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Protocolo 15 – Comparando preços e quantidades de um mesmo produto

3 AS TECNOLOGIAS DIGITAIS E AS POSSIBILIDADES DE ENSINO E

3.2.3 Abordagem multimodal

A multimodalidade é uma abordagem que envolve comunicação e representação, indo além da própria linguagem falada, sendo uma abordagem desenvolvida devido às grandes mudanças na sociedade com o desenvolvimento de mídias e tecnologias. Essas mudanças implicam profundas alterações em praticamente todos os segmentos da nossa sociedade, afetando a maneira como pensamos e agimos (KENSKI, 2007).

As tecnologias digitais são, sem dúvida, especialmente interessantes para a multimodalidade porque os tipos de recursos que estão disponíveis permitem diferentes combinações e exigem diferentes formas de interagir (PRICE; JEWITT, 2013).

Nesse tipo de abordagem, todas as formas de comunicação são reconhecidas, logo, não se restringe apenas à interação verbal, mas todos os tipos são considerados, tais como gestos e olhares, elementos pictóricos e imagens em movimento, sons, dentre outras representações e comunicações (ARZARELLO; ROBUTTI, 2010, LABURÚ; BARROS; SILVA, 2011). Como exemplos que ilustram como esses diversos modos podem ser empregados para representar e comunicar uma situação, têm-se as funções que podem ser representadas na forma de registro algébrico, gráfico, ou escrita em linguagem natural. Sua representação gráfica pode ainda ser feita em papel milimetrado, usando um software com características dinâmicas, descrito oralmente e com a ajuda de gestos.

As tecnologias digitais têm possibilitado a utilização de processos mais dinâmicos e interativos, do que as tecnologias analógicas tradicionais como lápis e papel, na construção tanto de gráficos de funções, como de diferentes figuras geométricas, permitindo que a linguagem multimodal esteja cada vez mais presente em sala de aula. A dinâmica de utilização de figuras interativas e outras linguagens vem, aos poucos, conectando o mundo da escola, tradicionalmente associado com a oralidade e com a escrita, para experiências mais enriquecedoras ligadas à comunicação e ao conhecimento.

Desta forma, pode-se relacionar a multimodalidade às diferentes formas de representar um raciocínio, ideia ou até mesmo à prática de representar conceitos de diferentes formas, com o objetivo de que os alunos se apropriem do significado dos conceitos, conforme forem compreendendo as diferentes formas representacionais destes (TYTLER; PRAIN; PETERSON, 2007).

Segundo Price e Jewitt (2013), na abordagem multimodal a interação deve ser considerada como parte da construção de significado, pois é realizado das escolhas feitas a partir de uma rede de alternativas, a qual pode incluir a seleção de um recurso em detrimento de outro, a posição e direcionamento de um corpo na manipulação de objetos, dentre outras possibilidades. Cabe ressaltar que significado, para Price e Jewitt (2013), é entendido como a conexão interativa entre o potencial significado de um artefato material, o potencial significado do ambiente social e cultural em que o indivíduo se encontra, e os recursos, intenções e experiências anteriores que as pessoas trazem para esse encontro ou discussão. Assim, os modos são social e culturalmente projetados em diferentes processos de construção de significado.

Price e Jewitt (2013) realizaram pesquisa com estudantes de 10-11 anos, agrupados em pares, com o objetivo de analisar as interações em um ambiente de aprendizagem, explorando uma abordagem multimodal. Essa abordagem possibilitou descrever e classificar as formas de interação, que foram além da linguagem oral ou formas específicas de ação, mas permitiram compreender e analisar o posicionamento do corpo, do olhar e a integração dos modos. As análises desta pesquisa ilustram a interação entre esses modos e o “fluxo de ação multimodal”, particularmente em termos de ritmo, ritmo e estrutura de interação, e as implicações disso para a interação e o processo de produção de significados. Prain e Waldrip (2006) acreditam que a aprendizagem pode ser possibilitada por meio da realização de atividades que envolvam multimodalidade e múltiplas representações, para isso apresentam três motivos: (i) uma representação pode complementar, confirmar ou reforçar conhecimentos anteriores (prévios); (ii) uma nova representação pode restringir ou

refinar a construção de uma interpretação; e (iii) diferentes representações ajudam na compreensão de um conceito. Há ainda um quarto motivo, levantado por Laburú, Barros e Silva (2011, p. 474):

[...] uma nova representação pode vir a se acomodar melhor, não só cognitivamente a um indivíduo, por servir-lhe de elo apropriado para compreender um conceito, em razão da existência de esquemas prévios já construídos pelo sujeito e que são próprios dele, mas por, igualmente, se conformar subjetivamente ao seu estilo de aprender.

Há, portanto, uma trajetória individual, ou seja, subjetiva, para a construção de significados, que deve ser considerada (LABURÚ; BARROS; SILVA, 2011) e que para Arzarello e Robutti (2010) pode estar relacionada com o paradigma de personificação. É preciso considerar que cada estudante tem suas próprias necessidades cognitivas, além de preferências motivacionais particulares.

Os estudantes podem possuir um estilo de aprendizagem preferido, que está relacionado com características visuais, auditivas, leitoras, cinestésicas e multimodais, ou seja, que contempla mais de um desses atributos (FLEMING, 1995). Devido às diversidades de estilos de aprendizagem, níveis de motivação e experiências vivenciadas,"[...] é altamente questionável um esquema educacional baseado num único formato representativo que somente dá conta das necessidades de um tipo particular de aluno ou grupo de alunos e exclui outros" (LABURÚ; BARROS; SILVA, 2011, p. 483).

Embora concorde-se com Laburú, Barros e Silva (2011) de que os estudantes possuam estilos de aprendizagem diferentes, é questionável, pelo menos por enquanto, o desenvolvimento de uma proposta personalizada para cada estudante em sala de aula, uma vez que a realidade escolar brasileira possui salas superlotadas e infraestrutura precária. Além disso, diferenciar e separar as contribuições da multimodalidade, das múltiplas-representações seria quase impossível, já que há muitas semelhanças entre elas. Como a proposta segue referencial teórico de Vergnaud (1990), que se baseia no conjunto de representações para o desenvolvimento de um conceito, opta-se pelas múltiplas-representações.

Considerando as três abordagens (instrumental, seres-humanos-com-mídias e multimodal) aqui apresentadas e discutidas, constata-se que os pressupostos que melhor se adéquam à proposta desenvolvida nesta tese são os da abordagem seres-humanos-com-mídias,

já que esta também engloba os pressupostos da abordagem instrumental.

Essa abordagem considera que a produção de conhecimento acontece a partir da interação entre homens e diferentes mídias, logo, a matemática produzida a partir da interação entre humanos com papel e lápis é diferente da produzida por humanos e mídias.

Diante das abordagens discutidas, tem-se que a representação e a comunicação possibilitadas pela evolução das tecnologias digitais contribuem para a produção do conhecimento, logo, para o desenvolvimento da aprendizagem. Contudo, Stahl, Koschmann e Suthers (2006) ressaltam que a comunicação humana e o uso de recursos representacionais para esta comunicação são muito flexíveis, pois, apesar de as tecnologias digitais poderem trazer possibilidades à aprendizagem, elas não têm a capacidade de especificar funções comunicativas.

Pesquisas que envolvem em seu contexto o desenvolvimento de conceitos por meio das múltiplas representações e da produção de conhecimento, requisitam um acompanhamento mais sistemático, desta forma, a seguir, apresentar-se-ão os procedimentos metodológicos da investigação.