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Algumas Considerações sobre as Estruturas de Expectativa

No documento fernandaraqueloliveiralima (páginas 75-79)

Desenho 2 Professor Ideal

4.2 Algumas Considerações sobre as Estruturas de Expectativa

Com base nos pressupostos da Lingüística Cognitiva sobre a noção de prototipia (cf.cap. 3), poderíamos esperar que os alunos, ao responderem à questão 2 (O que seus professores fazem nas aulas?), por exemplo, mencionassem ações mais exemplares dos professores durante uma aula, ou seja, comportamentos e atitudes mais reveladores da categoria “ações do professor” (ensinar, dar aula, passar dever, explicar etc.). No entanto,

devemos considerar também a influência das diferentes estruturas de expectativa nas respostas dos alunos, atuando não só nesta questão, mas em todas as demais (cf.cap. 3 e 4).

Os sujeitos investigados reconhecem a situação de pesquisa na qual estão inseridos, bem como os objetivos do estudo, logo, suas respostas podem vir a ser influenciadas por este nível de estrutura de expectativa. Um dos primeiros aspectos que podemos destacar como influenciando a resposta dos alunos, portanto, diz respeito ao contexto mais amplo da produção da escrita, relativo à situação de experiência na qual eles se encontram. Os sujeitos investigados sabem que estão participando de uma pesquisa e conhecem o objetivo do experimento, uma vez que isto lhes foi explicado oralmente e também está constando na primeira página do instrumento investigativo:

Prezado jovem,

As suas respostas às perguntas abaixo representam uma grande contribuição para com uma importante pesquisa que estamos desenvolvendo na Universidade Federal de Juiz de Fora. Tal pesquisa pretende contribuir para a melhoria de nosso ensino e, para tanto, precisamos saber sua opinião FRANCA e HONESTA sobre a realidade de sua escola, de sua sala de aula. Como aluno-cidadão, contamos com você!

Nossos agradecimentos,

Equipe do Projeto Educação da Oralidade – UFJF/CNPq

Por este motivo, é importante ressaltarmos que algumas respostas podem não representar apenas as ações freqüentes, mas também uma estratégia de denúncia, crítica ou outros desejos do aluno com o intuito de promover mudanças, uma vez que podem ver nos pesquisadores alguma janela em direção às transformações desejadas.

Outro nível de estrutura de expectativa atuante no momento em que os alunos responderam ao questionário foi aquele relativo à experiência quase diária dos educandos com a moldura comunicativa de uma aula. Os alunos são inquiridos a falar sobre uma experiência concreta de vida, na qual se vêem como atores centrais. A vivência cotidiana no cenário escolar faz com que os alunos já possuam expectativas quanto aos atores desta cena, seus papéis, os espaços, as tarefas, os deveres, as regras etc. As maneiras como eles percebem as experiências das interações e as formas como as guardam em suas memórias está intimamente relacionada às repostas dadas, visto que as perguntas do instrumento levam os sujeitos a refletirem, justamente, sobre a cena vivida na escola (cf.seção 4.1.1).

As teses evolucionistas do antropólogo Michael Tomasello (1999 e 2003), apresentadas nos capítulos 2 e 3, nos mostram que a escola é uma criação social simbólica, cujo objetivo é transmitir a herança cultural acumulada pelo homem ao longo de sua história. A herança cultural humana aumentou a tal ponto que se tornou trabalhoso, senão improvável,

a transmissão unicamente familiar, por este motivo foi necessária a criação de uma instituição que atendesse às necessidades das novas sociedades. Há, portanto, um conceito de escola, e, em conjunto, um conceito de aula que povoa a mente da população de uma determinada sociedade e cultura e reflete seus anseios e expectativas em relação à instituição. O aluno, como membro desta sociedade, compartilha destas concepções e reproduz o discurso da sociedade, por isso podemos destacar ainda mais este nível de estrutura de expectativas, relativo ao frame Aula transmitido na sociedade.

Este breve detalhamento de alguns dos níveis de frame que compõem o objeto de pesquisa nos ajuda a trabalhar sobre os dados com consciência em relação à possibilidade das diferentes estruturas de expectativa comparecerem no processo de escrita dos alunos e, consequentemente, marcarem os resultados da pesquisa. Esta consideração vale, igualmente, para todas as questões do instrumento investigativo.

5 A ANÁLISE DOS DADOS

Prefiro quando o espectador sai com perguntas ao invés de respostas. (Louis Malle)

A análise do corpus específico utilizado na presente pesquisa, constituído a partir do instrumento investigativo aplicado ao 6º e 9º ano do Ensino Fundamental da rede municipal pública de ensino de Juiz de Fora – MG, será dividida pelas quatro questões propostas por esse instrumento (cf. seção 4.1.1) e terá como unidade conceptual de análise principal o conceito de frame. Sustenta-nos, assim, a afirmação fillmoriana (FILLMORE, 1977, p.59) de que “os significados são relativizados às cenas” (cf. seção 3.3). Nesses termos, evocando, em todas as quatro questões, a palavra ‘aula’ como a unidade lexical (UL) nuclear de nossa investigação, nosso intento é desvelar as cenas conceptuais/frames a que tal UL se vincula

na perspectiva dos alunos. Dito de outro modo, interessam-nos os significados que tais

sujeitos atribuem à experiência cultural de ‘aula’ da qual participam cotidianamente; de que modo tal significado se aproxima ou se afasta das cenas conceptuais prototípicas instanciadas em nossa cultura.

O seguinte quadro de questões e objetivos analíticos conduz nosso trajeto: 1. Questão 1: Para você, o que é uma aula?

• Objetivo: desvelamento do significado da categoria ‘aula’ promovido pela perspectiva dos alunos investigados, através das cenas conceptuais/frames por eles instanciados;

2. Questões 2 e 3: O que os seus professores fazem nas aulas? O que vocês,

alunos, fazem nas aulas? Dê exemplos de suas ações mais comuns, freqüentes ou rotineiras.

• Objetivo: Análise das práticas escolares rotineiras de alunos e de professores em seu processo de interação, através das descrições das ações apresentadas pelos alunos. O intento é confrontar tais descrições com o(s) frame(s) vinculado(s) à ‘aula’, emergente(s) na primeira questão;

3. Questão 4: Para você, o que é um boa aula?

Objetivo: Análise da significação ideal proposta pelos alunos para a cena. A normatização idealizada da cena será confrontada com as conceptualizações e descrições anteriores.

No encalço de tais metas, nossas análises buscam, nos distintos atos de linguagem promovidos no discurso dos alunos, as palavras ou ULs (Nomes, Adjetivos e, principalmente, Verbos) e suas relações, isto é, o conjunto de papéis semânticos ou Elementos do Frame (EFs) que nos apontarão os frames evocados. Os resultados do 6º e 9º ano são confrontados em todo o percurso analítico de modo a observarem-se as continuidades e/ou rupturas significativas ao longo da escolaridade.

Conforme anunciado na Introdução, partimos da seguinte hipótese com relação aos ambientes públicos de interação: nestes contextos se instaura, presentemente, uma crise de valores que é sinalizada por práticas interacionais e lingüísticas conflituosas. Assim, as análises lingüísticas promovidas por este estudo buscam desvelar os papéis, os saberes e valores que perpassam a cena educacional, na perspectiva dos alunos, de modo a tentar encontrar os sinais da “crise da sala de aula” e uma possível maneira de contribuir para a sua compreensão e enfrentamento em nossa realidade.

No documento fernandaraqueloliveiralima (páginas 75-79)