2. BASE TEÓRICO-EMPÍRICA
2.1 INTERNACIONALIZACÃO
2.1.2 Acessando a internacionalização organizacional
Considera-se neste estudo que a internacionalização, pelo menos nos primeiros estágios de crescimento e desenvolvimento de uma empresa, “deveria ser vista de uma forma integral” (JONES, 1999, p. 21). Entende-se que a internacionalização constitui processo estratégico que, de forma geral, envolve todos os aspectos das atividades de negócio de uma organização, e “a forma tomada pela internacionalização refletirá crescimento interno e processo de desenvolvimento”
(JONES, 1999, p. 21), considerando que cada vez mais as organizações, mesmo pequenas e médias, operam em mercados globais.
Sob tal consideração, independentemente de ser adotada uma perspectiva teórica econômica ou comportamental de internacionalização, argumenta-se que a internacionalização organizacional pode ser examinada a partir da identificação das ligações externas ou cross-border links realizados ao longo do tempo por uma organização, desde a sua fundação. Entende-se que as ligações externas podem ser consideradas como pontos de partida e visualização da internacionalização em ambas as abordagens teóricas, tanto econômicas quanto comportamentais. Neste sentido é importante notar que, tal como observa JONES (1999), os pressupostos teóricos de ambas as escolas tendem a prescrever a internacionalização via processo de ações ou atividades que se vai das operações que envolvem baixo risco, custo e comprometimento, até altos graus de comprometimento, risco e custo.
Em relação as ligações externas enquanto forma de acesso a internacionalização, JONES (1999) defende que as estas são fundamentais para o entendimento da formação de redes, ao mesmo tempo que a visão baseada em recursos sugere que tais links ou acesso a recursos externos constituem fatores cruciais no desenvolvimento organizacional. Nesta direção a idéia que se propõe é identificar os tipos de ligações externas formadas pelas empresas em estudo desde a sua fundação como forma de acessar a internacionalização e perceber as estratégias utilizadas neste
processo.
A identificação das ligações externas ou cross-border links formados pela organização, desde sua fundação, possibilitam a verificação de pelo menos quatro dimensões relacionados à estratégia de internacionalização:
a) direção da internacionalização (entrada/saída);
b) modo de entrada/acesso ao mercado internacional;
c) atividades internacionais predominantes;
d) aspectos relativos ao período de tempo em que se desenvolveu a internacionalização.
A primeira dimensão relativa a internacionalização diz respeito a direção do processo, tal como apontou-se anteriormente esta pode ser tanto de entrada quanto de saída. Na direção de entrada a internacionalização se dá de fora para dentro e envolve ligações como por exemplo a importação e, na direção de saída, a internacionalização acontece de dentro para fora, como é o caso das exportações.
A segunda dimensão acessada pela identificação das ligações externas da organização diz respeito ao modo de entrada utilizado pela organização para acessar o mercado internacional. Segundo ROOT (1994), três categorias podem ser utilizadas neste sentido: i) exportação; ii) contrato; e iii) investimento.
A entrada em mercado internacional via exportação caracteriza-se pelo fato de o produto final ou intermediário da empresa ser manufaturado fora do país alvo e subseqüentemente ser transferido para ele. Para ROOT (1994) a exportação restringe-se basicamente a produtos físicos, e restringe-se dá primordialmente sob duas formas: indireta e direta. Na exportação indireta, utiliza-se um intermediário localizado no próprio país da empresa e que efetivamente realiza a exportação. Já a exportação direta não utiliza um intermediário no país de origem, muito embora possam ser utilizados intermediários no país alvo ou de destino.
A segunda categoria de modo de entrada ou acesso a mercados internacionais apontada por ROOT (1994) compreendem os contratos. Segundo o
autor, estes caracterizam-se primordialmente por constituírem veículos para transferência de tecnologia e habilidades, ainda que normalmente criem oportunidades de exportação. Sobretudo constituem associações ou acordos contratuais entre duas companhias, sendo uma estrangeira, e que envolvem a transferência de tecnologia ou habilidades humanas de uma para outra.
A terceira categoria de entrada em mercado estrangeiro é denominada por ROOT (1994) de investimento, e envolve a propriedade de uma subsidiária no país alvo. Ressalta-se que tais subsidiárias podem variar desde simples escritórios comerciais, armazéns de distribuição, até unidades completas de produção e manufatura. Em termos de propriedade e controle gerencial, ROOT (1994) sugere que as subsidiárias internacionais poderiam ser classificadas como: sole ventures, em que toda a propriedade e investimento é da empresa matriz, ou ainda joint ventures, em que o controle e a propriedade são compartilhados entre a empresa matriz e uma ou mais empresas, normalmente estrangeiras. No Quadro 2 são apresentadas as três categorias de modos de entrada em mercados internacionais e respectivas caracterizações.
Embora os modos de entrada em mercados internacionais, tal como os caracterizados pela tipologia de ROOT (1994), privilegiem a direção de saída ou outward, entende-se, a partir das considerações que envolvem a noção de ligações externas ou cross-border links, que estas podem dar-se em ambos os sentidos, ou seja, em relação a um país específico podem ser tanto de entrada quanto de saída. Neste raciocínio, na entrada, ao invés da exportação, tem-se a importação. Ressalta-se que, teoricamente, se aplicaria somente a classificação importação direta, uma vez que a importação indireta, por utilizar um intermediário localizado no próprio país da empresa, não atenderia ao primeiro requisito dos negócios internacionais, ou seja, envolver atores sociais de países diferentes. Logo, embora a importação indireta envolva a comercialização de bens ou serviços estrangeiros, caracteriza-se como compra no mercado interno.
QUADRO 2 - MODOS DE ENTRADA EM MERCADOS INTERNACIONAIS
− contrato de serviço
− contrato de gestão
− contrato de construção
− contrato de manufatura
− countertrade
− outro Investimento
− sole venture: novo estabelecimento
− sole venture: aquisição
− joint venture: novo estabelecimento/aquisição
− outro
FONTE: ROOT (1994, p. 26)
Na categoria dos contratos, entende-se que da mesma forma que nas operações de saída, estes constituem, no sentido inward, meios para a entrada de tecnologia e habilidades via empresas nacionais. Já nos investimentos realizados na direção de entrada, visualiza-se a empresa nacional participando e fomentado joint ventures no território nacional (Brasil). Vale ressaltar que não se aplica, no caso dos investimentos, a classificação sole venture como nas operações de saída, uma vez que, como na importação indireta, não seria atendida a primeira característica que envolvem os negócios internacionais.
A terceira dimensão da internacionalização acessada pelas ligações externas diz respeito a possibilidade de identificar as atividades predominantes realizadas no processo de internacionalização das organizações. Esta possibilidade justifica-se ante o fato de duas ou mais ligações externas se referirem à um único conjunto de atividades internacionais. É o caso por exemplo da participação de feiras no exterior com stand, o envio de vendedores ao exterior e a divulgação de produtos em televisão, radio, revista ou outra mídia no exterior. Ou seja, embora ligações externas distintas, ambas
referem-se a atividades promocionais no exterior.
Em face das possibilidades de agrupar as ligações externas por tipos de atividades internacionais, as seguintes categorias são elencadas1:
f) atividades exploratórias;
g) atividades comerciais indiretas;
h) atividades comerciais diretas;
i) atividades promocionais no Brasil;
j) atividades promocionais no Exterior;
k) atividades contratuais;
l) atividades relativas a treinamento;
m) atividades relativas a investimento.
A quarta dimensão relativa ao processo de internacionalização direciona-se ao período de tempo envolvido neste processo. Esta dimensão é acessada a partir da data ou ano em que as ligações externas foram realizadas pela primeira vez. De posse destas informações, relativamente ao ano em que a organização foi fundada, é possível se ter a noção geral do período em que a internacionalização se desenvolveu, bem como épocas ou períodos em que esta foi mais intensiva e também os intervalos de tempo entre a realização das ligações externas. Os aspectos relativos a manipulação das informações relativas a data de realização das ligações externas são apresentados na Seção 3.2.5 do Capítulo três.
A partir das considerações anteriores, apresenta-se no Quadro 3 uma série de ligações externas, certamente não exaustivas, mas que, de forma geral, exprimem um amplo leque de possíveis ligações externas para uma organização industrial. O quadro apontado é ilustrativo e construído segundo as dimensões da internacionalização discutidas anteriormente.
1 As categorias de atividades elencadas foram elaboradas a partir da revisão bibliográfica efetuada.
Após considerar a internacionalização, suas características, abordagens teóricas e forma de acesso, a segunda seção deste quadro teórico-empírico discute o constructo estratégia organizacional e, neste sentido, procura relacionar suas principais noções e perspectivas teóricas à internacionalização.
QUADRO 3 – EXEMPLOS DE LIGAÇÕES EXTERNAS OU CROSS-BORDER LINKS Ligações externas/cross-border links de entrada (inward)
- Importação de maquinário/equipamentos - Importação de matéria-prima
- Contratação de manufatura de produto no exterior para posterior venda no Brasil - Contratação de serviços técnicos a serem prestados por empresa estrangeira no Brasil - Realização de joint-venture para criação/aquisição de unidade fabril no Brasil.
- Importação de produtos para comercialização/distribuição no Brasil
- Estabelecimento de contrato para representação de empresa estrangeira no Brasil
- Contratação de empresa estrangeira para prestação de serviços/consultoria em marketing/gestão no Brasil - Aquisição de tecnologia via contrato de licenciamento de tecnologia de empresa no exterior
- Pesquisa e desenvolvimento realizados sob contrato no Brasil por empresa estrangeira - Contratação de funcionário no exterior para trabalhar no Brasil
- Contratação de treinamento de recursos humanos desenvolvido sob contrato no Brasil por empresa estrangeira ou instrutor
- Efetuação de empréstimos no exterior
- Recepção de investimentos financeiros efetuados por empresas ou investidores estrangeiros Ligações externas/cross-border links de saída (outward)
- Produção contratada por empresa no exterior
- Prestação de serviços técnicos para empresa no exterior
- Investimento direto via sole venture para criação/aquisição de unidade de produção no exterior - Investimento direto via joint venture para criação/aquisição de unidade de produção no exterior - Exportação via trading-company
- Exportação via consórcio de exportação - Exportação direta
- Estabelecimento de agentes/representantes de venda no exterior - Contratação de empresa de distribuição/logística no exterior - Envio de vendedores brasileiros para o exterior
- Participação em feiras com stand no exterior - Participação em feiras no exterior sem stand
- Promoção de produtos em televisão/radio/revista no exterior - Participação em licitações internacionais
- Prestação de consultoria de marketing/gestão no exterior - Estabelecimento de franquias no exterior
- IDE via sole venture para criação/aquisição de escritório de vendas ou armazém de distribuição no exterior - IDE via joint venture para criação/aquisição de escritório de vendas ou armazém de distribuição no exterior - Licenciamento de tecnologia para empresa no exterior
- Desenvolvimento de P&D para empresa no exterior
- Envio de funcionários para treinamento técnico/profissional no exterior
- Envio de funcionários para trabalhar em subsidiárias de vendas/produção da empresa no exterior - Envio de capital para bancos no exterior como investimento
- Investimentos financeiros diversos no exterior