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Análise da Técnica de Desenhos Estória

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3. Resultados

3.4.2. Análise da Técnica de Desenhos Estória

A seguir, apresentam-se as produções gráficas dos “desenhos-estórias com tema” da Sr. G. e as suas análises.

Primeira Unidade de Produção (criança com deficiência)

Fig. 13. Primeira unidade de produção gráfica – Sr. G.

O Sr. G. fez o desenho solicitado, comentando que não costumava desenhar e não sabia se conseguiria fazê-lo. Iniciou desenho pela cabeça, desenhando em seguida o restante do corpo, porém desenhou a boca por último, reforçando em seguida os traços do cabelo, pés e roupas.

Quando foi solicitado que o Sr. G. narrasse uma estória, respondeu: “Uma história? Estou pensando... Se ela andasse, as pernas iam ser assim (apontou para as pernas do desenho). Mas ela não anda. Se a cabeça fosse boa... Mas ela não sabe ir para canto nenhum. Se ela andasse, as perninhas iam ser assim, aprumadinhas”. Complementou: “Penso: se ela um dia andar... Não vai poder andar sozinha. Ir para lugar nenhum. Pode até ir, mas não vai saber voltar”.

Sendo solicitado um título para a estória, respondeu: “Não estou lembrado, não. Sinceramente”.

Segunda Unidade de Produção (pai de uma criança deficiente)

Fig. 14. Segunda unidade de produção gráfica – Sr. G.

Quando foi pedido que o Sr. G. fizesse a segunda figura, pai de uma criança deficiente, disse: “O pai de uma criança deficiente?” “Não sei se sei desenhar isso. Como que desenha o pai de uma criança deficiente?” ao que lhe foi respondido que fizesse o desenho da forma como achasse melhor.

O Sr. G. levou cerca de meio minuto para iniciar o desenho, começando novamente pela cabeça e em seguida desenhando o resto do corpo. Verbalizou que seu desenho parecia o desenho de uma figura humana feminina e disse que não sabia desenhar, apontando para o braço do desenho que estava situado na região do quadril, fazendo uma tentativa de desenhar outro braço mais acima.

Para essa produção, narrou: “Pai da criança com... Da criança deficiente. Acho que o pai da criança quer muito que... Acho que ele tem que se conformar. Não foi ele que quis. Nem a mulher dele. Nem os médicos. É tipo um mistério... De porque nasce assim. Nasce porque tem que ser assim. Do porque veio ao mundo. Outro dia a irmã da minha mulher, aquela que mora no Rio, veio aí e ficou uns dias em casa. Ela estava falando da menina e perguntou porque ela nasceu desse jeito. Eu falei que não sabia e comecei a chorar”.

Nesse instante o Sr. G. começou a chorar e a limpar o nariz na gola da camisa. Pediu desculpas e, ao ser indagado pelo quê se desculpava, respondeu: “Porque eu estou chorando. Tem vez que eu choro. Acho que sou fraco. A irmã da minha mulher falou que Deus só dá criança assim, especial, para quem vai saber cuidar da criança. Acho que ela está certa. Mas

tem vez que eu choro. Penso “quem é que vai cuidar dela se eu morrer? Quem é que vai cuidar dela? E se eu ficar sem ela? Eu não posso resolver o problema dela... Eu queria saber resolver... Saber ajudar ela... Mas eu não sei”.

ANÁLISE

Segue a análise e interpretação das produções do Sr. G., conforme o proposto por Trinca (1997), Tardivo (1997) e Aiello-Vaisberg (1997).

Grupo I – Atitudes Básicas:

Insegurança: necessidade de proteção, de ajuda; atitudes de inibição.

Identificação negativa: sentimentos de incapacidade. Sua produção gráfica e suas estórias mostram incapacidade – põe em ação toda sua impotência diante da deficiência.

Grupo II – Figuras Significativas: as figuras significativas das relações de objeto - figura materna sentida como frágil, com quem se identifica. A figura paterna é sentida como austera ou ausente. Deus, que dá um filho com defeito, mas que é “bonzinho”, pois só dá para quem pode cuidar. Ai aparece uma ambigüidade: do pai punitivo e bondoso.

Grupo III – Sentimentos Expressos:

Sentimentos derivados do instinto de morte: aparece nesse pai o desespero.

Desejo de ficar sem a filha: “E se eu ficar sem ela?” E uma culpa infinita advinda desse mesmo desejo: “Eu não posso resolver o problema dela... Eu queria saber resolver... Saber ajudar ela...”. Depois, aparece então uma forma de amenizar essa mesma culpa: “Mas eu não sei” (sou impotente).

Sentimentos derivados do conflito: culpa e impotência em poder reparar, depressão. Grupo V – Impulsos: ambos, amorosos e destrutivos (há ambivalência)

Grupo VI – Ansiedades: persecutória, assim como a culpa é também persecutória.

Grupo VII – Mecanismos de Defesa:

Projeção; identificação projetiva - aparece maciçamente em ambas produções, pois se coloca plenamente nelas.

Compensação – tenta compensar a deficiência da filha fantasiando como ela seria caso não tivesse paralisia cerebral, e tenta compensar suas próprias deficiências como pai afirmando que “Deus só dá criança assim, especial, para quem vai saber cuidar da criança”. 3.4.3. SÍNTESE DO CASO

O Sr. G. apresenta-se frágil, sem energia e desvitalizado, dando indícios de depressão e de predomínio da pulsão de morte. Isso resulta em falta de iniciativa diante de situações problema e mesmo diante de situações cotidianas, sendo que o Sr. G. aceita sua situação de vida atual como sendo seu destino. Com relação à deficiência da filha, chega a interrogar de quem é a culpa, mas acaba chegando à conclusão de que foi o destino.

Em determinados momentos tem percepção de sua fragilidade, a qual é percebida pela sua incapacidade (impotência) em reverter a situação da deficiência da filha. Porém apresenta fantasia de cura e oscila entre a aceitação da realidade e a fantasia da cura.

Tenta atenuar as condições de saúde da filha, mas sempre que isso não é possível, sofre e mostra sinais de que não elaborou o luto pela criança saudável perdida e usa mecanismos como a exclusão social e a negação de seu sofrimento para tentar lidar com seu luto. Outra estratégia de que lança mão é o uso de sua falta de instrução e de sua dificuldade de compreensão com a finalidade de não ter maior contato com a realidade da deficiência da filha.

Há sinais de que já apresentava vivência depressiva e fragilidade antes do nascimento da filha, porém, com o nascimento dela, passou a ligar sua própria vida a vida dela, estando projetivamente identificado com ela e tendo temores de destruição ligados à morte da filha, acreditando que, quando ela morrer, poderá morrer junto. Sua vida está tão ligada à vida da filha que não suporta seu sofrimento, pois o sofrimento da filha significa para ele seu próprio sofrimento.

3. 5. SÍNTESE GERAL

Através da análise das entrevistas e dos Desenhos-Estórias com tema pode-se identificar alguns aspectos que são comuns aos participantes. Dentre eles, a necessidade de adaptação à nova situação: pai/mãe de criança com paralisia cerebral. Nova situação que envolve desde mudanças na rotina que ocorrem devido à necessidade de cuidados diários e tratamentos das crianças e na distribuição de tarefas no meio familiar, ao impacto que a

deficiência do filho causa no âmbito emocional.Com relação às mudanças nos afazeres diários, os participantes narram que essas atingem toda a família, especialmente os pais, ficando para um dos pais os cuidados mais diretos com a criança, resultando que um dos pais trabalha enquanto o outro passa a maior parte do dia cuidando do filho e ficando como principal responsável em levá-lo aos tratamentos. Isso representa perdas para os pais, já que significa o abandono de atividades antes desempenhadas e valorizadas com o objetivo de suprir as necessidades do filho.

Identifica-se, portanto, perdas decorrentes da deficiência do filho. Cada um dos participantes relatou ter que abdicar de uma ou mais atividades (tanto de trabalho, quanto de lazer) em decorrência das mudanças na rotina. A atividade que foi deixada varia de participante para participante, mas é comum a todos a percepção dessas perdas. Em apenas um caso, o da Sra. K., percebe-se alguma tentativa de retomar alguma dessas atividades quando esta descreve que, mesmo tendo que convencer o marido (Sr. F.), ocasionalmente deixa o filho com uma das avós para poder sair e viajar, sendo que o casal chegou a fazer uma viajem com o filho. Os demais participantes demonstraram que, apesar de sentirem essas perdas, não buscaram meios para tentar reaver aquilo que foi perdido, nem tentaram encontrar algo que pudesse substituir o que foi perdido

Os pais e mães demonstraram sofrer com essas perdas, mas a perda que parece causar maior dor é justamente a perda do filho saudável esperado e que não veio. Tanto aqueles que relataram terem nutrido desejo de ter um filho quanto aqueles que inicialmente o rejeitaram denotam terem vivido a expectativa de serem pais/mães de uma criança saudável, sendo que a notícia do diagnóstico de paralisia cerebral da criança foi causa de sofrimento para todos os participantes.

Cada um lançou mão de mecanismos de defesa diversos para enfrentar o momento de crise gerado por essa notícia, mas a todos é comum a necessidade de buscar estratégias para lidar com a situação problema.

Identifica-se, portanto, o luto vivido por esses pais/mães. Luto pela criança que nasceu desviante daquilo que esperavam. Luto pela morte simbólica da criança saudável e perfeita que vivia em suas fantasias.

Esse luto é vivido por esses pais e mães e, em todos os casos, foi possível perceber que o luto não pôde ser elaborado por nenhum deles. Seja através de mecanismos de negação total ou parcial da deficiência do filho, seja pela negação do próprio sofrimento, seja através do uso de outros mecanismos de defesa, como a identificação projetiva e a projeção de partes carregadas de ódio e de culpa, seja através de tentativas de compensar a deficiência do filho

(vista em frases como “ele não dá trabalho”), seja através de fantasias de cura da criança, o que se pode perceber é que esses pais/mães oscilam entre momentos de maior aceitação da deficiência do filho e momentos em que não conseguem fazê-lo, indicando o luto não elaborado. O que se pode identificar é que, apesar de que cada participante tem uma vivência da culpa bastante distinta, todos eles demonstram culpa ligada à deficiência da criança, levando à hipótese de que a ferida narcísica ocasionada pela produção deficiente desses pais causam-lhes a vivência da culpa por terem produzido essa criança.

Os participantes demonstraram buscar a identificação de um culpado pela deficiência da criança. Esse movimento fica especialmente claro no caso do Sr. G. quando este busca descobrir quem causou a deficiência da filha, se sua família, se a mulher, se o destino. No Sr. G. percebe-se a projeção de seu sentimento de culpa e a tentativa da resolução de sua busca na sentença de que a culpa é do destino, assim o Sr. G. aceita seu papel como pai de uma criança deficiente de forma passiva, como sendo um fardo que precisa carregar. No caso da Sra. E., também há a projeção da culpa, que se revela através da busca que faz por uma indenização e pela forma agressiva com que responde às pessoas que não lhe atendem os pedidos, indicando uma culpa persecutória tão insuportável para ela que precisa ser projetada indistintamente nas pessoas de seu convívio. Para Sr. F. a culpa é também persecutória, com a crença de que a paralisia cerebral é uma espécie de punição por ter desejado a morte do filho e por nunca ter desejado ser pai ou ter gostado de crianças. Já com a Sra. K., apesar de esta também viver uma culpa persecutória, na qual projeta toda a culpa e todo seu ódio no médico que fez o pré- natal de seu filho, possibilitando que cuide de seu filho e o ame, percebe-se uma tentativa amorosa de reparação com o filho, apesar de não conseguir essa reparação.

Não é somente na Sra. K. que é possível identificar o desejo de reparação com relação ao filho, o Sr. G. e o Sr. F. também apresentam esse desejo, revelado em falas como “Eu não posso resolver o problema dela... ... Eu queria saber resolver... ... Saber ajudar ela...” (Sr. G.) e quando o Sr. F. se esforça para que o filho não sofra, pois considera que este já sofreu demais. O que distingue a Sra. K. dos demais é que os estes vivem uma identificação projetiva maciça os filhos, o que os impede de maiores tentativas de reparação. Já a Sra. K., estando com um maior distanciamento do filho, pode lidar com ele como um objeto total, e não parcial, o lhe propicia maior contato com o filho real e maior proximidade em ser bem sucedida em sua tentativa de reparação.

Para todos os casos percebe-se a relevância do apoio familiar e social nos cuidados com a criança deficiente e na forma como cada um lida com a deficiência do filho. No caso da Sra. K. e do Sr. F., percebe-se que o apoio da rede social e da família é de grande importância

para eles, sendo de grande valia para a própria adaptação de ambos. Já no caso do Sr. G. e da Sra. E. essa relevância se traduz pela falta de apoio e pelas dificuldades que enfrentam em não ter com quem compartilhar os cuidados com as crianças, os sofrimentos e as expectativas.

4. DISCUSSÃO

Segue abaixo a discussão dos resultados obtidos pelos instrumentos EDAO e análise dos Desenhos-Estória com Tema.

4.1. Sra. E.

De acordo com a EDAO (SIMON, 1989; SIMON, 2005), compreendeu-se que a Sra. E. se classifica em Adaptação Ineficaz Severa, o que significa que esta mãe apresenta dificuldades e conflitos internos e externos (conforme descrito na análise das entrevistas) que não lhe permitem satisfação; o que indica “sintomas neuróticos mais limitadores, inibições restritivas, rigidez de traços caracterológicos” (SIMON, 2005, p. 28). Podem-se considerar como sintomas mais limitadores da Sra. E. a negação de partes ruins e boas do mundo interno e do mundo externo; suas relações de objeto, que são estabelecidas com objetos parciais são feitas pela via da dissociação; esvaziamento, com desvalorização de aspectos positivos internos e externos; além de utilizar a identificação projetiva indiscriminada. Há, deste modo, predomínio da fantasia como modo de enfrentamento da realidade, impulsividade, agressividade excessiva, baixa tolerância a frustrações e regressão e fixação com características pré-genitais. Os sintomas que essa mãe apresenta são considerados típicos da posição esquizo-paranóide e, portanto, são mais primitivos (KLEIN, 1946; 1957)

Os sintomas que a Sra. E. apresenta indicam também certa rigidez, já que ela denota pouca possibilidade de mudança e dificuldade de fazer uso de ações mais flexíveis nas situações cotidianas. No entanto, apesar de apresentar sintomas neuróticos limitadores e rigidez de traços, eles não impedem que a Sra. E. cuide da filha deficiente, outrossim, esses possibilitam que a Sra. E. seja capaz de lidar com seu sofrimento para, assim, ser capaz de lidar com sua vida cotidiana, de outra maneira, insuportável.

Um correlato desse aspecto acima descrito foi também visto por Faria (1997) quando trata a respeito da ferida narcísica que um filho deficiente inflige nos pais. Isso pode ser percebido na Sra. E., na qual a ferida narcísica decorrente do nascimento da filha causa um sofrimento com o qual não consegue lidar, senão negando-o. Na Sra. E., esse narcisismo ter sido exacerbado na crise manifestada no nascimento da criança. Assim, pode-se compreender, através da descrição de crise feita por Caplan (1980), que o diagnóstico de paralisia cerebral da filha representou para a Sra. E. uma situação problema para qual não obteve resposta durante um período, e a negação foi um recurso importante para lidar com essa crise.

Assim, aliando negação e identificação projetiva como meio de lidar com a deficiência da filha, também surge a culpa como sentimento pela deficiência da filha. Porém, a Sra. E.

também nega a culpa, que, de acordo com Grinberg (s/d.), pode ser considerada como persecutória, já que a Sra. E. projeta a culpa no outro (no médico, no marido ou nas pessoas que não lhe oferecem a ajuda que busca), e como se sente perseguida pelo outro em quem projetou a culpa, age agressivamente contra o objeto que se tornou perseguidor para ela.

Em estudos mais recentes esses mecanismos defensivos utilizados pela Sra. E. também foram observados, como vemos em Amaral (1995), Buscaglia (2006), Brunhara e Petean (1999), Góes (2004) e Boscolo (2002), principalmente no que se refere à negação como meio de conseguir lidar com o nascimento de um filho deficiente (o que gerou a crise). Mas, a Sra. E., ao ter resolução da crise e tendo adquirido um patamar adaptativo ineficaz, persiste na utilização da negação de seu sofrimento, assenta-se em uma organização narcísica cujo cenário são fantasias de cura da filha. Esse quadro é similar ao que Amaral (op.cit) chamou de reedição da crise.

4.2. Sra. K.

Observamos pela EDAO (SIMON, 1989; 2005) que a Sra. K. se classifica como tendo uma Adaptação Ineficaz Moderada que, segundo esse mesmo autor (SIMON, 2005), indica “Alguns sintomas neuróticos, inibição moderada, alguns traços caracterológicos” (p. 28) e que, no caso da Sra. K., podem ser compreendidos pela constatação de que essa mãe vivencia um período de transição entre a posição esquizo-paranóide e a posição depressiva (KLEIN,1957), no qual é possível identificar mecanismos defensivos de ambas as posições que indicam a coexistência de conflitos prejudiciais à adaptação da Sra. K. e tentativas de solucioná-los, sendo algumas tentativas mais bem sucedidas que outras. Percebe-se vivência de culpa, medo de abandono e desproteção, além de constantes tentativas reparatórias. Apesar de buscar a reparação, a Sra. K. não a consegue, pois faz uso muito freqüente da identificação projetiva e da negação, que, segundo Klein (op. cit.) são defesas características da posição esquizo-paranóide, impedindo a renúncia e a restauração das partes danificadas que possibilitariam a entrada na posição depressiva e a reparação.

Assim, a Sra. K. não consegue atingir uma reparação de fato, devido ao uso freqüente da identificação projetiva e da negação, além da culpa persecutória. O uso da negação foi apresentado Amaral (1995), Buscaglia (20006) Brunhara e Petean (1999), Góes (2004) e Boscolo (2002), como um mecanismo de defesa utilizado por pais e mães de crianças deficientes, dentre eles, destaca-se Amaral (1995) que compreende que a negação pode ser entendida como uma atenuação da gravidade da deficiência. Isso pode ser identificado na Sra. K. através de sua produção gráfica e de sua relação com o filho, já que a Sra. K. parece oscilar

entre momentos de maior assimilação da realidade da deficiência do filho e momentos em que tenta atenuar sua gravidade (sem, no entanto, negá-la por completo). Recorrendo a Góes (2004) e sua compreensão de que pais de crianças com deficiência apresentam um movimento de báscula que alterna momentos de aceitação e de negação da deficiência, pode-se compreender essa oscilação da Sra. K.

Com relação ao sentimento de culpa, que Buscaglia (2006) descreve como algo comum em pais de crianças deficientes e que também é descrito por Góes (2004), a Sra. K. denota pouca capacidade para sentir essa culpa (depressiva) como sua e a projeta maciçamente no médico que fez o pré-natal de seu filho e que não fez o diagnóstico de descolamento de placenta a tempo de evitar maiores complicações. Com base em Grinberg (s/d.), compreende-se que a Sra. K. não consegue ter um alcance da culpa depressiva com seu objetivo reparador e regride à culpa persecutória com uso de defesas esquizo-paranóides. Como foi descrito na análise das entrevistas dessa mãe, compreende-se que a Sra. K. faça uso desse mecanismo como meio para canalizar sentimentos típicos da pulsão de morte, como o ódio e a agressividade destrutiva, ao médico, conseguindo endereçar ao filho sentimentos amorosos e tentativas reparatórias.

Isso parece só ser possível devido a uma estruturação psíquica anterior ao nascimento do filho, que foi afetada por esse nascimento, o qual significou um momento de crise para a Sra. K. (isso compreendido com base em CAPLAN, 1980). Sua resposta para essa crise parece ter sido de regressão e estagnação; porém, na atualidade, acredita-se que, passada a crise, essa mãe denota possibilidade de crescimento e melhora de sua eficácia adaptativa numa psicoterapia. O que pode ser compreendido, segundo Simon (1989; 2005), como a possibilidade de retomar um estado anterior à crise após a resolução desta. No caso da Sra. K. isso parece acontecer aos poucos, como um processo de retomada de curso de vida no qual não se pode saber ao certo até que ponto a Sra. K. conseguirá ir.

4.3. Sr. F.

O Sr. F. foi classificado através da EDAO (SIMON, 1989; 2005) em Adaptação Ineficaz Severa, que, de acordo com Simon (2005) indica “Sintomas neuróticos mais limitadores, inibições restritivas, rigidez de traços caracterológicos” (p. 28) que, no caso do Sr. F. podem ser identificados como o uso freqüente de mecanismos de defesa primitivos, especialmente, identificação projetiva, negação, regressão e fixação, sendo que esses mecanismos defensivos indicam que o Sr. F. apresenta características mais típicas da posição esquizo-paranóide (KLEIN, 1946; 1957).

Isso explica a sua imaturidade. Conforme descrito na análise da entrevista, o Sr. F.

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