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Actualidade, Políticas de Educação e Educação para a Cidadania

A decisão política que dá acesso generalizado das populações escolares data de 1974, segundo Sanches (2003), com a revolução de Abril. Fundamenta-se no princípio da igualdade de oportunidades, visto como condição prévia mas essencial ao acesso a uma cidadania de pleno direito. Assistiu-se assim a um fenómeno, o da massificação do ensino que desencadeou inúmeros problemas ao nível da formação de professores, da organização das escolas, da própria concepção e desenvolvimento curricular. Segundo a autora, a política educativa em Portugal decretou a educação para a cidadania, “ao mesmo tempo que aplaude a urgência da inclusão social (dentro da escola) e da educação intercultural. Com efeito, a análise das estatísticas das últimas décadas mostra que a população escolar se está a tornar cada vez mais multiétnica” (pp: 486-487). Castilho (2003) refere que “a

44 globalização da sociedade impõe que a escola confira a capacidade de pensar universalmente e agir localmente preservando a diversidade das nações” (139). Cabanas (2003) considera que esta questão da desigualdade facilmente se remete e espelha em território educativo e que as políticas educativas vêem a educação como um instrumento de socialização e de promoção social e pessoal dos indivíduos” (p. 46).

De modo a efectivar o conceito de cidadania no espaço escolar, as escolas são e devem ser vistas como um espaço de transmissão de valores, de coesão social, emissão de conceitos como justiça social, tolerância, igualdade, direitos e deveres e é aqui que a nosso ver se encaixa a educação para a cidadania. Importa saber se as escolas detentoras desta realidade multicultural, nos seus projectos educativos de escola contemplam esta problemática, cada vez mais crescente, assim como modos de a operacionalizar, estratégias de actuação no sentido de atenuar o insucesso escolar, o absentismo e abandono precoce da escola e/ou solicitam aos centros de formação aos quais pertencem formação contínua de professores nesta temática, que inserimos na educação intercultural e/ou para a cidadania.

As conclusões e sugestões contidas no Relatório da Comissão Europeia, em 2001, (citado por Sanches, 2003, p.488) referenciam “a qualidade e eficácia do sistemas educativos”, no que respeita ao processo de ensino-aprendizagem; e apelam para a formação inicial e contínua dos professores frisando que é finalidade dos sistemas educativos “incentivar as pessoas provenientes de minorias a aprender, afim de poderem desempenhar um papel activo na sociedade” (p. 4), de se promover a sua participação, de se desenvolver o seu sentido crítico e de oportunidade. Neste sentido, Cardona (2007) refere que “ o cidadão não só usufrui de direitos como assume, perante a sociedade, determinados deveres” (p.22). Há que existir uma consciencialização prévia dos deveres e direitos de quem vive em sociedade, o seu exercício “pressupõe a aquisição de competências específicas” (…) são estas que “permitem ao indivíduo tornar-se cidadão” (Cardona, 2007, p.22). As competências de cidadania emergem das suas demais dimensões, a mencionar: a política, a social e a civil, e ainda “uma dimensão relativamente autónoma, a comunidade” (B. S. Santos, 2002, p.272).

Cardona (2007) ressalva que a cidadania de hoje, “depara-se com a emancipação das minorias”, com o despoletar da transnacionalização e é resultante da globalização. As transformações da sociedade emergentes da globalização reflectem-se e trabalham-se na

45 instituição educativa, onde a concepção de cidadania (e/ou de cidadanias) atingem o seu sentido mais profundo face à heterogeneidade cultural, resultante da crescente multiculturalidade na sociedade, que se manifesta nos mais diversos domínios. Num contexto cada vez mais multicultural, torna-se urgente “ uma educação para a cidadania responsável e eficaz” (Cardona, 2005, p. 31), que facilite o processo de (re)construção de identidade cultural e o refundamento da própria cidadania, com uma maior abertura para outras culturas e respeito pela diferença.

Entenda-se por (re)construção de identidade cultural o facto de, tal como o ser humano está em permanente evolução, pois adapta-se às transformações que vão ocorrendo, a própria “identidade” acaba por ser “um processo em constante transformação”, segundo Castells (2003) qualquer identidade pode ser construída. O indivíduo a partir do momento em que se insere numa sociedade acaba por se submeter a “configurações hermenêuticas” sucessivas (B. S. Santos, 2002, p.119), resultantes das transformações actuais com que a sociedade se confronta. Neste sentido, Popkewitz (2007) refere que “as práticas culturais são continuamente moldadas e actualizadas”, são o resultado dos discursos de poder, “a comunidade multicultural é formada pelos discursos liberais universais dos direitos do homem” (p. 127). É a escola que concentra estas práticas culturais, sociais, políticos e cívicos.

Reforça Castilho (2003) que “a qualidade das escolas (…) é vital para os países e para as comunidades económicas a que pertencem (…)” (p. 138). A escola, em qualquer estado democrático, tem a obrigação e responsabilidade social de emanar e reforçar o princípio da igualdade e equidade, reforçando o conceito de identidade nacional e de identidade cultural de cada um. A este respeito Mendo Henriques (1996) diz-nos que a cidadania assenta num “princípio humanista de justiça” em que a escola tem um papel fundamental, que passa pelo estímulo, equilibro e operacionalização de práticas de cidadania.

Referencia Cabanas (2003) que “a desigualdade de oportunidades, num contexto integralista da sociedade, é mais preocupante que a diversidade de identidades (p.45). Segundo Patrício (2003) “ a identidade cultural é o que faz de uma comunidade um sujeito cultural participar por inteiro” (p. 81), contudo, a nosso ver importa saber se a identidade pessoal, cultural e nacional são definidas de igual modo. O mesmo autor diz-nos que “uma cultura é uma identidade” e que cada cultura “ é um sistema vivo e único de valores” (op

46 cit. p. 82). Ainda Cabanas (2003) fala-nos da singularidade própria de cada pessoa, “como consequência natural da liberdade dessa pessoa, que graças à qual a distingue radicalmente dos outros” (p. 45). No fundo o que aqui pretendemos evidenciar é que os conceitos: identidade, diversidade, cultura, valores e globalização acabam por ser indissociáveis e incontornáveis pelos sistemas educativos.

A sociedade juntamente com as instituições educativas têm como desafio conservar a identidade cultural a que cada um tem por direito, conforme Ibáñez (2003) “o reconhecimento desta multiplicidade de culturas desenvolve instituições dialogantes e democráticas” (p. 91). Cabe às instituições que vivenciam esta multiculturalidade favorecer uma educação para a cidadania intercultural, que assente nos princípios do respeito pelo outro e pela igualdade de direitos e de oportunidades, por parte de todos os que pertencem a uma minoria, munindo-os de conhecimentos, direitos, deveres e capacidades, diluindo-os assim na sociedade, tornando-os capazes de uma intervenção activa e consciente. Queremos aqui patentear que as práticas de cidadania, no contexto escolar, devem ser parte estruturante do projecto educativo da escola, aqui a instituição deve manifestar o seu sentido integralista de toda a comunidade escolar, quer ao nível cultural quer ao nível social, deve promover espaços de colegialidade, de reflexão, de partilha e participação, e deve promover a igualdade para todos e o respeito pela identidade cultural de cada um.

3.4. A Escola Cultural – Reflexão sobre Processos de Autonomia, Gestão