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A Escola Cultural – Reflexão sobre Processos de Autonomia, Gestão Escolar e Participação do Local

A administração educativa reconhece a autonomia de escola, principalmente, no que concerne às tomadas de decisão ao nível organizacional, estratégico e administrativo e, claro não poderíamos deixar de focar, o nível financeiro (Lemos & Silveira, 2003). Esta autonomia, embora reconhecida, continua a ser regulada.

Ao longo das últimas décadas temo-nos deparado (em investigações, estudos, políticas educativas, legislação) com a seguinte terminologia, no que respeita à organização e gestão escolar: descentralização, autonomia, participação, cidadania. Que com a qual, elaborámos o esquema da figura 3:

47 Figura 3: Organização e gestão escolar mais participativa - adaptado de Sergiovanni (2004)

O que pretendemos esclarecer na figura 3 é a descentralização do poder central em prol do poder local, enquanto factor de mudança, ou seja, se se apelar mais à participação da Autarquia, do meio que envolve a comunidade educativa, em relação à administração das escolas, maior é a taxa de contentamento e sucesso no que concede à implementação de uma cidadania mais interventiva e eficaz. É o “local” que melhor conhece a sua população e que de um modo mais eficiente consegue estabelecer uma relação de participação mais evidente com a comunidade, pois é conhecedor da sua realidade. Entendemos por descentralização a transferência de competências para as autarquias, municípios (o poder local) por parte do poder central (o Estado), neste contexto, o termo autonomia refere-se ao livre arbítrio na tomada de decisões por parte da escola. A escola, aquando da elaboração do seu projecto educativo deve contemplar e sugerir a participação da comunidade no que diz respeito a este processo de gestão organizacional, com apelo directo ao local, efectivando-se assim a tão desejada cidadania intercultural.

Autonomia

Participação Descentralização

48 Solicitando o modelo participativo de gestão organizacional de Banas (1990), completamos assim o nosso raciocínio através do seguinte organigrama, a figura 4. Aqui, explicitamos as competências que a gestão organizacional deve ter em conta no processo de participação: planeamento, fixação de objectivos ou finalidades a atingir, tomada de decisões e resolução de problemas.

Figura 4 – Competências da gestão organizacional - adaptado de Banas (1990)

Esta figura resume os três domínios que constituem o subtítulo deste ponto de revisão de literatura: autonomia, gestão escolar e participação, que têm sido alvos de muitos debates e cremos que se enquadram na investigação, pois ao longo dos últimos vinte e cinco anos foram e têm sido focos de reflexão sobre a crescente transformação e diversidade, na escola actual. A partir de Abril de 1974 foram proporcionados momentos de expectativa, desde essa data que muito se perspectivou, reflectiu, investigou, transformou e mudou, enfim muitos são os adjectivos para qualificar as transformações ocorridas no âmbito da governação de escolas, da sociedade civil e educativa.

Sanches (2002), recorrendo à sua investigação na área da administração, numa visão muito pessoal e vivencial fala-nos deste período, da utopia construída na década de 70, pós o 25 de Abril de que modo é que este “processo revolucionário representa uma mudança de

Tomada de decisão Resolução de problemas Planeamento Fixação de objectivos

49 paradigma no domínio educativo e social” (p. 65), salientam-se aqui três pontos: a emergência da escola democrática, as significações dos professores face às transformações realizadas, a autonomia das escolas e flexibilidade curricular. Esta visão utópica assentava em princípios como: a construção de uma escola com um projecto social, político e cultural mais abrangente, queria-se mais interventiva e autónoma; o objectivo era a construção de uma escola democrática, que acompanhasse a sociedade que se apresentava com características mais globais e que galopava para a era do conhecimento, da tecnologia, da comunicação e de participação da comunidade no processo de ensino-aprendizagem da sua população. Seguindo o pensamento de Sanches (op cit.) a “politização da escola foi um dos factos mais relevantes neste processo revolucionário” (p. 66), mencionada no decreto-lei nº 769/76. Porém, estes momentos de incertezas permitiram uma reformulação pedagógica e organizacional das instituições escolares e uma maior abertura ao meio. Esta foi uma época de construção de autonomia e de descentralização de poderes, favorecendo e privilegiando as diversidades sociais locais, a vontade de mudar e transformar que “ imprimiu vitalidade criativa e decisional à escola” (Sanches, 2002, p. 68).

Não poderíamos deixar de abordar um outro aspecto inovador e revelador, deste período, a (re)construção da identidade da classe docente que se pretendia e se pretende de práticas colegiais, de trabalho colaborativo e cooperativo entre os seus pares e, sobretudo, de participação organizacional, não descurando os problemas sociais, promotores de equidade e igualdade e de uma cidadania operacionalizada. A validação dos projectos educativos de escola viram crescer a sua hegemonia, neles contemplam-se as suas realidades, estratégias de intervenção, suas finalidades, tendo em conta o seu contexto social e político que envolve a sua comunidade educativa.

Utilizámos o termo utopia para focar o pensamento destes actores que anunciaram e participaram neste “processo revolucionário” que teve a sua origem numa época de ascensão à mudança e libertadora de expressões mudas e caladas pela opressão, contudo, considero que, hoje, a escola pretende dar continuidade ao que se iniciou desde então, muitos artigos foram escritos sobre esse escrutínio, as políticas educativas e o clima de transformação que se respira neste momento vão de encontro ao idealismo libertador e basilar da escola neo-liberal, que foi crescendo e desenvolvendo-se, dando ensejo a tantos

50 debates e pensamentos da escola actual é “o mito usado para uma intervenção actual” (Formosinho, 2002, p. 71).

A participação da comunidade e a multiculturalidade na escola são duas preocupações, muito actuais do nosso sistema educativo, levantadas por Formosinho (2002); ele questiona a gestão democrática da escola e a autonomia individual sem controlo, como uma gestão permissiva, associando-a ao fenómeno crescente da massificação discente coincidente da docente. Explica-nos que à medida que se consolida a gestão assente na democratização emergem os serviços normativos centrais (pp. 72-73). Este autor correlaciona este aspecto com os programas de administração escolar, pós 25 de Abril de 1974, onde não se defendiam com clareza as competências formais desta escola nova, no fundo as actuais e as anteriores eram as mesmas, é aqui que converge o “mito”. Há que, realmente, conseguir ver a escola como uma organização, com conceitos de administração, na época de cariz teoricista, pois tinham a sua génese “nas teorias organizacionais, a sociologia das organizações” (Formosinho, 2002, p.74), já aqui evidenciadas.

3.4.1. Cidadania, poder local e educação

O Decreto Lei n.º 159/99 de 14 de Setembro, art. 19º, no ponto 1, define a atribuição de competências na área da educação para a cidadania com participação das Autarquias, nomeadamente da Divisão de Educação das Câmaras Municipais, e visa contribuir para uma educação de qualidade para todos tendo como objectivo garantir o acesso e a permanência de crianças e jovens na escola e a igualdade de oportunidades, colaborando no desenvolvimento humano integral, com base no sentido de responsabilidade e de comunidade.

O reconhecimento do papel da Educação na implementação de um desenvolvimento verdadeiramente sustentável, é da responsabilidade de todos. O alargamento da rede escolar e as significativas adaptações do ensino às realidades locais são dois aspectos, que neste momento se encontram em evolução.

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