• Nenhum resultado encontrado

Adaptação

No documento Download/Open (páginas 132-137)

3. Resultados

4.5. Os pais de crianças deficientes: uma interpretação

4.5.10. Adaptação

Como visto através da EDAO (Simon, 1989; 2005), os pais e mães foram classificados com Adaptação Ineficaz, sendo apenas uma mãe (Sra. K.) considerada com Adaptação Ineficaz Moderada e sendo os demais considerados com Adaptação Ineficaz Severa. Como a discussão dos aspectos individuais já foi apresentada, serão discutidos agora aspectos mais generalizados concernentes à adaptação dos pais e mães de crianças diagnosticadas com

paralisia cerebral. A adaptação foi propositadamente o último elemento a ser apresentado nessa discussão, uma vez que se compreende que todos os fatores anteriormente discutidos são, em alguma medida, participantes de todo um conjunto que influi na adaptação dos pais e mães de crianças com paralisia cerebral.

Nesse sentido, o presente estudo apresenta pontos de concordância com Rabinovich e Sá (2006), no sentido em que aponta para a necessidade de adaptação de pais e mães de crianças com paralisia cerebral diante do diagnóstico da criança a fim de buscarem um novo equilíbrio através de seus recursos para lidar com a situação virtualmente transformadora a que são expostos. Assim, compreende-se que os fatores sócio-culturais anteriormente apresentados também influenciam a adaptação desses pais e mães, podendo constituir-se em influências positivas ou negativas à adaptação a depender das necessidades de cada pai e cada mãe e do apoio que este/esta recebe ou deixa de receber de seu meio social e familiar, assim como já descrito. Da mesma forma como a reação ao diagnóstico e a crise que esse diagnóstico ocasiona, que levam à ferida narcísica e ao luto, além do uso de mecanismos defensivos como negação e identificação projetiva frente à culpa de ter gerado uma criança com deficiência e as expectativas para o futuro e fantasias, também contribuem para uma melhor ou pior adaptação.

Conforme visto em Simon (2005) há fatores internos e externos que interferem na adaptação do indivíduo e se entende que os elementos acima apresentados podem ser considerados como alguns desses fatores internos e externos que influenciam a adaptação especificamente de pais e mães de crianças com deficiência. Nesse sentido, acrescem-se esses elementos como concernentes aos pais e mães de crianças com deficiência de modo a complementar a compreensão da adaptação vista através dos setores adaptativos propostos por Simon (1989; 2005).

Tratando sobre os setores adaptativos, percebe-se que os pais e mães apresentam Adaptação Pouquíssima Adequada no setor afetivo relacional, com exceção da Sra. K., que teve a adaptação classificada como Pouco Adequada nesse setor. Nos casos da Sra. E., do Sr. F. e do Sr. G., identifica-se que fatores internos negativos prejudicam a adaptação frente ao fator externo negativo que a paralisa cerebral de seus filhos representa. O que parece diferenciar a Sra. K. dos demais são fatores internos positivos que lhe auxiliam a lidar com o fator externo negativo que é a deficiência de seu filho.

A respeito do setor da produtividade, todos os pais e mães foram classificados com Adaptação Pouco Adequada. No caso da Sra. E. e da Sra. K. se percebe a interrupção do trabalho a fim de cuidarem de seus filhos, sendo que ambas denotam considerar essa

interrupção como uma perda significativa tanto do ponto de vista interno, pois gera sofrimento, quanto externo, já que significa, especialmente no caso da Sra.E., diminuição de renda. Com o Sr. G. acontece um fenômeno semelhante, pois ele deixa de investir em buscar trabalho para dedicar-se a cuidar da filha, mas, no entanto, não demonstra sentir isso como uma grande perda de seu espaço no mercado de trabalho. Já no caso do Sr. F., este continuou trabalhando após o nascimento do filho, porém demonstra sentir pouca ou nenhuma satisfação nessa atividade. Em todos os casos, houve o relato de que os pais e mães sentem satisfação em cuidar de seu filho deficiente.

No setor sócio-cultural, como já foi discutido, percebe-se que o Sr. F. e a Sra. K. recebem maior apoio familiar e social do que a Sra. E. e o Sr. G., porém apenas a Sra. K. apresentou Adaptação Adequada nesse setor, sendo que o Sr. F. e a Sra. E. apresentaram Adaptação Pouco Adequada e o Sr. G. foi classificado em Adaptação Pouquíssimo Adequada. A análise desse quadro aponta que o apoio de amigos e familiares e o acesso a meios sociais de atendimento são de grande importância, mas que esses aspectos podem ser mais ou menos bem aproveitados a depender dos fatores internos de cada um. Nesse sentido, compreende-se que a Sra. K., não só tem acesso a fatores externos sócio-culturais favoráveis, mas tem fatores internos positivos que lhe possibilitam fazer um bom uso desses fatores externos. Já o Sr. F., apesar de ser casado com a Sra. K. e ter acesso aos mesmos fatores externos positivos, não faz o mesmo uso desses mesmos fatores devido a seus fatores internos negativos que interferem em sua adaptação no setor sócio-cultural. No caso do Sr. G. e da Sra. E., apesar dos fatores externos negativos nesse setor, se vê que novamente os fatores internos influenciando o modo como cada um faz uso desses fatores. A Sra. E. denota fatores internos mais favoráveis à adaptação nesse setor, com predomínio de pulsão de vida que a leva a buscar meios para buscar soluções no setor sócio-cultural, já o Sr. G., com pouca vitalidade e depressivo, apresenta fatores internos positivos insuficientes para buscar meios para aproveitar os recursos sociais a que dispõe ou para buscar novas soluções ao seu pouco acesso fatores externos positivos nesse setor.

Por fim, no setor orgânico pode-se perceber que, com exceção do Sr. F. que foi classificado em Adaptação Adequada nesse setor, todos variam entre Adaptação Pouco ou Pouquíssimo Adequada, sendo que tanto a Sra. E. (Adaptação Pouco Adequada) quanto o Sr. G. (Adaptação Pouquíssimo Adequada), deram sinais de que a paralisia cerebral de seus filhos interfere em sua saúde, seja por falta de acesso a transporte adequado e conseqüente necessidade de carregar a criança no colo, seja por falta do uso de cadeira de rodas, seja pelos poucos cuidados que despendem a si mesmos a fim de oferecerem maiores cuidados à sua

criança.

Compreende-se, portanto, que, apesar de todos os pais e mães sofrerem importante influência da paralisia cerebral de sua criança em sua adaptação, esse fator não é, por si só determinante quanto à eficácia adaptativa dos mesmos, já que a adaptação é determinada por diversos fatores. Não obstante, há diversos elementos relacionados à deficiência que também interferem na adaptação desses pais e mães, conforme já discutido nesse trabalho.

Coelho, Matos e Monteiro (2002), apresentando um trabalho na linha cognitivo- comportamental, tratam a respeito da adaptação de mães de crianças diagnosticadas com paralisia cerebral, sendo possível identificar pontos de concordância e pontos de discordância entre esse e o presente estudo. Como pontos de concordância apresentam-se a compreensão de que o período de gestação é vivido com grande expectativa e com fantasias sobre como será a criança e que a mãe da criança com deficiência alterna entre períodos de maior aproximação e de maior rejeição com sua criança deficiente. Dada à diferença teórica entre os dois trabalhos, é preciso resgatar que o presente estudo compreende que essa alternância entre aceitação e rejeição como o uso de mecanismos defensivos frente ao sofrimento e à ferida narcísica causados pelo diagnóstico de deficiência do recém nascido.

Outro ponto de concordância é a própria necessidade de adaptação frente ao diagnóstico de paralisia cerebral da criança e as mudanças nas condições de vidas dessas mães, que fica atrelada e é indissociável da vida da criança. No caso do presente trabalho, compreende-se que essa indissociação entre mãe e criança com deficiência é devida à identificação projetiva da mãe com a criança.

Como ponto de discordância, aponta-se a proposição de Coelho, Matos e Monteiro (2002) de que as mães apresentam maior sofrimento do que os pais de crianças com paralisia cerebral. Dadas as distinções entre função paterna e função materna, compreende-se que tanto os pais quanto as mães passaram por grande sofrimento ao receber o diagnóstico de deficiência do seu filho e que cada um, de acordo com os recursos internos e externos que possui e que já foram anteriormente apresentados, busca meios de adaptar-se à situação de pai/mãe de criança com paralisia cerebral e de manter o equilíbrio homeostático.

Também não há concordância com o que os autores propõem ao descreverem que as mães apresentam melhor adaptação e menos ocorrência de doença mental do que os pais (COELHO, MATOS e MONTEIRO, 2002). Os dados aqui obtidos sugerem que não há, dentro de uma concepção psicanalítica da adaptação, base que fundamente tal concepção. Pelo contrário, a análise das entrevistas e dos Desenhos-Estória, juntamente com o embasamento teórico aqui utilizado, especialmente os estudos de Simon (1989; 2005),

indicam que a qualidade da adaptação (sendo aqui empregado o termo de eficácia adaptativa) de pais e mães de crianças com paralisia cerebral é determinada por todo um conjunto complexo de fatores internos e externos que, no caso específico de pais e mães de crianças com deficiência, recebem a adição do diagnóstico da criança (que representa um fator externo negativo). Não há, portanto, como afirmar que as mães apresentam melhor adaptação do que os pais.

No documento Download/Open (páginas 132-137)

Documentos relacionados