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Abordagem sob a Perspectiva da Proteção Marcária

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CAPÍTULO I – MARCA: UM CONCEITO EM EVOLUÇÃO

1.4. Funções da Marca no âmbito do Marketing e da Proteção Marcária

1.4.2. Abordagem sob a Perspectiva da Proteção Marcária

Sob o ponto de vista da proteção marcária, os autores citam como principais funções23

da marca o exposto a seguir.

Várias são as funções desempenhadas pela marca e aqui nos preocuparemos em levantar aquelas consideradas as principais direcionadas para a contribuição de uma análise técnica da marca.

As marcas são ativos intangíveis que visam, por meio de seu uso e exploração, a obtenção de uma vantagem competitiva e consequentemente, o aumento dos resultados empresariais. A marca pode ser vendida, licenciada, transferida, utilizada como uma mercadoria. Este sinal possui uma importante função econômica manifestada através da possibilidade de se sobressair num mercado altamente competivivo, se diferenciando de seus concorrentes e atraindo o consumidor.

Ao aplicar técnicas cada vez mais sofisticadas de publicidade e distribuição, as empresas pretendem divulgar e propagar a marca entre seus consumidores gerando expectativas e atendendo suas necessidades. Além disso, a empresa deseja disponibilizar sua marca pelo maior número de áreas geográficas, permitindo seu consumo, através de um maior acesso às mercadorias.

O objetivo é estimular as vendas e incrementar o poder econômico de sua marca. “As marcas assumem valiosa função econômica, garantindo o trabalho e o esforço humano, representando fator do tráfego e tornando-se elemento de êxito e de segurança às transações” (CERQUEIRA, 1946, p. 349).

A primeira função exercida pela marca era a de indicar a origem ou procedência24 dos

produtos que assinalava, seja esta proveniência advinda do artesão, da fábrica, ou do produtor.

Em seu primitivo conceito, as marcas tinham suas funções restritas à indicação de origem ou procedência dos produtos ou artigos entregues ao comércio. Sua finalidade era indicar ao consumidor o estabelecimento em que o artigo fora fabricado ou a casa comercial que o expunha à venda (CERQUEIRA, 1946, p. 347).

Uma vez que existem no mercado diversas empresas produzindo e oferecendo produtos e serviços, a marca permite que diante de tantos concorrentes, seja possível indicar de qual empresa o produto é originário. Isto gera uma maior confiança e tranquilidade ao consumidor que reconhece qual é a empresa fornecedora.

Consequentemente, a marca passou a desempenhar a função de identificar os produtos ou serviços.

As marcas, assumem, assim, toda a sua força de expressão: marcam, efetivamente o produto, que passa a ser um produto diferente na multidão dos produtos congêneres.

23 Para diferentes autores, a marca exerce uma única função, para outros, ela possui múltiplas funções que se

complementam. Neste trabalho, não discutiremos as funções da marca sob o ponto de vista jurídico brasileiro, apenas citaremos as várias funções levantadas por diferentes autores e seus conceitos.

24 Atualmente, vem se questionando a pertinência de ser a função de indicação de origem uma função jurídica da

marca. Entretanto, como essa discussão não é matéria do nosso trabalho, apenas remetemos aos estudos de José de Oliveira Ascensão (2006) e Couto Gonçalves (1999).

A marca individualiza o produto, identifica-o, distingue-o dos outros similares, não pela sua origem, mas pelo próprio emblema ou pela denominação que a constitui. É, pois, um sinal de identificação, cuja função econômica é importantíssima (CERQUEIRA, 1946, p. 348).

Para o mesmo autor, a função identificadora da marca é muito mais importante que sua função distintiva. O que ele menciona é que “antigamente a marca distinguia os produtos, indicando-lhes a origem. Hoje distingue-os, identificando-os, dando-lhes individualidade própria”. (CERQUEIRA, 1946, p. 348-349)

Outra importante função da marca, principalmente em relação ao tema abordado neste estudo que são as marcas de AR, diz respeito à função publicitária. Esta visa utilizar várias ferramentas de marketing para comunicar a marca de forma eficiente e diferenciada para seu consumidor ou potencial consumidor. A publicidade visa transmitir ideias, divulgar a marca, o produto, suas qualidades ao público, através de diferentes meios de comunicação. O objetivo é criar um elo entre a marca, o produto, seus atributos, o simbolismo do sinal e o consumidor.

A atribuição à marca da função de sinal distintivo do produto ou serviço em si mesmo, sem qualquer nexo com a sua fonte produtiva, conduz a que a função distintiva desenvolvida pelo sinal se refira às características intrínsecas do produto ou serviço, isto é, à qualidade, o que é inadmissível por não haver tutela jurídica desta25. A autora defende a função distintiva da marca como indicadora de origem

ou procedência, mas não como única função marcária, incluindo também em relação às marcas de prestígio26, a função publicitária (CARVALHO, 2003, p.210- 211). A autora não concorda com a doutrina que trata a função da marca apenas como função distintiva, onde o sinal é distinto em si mesmo, atrelado a aspectos do produto como a qualidade, sem associá-la a uma origem ou procedência.

“A função publicitária autônoma surge na senda da teoria econômica da diferenciação dos produtos” 27(CARVALHO, 2003, p. 217). Esta teoria econômica é destacada por Arean

Lalin (apud CARVALHO 2003, p. 217):

No atual mercado de concorrência imperfeita existe um elevado número de produtos e serviços que, objetivamente, são capazes de proporcionar idênticas satisfações aos seus compradores ou usuários. Por tal motivo, as empresas tratam de diferenciar as suas mercadorias através de fatores intangíveis que gerem e perpetuem uma determinada procura. Como acertadamente destaca SCHERER, um dos métodos de diferenciação de produtos é constituído pela imagem subjetiva que destes se projeta na mente dos consumidores. Para estimular as vendas, facilita-se ao produto uma imagem característica, uma personalidade própria que, frequentemente, não corresponde às qualidades objetivas do mesmo. Acrescenta-se um valor adicional ((...) o exótico, o prestígio, o conforto...) que o consumidor adquire com a compra e que lhe permite identificar-se com o grupo social desejado. Pois bem, esta imagem subjetiva ou realidade psicológica confecciona-se e realça-se – nas palavras de SCHERER – por meio de marcas e etiquetas, da publicidade, da promoção pessoal de vendas e do desenho estético da embalagem. (...) em circunstâncias normais, a marca possui, por si mesma, <<Sales appeal>>, ou <<selling power>>; erige-se em instrumento <<coletor de clientela>>; exerce uma <<vis attractiva>> sobre os consumidores que pode ser independente tanto da qualidade dos produtos ou serviços diferenciados, como da reputação da empresa titular.

25 Tutela jurídica em Portugal.

26 Marcas de prestígio são equivalentes à marca de AR no caso brasileiro.

27 Para a autora a função publicitária pode ocorrer como consequência de outras funções da marca ou pode surgir

Assim, a publicidade proporciona à marca uma personalidade, um conjunto de atributos, identificados pelo consumidor que passa a consumi-la. A criação publicitária é uma criação de imagens e conceitos ao redor da marca para que o consumidor se identifique com ela e possa adquiri-la, aumentando as vendas, atingindo o objetivo econômico da empresa. Entretanto, como citado acima, a própria marca poderia ser uma forma de propaganda ao estar fixada ao produto. Porém, ao estar assinalando o produto, ela apenas o diferencia dos demais e indica sua origem, atesta ou não sua qualidade, já que o aspecto simbólico e atributivo construído na mente dos consumidores é desenvolvido pela atividade publicitária.

Para Demaret (apud SILVA, 1998, p. 16), a utilização de uma marca constitui em si mesma uma publicidade, porquanto ela chama a atenção do público para um produto. A marca recordará o produto aos consumidores e constituirá uma recomendação para aqueles que tenham ficado satisfeitos. No entanto, este efeito de publicidade é uma consequência da função da indicação de proveniência.

Carvalho (2003) reconhece que, em Portugal, existem algumas disposições legais que representam abordagens sobre a função publicitária da marca, principalmente, a tutela ultramerceológica28 conferida à marca de prestígio. Silva (1998 apud CARVALHO, 2003,

p.221) destaca “o que há a salvaguardar, neste âmbito [da proteção ultramercadológica], não é tanto a indicação de proveniência – pois pode mesmo não existir qualquer risco de confusão entre os produtos – mas sim, e primordialmente, o valor comercial da marca, ou o seu poder de atrair o público, mercê do prestígio que gozam os produtos em questão”.

Segundo Carvalho (2003, p.226), a tutela jurídica autônoma da função publicitária da marca existirá nos casos da marca de prestígio. Já as marcas ordinárias, juridicamente, desempenham a função que lhes é reconhecida que é a de indicação de origem29.

Desta forma, seguindo o entendimento dos autores, a função publicitária estaria relacionada às marcas de AR. Uma vez que estas possuem uma boa reputação perante o mercado e um alto reconhecimento por parte do público, fruto de um intenso trabalho de marketing, o que se preza nestas marcas é o valor que elas adquiriram devido ao seu prestígio.

Um importante fator a se abordar está relacionado ao novo papel desempenhado pela marca que diz respeito ao aspecto da comunicação.

Hoje, a economia é global não apenas ao nível geográfico, mas também ao nível merceológico. E a marca desempenha aqui um importante e renovado papel: a marca permite superar a barreira da incompreensão linguística, permitindo chegar a todos os mercados a mesma mensagem e os mesmos valores. Daí que se tenha já afirmado que “a marca moderna não pertence mais ao universo do comércio, mas ao da comunicação”30 (CARVALHO, 2003, p. 204).

Realmente a marca não transmite suas características e sua mensagem apenas aonde sua titular está sediada. O desenvolvimento das comunicações e da distribuição permite que a marca e seu produto estejam globalmente localizados e comunicados. Assim, o que a marca pretende transmitir e a quem ela deseja atingir pode ser encontrado em qualquer lugar e da mesma forma.

28 Ultramerceológica diz respeito à proteção em todas as classes (exceção ao princípio da especialidade). 29 Segundo Carvalho (2003), nos EUA a função publicitária da marca é reconhecida juridicamente. Neste país, a

função publicitária está profundamente ligada à chamada função condensadora de goodwill.

Outra função abordada por alguns autores diz respeito à função de garantia de qualidade que, segundo Tavares (2007), está intrinsecamente relacionada à função de indicação de origem.

(...) os consumidores, certificando-se da procedência do produto, terão uma garantia de sua qualidade. De fato, se já adquiriu produto de determinada procedência e ficou satisfeito, irá procurar produto similar que tenha a mesma origem, sendo, assim, esperada a mesma qualidade (TAVARES, 2007, p.228).

“A função de garantia de qualidade dos produtos ou serviços marcados [se] beneficia de alguma tutela jurídica, derivada da proteção legal conferida à função de indicação de origem da marca” (CARVALHO, 2003, p. 231). Desta forma, a autora entende que não há elementos na lei portuguesa, que possibilitem a constatação de que a marca possui uma função de qualidade que apresente uma tutela jurídica autonôma31,32.

Ao utilizar a marca como uma função de garantia de qualidade, a dificuldade de se obter da empresa que a mesma disponibilize um nível de qualidade constante, é algo de difícil concretização e averiguação. A empresa é quem se preocupa em oferecer ou não bens com qualidade.

Alguns produtos possuem maior ou menor grau de qualidade e os consumidores decidem consumi-los ou não, baseados em dados fornecidos pelo produto, como preço, apresentação, identificação com o produto, status. É interesse do empresário que seus produtos possuam qualidade, uma vez que a presença de tantas mercadorias similares funcionalmente no mercado faz com que um dos diferenciais seja este atributo.

Mas, apenas a marca não é capaz de garantir essa qualidade, que é demonstrada pela empresa e percebida pelo consumidor. O que não deve ocorrer, até pelo princípio da veracidade, é que a empresa utilize uma marca que induza o consumidor ao erro em relação à qualidade do mesmo.

Para Cerqueira (1946, p. 349), “a marca desempenha ainda [uma outra] função, de natureza indireta, em relação ao consumidor, constituindo para este a garantia da legitimidade e da origem do artigo que adquire”.

A proteção das marcas visa assegurar os interesses do titular do sinal e somente sob um aspecto indireto visa proteger o consumidor. “A lei é feita no interesse do fabricante e que, se ela protege o consumidor, não é senão indiretamente, porque protege, primeiro o fabricante” (POUILLET33 apud CERQUEIRA, 1946, p. 350).

Assim, por exemplo, quando a nossa lei se refere à possibilidade de erro ou confusão por parte do consumidor, como critério para a apreciação das imitações, não tem ela em vista, senão secundariamente, o prejuízo que dessa confusão possa advir para o

31 “A doutrina e a jurisprudência majoritárias norte-americanas defendem a existência de uma função de garantia

de qualidade autônoma juridicamente reconhecida” (CARVALHO, 2003, p. 227).

32 Carvalho (2003, p.228) cita o autor Coutinho de Abreu que entende que a função de garantia de qualidade está

tutelada juridicamente. Ele baseia seu entendimento na norma do CPI português quando o art. 269 n.2 al. b diz que “deve ainda ser declarada a caducidade do registro se, após a data em que o mesmo foi efetuado se a marca se torna susceptível de induzir o público em erro, nomeadamente acerca da (...) qualidade (...) desses produtos ou serviços (...)”. Desta forma o autor entende que “esta norma proíbe diminuições de qualidade suscetíveis de induzir o público em erro (...) e daqui resulta que a função de garantia de qualidade está tutelada juridicamente”.

comprador, sendo seu fim evitar prejuízo do titular da marca resultante dos erros em que os consumidores podem ser induzidos pela semelhança das marcas (CERQUEIRA, 1946, p. 350).

Atualmente a marca possui várias funções, cada qual com um grau de relevância para seu titular e para o consumidor. Entretanto, a principal função ainda hoje da marca é a de distinguir, diferenciar, ou seja, individualizar o produto em relação a tantas outras marcas comoditizadas encontradas no mercado. 34

Este primeiro capítulo se propôs a mostrar as definições de marca, suas funções, o significado semiológico do termo e o entendimento da marca como um ativo intangível importante para a organização e consumidores.

Atualmente consideradas um valioso ativo e grande fonte de vantagem competitiva, as marcas ganharam destaque nas organizações. Uma marca forte é sinônimo de ganho para as empresas. A gestão e a administração das marcas tornaram-se fundamentais nos últimos anos e as empresas têm se esforçado para gerir da melhor forma este bem.

1.5. A MARCA COMO PROTAGONISTA DO MARKETING

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