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ABORDAGENS TEÓRICAS SOBRE A ESCRITA

A interação social é a linha de pensamento iniciada por Vygotsky e é também utilizada pelos enfoques sócio-histórico-culturais. O autor não acredita no modo de aprendizagem uni-lateral, ele defende a importância do aprendizado da criança ser mediado por um adulto, a princípio na família, destacando o acompanhamento dos pais, e posteriormente na escola sob a supervisão do professor. Eis o pensamento de Vygotsky sobre a aprendizagem e que García (1998) comenta:

A aprendizagem supõe um autêntico diálogo, uma autêntica comunicação aprendiz-mestre, em igualdade e respeito, em processos de mediação instrumental e semiótica, atuando o professor, na zona de desenvolvimento proximal de forma dinâmica, em microcosmos ou formatos agradáveis e motivantes em que se repetem as tarefas e se possibilita a aprendizagem. ( VYGOTSKY apud GARCÍA, 1998, p. 40)

A aprendizagem da escrita, não diferente das demais fontes de saberes, ou uma das prin-cipais, necessita dessa interação social enfatizada por Vygotsky, desse processo de mediação entre o adulto e a criança. Tal pensamento também é similar ao defendido por John Dewey, que García (1998) aborda:

O professor ou educador ou o adulto seria o “formatador” da aprendizagem da crian-ça através de processos de mediação instrumental e, sobretudo, semiótica e, ao mes-mo tempo, seria o agente catalizados, liberador do aprendiz ( na terminologia já clássica de John Dewey). ( JOHN DEWEY apud GARCÍA, 1998, p. 40)

A princípio a escrita era utilizada somente para o registro de informações importantes e era privilégio de uma elite seleta, na atualidade é pré-requisito básico para formação do ser.

Através da escrita o sujeito tem contato com as fontes de saberes. Porém algumas crianças têm dificuldade de aprendizagem na escrita, enfrentando defasagem no seu processo escolar.

Depois de conhecer um pouco do processo histórico da escrita pode-se entender a ênfase de Vygotsky (1998, p. 140), quando diz: “O domínio da escrita é o ápice para a criança, mas não deve ser alcançado de forma unilateral, mecânica e externa.”

Ainda sobre a aprendizagem da escrita e seguindo a mesma linha de pensamento de Vy-gotsky, Teberosky (1991), salienta que as investigações recentes demonstram que a aprendi-zagem da escrita não é uma tarefa fácil para a criança, já que requer um processo complexo de construção, em que suas idéias nem sempre coincidem com a dos adultos. Enfatiza que para ler bem é preciso escrever bem, mas para este fim ser alcançado requer exercício constante, estímulo e que é imprescindível dar sentido ao que está sendo proposto. E ressalta que a sala de aula é o lugar de troca, onde o professor ensina e é ensinado.

Vygotsky (1989) afirma que o auxílio prestado à criança em suas atividades de aprendi-zagem é válido, pois aquilo que a criança faz hoje com o auxílio de um adulto ou de outra cri-ança maior, amanhã estará realizando sozinha. O autor (op.cit.) observou ainda, que a cricri-ança pode imitar ações que vão além das suas capacidades reais ou efetivas e sendo assim cria zo-nas de desenvolvimento proximal. Desta forma, o autor enfatiza o valor da interação e das re-lações sociais no processo de aprendizagem.

Mesmo quando a escrita da criança parecer apenas, rabiscos elas devem escrever. Ao imitar os adultos, segurando o lápis, elas reproduzem um “comportamento escritor”.

(CAVALCANTE, e BERNARDINO 2008).

Para aprender a escrever é fundamental que a criança tenha muita oportunidade de exe-cutar, mesmo antes de saber grafar as palavras, pois o fato de não estar dominando a escrita permite que a criança compare idéias sobre a escrita, pense em como organizá-la, o que irá representar a sua utilidade, mesmo sem saber a escrita convencional. Sendo assim a criança constrói seus sistemas interpretativos, para construir seus conhecimentos.

Vygotsky (1998) diz que:

[...] apesar da existência na pedagogia prática, de muitos métodos de ensinar a ler e escrever, ainda tem-se que desenvolver procedimento científico efetivo para o ensino da linguagem escrita às crianças. Diferentemente do ensino da linguagem falada, no qual a criança pode se desenvolver por si mesma, o ensino da linguagem escrita de-pende de um treinamento artificial, que requer atenção e esforços enormes, por parte do professor e do aluno, podendo-se, dessa forma, tornar fechado em si mesmo, re-legando a linguagem escrita viva a segundo plano. Ao invés de fundamentar nas ne-cessidades naturalmente desenvolvidas das crianças, e na sua própria atividade, a es-crita lhes é imposta de fora, vindo das mãos de professores. (VYGOTSKY 1998, p.

139)

As abordagens teóricas de Vygotsky (1998) além de contribuir no campo educacional enfatiza a discussão sobre o aprendizado da escrita ( analisada como um sistema de signos so-cialmente construídos), onde entende o processo de apropriação da escrita como processo cul-tural, de caráter histórico, envolvendo práticas interativas. Este sistema de signos foi produzi-do pelo homem para suprir às suas necessidades socioculturais concretas.

A partir da compreensão sobre a escrita, Vygotsky (1998), defende duas linhas distintas de desenvolvimento: uma natural e outra cultural. Tratando-se da natural, o autor enfatiza que os mecanismos são biológicos e na cultural, que os mecanismos de mudanças são fornecidos por instruções.

Sendo assim o desenvolvimento natural da escrita deriva naturalmente do gesto, da imi-tação e do jogo. Neste sentido a criança descobre naturalmente que a escrita representa dire-tamente as coisas, antes de entender que representa as palavras. De acordo ainda com o pen-samento do autor, o desenvolvimento cultural começa com a instrução do adulto, fundamen-talmente na escola.

Entendida como produto cultural o uso e função da escrita vão além da sala de aula, sendo assim atuam em todos os contextos inerentes a uma sociedade letrada.

Até agora, a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural da criança. En-sina-se as crianças a desenhar letras e a construir palavras com elas, mas não se ensi-na a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal forma a mecânica de ler o que está escrito que acaba-se obscurecendo a linguagem como tal. (VYGOTSKY 1998, p. 139).

Analisando os aspectos e funções da linguagem escrita, Zorzi (2003) acrescenta:

Ler e escrever, portanto, são conhecimentos que não podem ser reduzidos a alguns dos seus aspectos como dominar letras, decodificá-las traçá-las etc. Seu aprendizado implica também conhecer as várias funções que a linguagem escrita pode ter em ter-mos sociais, as muitas e variadas formas como pode ser usada. Isso também quer di-zer que, como elemento que contém significados, a escrita pode ser interpretada de muitas formas ou em diferentes graus. (ZORZI, 2003 p.12)

Nessa perspectiva o pensamento vygotskyano entende que a criança já chega à escola com conhecimentos previamente adquiridos e construídos no seu ambiente social, dessa forma corrobora com as idéias de letramento, segundo as quais, na aprendizagem escrita, a criança não parte do zero. Entende-se que num processo sócio-interativo, a criança se apropria da lín-gua escrita em conseqüência da influencia do mundo letrado.

Assim como Vygotsky (1998) Emília Ferreiro (1991) salienta que a criança começa a ter contato com a escrita, no ambiente familiar e amplia este processo na escola, todavia o aper-feiçoamento e desenvolvimento da lecto-escrita continuam por todo o processo de construção do conhecimento. A autora (op.cit.) enfatiza que a lecto-escrita se constitui num dos objetivos da instrução básica, e sua aprendizagem, condição de sucesso ou fracasso escolar.

Há crianças que chegam à escola sabendo que a escrita serve para escrever coisas in-teligentes, divertidas ou importantes. Essas são as que terminam de alfabetizar-se na escola, mas começaram a alfabetizar muito antes, através da possibilidade de entrar em contato, de interagir com a língua escrita. Há outras crianças que necessitam da escola para apropriar-se da escrita. (FERREIRO 1999, p.23)

Uma criança de 2 anos e meio a 3 anos com lápis e papel na mão já começa a tentar es-crever, registros diferentes de desenhos, através das primeiras garatujas. Estas tentativas divi-dem-se em dois tipos: traços ondulados contínuos, ou seja, como uma série de emes em cursi-va; e/ou uma série de pequenos círculos ou de linhas verticais; porém nesta etapa a criança só está imitando ainda não há interpretação da sua escrita (FERREIRO 1991).

Neste sentido Ferreiro, (1992) diz:

[...] eu digo escrita entendendo que não falo somente de produção de marcas gráficas por parte das crianças; também falo de interpretação dessas marcas gráficas. [...] al-go que também supõe conhecimento acerca deste objeto tão complexo – a língua es-crita –, que se apresenta em uma multiplicidade de usos sociais. (FERREIRO 1992, p.79)

Ao começar a interpretar a escrita a criança representa seu próprio nome através dos de-senhos, todavia caso use a escrita de imprensa (grafias separadas) ou similares, em todas elas estará representando seu próprio nome.

E Moura (1999) complementa:

Desde que nascem esses sujeitos são construtores de conhecimento.

No esforço de compreender o mundo que os rodeia, levantam problemas muito difí-ceis e abstratos e tratam por si próprios, de descobrir respostas para eles. Estão cons-truindo objetos complexos de conhecimento, e o sistema de escrita é um deles.

(MOURA 1999, p. 111)

Desde os tempos primitivos o homem escreve para registrar fatos e momentos importan-tes, comunicar-se, controlar e influenciar a conduta do outro, para criar e recriar, para registrar idéias através de textos. Como a escrita é mais permanente que a fala seus problemas são mais evidentes, constituindo-se em dificuldade de aprendizagem da escrita ou disgrafia, foco deste estudo.

Partindo da complexidade da tarefa da escrita, algumas crianças não conseguem produ-zir uma escrita aceitável. Estas crianças apresentam dificuldade de aprendizagem na escrita ou disgrafia, que de acordo com García (1998) poderia ser conceitualizada nos seguintes termos:

[...] trata-se de casos que, sem nenhuma razão aparente, manifestam-se dificuldades na aprendizagem da escrita no contexto de uma inteligência normal, bom ambiente familiar e sócio-econômico, escolarização correta, normalização na percepção e na motricidade, e suspeita-se que o déficit esteja em alguma disfunção na área da lin-guagem. [...] ensinar a escrever é fazê-lo dentro de um modelo completo, tratando-se de pessoas normais ou tratando-se de pessoas com dificuldades de aprendizagem da escrita. (GARCÍA (1998, p.198, 207)

Os autores que foram vistos são unânimes em afirmar a complexidade da escrita e que para a criança não é fácil aprender e interpretar a linguagem escrita, esta tarefa se torna mais complicado ainda, quando esta criança é portadora de dificuldade de aprendizagem da escrita.

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