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5. ANÁLISES E DISCUSSÃO

5.3. Repertórios sobre família

5.3.1. Adjetivos atribuídos à família

Seguindo o panorama dos ideais construídos sobre a família, os adjetivos conferidos a esta instituição por meio dos repertórios lingüísticos possuem, em geral, um teor positivo. Mesmo que esta não seja a experiência narrada pelos jovens em relação às suas famílias, há uma referência a como eles julgam que ela deveria ser. Os aspectos frisados fazem referência à união, apoio, compreensão e ausência de brigas e desentendimentos, como pode ser percebido nos trechos abaixo.

Uma família é... primeiramente, o marido e a mulher se entender, saber conversar tudinho, saber respeitar um o outro, se teve um me... um filho agora, senta pra conversar direitinho, tudinho, se vai dar certo, se não vai. Porque se não for, é melhor nem ter menino, tudinho, pra poder reunir a família. E, por uma parte, uma família é muito bom, que ajuda muito bem uma pessoa, ajuda muito a família. E saber educar os filhos, né, que, eu vejo aí muitas mães que não sabe nem... tem filho só por ter mesmo, não sabe nem dar educação (Ronaldo).

Família é ser tudo reunido. Tudo junto. Não ter briga entre família. Briga tem assim, né véi, é discussão, mas fica tudo junto unido, sempre pedir perdão ao outro, desculpa. Só, é isso. (...) Minha família é... não é muito, não é muito unida não. Que um mora ali, outro mora ali, num lugar. Mas, é boa (Cleyton).

Família deveria ser tudo em paz, tá sem arenga nem nada, e quando eu vou olhar a menina, é uma arenga danada, quando apareço, a menina lá com a mãe, cheio de negócio do lado (Anderson).

Somam-se a tais elementos, os sentidos de família associados à noção de lugar de proteção e preparação para a vida. Os repertórios que fazem esta referência podem estar associados àqueles já citados anteriormente, quando foram

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discutidas questões relacionadas à paternidade. Isto é, a família como responsável pela provisão não só financeira e material, mas de conhecimento e proteção, como deve ser também a paternidade (LONGHI, 2001). Assim, pode-se ainda presumir uma intensa associação entre paternidade e família nas práticas discursivas dos jovens, uma vez que parece haver uma co-dependência entre estas duas instituições, apontando que uma precisa da outra, como fatores que se complementam, para atingir uma espécie de plenitude.

Família pra mim, acho que é tudo né. Ter uma família, família mesmo, que saiba ensinar e educar uma pessoa, não é só na malandragem no meio da rua. Que meu pai mesmo, enquanto ele era vivo, eu nunca vi a rua, assim, né, saía com ele, brincava com ele, com minha irmã, mas ele nunca me deixou ir pra rua, no meio desses... assim, né, favela, no meio desses negócio sozinho. Aí eu acho que hoje, eu aprendi o que que ele queria me passar. Hoje vivo dentro duma favela, mas sei entrar e sei sair dela. Família pra mim é tudo. Minha mãe, meu pai, meus irmão sempre tá me apoiando também (Rafael).

Além disto, como é usualmente esperado de um homem, pai, a família é referida como o valor supremo de suas vidas, elemento que os motiva a mudar de comportamento e ir em busca de outros objetivos e conquistas. Estes devem trazer melhorias capazes de beneficiar não só o jovem, mas a todos que consideram parte da família. Assim é que esta assume uma proporção inigualável entre os elementos que fazem parte da vida dos jovens, na medida em que decidem apostar tudo por ela, sacrificando, inclusive, a vida de curtição.

...uma família pra mim, é muita coisa, muita coisa. Alegria, tudo na vida da gente depende da família, a gente sem uma família, a gente não é nada (Rodrigo).

Sei lá, pra mim, uma família é tudo, pra mim, família é um... pra mim família é tudo, é... a minha família, que eu construí agora, é minha mulher e meus dois filhos, é, são maravilhosos, que agora eu tenho responsabilidade que antes eu não tinha, e uma família, porque responsabilidade pela minha família mesmo que é minha mãe, meu... eu não tinha. Agora, hoje eu tenho, eu não tenho na cabeça pra pensar

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mesmo, que hoje eu tenho uma família, sou digno daquilo, sou, tenho que ser o chefe daquilo, tá entendendo? Antes disso, vem a minha esposa, e, a gente tem que batalhar mesmo pra construir uma família (César).

...não pensava em nada e só curtição e vamos beber, vamos cheirar e eu não tinha medo de nada, eu não tinha família, tá entendendo? Mas eu vi que a vida não era assim não, a pessoa tem que, tem que botar a cabeça pra pensar e, e se esforçar e lutar né, pelos objetivos, pra pessoa não, não se orientar não vai ser ninguém nunca. (...) Uma família é tudo na vida duma pessoa. (MC).

...diferente que eu queria era assim, tá com a mãe da minha filha, tá perto dela. Daí eu acho que se eu tivesse com ela eu acho que eu tava num trabalho bom, eu acho que eu já tava numa, assim, comprando minhas coisa devagarzinho (Ronaldo).

Logo, esta exaltação da família, especialmente a nuclear, gera uma situação de conflito quando confrontada com as possibilidades presentes nas práticas discursivas dos jovens pais e com as informações construídas por meio da observação no cotidiano do Centro da Juventude. Assim, parece que nem as famílias nem os estilos de vida dos jovens são como eles afirmam que gostariam que fossem.