto dos seus atrativos e paisagens; seu brasão; c) Identidade sonora: hino da cidade, samba enredo nos desfiles de Carnaval (Hotel

56

LENCASTRE, 2007, p. 55. 57

Jerubiaçaba- na atualidade); Músicas em homenagem a cidade (nos tempos do Cassino do Grande Hotel);58

d) Identidade olfativa: o cheiro e gosto de suas águas minerais;

e) Identidade tátil: contato com as águas nos banhos, sauna e massagens oferecidas no Balneário Municipal e alguns hotéis.

Segundo Lencastre,59 em sentido lato, a marca abrange o marketing mix da organização (as suas pessoas, produtos, processos, comunicações), unindo-se ao programa de identidade corporativa (nomenclatura, identidade visual, etc). As submarcas entram no identity mix numa relação mais ampla. Ao se estabelecer uma relação com o município turístico tem-se, então, o nome dos atrativos e dos hotéis como submarcas de outra que mantém a unidade - o nome Águas de São Pedro, que aparece no endereço de "sites”, folders e cartão de visitas de todas essas organizações. A empresa de engarrafamento de águas minerais e refrigerantes “Águas Sulfídricas e Termais São Pedro” divulgava no rótulo de seus produtos o mapa com o nome da cidade, na década de 1940, conforme mostra a Figura 1.

Figura 1 - Rótulos de refrigerante e água mineral de São Pedro

Como resultado dessa ação de marketing, a cidade ficou mais conhecida através da venda dos refrigerantes Laranjada, Brasicóla, Guaraná, Soda Limonada, Água Tônica de São Pedro e das águas minerais Fonte Gioconda e Almeida Salles.

58

Cf. ARENA, Juracy (maestro) Partitura da música: Valsa-canção: Saudades de São Pedro, 1940. 59

Lencastre60 mostra que “a ‘figuratividade’, definida pela semiótica como ‘ligação de um sinal a um mundo sensível’ torna-se um critério fundamental. Dela decorrem vantagens claras do ponto de vista da resposta à marca”.

Em relação às Águas de São Pedro, o “mapa”61 (localização da cidade/trajeto desde São Paulo) foi fundamental na década de 1940 para a divulgação da cidade. As pessoas precisavam saber como chegar até ela para conhecê-la. Em todos os materiais impressos publicados pelo Grande Hotel São Pedro, GHSP, este “mapa” era colocado inclusive na publicação da partitura de música feita para a cidade pelo maestro do cassino do GHSP. 62

Em 1959, o logotipo da fonte no Jornal Águas de São Pedro, relacionou a cidade às suas águas e às três fontes, conforme pode ser visto na Figura 2.

Figura 2 - Logotipo do Jornal Águas de São Pedro

Da mesma forma, no logotipo oficial da cidade, de 1996 (criado na primeira administração do prefeito Paulo Ronan), o desenho refere-se às três fontes e o de 2009 também, devido aos três semicírculos embora o interno seja bem estreito, dele caindo uma gota d’água.

60

LENCASTRE, 2007b, p. 60. 61

Cf .Anexo “14” (Convite Promocional do GHSP em espanhol). 62

O logotipo do município, de 2009, com semi-círculos azuis, aproxima a cidade ao logo do “Circuito das Águas Paulista”. Apesar de ser uma estância hidromineral, que não pertence a esse circuito, ao utilizar parte desse logotipo, Águas de S. Pedro cria um referencial a mais, desta vez ligado às águas minerais. Nesse caso, este logotipo aproxima mais a cidade às suas concorrentes que fazem parte do Circuito das Águas Paulista: Águas de Lindóia, Lindóia, Serra Negra, Socorro, Amparo, Jaguariúna, Pedreira e Monte Alegre do Sul.

Figura 3 - Logomarcas e brasão de Águas de São Pedro

Lencastre63 conclui que a marca

[...] é o sinal de um objeto, que o distingue junto de toda gente [...]. Deve ser o sinal figurativo de uma missão única, com uma imagem diferenciada junto a seus públicos e segmentos-alvo’. [O autor considera marca desde] ‘o nome pessoal de cada um de nós (nossa assinatura, cartão de visita) até a marca de uma região, nação ou continente (o seu nome, seu escudo, sua bandeira, o seu hino,...).

Devido a todas as características da marca, o nome do lugar turístico também se constitui em uma marca, como a Estância Hidromineral de Águas de São Pedro, a que esse trabalho se refere. No estudo desse nome e suas associações (logotipo, “slogan”, propaganda, seu histórico, entre outros), tudo isso faz parte de sua marca.

63

No caso da cidade turística, o valor da marca, através da divulgação da propaganda, é o valor da adesão e da fidelidade dos turistas a uma imagem, a uma missão e a um sinal.64

2.2 Os signos não verbais que se aliam aos topônimos como representantes dos