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4 DESENVOLVIMENTO

2.1.4 Aculturação e Expatriação

De acordo com a o propósito deste estudo de investigar as relações entre novos ambientes culturais e o comportamento de consumo, faz-se necessário abordar alguns processos e conceitos relacionados ao que se passa com os sujeitos que os vivenciam, bem como as situações relacionadas à aculturação.

Todo indivíduo, até o final da sua adolescência, passa pelo processo de enculturação no qual aprende a preferir se comportar de acordo com o que os outros do seu grupo social, nação ou país entendem como a maneira correta, moral, ética e natural de fazer as coisas. Dessa forma, ele assimila, de forma contínua, a cultura do seu local de origem por meio dos grupos sociais com os quais convive, o que se dá de modo informal ou formal (SUSSMAN, 2002).

Para Triandis (1989, p. 506), “[...] as preferências culturais e as formas de pensar e agir, assim como um par de óculos feitos sob medida, modela tudo o que vemos, como interpretamos o

que vemos e como devemos agir”. Sussman (2002) ressalta que, dessa maneira, a perspectiva cultural da pessoa se torna invisível e passa a fazer parte da sua identidade, da mesma forma que o gênero, a ocupação, as habilidades pessoais – elementos cuja soma é chamada de autoconceito.

O encontro intercultural é tão antigo quanto a humanidade, tendo surgido quando os primeiros indivíduos pertencentes a tribos diferentes se encontraram há estimados 30 mil anos (HOFSTEDE, 1980). Quando ele ocorre, são criadas condições para que o indivíduo passe a assimilar novos elementos culturais, iniciando-se o processo de aculturação. Dependendo de vários fatores, a aculturação pode ser mais ou menos intensa e vem acompanhada de processos sociais e psicológicos.

No entendimento dos antropólogos Redfield, Linton e Herskovits (1936) aculturação compreende os fenômenos que geram mudanças nos padrões de diferentes culturas dos grupos de indivíduos que se encontram pela primeira vez. Ressaltam que, de acordo com essa definição, aculturação deve ser distinguida de mudanças culturais, que são apenas um aspecto do construto cultura, assim como a assimilação e difusão, que são fases da aculturação. Fica aparente que esses estudiosos trataram o tema no nível grupal. Décadas mais tarde, Graves (1967) criou o termo aculturação psicológica para tratar o assunto em nível de indivíduo, sob a perspectiva de que membros de grupos em contato com culturas distintas experimentam mudanças psicológicas. Berry (2001) destacou que esse impacto é comum a todos os grupos, seja o não dominante como o dominante, pois o foco inicial dos estudos se concentrou no primeiro.

No encontro intercultural é comum ao estrangeiro inexperiente se deparar com alguma forma de choque cultural, pois não vai conseguir reconhecer, por si só, os valores subjacentes apesar de poder, com algum esforço, apreender símbolos e rituais do novo ambiente, tal como a forma de cumprimentar e de se comunicar adequadamente. Isso se deve ao fato de que os rituais, símbolos e heróis são as manifestações mais superficiais de cultura, enquanto os valores básicos de cada pessoa são aprendidos no decorrer da vida e se tornam tão naturais como se fossem inconscientes. Deste modo, quando em contato com uma nova cultura, o visitante retorna ao seu estado mental da infância, tendo que aprender coisas simples novamente.

Sussman (2000; 2002) estudou a transição cultural junto a visitantes a outros países que depois de um determinado período retornam ao local de origem7, que podem ser turistas, missionários, diplomatas, estudantes matriculados em uma universidade estrangeira, executivos designados para trabalhar em uma sucursal no exterior, cujo número anual está na casa dos milhões. O que essa autora denomina de ciclo da transição cultural envolve várias etapas: consciência, ajustamento, adaptação, mudança da autoimagem, resposta à identidade cultural e repatriação. Cada uma dessas etapas, por sua vez, pode ser fracionada em estágios, o que faz com que diversos aspectos psicológicos se sobressaiam.

Hofstede (1980) explicou esse mesmo processo por meio da curva de aculturação (FIG. 7). Esse diagrama representa a evolução dos estados emocionais vivenciados por um indivíduo durante esse período. Não há uma duração definida para cada das fases, pois isso varia em relação ao período de expatriação. A Fase 1 é chamada de euforia ou lua de mel, quando predomina a excitação com a viagem, de novas descobertas como paisagens, comidas e bens de consumo. A Fase 2 é o período de choque cultural, quando a vida real se inicia no novo ambiente, por exemplo, o expatriado se conscientiza também dos aspectos negativos presentes no novo local de residência. Na Fase 3, denominada aculturação, é quando o expatriado começa a aprender como agir de acordo com os processos e hábitos locais, alguns valores começam a ser internalizados e há mais autoconfiança e integração no meio social. Na Fase 4 a pessoa alcança uma determinada estabilidade mental, que pode ser (1) negativa em relação ao ambiente de origem se o visitante continua se sentindo alheio e discriminado; (2) de plena adaptação; ou até mesmo melhor, (3) quando há um sentimento do expatriado de ter se tornado praticamente um nativo.

Essa situação frequentemente leva a sensações de angústia, incapacidade e hostilidade em relação ao novo ambiente, caracterizando manifestações de choques culturais. Selmer (1998, p. 996) destaca que a [...] “a tentativa de ajustamento a um novo ambiente cultural pode ser uma experiência estressante e nem todas as pessoas são bem-sucedidas nessa árdua tarefa”. O ajustamento internacional tem duas vertentes: a (1) psicológica, baseada em uma visão orientada a problemas e com foco em mudanças atitudinais, e a (2) sócio-cultural, fundamentada na aprendizagem cultural e habilidades da prática social, ou seja, refere-se a mudanças comportamentais. Para Jun, Lee e Gentry (1997) o ajustamento sócio-cultural pode

ser adotado involuntariamente devido às circunstâncias existentes no ambiente, enquanto o ajustamento psicológico requer mais voluntariedade por parte do expatriado.

FIGURA 7 – Curva de aculturação

Fonte: HOFSTEDE; HOFSTEDE, 2005, p. 324.

Amiot et al. (2007) destacaram que alterações sociais como migração, ajustes organizacionais e câmbios políticos provocam mudanças intra-individuais profundas em identidades sociais ao longo do tempo. Nesses contextos, modificações nas identidades sociais geralmente são profundas e requerem do indivíduo, a exemplo de um expatriado, uma completa reorganização do autoconceito para integrar-se a essas novas identidades.

Os conceitos e informações apresentadas tiveram o objetivo de descrever, ainda que parcialmente, a complexidade do processo de expatriação e das suas repercussões nos executivos expatriados, sujeitos desta pesquisa. A seguir são apresentados conceitos relativos a valores. Sentimentos Positivo + Negativo - Fase Tempo 1 Euforia 2 Choque Cultural 3 Aculturação 4 Estabilidade c b a