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3 PROPOSTAS DE SUPERAÇÃO DA CRISE DEMOCRÁTICA ATRAVÉS DO

3.3 A ampliação da participação popular nas decisões públicas como controle

As decisões governamentais que afetam toda a comunidade poderiam ser aprimoradas se permitissem o envolvimento do maior número possível de pessoas dessa comunidade. Isso implica a configuração de uma democracia que combine democracia representativa com democracia direta, de modo que a representatividade não se anule mas seja legitimada e fortalecida. Para Barber (2003), a participação da sociedade civil aprimora o poder das comunidades e as dota de uma força moral que a governança não-participativa raramente alcança. A redução da democracia à eleição implica a existência prévia de uma agenda, a qual promove a replicação de interesses privados em níveis superiores, onde são chamados de maiorias e minorias, e onde, consequentemente, causam inegáveis danos.

O alargamento da participação política, além do acesso à informação, da reinvenção de formas democráticas, requer o aprimoramento do diálogo. Jürgen Habermas (1995), a partir da crítica aos modelos de democracia propostos pelo liberalismo e pelo republicanismo, sugere uma nova configuração democrática fundada na teoria do discurso. A diferença entre as duas concepções referidas deve-se, principalmente, ao papel do processo democrático. O processo democrático, segundo a concepção liberal, “cumpre a tarefa de programar o Estado no interesse da sociedade, entendendo-se o Estado como o aparato de administração pública e a sociedade

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como sistema, estruturado em termos de uma economia de mercado, de relações entre pessoas privadas e seu trabalho social.” (HABERMAS, 1995, p. 39). A formação da vontade dos cidadãos, enquanto política, tem a finalidade de “agregar e impor os interesses sociais privados perante um aparato estatal especializado no emprego administrativo do poder político para garantir fins coletivos.” (HABERMAS, 1995, p. 39) Segundo a concepção republicana, por outro lado, a função da política supera a mera mediação, na medida em que:

Ela é um elemento constitutivo do processo de formação da sociedade como um todo. A política é entendida como uma forma de reflexão de um complexo de vida ético (…). Ela constitui o meio em que os membros de comunidades solidárias, de caráter mais ou menos natural, se dão conta de sua dependência recíproca, e , com vontade e consciência, levam adiante essas relações de reconhecimento recíproco em que se encontram, transformando-as em uma associação de portadores de direitos livres e iguais. (HABERMAS, 1995, p. 39-40)

Em razão disso, junto às instâncias do Estado e do mercado, surge a solidariedade e uma terceira fonte de integração social por meio da orientação pelo bem comum. A vontade política, nesse modelo, forma-se horizontalmente, direcionada para o entendimento ou para o alcance de um conceito pela argumentação.

A teoria do discurso proposta por Habermas (1995, p. 47) “associa ao processo democrático conotações normativas mais fortes que o modelo liberal, porém mais fracas do que o modelo republicano, toma elementos de ambos e os articula de uma forma nova e distinta.” Sem compreender como secundária a estruturação consoante ao Estado de Direito, ela concede ao processo político de formação da vontade comum e da opinião um lugar de destaque, similarmente ao modelo republicano. A teoria do discurso articula-se por meio da:

intersubjetividade de ordem superior de processos de entendimento que se realizam na forma institucionalizada das deliberações, nas instituições parlamentares ou na rede de comunicação dos espaços públicos políticos. Essas comunicações desprovidas de sujeito, ou que não cabe atribuir a nenhum sujeito global, constituem âmbitos nos quais pode dar-se uma formação mais ou menos racional da opinião e da vontade acerca de temas relevantes para a sociedade como um todo e acerca das matérias que precisem de regulação. A geração informal da opinião desemboca em decisões eleitorais institucionalizadas e em decisões legislativas por meio das quais o poder gerado comunicativamente se transforma em poder passível de ser empregado em termos administrativos. (HABERMAS, 1995, p. 48)

A questão da institucionalização, para Habermas (1995), assume especial relevância a partir do estudo da tensão entre efetividade e validade no Direito. A esfera geradora do poder legítimo, para ele, é a esfera pública, por meio ação comunicativa. Esse poder é superior ao

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poder administrativamente gerado pelo Estado. Portanto, toda carga de legitimação repousa sobre a democracia. O princípio do discurso, então, assume a forma normativa de um princípio democrático.

Para a resolução das tensões entre representatividade e legitimidade, Sousa Santos (2005) propõe a formulação de um novo modelo democrático, o qual difere do modelo representativo em muitos aspectos. A democracia radical de alta intensidade requer, especialmente, a democratização de todos os espaços públicos. Esta preconiza a construção de relação de autoridade compartilhada, em detrimento do modelo tradicional de relações de poder. O autor pretende apresentar a relação entre democracia representativa e democracia participativa como forma de recuperação da demo-diversidade. O contraste entre o modelo democrático moderno e a democracia participativa é demonstrada pelo autor:

En la democracia representativa nosotros elegimos a los que toman decisiones políticas; em la democracia participativa, los cidadanos deciden, toman las decisiones. Pero esta polarización debe ser matizada: primero, la democracia representativa tiene también una parte de participación. El voto lo es, pero es una participacion compleja, porque conlleva la idea de renuncia a la participación, y por eso es limitada. La democracia participativa, por el contrário, también tiene delegaciones y formas de representación: hay concejales, y delegados (SOUSA SANTOS, 2005, p. 79).

Antes de tudo, deve-se superar o bloqueio de cidadania imposto pela democracia representativa, a qual garante a participação política mas não as condições materiais de participação. Nesse ponto, percebemos que a democracia substancial e democracia formal, segundo terminologia proposta por Ferrajoli (2002), necessariamente se enlaçam. Sousa Santos (2005) entende que são condições imprescindíveis para haver participação e competitividade política a garantia da subsistência material, de acesso à informação e de uma liberdade mínima para que o voto seja livre e haja emancipação social. A diminuição da desigualdade social deveria ser implementada para a resolução da crise de contrato social atual. A ausência de condições materiais mínimas de sobrevivência tem causado a expulsão da sociedade, do contrato social, de milhões de indivíduos (em alguns países mais, em outros menos) colocados em um estado de natureza, em estado de exclusão social.

A democracia representativa e a democracia participativa devem ser complementares. Para isso, Sousa Santos (2005) sugere uma articulação entre Estado e movimentos sociais, partidos políticos e movimentos sociais e entre os movimentos sociais entre si. Realizar a complementariedade e articulação necessárias é, em verdade, bastante complexo. Contudo, o

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Brasil, especialmente Porto Alegre, possui experiências de consultas populares, referendos, conselhos sociais, conselhos de gestão de políticas públicas que demonstram o início de uma complementariedade a nível local. A partir desses casos, foi possível compreender que “una democracia participativa em nível local logra articular autorización com rendición de cuentas, crea realmente una transparencia, limíta la corrupción (…) y logra redistribuición social” (SOUSA SANTOS, 2005, p. 82).

Recentemente, em nível nacional, a Presidência da República instituiu por decreto presidencial (nº 8243/2014), em maio de 2014, a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS). O programa foi instituído “com o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil.” (art. 1º). O programa orientava-se pelas seguintes diretrizes:

I - reconhecimento da participação social como direito do cidadão e expressão de sua autonomia; II - complementariedade, transversalidade e integração entre mecanismos e instâncias da democracia representativa, participativa e direta; III - solidariedade, cooperação e respeito à diversidade de etnia, raça, cultura, geração, origem, sexo, orientação sexual, religião e condição social, econômica ou de deficiência, para a construção de valores de cidadania e de inclusão social; IV - direito à informação, à transparência e ao controle social nas ações públicas, (...) V - valorização da educação para a cidadania ativa; VI - autonomia, livre funcionamento e independência das organizações da sociedade civil; VII- e ampliação dos mecanismos de controle social (art. 3º). (PLANALTO, 2017f)

Ainda, objetivava “consolidar a participação social como método de governo” (art. 4º), entre outros. As instâncias e mecanismos de participação social implementados constituiam-se de “I - conselho de políticas públicas; II - comissão de políticas públicas; III - conferência nacional; IV - ouvidoria pública federal; V - mesa de diálogo; VI - fórum interconselhos; VII - audiência pública; VIII - consulta pública; e IX - ambiente virtual de participação social (art. 6º).” (PLANALTO, 2017f)

Este constituiu-se no programa mais avançado em termos de experiência em democracia participativa e também o de maior abrangência. O texto do decreto mostra desenvolvimento a partir da consolidação e evolução das práticas participativas nos municípios e estados, a partir das quais definiram-se metas mais precisas e aprimoraram-se os mecanismos e modelos de ação. O programa coloca dentro da esfera política e institucionalizada aqueles grupos minoritários e indivíduos que por falta de representação adequada limitavam suas ações

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à esfera extrapolítica, aos movimentos sociais e ao ativismo direto. Ao mesmo tempo, o programa afirma que a instauração de novas instâncias de diálogo entre a sociedade civil e o poder público resultam no aperfeiçoamento da accountability, do acesso à informação e da transparência e publicidade das ações públicas.

Contudo, poucos meses após sua expedição, o decreto foi rejeitado pela Câmara dos Deputados. Perdeu-se, em verdade, uma oportunidade de democratização profunda e necessária para a sociedade brasileira, tão fraturada social e economicamente, além de polarizada politicamente. A abertura de instâncias de participação popular é especialmente democrática por abrir-se a todos, independentemente de crença ideológica ou posição política. Assim, a rejeição da Câmara à abertura de mais um canal de diálogo com os titulares dos direitos que são representados por ela mostra a distância existente entre a classe de detentores do poder e a massa de cidadãos passivos.

As práticas de democracia participativa, porém, não se esgotam no Brasil. Sousa Santos (2002) aponta experiências que conjugam o reconhecimento identitário e cultural, a inclusão social e a participação por meio do rompimento com o colonialismo ou com o autoritarismo realizadas a partir da década de 80 na África do Sul, Moçambique, Índia, Colômbia e Portugal. Como ponto em comum, as práticas participativas opõem-se ao fenômeno recente pelo qual “a política torna-se uma atividade particular, exercida por profissionais, que constituem uma elite política, responsável pelo 'gerenciamento' da sociedade através do Estado – este cada vez mais considerado como uma 'empresa'.” (SOUSA SANTOS, 2002, p. 658) Entre essas experiências, a mais avançada é a do orçamento participativo de Porto Alegre. O programa objetivou uma reforma democrática radical, a construção de uma nova relação entre governantes e governados por meio da socialização da política e do poder.

Nesse sentido, Copetti Santos; Freistedt Copetti Santos; Edler (2016) ressaltam a relação entre interculturalidade e democracia participativa, ao mesmo tempo em que demonstram o poder de minimização da segregação e da criação de guetos (de origem sócio- econômica, cultural, em razão de orientação sexual e de gênero), por meio de uma nova dinâmica entre aqueles elementos. De fato, em um contexto atual de aumento de complexidade e de diversidade humana, em que há uma crise de representatividade, as minorias acham-se captadas por um fluxo de sucessão ininterrupto pelo qual a exclusão de determinados grupos dos processos decisórios acaba gerando o não atendimento de seus direitos humanos fundamentais, o que os torna inaptos a alcançar o sucesso em um processo eleitoral competitivo

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pelo poder público. Através da articulação entre controle social, democracia participativa e diversidade, resulta o empoderamento dos grupos minoritários e, consequentemente, a possibilidade de afirmação dos direitos humanos desses grupos. Essa dinâmica, portanto, requer da democracia participativa sua:

institucionalização onde o pluralismo social possa materializar-se através de uma dialética da interculturalidade, apoiado numa ideia de sustentabilidade democrática multifacetada, pela criação de espaços decisórios onde todos os segmentos populacionais tenham possibilidade efetiva de participação, e não apenas uma participação ficcional, como tem acontecido nas democracias representativas nacionais, criando uma ilusão de que o poder emana do povo e de que efetivamente as pessoas governam. (COPETTI SANTOS; FREISTEDT COPETTI SANTOS; EDLER, 2016, p. 200)

Por este ângulo, o sistema participativo é desenvolvido a partir das premissas de que a democracia pensada a partir da pluralidade humana implica na “ênfase na criação de uma nova gramática social e cultural e o entendimento da inovação social articulada com a inovação institucional, isso é, com a procura de uma nova institucionalidade da democracia” (SOUSA SANTOS, 2002, p. 51) Isso envolve a compreensão de que o espaço público é um espaço de deliberação amplo que inclui o questionamento individual da desigualdade privada. A pluralidade de formas de vida na sociedade requer o assentimento desses atores em processos racionais de discussão e decisão. O procedimentalismo político deve ser uma forma de exercício coletivo do poder político cujo fundamento resida em um processo livre de apresentação de razões entre iguais.

Sob essa perspectiva, Sousa Santos (2002) salienta que um dos principais efeitos que as experiências participativas engendram consiste em colocar na agenda democrática a representação dos grupos sociais mais vulneráveis socialmente, religiões minoritárias, grupos envolvidos em questões de gênero, de orientações sexuais e etnias minoritárias. A medida em que o número de atores políticos no processo democrático aumenta percebe-se que “a representação não garante, pelo método da tomada de decisão por maioria, que identidades minoritárias irão ter a expressão adequada no parlamento” (SOUSA SANTOS, 2002, p. 50). Nesse sentido, Robert Michels (1966), através de sua “lei de ferro da oligarquia” explica o fenômeno pelo qual as democracias têm visto surgir classes políticas dominantes e o processo de circulações no poder dessas elites. A dominação de uma classe política surge como resultado das relações entre as distintas forças sociais, orientadas à competição pela supremacia, considerando-as por seu caráter dinâmico.

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Desse modo, a democracia representativa mostra-se incapaz de responder à evolução contínua e proteção dos direitos das minorias. A previsão genérica de proteção aos direitos e garantias fundamentais presentes na Constituição é insuficiente para acompanhar a evolução das demandas das minorias. Os direitos das minorias, ficam, assim, sujeitos à interpretação de uma Corte Constitucional, quando acionada para o controle de constitucionalidade, a partir de um preceito fundamental. Percebe-se, então, a necessidade de estabelecer-se espaços de participação contramajoritários, onde exista a possibilidade de manifestação e intervenção pelas minorias e seus representantes. Por meio das práticas de democracia participativa, percebe-se um indicativo das ferramentas necessárias para a realização disso.

Nesse sentido, a relação entre pluralidade, dissenso e democracia representativa envolve, para Bobbio (1997, p. 63), a compreensão de que a democracia representativa apresenta a formação de pequenas oligarquias relacionadas aos partidos políticos que concorrem entre si. O melhor seria, então, que essas oligarquias, por meio da democratização da sociedade civil, por meio da conquista de centros de poder pertencentes à sociedade civil por parte de indivíduos cada vez mais e melhor participantes, tornem-se menos oligárquicas, operando não somente a distribuição do poder, mas também seu controle. Em suma,

a liberdade de dissentir tem necessidade de uma sociedade pluralista, uma sociedade pluralista consente uma maior distribuição do poder, uma maior distribuição do poder abre as portas para a democratização da sociedade civil e, enfim, a democratização da sociedade civil alarga e integra a democracia política.

Lavalle; Houtzager; Castello (2006, p. 85-86), colocam a ampliação e pluralização da participação política sob o viés de seu impacto sobre o próprio instituto da representação, de modo que esta,

exercida por atores da sociedade civil é coletiva e ocorre através de um conglomerado heterogêneo de organizações civis que atuam em nome de subpúblicos e/ou minicomunidades, diferindo da representação de interesses pessoais ou de indivíduos, própria da democracia liberal, sem corresponder, no extremo oposto, com a representação do bem comum ou da nação, característica da tradição republicana e de compreensões não liberais da própria representação e dos interesses mediante ela salvaguardáveis.

Em última instância, Lavalle; Houtzager; Castello (2006) concluem que a representação coletiva por meio de mini-comunidades, ao levar demandas e exercer pressão perante o Poder Público, apesar da heterogeneidade e pluralidade, apresenta condições mais propícias à

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consonância entre as orientações deliberativas dos representantes e as demandas dos representados em comparação à nação ou a um eleitorado portador de um mandato vago resultante de uma agregação de votos.

De fato, a sociedade civil ao articular-se em organizações capazes de intervir no Estado por meio de mecanismos de democracia direta ao fomentar políticas públicas, de exigir maior transparência, tornam-se “mediadores (...) a exercer de facto e de jure funções de representação política em novos lugares de representação.” (LAVALLE; HOUTZAGER; CASTELLO, 2006, p. 84-85) Consequentemente, a ampliação considerável da capacidade de interlocução com governos locais e nacionais prefigura traços de uma democracia e representação política pós- liberal. Nesse sentido, não há uma substituição dos mecanismos tradicionais da democracia de representação, mas um aprofundamento, “porque a pluralização e diversificação da representação a levam aonde as eleições e seus atores acusam limites estruturais (LAVALLE; HOUTZAGER; CASTELLO, 2006, p. 85).”

Os laços de sociabilidade que unem uma comunidade, para Castells (2000), podem ser favorecidos pelas redes sociais, no contexto das novas tecnologias cibernéticas. As comunidades virtuais, em verdade, são mais intensas do que se acredita. Elas são capazes de criar laços fracos, os quais são empregados especialmente no fornecimento de informações e na abertura de oportunidades novas a baixo custo. A comunicação estrutura-se num modelo igualitário de interação, no qual as diferenças sociais são menos influentes ou impeditivas. A comunicação online apresenta índices significativos de solidariedade recíproca, o que a transforma num elemento fundamental diante da ruptura cívica e da expansão da individualização atuais.

Contudo, surgem dúvidas acerca da disponibilidade e capacidade do indivíduo de agir politicamente. Assim, Barber (2003) sugere que o modo de envolver o cidadão no controle social e numa rede dialógica se dá pela própria prática. A comunidade desenvolve-se a partir da participação ao mesmo tempo em que torna a participação possível. A atividade cívica educa os indivíduos a pensar civicamente enquanto a cidadania informa a atividade cívica com o senso necessário de publicização e justiça. Ao final, a liberdade (desta vez, real e tangível), é o que resulta desse processo e não seu pressuposto.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A democracia representativa, certamente, desenvolveu-se durante um longuíssimo período de tempo. Mais importante: ela é resultado da intervenção humana não somente contínua e contundente, mas intensamente desafiadora, tanto em relação aos sistemas sociais e políticos vigentes quanto aos poderes estabelecidos. Como movimentos principais, observamos, na Inglaterra, o esforço dos barões em limitar o poder monárquico, garantindo sua representação junto ao Parlamento. Com o uso de sua influência local, esses sujeitos realizavam um contraponto ao poder central, desestabilizando o despotismo. A fusão entre as culturas normandas e saxãs levou ao reconhecimento precoce de um direito de resistência à opressão, de supremacia da lei e divisão do poder real. Como resultado, a Bill of Rights de 1689, institucionalizou a limitação do poder monárquico. Na França, o movimento de resistência e conquista de direitos resultou na Declaração de 1789. O contratualismo, a introdução de um modelo de sociedade individualista, a crença na igualdade humana foram imprescindíveis para a emergência da democracia representativa.

Em seguida, apresentamos requisitos para que um sistema político seja considerado democrático, como: eleições limpas, justas e frequentes, liberdade de expressão, funcionários eleitos, fontes de informação diversificadas, autonomia para as associações e cidadania inclusiva. Superados esses requisitos, a escolha de um tipo ideal de democracia considera os principais modelos observados pela literatura: democracia formal, democracia substancial, democracia eleitoral, democracia de referendo, democracia autogovernante, democracia participativa, e, especialmente, os modelos de democracia indireta majoritária e consensual de Lijphart.

O modelo consensual apresenta sistemas eleitorais pluripartidários, distância menor entre governantes e cidadãos, índices menores de corrupção, aspectos inclusivos em sociedades plurais, estimula o consenso, a ampliação da maioria governante, a possibilidade de representação de minorias e a satisfação dos cidadãos com seus regimes políticos. Consequentemente, elegemos o modelo consensual de democracia representativa como tipo

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ideal, em combinação com a democracia participativa. Dessa forma, pode-se garantir a racionalidade e independência das decisões nos processos eleitorais, mecanismos de

accountability adequados, autonomia, inclusão e participação de indivíduos e grupos em um

modelo de compartilhamento do exercício do poder.

A análise da história da democracia brasileira a partir de suas Constituições revela a