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2 APORTES TEÓRICOS

2.3 ABORDAGEM HISTÓRICO-INVESTIGATIVA

De acordo com os autores Heering & Höttecke (14) e Pinho (80), abordagens complementares podem ser utilizadas ao estudar a HFC. Entre as várias alternativas metodológicas e abordagens complementares há a abordagem histórico-investigativa (HI), que contempla a inserção da HFC no ensino de ciências integrada com a abordagem

investigativa. A HI visa motivar e ensinar conceitos científicos de uma forma mais crítica, explicitando dificuldades e conquistas e contextualizando os conteúdos a serem trabalhados em sala de aula.

A abordagem histórico-investigativa pode ou não conter experimentos. No caso desta pesquisa entendemos como abordagem histórico-investigativa a inserção do uso da história da ciência em atividades experimentais de cunho investigativo de forma a criar um mecanismo de ensino e aprendizagem centrado no aluno e orientado pelo professor. Assim, ao utilizar a abordagem histórica aliada à investigativa, os estudantes podem ser levados a discutir, dividir opiniões e conhecimentos e debater sobre as diferentes interpretações e teorias. Isso, pois o ensino investigativo se concentra “[...] tanto no aprendizado dos conceitos, termos e noções científicas quanto no aprendizado de ações, atitudes e valores próprios da cultura científica” (10, p.13) e ao fazer o debate histórico juntamente com os experimentos, há a revelação de como a ciência acontece, é criada, construída e funciona. (50,81-86)

Salientamos que a atividade histórico-investigativa não prepara os alunos para manipular materiais automaticamente em busca de um resultado numérico, como normalmente ocorre em aulas de laboratório tradicionais. Na abordagem HI é esperado que os estudantes se envolvam em uma investigação através da participação ativa. Não é suficiente que os alunos desfrutem da experiência. Com a mediação do professor, os alunos problematizam uma situação, contextualizam e relacionam com o conteúdo, criam hipóteses que são discutidas e testadas experimentalmente, e interpretam seus resultados.

Segundo Heering & Höttecke (14), a abordagem histórico-investigativa (HI):

• Contextualiza a ciência com sua história e filosofia;

• Enfatiza os aspectos sociais e culturais da história e da filosofia;

• Possibilita o ensino e aprendizagem de ciências;

• Permite que os alunos explorem por conta própria os fenômenos naturais;

• Possibilita a reflexão dos alunos sobre suas ações e fomenta habilidades de raciocínio;

• Conecta as atividades investigativas com a ciência do passado.

Heering & Höttecke (14) afirmam que ao utilizar e manipular experimentos os estudantes não irão testar somente as hipóteses conhecidas, mas adquirir entendimento pela

interação teórica, material e humana, desenvolver habilidades e refletir em uma investigação própria e na relação que há com um determinado contexto histórico. Além disso, ao conduzir uma investigação científica, os estudantes podem contextualizar a ciência com sua história, possibilitar a aprendizagem sobre a natureza da ciência, permitir reflexões críticas de suas próprias ações e aprendizagens, além de promover habilidades de raciocínio, basear as investigações em pesquisas relacionadas à ciência do passado, enfatizar os aspetos culturais, sociais e materiais da ciência, entre outros. (14) Dessa forma, eles discutem outras estratégias de ensino fundamentadas na abordagem HI que podem ser utilizadas no ensino de ciências:

• Narrativas† históricas com experimentação: os alunos, através de suas ideias e conhecimentos prévios, interagem com as ideias de narrativa histórica para realizar um experimento. Neste caso, os alunos formulam ideias e hipóteses e testam para comparar com o trabalho original,

• Narrativa sobre história da ciência: os professores orientam os alunos na narrativa, por meio de um processo de análise crítica para discutir, interagir e questionar sobre a história da ciência apresentada,

• Manuscritos e diários de laboratórios de cientistas: utilizam fontes primárias que podem fornecer uma base confiável para a compreensão da ciência. Esse tipo de abordagem mostra aos alunos que alguns dos questionamentos que eles possuem atualmente sobre determinado problema foram os mesmos que os cientistas enfrentaram. Os experimentos descritos nos diários podem ser efetuados pelos estudantes de forma a mostrar as dificuldades e erros que os cientistas enfrentaram,

• Instrumentos/aparatos do passado: reconstrução de experimentos históricos ou experimentação através de aparatos originais. Essa abordagem fornece aos alunos o entendimento sobre como a construção de um conhecimento científico foi desenvolvido e contextualiza os experimentos, materiais e instrumentos utilizados na época,

• Materiais modernos: podem fornecer aos alunos a compreensão do processo da ciência e também permitem o desenvolvimento de habilidades de resolução de problemas dos alunos,

• Museus e centros de ciências: através de experimentos históricos e originais contidos nos museus, os alunos exploram e analisam os fenômenos físicos no contexto histórico da época, permitindo uma visão sobre a cultura material da experimentação científica.

Allchin e colaboradores (81,87) consideram importante utilizar “casos” e “problemas” no ensino, pois situam o conhecimento em um contexto real, focam em situações específicas, usando um ensino orientado ao aluno e contribuindo para a compreensão da natureza da ciência. (81) Os autores acreditam que os alunos ao trabalharem em casos ou problemas, exercitam o pensamento crítico e reflexivo, desenvolvem habilidades de análise e interpretação, podem refletir sobre sua experiência e assim compreender as práticas científicas. (81,87) Allchin (81,87) cita estratégias que utilizam o EI e a HFC e podem ser usadas no ensino:

• Casos contemporâneos são casos ainda não resolvidos e mostram uma ciência que ainda está caminhando (“in-the-making”). Nesta abordagem são utilizados artigos de jornais contemporâneos e materiais dos meios de comunicação, de forma a promover o desenvolvimento crítico do aluno e mostrar a evolução da ciência. Além disso, ao analisar casos os alunos percebem aspectos da ciência como a incerteza, a subjetividade, as tentativas, diferentes perspectivas, papéis sociais e interesses políticos.

• Investigações orientadas aos alunos englobam problemas, hipóteses, ideias, discussões, comunicações, testes experimentais, coleta de dados, análise e interpretação dos dados, explicações. Este tipo de abordagem desenvolve as habilidades em práticas científicas nos alunos. Allchin cita duas estratégias que são orientadas aos alunos e utilizam casos/problemas: Case-based learning (CBL) e Problem-based learning (PBL). No CBL os casos podem ser narrativas ou somente um cenário para que o aluno entenda como um conhecimento foi gerado e no PBL os problemas são apresentados aos alunos que assumem um papel ativo para encontrar a solução à este problema.

• Casos históricos podem mostrar as críticas, debates, perspectivas culturais e sociais, as motivações, problemas e erros que os cientistas enfrentaram. Esses aspectos promovem o entendimento do conhecimento, a função das teorias, a natureza da observação e do experimento, as diferentes interpretações científicas que podem surgir.

O mesmo autor acredita que essas abordagens (ou qualquer outra) sozinhas não são efetivas e por isso devem ser integradas entre si. O modelo utilizado por ele se baseia em narrativas históricas como guia para investigação, objetivando o ensino da ciência. (66) Para que isso ocorra, são citados alguns elementos que devem estar presentes na estrutura desta abordagem:

• Contexto motivacional da história, tanto cultural quanto biográfico, e que consista em perguntas para serem investigadas,

• Formato narrativo com um exemplo de caso, mostrando uma explicação histórica do processo de ciência,

• A narrativa deve ser de tal forma que tenha uma pausa para o pensamento investigativo,

• Perspectivas históricas que mostrem a incerteza da ciência, ou seja, que a ciência está em construção,

• Questões que problematizam a natureza da ciência e promovem a investigação da natureza da ciência,

• Finalização da investigação e narrativa histórica,

• Reflexão das lições da natureza da ciência.

Höttecke e Riess (88) e Henke, Höttecke e Riess (89) também defendem uma abordagem para o ensino de ciências que envolve a participação do aluno e o uso da história da ciência. Para os autores é importante que a atividade seja centrada no aluno para proporcionar a observação, discussão e experimentação, promovendo o ensino e aprendizagem de ciências. Dessa forma o método utilizado por eles inclui o desenvolvimento de um modelo inspirado no ensino investigativo e uso de réplicas de experimentos históricos, de forma que os alunos elaboram seus próprios experimentos, relacionando-os com os descritos no passado. Os autores também desenvolveram estudos de casos históricos para o uso em sala de aula com atividades centradas nos alunos utilizando diferentes estratégias didáticas. Dentre elas:

• Escrita criativa na qual os estudantes escrevem cartas, diários, diálogos, comentários e representações a partir da perspectiva de um personagem fictício. A escrita criativa faz com que os alunos compreendam a ciência e os cientistas por suas próprias

perspectivas, entendimento de suas próprias ideias sobre a natureza da ciência e conceitos científicos,

• Atividades de encenação em que os estudantes exploram conflitos entre cientistas, e os motivos das controvérsias científicas além de tentar solucioná-las. Esse método humaniza os cientistas e promove um melhor entendimento sobre a natureza da ciência. Os autores ainda citam que quanto mais envolvidos os alunos estão na encenação, maior a compreensão de conceitos científicos complexos,

• Reconstrução de réplicas de aparatos e instrumentos históricos. Esse método tem como objetivo focalizar no caráter processual e na situação sobre aquele momento da história, havendo assim uma contextualização sobre o momento,

• Atividades investigativas por problemas, ações ou ideias de cientistas, nos quais os alunos buscam uma resolução de um problema explorando como os cientistas desenvolveram instrumentos e interpretaram resultados e chegaram a seus resultados.

Não obstante suas potencialidades, o uso da abordagem HI na sala de aula não é uma tarefa trivial, e os professores enfrentam várias dificuldades e obstáculos para inseri-la em sala de aula. Entre eles está o tempo necessário para estudar e compreender uma nova abordagem, o fato de que os professores precisam desenvolver novas habilidades para atuar como mediador na sala de aula, os professores têm dúvidas sobre o método e insegurança para a inovação, que pode estar relacionada com as suas atitudes e crenças sobre o ensino e novas abordagens. (45,49,73,79) Além disso, os professores também precisam aprender sobre a história da ciência e buscar novos materiais de ensino.

Enfatizamos que a atividade experimental HI elaborada possui um problema no qual os alunos procuram uma resposta e uma conclusão, mas eles não irão replicar a história para realizar isso. A HFC nesta abordagem atua como um provedor das situações investigativas em que os alunos discutem, elaboram um plano de trabalho e testam suas ideias experimentalmente. Assim, a história pode orientar os alunos na atividade histórico- investigativa ao mesmo tempo em que pode ajudar o professor a orientar os alunos (figura 1):

Figura 1 – História e Filosofia da Ciência na abordagem HI. Fonte: Elaborada pela autora.

Dessa forma, ao aliar as duas abordagens, pretendemos superar a aquisição mecânica de fórmulas, equações e expressões matemáticas que, muitas vezes, os alunos decoram e utilizam sem compreender o seu significado real, estabelecer o processo de elaboração de um conceito e apresentar a construção do conhecimento científico, contribuindo para o processo de ensino e aprendizagem do aluno.