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A declaração da Independência está intimamente ligada ao advento da primeira Constituição no Brasil. A primeira constituição, de 1824, foi outorgada pelo Imperador, depois de intensas tratativas e tentativa de feitura de um projeto pela Constituinte que não centralizasse o poder de forma tão definitiva. De acordo com Villa (2011), o projeto não agradou a monarquia e resultou na dissolução da Constituinte, prisão de parlamentares, colocação em exílio de outros e mortes de opositores, inaugurando a infame história de golpes de Estado no Brasil.

O texto constitucional resultante de tudo isso não poderia ser diferente: poder absoluto, com o fato mais significativo: a criação de um quarto poder, o Poder Moderador. Tudo isso expressa a contradição gritante: vestido em um manto constitucional, institucionaliza-se um governo monarquista e ditatorial. Por essa razão explica-se a correlação, na história política brasileira, entre os períodos autoritários e os democráticos e o peso daqueles sobre estes. Em Villa (2011), não é surpresa que o autoritarismo esteja enraizado no Brasil, uma vez que o país surgiu politicamente envolto numa organização antidemocrática e não reconhecida como tal. De fato, estudar as falhas e fragilidades da democracia brasileira ao longo de sua história passa,

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obrigatoriamente, pela consideração acerca da influência cultural, institucional e estrutural que o autoritarismo exerceu, deixando marcas indeléveis.

Sob esse ângulo, Schwarcz e Starling (2015, p. 222), a Independência brasileira expressa-se no contexto da crise do sistema colonial e do absolutismo, em um arranjo de tensões externas e internas. A opção pela monarquia visava evitar o desmembramento da ex-colônia, enquanto a colocação de um rei no poder refletia o perfil das elites políticas brasileiras educadas aos moldes da nobreza. Desse modo, as contradições sugerem que:

Se o movimento foi liberal, porque rompeu com a dominação colonial, mostrou-se conservador ao manter a monarquia, o sistema escravocrata e o domínio senhorial. (...) Por outro lado, se uma nova unidade política foi implantada, prevaleceu uma noção estreita de cidadania, que alijou do exercício da política uma vasta parte da população e ainda mais o extenso contingente de escravizados. Com isso, noções bastante frouxas de representatividade das instituições políticas se impuseram, mostrando como a Independência criou um Estado mas não uma Nação.

O Poder Moderador constituía o elemento-chave de todo o sistema. Para José Afonso da Silva (2011), a inspiração de Benjamin Constant previa um Poder Moderador neutro, com a função de equilibrar os outros poderes. Contudo, na prática, D. Pedro I e seu sucessor, D. Pedro II, fizeram do Poder Moderador um poder pessoal do Imperador, além de bastante atuante e controlador. Era situado acima dos demais poderes e praticava atos de toda natureza, ao aprovar e suspender resoluções, dissolver a Câmara dos Deputados, entre outros. Ademais, o seu exercício tornava o chefe de Estado imune à qualquer tipo de responsabilização. Enfim, era um poder autoritário e centralizador.

As regras de acesso ao poder na Constituição de 1824 eram, evidentemente, excludentes. Os deputados, senadores e membros dos Conselhos Gerais das Províncias eram eleitos indiretamente. Eram proibidos de votar os escravos, os libertos, as mulheres, os que não obtivessem renda anual de 100 ou 200 mil réis, como exemplo. Para senador, exigia-se que o indivíduo possuísse saber, capacidade e virtudes, sem especificar exatamente seu significado, e que obtivesse rendimento anual de 800 mil réis. Para deputado, exigia-se a renda de 400 mil réis, sendo necessária professar a religião oficial do Estado, o catolicismo (PLANALTO, 2016a).

O conceito de cidadão, portanto, era bastante limitado. Além da liberdade de opinião, era exaltado o princípio da legalidade e da anterioridade da lei penal, a liberdade de ir e vir, a

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inviolabilidade doméstica, a igualdade perante a lei, o direito de propriedade em toda sua plenitude, a inviolabilidade da comunicação, instrução primária gratuita a todos os considerados cidadãos, de acordo com regras amplamente excludentes (PLANALTO, 2016a). A Carta de 1824 exaltava a liberdade de opinião, de publicação de palavras e pensamentos pela imprensa, sem censura. Contudo, diversos jornalistas eram perseguidos e violentamente atacados, entre outros exemplos de contradição (VILLA, 2011).

Portanto, é válido destacar que tanto a Constituição e seus preceitos quanto as liberdades e garantias previstas eram, na realidade, anuladas pelo poder ilimitado e centralizador do Imperador por meio do Poder Moderador. Isso, é resultado do fato de que, a Independência do Brasil fora imposta “de cima para baixo”, ou seja, fora realizada pelos próprios detentores do poder, cuja Constituição outorgada preservaria sua esfera de poder.

Após a abolição da escravidão, a perda do apoio à monarquia atingiu seu auge com o golpe militar republicano de 1889. O nascimento da república foi acelerado pelo temor de que se fizessem reformas econômico-sociais. Além disso, a adoção do sistema federativo com a transferência de atribuições do poder central para as oligarquias estaduais transformou a causa republicana em um movimento muito mais atrativo (VILLA, 2011).

A Constituição da Primeira República expressou intensamente os ideais do liberalismo, como influência de Rui Barbosa, um dos maiores críticos da política imperial. Propunha limitar o poder pessoal do governante, anteriormente expandido pela instituição do Poder Moderador na Constituição do Império. O novo texto seguiu a teoria da separação dos poderes de Montesquieu e buscava criar uma distância entre Estado e sociedade, em fidelidade à dimensão axiomática fundamental do liberalismo. A Carta de 1891 instituiu no país, em teoria, um poder governante cuja titularidade se renovava periodicamente; a autonomia das Províncias agora transformadas em Estados concretizavam o poder descentralizado; a inauguração de uma Federação, inspirada no pacto norte-americano; e, principalmente, a extinção da forma parlamentar e introdução do sistema presidencialista (BONAVIDES; ANDRADE, 1991).

Contudo, a precisão técnica do texto e a linha principiológica não expressavam a realidade, tornando-se, ao final, um instrumento disfuncional. A figura do Presidente da República aglutinava as oligarquias estaduais e exercia as prerrogativas de um monarca sem coroa. As instituições democráticas mostravam-se incapazes de romper com as tradições sedimentadas na sociedade e com as desigualdades econômicas regionais, refletidas no âmbito

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político. Não se criaram mecanismos para que houvesse participação e garantia dos direitos resguardados (BONAVIDES; ANDRADE, 1991).

A fração econômica dominante de produtores de café de São Paulo coincidia, quase que totalmente, com os representantes políticos no estado. As eleições demonstravam o sistema de dominação existente, onde todos o processo eleitoral era conduzido pelo próprio coronel. As relações no âmbito rural, com o cafeicultor, nos moldes do coronelismo, de dependência pessoal, introduzia a confusão patrimonial entre esfera pública e esfera privada, repetindo-se no âmbito político-jurídico. Mais precisamente, nas palavras de Perissonatto (1994, p. 107):

A forma específica pela qual a lavoura, isto é, o coronel, se faz presente na política republicana é o domínio privado do poder público local com a bênção do poder regional, e sua total obediência a este último dentro das regras do compromisso coronelista. A expressão ideológica da subordinação política do poder local ao poder regional, isto é, a expressão ideológica do compromisso coronelista, no âmbito das frações dominantes, é o “governismo” declarado que graçava em São Paulo na Primeira República. Dentro das regras do “compromisso”, ser oposição significava suicidar-se politicamente, pois isso não seria perdoado pelo poder regional, que colocaria todo o seu aparato — polícia, juízes, corte de verbas, fraude eleitoral etc. — contra o coronel rebelde. No contexto do cerceamento da autonomia municipal consagrado pelo compromisso coronelista não havia outra coisa a fazer senão apoiar o governo e dele receber a bênção para dominar o poder local.

Além disso, o sistema eleitoral previsto na Carta de 1891 excluía da condição de eleitores os mendigos, os analfabetos e os religiosos pertencentes a ordens monásticas. A eleição da Câmara de Deputados era por sistema distrital. Bem como a Carta de 1824, eram previstas a liberdade de opinião, o princípio da legalidade e da anterioridade da lei penal, a liberdade de ir e vir, a inviolabilidade doméstica, a igualdade perante a lei, o direito de propriedade em toda sua plenitude, a inviolabilidade da correspondência. Além disso, foram ampliadas as liberdades e garantias da pessoa humana com a criação do habeas corpus e a abolição da pena de morte. Ademais, a República extinguiu, todos os títulos de nobreza e privilégios de berço e separou o Estado da Igreja (PLANALTO, 2016b).

A centralização do poder, apoiada pelo poder regional das oligarquias, resultou em uma grande instabilidade federativa. As instituições democráticas que formavam o sistema político da Primeira República demonstravam-se frágeis e instáveis, e serviam, para Bonavides e Andrade (1991, p. 256), para “sustentar o status quo dos privilégios políticos da sociedade patriarcal, restando indiferentes às massas rurais e urbanas espoliadas pelo colonialismo interno

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que as mantinha na semi-servidão, sem nenhum peso da ingerência política, portanto sempre marginalizadas pelo Poder.”

É oportuno destacar que, mais uma vez, o Brasil sofrera um câmbio político-estrutural realizado pelas classes dominantes. O segmento militar aliado às oligarquias estaduais realizaram a mutação da monarquia para a república, de modo que a maior parte da população ignorava ou era excluída do processo. Como ressalta Carlos Nelson Coutinho (1974, p. 41), as transformações econômicas e políticas no país seguem o quadro de uma “via prussiana”, por meio,

da conciliação entre frações das classes dominantes, de medidas aplicadas 'de cima para baixo', (…) essas transformações 'pelo alto' tiveram como causa e efeitos principais a permanente tentativa de marginalizar as massas populares não só da vida social em geral, mas sobretudo do processo de formação das grandes decisões políticas nacionais.

Pode-se concluir que o federalismo era, em verdade, inexistente, em razão das desigualdades regionais e da dominação do cenário político pela classe dominante de São Paulo. A liberdade de escolha e a autonomia do indivíduo em votar e ser votado, do mesmo modo, eram minadas em virtude das práticas coronelistas. A alternância do poder, a existência de eleições limpas eram, também, fatores ausentes do sistema político e democrático da Primeira República.

De acordo com Bonavides e Andrade (1991), a primeira Constituição Republicana foi derrubada com a Revolução de 1930. Esta deu início a um novo período para o sistema político, agora republicano e federalista. Contudo, em sua praxis, pode-se dizer que a revolução de 30, por fatos impeditivos, não foi uma revolução, apesar de persistir como tal na mente de seus idealistas à época. As transformações políticas e sociais engendradas por suas lideranças não conseguiram alterar os problemas profundos e complexos vividos pela sociedade.

Para Schwarcz e Starling (2015), após assumir o Governo Provisório, Getúlio Vargas não demonstrou disposição em convocar uma Assembleia Constituinte nem em determinar a data para uma nova eleição presidencial. Diante das pressões, em 1932, o país passou a dispor de um Código Eleitoral moderno e uma Justiça Eleitoral. As mudanças mais significativas foram a instituição do voto secreto e a conquista do direito de votar e serem votadas. É relevante salientar que essas medidas visavam a inviabilização da dinâmica fraudulenta característica do sistema representativo Primeira República. O voto secreto inibia o eleitor da coerção das elites

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regionais, enquanto a Justiça Eleitoral designava a profissionais a apuração dos votos e fiscalização das eleições.

Consoante a Bonavides e Andrade (1991), a revolução de 1930, não obstante ter sido motivada por valores predominantemente liberais, ao fim possibilitou o constitucionalismo do Estado Social. O quadro político da época fez surgir estruturas obreiras que logo tornaram-se fatores relevantes para o país. As teses do marxismo e do corporativismo expandiram-se e transformam o diálogo liberal em um diálogo social. Nesse sentido, Getúlio Vargas implantou uma política trabalhista forte e dominante. Apesar disso, o prolongamento do Governo Provisório uniu as resistências intrarregime e as forças de oposição em torno da Revolução Constitucionalista Paulista de 1932. A revolta, que tinha como reivindicações a instituição de uma representação legítima e a normalização do Estado de Direito, acabou sendo derrotada.

Raymundo Faoro (2001) destaca, especialmente, o confuso conglomerado dominante de tendências e alas o qual adiantou-se ao povo na condução da insurreição de 1930: liberal, mas de caráter tutelar, positivista mas não rousseauniano. O projeto de governo objetivaria o atendimento da pressão da soberania popular, mas reservando a seletividade das reivindicações, A incorporação dos problemas sociais ao mecanismo institucional teria, ainda, a função de pacificá-los. A reforma política e social, por sua vez, impediria a efetiva transferência de poder às camadas médias e proletárias. O Estado forte, nacionalista, conduzido por um líder paternalista, auxiliado pela ideologia fascitizante, teria como principal pilar de sustentação o elemento militar, por meio da classe dos tenentes.

A falência da Revolução de 1930, em Schwarcz e Starling (2015, p 362-363), já residia desde sua implementação:

A Aliança liberal prometeu refundar a República, sustentou sua promessa num impressionante programa de reformas, mas as grandes forças políticas responsáveis por sua institucionalização não tinham origem nem vocação democrática. Acreditavam que o projeto democrático que animava a Constituição de 1891 definhara sob a prevalência da Política dos Governadores, e optaram por um governo forte e centralizador. A coalizão que empalmou o poder em 1930 era heterogênea, e os protagonistas divergiam sobre quase tudo - menos sobre os adversários. Desde os primeiros dias do Governo Provisório, o grupo se viu às voltas com um amplo programa de reformas cujo objetivo era mudar a República, sem, contudo, alterar as bases sobre as quais ela se constituiu.

Consoante a Bonavides e Andrade (1991) eleita uma Assembleia Legislativa exclusivamente para os fins de elaboração da Constituição, em seguida promulgou-se a

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Segunda Constituição da República em 1934. Foi eleito indiretamente Getúlio Vargas como presidente. Entretanto, pode-se destacar que a Assembleia Constituinte de 1932 fora duvidosa. A imprensa encontrava-se sob censura e líderes políticos adversários de Vargas exilados. Tudo isso contribuía para um questionamento da legitimidade da referida assembleia.

Em relação às liberdades e direitos fundamentais, a Carta de 1934 redirecionou o foco da concepção individualista e liberal dos direitos e garantias fundamentais para os direitos da ordem econômica e social. O Poder Legislativo constituía-se de um modelo bicameralista. A Câmara dos Deputados compunha-se de representantes do povo e, ineditamente, de representantes de organizações profissionais. Estes últimos eleitos por sufrágio indireto pelas associações de áreas específicas. Poderiam candidatar-se à Câmara dos Deputados os brasileiros natos, alistados eleitores e maiores de 25 anos e ao Senado, da mesma forma, maiores de 35 anos. Para a caracterização como eleitor, foram mantidas restrições da Carta anterior, como aos analfabetos e aos mendigos. A Constituição introduziu uma série de direitos trabalhistas e preceitos a serem observados pela legislação trabalhista, dentro da seção específica da Ordem Econômica e Social (PLANALTO, 2016c).

Para Villa (2011), a Constituição de 1934 restringiu os direitos fundamentais. Foi introduzido o conceito de Segurança Nacional como central, o que refletia o clima de autoritarismo da década de 30 e a rejeição ao liberalismo. Foi previsto o estado de guerra e a suspensão das garantias fundamentais, além de garantido o estado de sítio e a censura da imprensa até mesmo em tempos de paz. Percebia-se um culto ao Estado forte, inspirado no totalitarismo europeu. O nacionalismo tornou-se o axioma fundamental da Carta.

Para Bonavides e Andrade (1991), a Constituição de 1934 é perpassada por princípios antagônicos e contraditórios. O embate ideológico entre os defensores do liberalismo e os adeptos do constitucionalismo social, seguindo a tendência europeia do pós-guerra, mais especificamente pela Carta de Weimar, resultou em uma grande junção de indecisões e ambiguidades, expressando a ausência de um projeto político hegemônico para o Estado. As discussões giravam em torno das correntes doutrinárias centralizadoras ou unitárias e correntes autonomistas ou perifericamente federativas. Ainda, optou-se pelo bicameralismo, apesar de fortes opiniões contrárias. Com efeito, somente uma tendência poderia prevalecer, o que deu ensejo ao golpe de estado de 1937 e à instauração da ditadura do Estado Novo.

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De acordo com José Afonso da Silva (2011), a Carta Constitucional do Estado Novo, a conhecida “Polaca”, tinha como principal preocupação o fortalecimento do Poder Executivo. A Carta previa a eleição do presidente da república por via indireta, sem a participação do povo. A Carta não procurou estabelecer uma tripartição de poderes. Ao Presidente da República pertenciam uma série de atribuições, sendo, desse modo, a autoridade dominante. Não se realizou a submissão da Carta a um plebiscito, bem como a realização de eleições por um Parlamento Nacional como previsto em seu próprio texto. O regime autoritário estava instalado. De acordo com Villa (2011), a ditadura do Estado Novo, imposta em 1937, fora rodeada por uma luta entre facções pelo poder, como as integralistas e comunistas. Instaurou-se uma histeria anti-comunismo, marcada por violência e repressão. Fora imposto estado de guerra e de sítio, sucessivamente. Somente entre os anos 1935 e 1937 foram encarceradas mais de 7 mil pessoas. Tudo isso serviria de motivo para que Vargas justificasse o cancelamento das eleições presidenciais de 1938 e permanecesse no poder através de um golpe, apoiado pela elite política e pelas Forças Armadas.

Diante disso, foi fechado o Congresso Nacional e restringidas as liberdades constitucionais. A censura prévia fora instaurada para garantia da ordem. O período fora caracterizado pelo culto ao Estado forte e pela exaltação ao nacionalismo, uma tendência inspirada no totalitarismo europeu. Ao lado do ultrautoritarismo, A Constituição introduziu um amplo programa de proteção do trabalhador. Contudo, o trabalhador permanecia vinculado ao Estado, como compreende-se pela autorização estatal do sindicato (VILLA, 2011).

De acordo com Bonavides e Andrade (1991), após oito anos de um governo autoritário, a enorme contradição que o país vivia, tendo lutado contra ditaduras na Segunda Guerra Mundial em nome da liberdade ao continuar vivendo em um estado totalitário, exacerbou-se com a tentativa, em 1945, de reforma da constituição outorgada de 1937, a qual pretendia manter no poder o atual governante. Dessa forma, as forças oposicionistas engendraram o fim do Estado Novo. Em outubro de 1945 as Forças Armadas foram às ruas e entregaram o poder ao presidente do Supremo Tribunal Federal. O legado do período da ditadura do Estado novo consistiu na difusão do corporativismo e do pensamento autoritário. O paternalismo exacerbado fora cristalizado na cultura e no pensamento político brasileiro, exaltando a falsa concepção de origem da lei como benesse pessoal do governante.

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A Constituição de 1946 afirmou o princípio federativo, concedendo autonomia aos Estados e Municípios, retomou a tripartição e o equilíbrio dos Poderes. Dividiu o Poder Legislativo em duas Casas. Criou o cargo de vice-presidente, com atribuições próprias, como a presidência do Senado Federal. Quanto às liberdades fundamentais, estabeleceu a liberdade de pensamento, protegeu os direitos e garantias fundamentais ao limitar a instauração do estado de sítio, devendo ser aprovada pelo Congresso Nacional (PLANALTO, 2016d). Segundo Bonavides e Andrade (1991), a Constituição de 1946 proporcionou avanços e retrocessos em determinadas áreas, mas manteve a estrutura básica do Estado social brasileiro. O texto procurou um equilíbrio entre o Estado liberal e o Estado social ao fazer alterações em áreas como a intervenção pública no domínio econômico.

Em relação ao sistema político, nomeou livre a criação de partidos políticos, com exclusão daqueles que contrariassem o princípio democrático. Não poderiam ser eleitores os analfabetos, os não falantes da língua nacional, “as praças de pré, salvo os aspirantes a oficial, os suboficiais, os subtenentes, os sargentos e os alunos das escolas militares de ensino superior.” (art. 132, parágrafo único). Esses últimos, também não poderiam ser eleitos. Era proibida a reeleição. É oportuno destacar que se estabeleceu que a eleição do presidente e do vice- presidente seria feita separadamente, ou seja, não formariam uma chapa (PLANALTO, 2016d)

Após a renúncia do presidente Jânio Quadros, em 1961, instalou-se uma grave crise política de acordo com Villa (2011). O vice-presidente, João Goulart, foi impedido de assumir a Presidência da República. Como resolução, implantou-se o parlamentarismo e foi eleito um novo nome para primeiro ministro. Em 1963, realizou-se um plebiscito para decidir acerca da permanência do sistema parlamentarista, o qual resultou derrotado. Em 1964, um golpe de estado colocou fim ao período democrático, instaurando uma ditadura militar extremamente violenta e repressiva que duraria 21 anos. Um dos primeiros atos dos militares consistiu na edição do ato institucional que suspendia garantias constitucionais em abril de 1964. Logo, seguiram-se outros atos institucionais e outorgou-se a Constituição autoritária de 1967.