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Da Contribuição dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa

No documento fernandaraqueloliveiralima (páginas 37-39)

Desenho 2 Professor Ideal

2.4 Da Contribuição dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa

Como foi exposto na seção anterior, até a década de 80 o ensino de língua portuguesa baseava-se nas propostas das pedagogias tradicional e progressista. Somente após os anos 80 inicia-se uma nova reflexão sobre o ensino de língua materna nas escolas brasileiras, motivada pelo florescimento de pesquisas nos campos da Lingüística e de outras áreas preocupadas com as questões educacionais. As críticas aos modelos tradicional e progressista e as novas propostas para o ensino de Língua Portuguesa, já discutidas anteriormente, foram incorporadas por secretarias de educação estaduais e municipais, contribuindo para o estabelecimento de novos currículos e criação de cursos de formação e aperfeiçoamento de professores. A adoção das discussões contemporâneas sobre a linguagem pelos órgãos competentes municipais e estaduais resultou na formulação de documentos oficiais federais (Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs) que visam a subsidiar discussões sobre currículo e práticas pedagógicas, planejamento de projetos educativos e aulas, análise de material didático e outros recursos, além de formação e atualização dos profissionais da educação. Os

PCNs constituem, portanto, um importante instrumento de divulgação das discussões travadas nas academias para todos os envolvidos no processo educativo.

Os PCNs de Língua Portuguesa do terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental expõem em seus objetivos não só as propostas de mudança no ensino da língua escrita – calcado na progressão dos gêneros textuais e com reflexões metalingüísticas bastante diferenciadas daquelas contempladas pela gramática tradicional –, mas, também, as propostas de inserção do estudo da linguagem oral nas aulas de Língua Portuguesa. Nos termos do documento (SEF, 1998, p.24 e 25), a modalidade oral da língua é utilizada nas salas de aula apenas como instrumento para o tratamento dos mais diversos conteúdos, para interação dialogal durante as aulas, sem a contemplação de um estudo sistemático dos gêneros da oralidade. Isso porque se considera que o aluno “já dispõe de competência discursiva e lingüística para comunicar-se em interações que envolvem relações sociais de seu dia-a-dia, inclusive as que se estabelecem em sua vida escolar” (Idem, p. 1998:24).

Certamente, o aluno já domina bem os usos privados da oralidade (bate-papo, conversa telefônica, “causo”, piada etc.), nos quais faz uso de sua variante e dos padrões interacionais específicos do uso privado do oral. Contudo, existem diferentes gêneros orais institucionais públicos (palestra, aula, entrevista de emprego, conferências etc.) que fazem exigências diversas, tais como o uso da variante padrão, regras e padrões interacionais mais rígidos, papéis discursivos bem delimitados, hierarquia entre os participantes etc.. O aprendizado destas exigências (como agir, o que falar, quando falar, quando calar, que variante usar, qual o grau de formalidade etc.), implica um trabalho sistemático e rotineiro dos gêneros. Este trabalho cabe, em especial, ao professor de Língua Portuguesa, mas é tarefa, também, de todo professor, “independente da área, ensinar (...) os procedimentos de que o aluno precisa dispor para acessar os conteúdos da disciplina que estuda” (Ibidem, p. 1998:32).

A preocupação com a inserção do ensino do uso oral público da linguagem é questão explícita nos PCNs, contribuindo para que a crescente discussão sobre a prática e pressupostos que subjazem ao ensino de língua passe da teoria para a prática. É certo que a transposição dos PCNs para a prática pedagógica ainda se configura como mais um obstáculo a ser vencido, mas tal documento já se apresenta como um avanço ao legitimar as pesquisas desenvolvidas nos importantes centros de pesquisa brasileiros e internacionais, rompendo com uma prática educacional de tradição secular.

A educação da oralidade nos PCNs de Língua Portuguesa prevê a inclusão do aprendizado dos gêneros orais institucionais públicos, importantes para as diferentes situações sociais do exercício da cidadania; e o aprendizado da necessidade de adequação da linguagem

às inúmeras circunstâncias de uso, o que implica uma discussão preocupada sobre variação lingüística. De acordo com o que é exposto nos PCNs (1998, p.31), a perpetuação de crenças preconceituosas sobre a linguagem levou a uma prática educacional de “mutilação cultural” que precisa, urgentemente ser reparada, por um estudo consciente do fenômeno da variação e substituição da noção de erro pela noção de adequação às condições do contexto de produção.

Miranda (2005) aponta para a necessidade da educação da oralidade com um objetivo que contemple, de modo mais amplo, o aprendizado dos gêneros orais públicos como uma forma de estar apto para “as situações sociais do exercício da cidadania que se colocam fora dos muros da escola” (SEF, 1998, p.25). A autora sinaliza uma relação entre a educação da oralidade e a educação de valores éticos e morais de modo a se enfrentarem as práticas interacionais conflituosas vigentes em nossa sociedade, nas quais faltam delicadeza, polidez; nas quais não há atenção e intenção partilhada entre os interlocutores, não há o reconhecimento dos limites hierárquicos, das regras que organizam os diferentes papéis comunicativos nos diversos contextos. Enfim, são práticas que nos convidam, ou mesmo convocam, para a educação da oralidade em sua relação com valores de cidadania. Os temas transversais (ética, pluralidade cultural, meio ambiente, saúde, orientação sexual, trabalho e consumo), propostos nos PCNs para o trabalho integrado de várias áreas, podem vir a contribuir para este projeto educativo.

Este é, pois, um novo olhar sobre a educação da oralidade que considera a questão da variação lingüística, mas a ultrapassa, propondo uma equação mais forte entre educação da oralidade e educação de valores. É sobre estas duas questões que passamos a discorrer nas próximas seções.

No documento fernandaraqueloliveiralima (páginas 37-39)