• Nenhum resultado encontrado

VI. O DIREITO E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

7.3. A visão tradicional de planeamento

Os primeiros estudos formais sobre o planeamento em administração datam do final da década de 1950 e início da década de 1960. Nessa época, os estudos organizacionais sofrem uma grande influência da Teoria de Sistemas, a qual possibilitou uma maior compreensão da interface entre a empresa e o meio ambiente. Segundo essa teoria, um sistema organizacional rígido não poderia sobreviver se não conseguisse responder eficazmente às mudanças contínuas e rápidas do ambiente. Além de destacar as relações dinâmicas entre os componentes de todas as organizações, a Teoria de Sistemas colocou então um foco sobre as trocas entre a organização e seu meio, fornecendo as bases teóricas que seriam utilizadas posteriormente pelos autores e consultores do campo do planeamento estratégico.

Na década de 1970, o curso de política de negócios já fazia parte do currículo de muitas escolas de administração no mundo e tinha como objectivo oferecer aos estudantes uma visão mais ampla da organização, fazendo com que estes integrassem os conhecimentos adquiridos em outras disciplinas, na análise e solução de problemas reais (CERTO & outros, 1993). Por outro lado, pesquisas e estudos eram realizados por diferentes autores e consultores, dando origem às primeiras escolas de planeamento, destacando-se o contributo de ANSOF, com a

25 Refere-se aqui a escolas no sentido de correntes (doutrinárias, filosóficas, políticas e outras) prevalecentes, em

72

obra Estratégia Corporativa, publicada em 1972, e de PORTER, com "A Vantagem Competitiva das Nações", em1989.

No âmbito económico, por sua vez, imperava o modelo de desenvolvimento fordista26, que predominou após a Segunda Guerra, até a década de 70. Este modelo foi caracterizado pelo

boom económico dos países do norte, tendo como força motriz a industrialização apoiada pela

mecanização. Em síntese, pode-se afirmar que a máxima do fordismo era o progresso social, apoiado na distribuição de renda através do trabalho; o progresso técnico, apoiado na separação entre aqueles que pensam e os que executam; e o progresso económico, tendo por base o consumo de massa. O sistema fordista fazia com que as empresas priorizassem a produção em larga escala de produtos padronizados a um baixo custo, dando maior ênfase ao processo e à produção do que ao mercado.

Essas tendências no campo da ciência e da economia influenciaram fortemente os modelos e as teorias que fundamentaram o conceito de planeamento, assim como o sentido que o conceito assumiu na modernidade. As abordagens de planeamento que se desenvolveram nessa época reflectiam tal influência. Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), em seu livro

Safári de Estratégia, classificam essas abordagens em três escolas que denominam de: design,

planeamento e posicionamento. Os elementos essenciais dessas escolas são identificados no quadro seguinte: Escolas Principais Autores Palavras-chave Visão da Organização Visão do Ambiente Design Selznick, 1957 Andrews, 1965 Congruência, competência distintiva, vantagem competitiva Como máquina Pode ser definido e é estável Planeamento Ansoff, 1965 Programa, orçamento,

esquema, controlo Como burocracia Simples e estável (logo, previsível) Posicionamento Porter, 1980, 1985 Estratégia competitiva, análise da concorrência, curva de experiência Como máquina enorme, dividida e globalizada Simples, estável e quantificável)

Fonte: MINTZBERG, Henry e outros – Safari de estratégia. Porto Alegre: Bookman, 2000

26 Trata-se do conjunto de ideias que conformam a teoria de organização de Hery Ford, fabricante de automóveis

(EUA,1863-1947), baseada no princípio básico do rendimento máximo da empresa, evitando-se desperdícios de matérias primas e reduzindo-se ao máximo o ciclo das transformações, em virtude da concepção do trabalho em cadeia, com uma sequência lógica de execução. Produtividade máxima, intensificação e economicidade são outros princípios básicos constantes de suas obras.

73

Em síntese, pode-se afirmar que tais escolas têm em comum uma visão prescritiva do processo de planeamento Os seus autores apresentam o planeamento, em geral, como um processo estruturado, formado por elementos bem identificados, como o diagnóstico ambiental, as directrizes organizacionais (missão, visão e objectivos) e as estratégias. Tais elementos são definidos por meio de um processo intenso de formulação conduzido principalmente pelos dirigentes da empresa, de maneira formal. A visão de planeamento difundida por essas escolas é de um processo top-down, isto é, aquele em que o pensar é mais importante que o fazer, ou seja, é dada mais importância ao processo de formulação da estratégia do que a sua execução.

Sem desconsiderar a importância de tais escolas para a definição dos conceitos essenciais na composição da própria área, percebe-se que alguns dos seus pressupostos começam a ser questionados. De facto, o novo contexto competitivo faz com que as empresas tenham de se adaptar rapidamente às mudanças do ambiente, o que reduz cada vez mais a distância entre planeamento e execução. Por outro lado, a própria configuração do ambiente se altera: os clientes e fornecedores estão cada vez mais dentro da empresa, influenciando directamente na sua gestão; a concorrência, muitas vezes, cede lugar às alianças, às redes e às parcerias; e o local e o global estão cada vez mais próximos, o que faz com que as empresas necessitem adoptar múltiplas estratégias para permanecer nos mercados.

Esse conjunto de mudanças coloca em questão as concepções tradicionais do planeamento. Alguns chegam mesmo a afirmar que o planeamento, nos tempos actuais, é uma utopia. Seria o fim dessa função nas empresas?

Olhando além das aparências, percebe-se que, em lugar de perder a importância, o planeamento tornou-se ainda mais essencial. Entretanto, o que muda é sua natureza, a forma de praticá-lo e também alguns de seus elementos. Essas questões serão abordadas a seguir.