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O Gênero oral Aula

No documento fernandaraqueloliveiralima (páginas 48-50)

Desenho 2 Professor Ideal

2.7 O Gênero oral Aula

Na atualidade já é possível vislumbrar um número considerável de pesquisas voltadas para a linguagem com ênfase na educação da oralidade (incluindo o viés da educação de valores), como pode ser observado nos trabalhos apresentados na seção 2.5 e outros com igual importância. A proposta de pesquisa desta dissertação soma-se às demais pesquisas sobre educação da oralidade nos esforços de incluir um espaço no ensino de Língua Portuguesa, e na escola como um todo, para as práticas sociais de oralidade juntamente com as práticas de letramento.

O foco específico deste trabalho é, conforme já explicitamos, a forma como os alunos concebem um gênero da oralidade institucional, a aula, na tentativa de identificar os papéis, os saberes e os valores que perpassam esta cena educacional e, a partir disto, identificar os sinais da “crise da sala de aula” na perspectiva de um de seus atores, o aluno.

Segundo Lima et al (2006, p.58), "o trabalho com os gêneros da oralidade se dá num processo, que precisa ser iniciado na primeira série do ensino fundamental, quando deveria ser trabalhado o gênero aula (uma nova moldura comunicativa que fará parte da vida do aluno por pelo menos mais oito anos)”.

Teixeira (2001), ao observar a forma como as crianças de uma pré-escola vão “alunando-se”, ou seja, a forma como elas migram de uma “estado de esquina de rua” para um “estado de estudante” (MACLAREN, 1991. Apud: TEIXEIRA, 2001) e começam a aprender, paulatinamente, as regras de uma sala de aula, aponta para a existência de “saberes que fazem parte do currículo oculto da sala de aula (...) tão importantes para o sucesso na carreira de aluno quanto os saberes do currículo manifesto” (TEIXEIRA, 2001, p.220). Esse “currículo oculto” é composto pelas regras específicas da cultura interacional da sala de aula, que garantem o bom convívio entre os alunos, entre eles e seus professores, entre eles e o espaço e tempo escolar, entre eles e os conteúdos etc. De acordo com a autora, a professora da turma observada age, de maneira não explícita, “regulando o ‘modo de estar’ do aluno, vai aos poucos ensinando que ali há uma ‘etiqueta’ que devem cumprir ao se relacionarem com o colega e com ela própria, que ali há necessidade de uma certa habilidade para ‘estar - junto’” (Idem, 2001, p.219). Como o aprendizado da “etiqueta escolar” não se dá de forma explícita, os alunos podem vir a aprendê-la pelo constrangimento, muitas vezes imposto àqueles que não percebem as necessidades da nova moldura enunciativa na qual estão inseridos.

Os problemas observados na educação brasileira nos dias atuais não são apenas os reiterados problemas na formação do professor ou na formulação do currículo, mas um

problema contemporâneo de falta de postura interacional e Lingüística no espaço escolar e em muitos outros cenários de interação. As salas de aula são muitas e variadas, mas elas se parecem, e, hoje, a cena predominante é a apresentada por Miranda (2005, p.163):

A cena escolar. Hora da aula. Que aula? Dez, quinze minutos tentando, desesperadamente, conseguir que os alunos se sentem e façam silêncio. Pronto. Sentados estão. Onde? Sobre a carteira estão pernas, braços, cabeça. O jeito é inaugurar uma nova pedagogia: escola é lugar ‘gostoso’, onde aluno só fica se puder passar o tempo em aulas de falação, ouvindo as músicas de que gosta, curtindo o papo que elege. Professor bom tem que ser um ‘animador cultural’. Uma pedagogia do barulho se impõe. Leitura, estudo, palestras, conferências, teatro, excursões? Nem pensar! Ninguém faz essa turma se calar.

A aula, entendida como um gênero oral institucional público, deve estar presente, junto com outros gêneros orais públicos, no “currículo manifesto”, uma vez que constitui um aprendizado das práticas interacionais e lingüísticas de um gênero altamente funcional na vida dos alunos. Tal gênero encontra-se, em todos os momentos da história, em uma intrincada relação com a sociedade, na qual o reflexo de uma sobre a outra é frequentemente sentido. Considerando, portanto, que a sociedade passa, constantemente, por profundas modificações, é de se esperar que o gênero aula esteja sempre se adaptando às novas exigências desta. Sendo assim, para ensiná-lo, é preciso desvendá-lo, reconhecer nele quais aspectos da sociedade contemporânea têm prevalecido, como os atores desta cena pensam esta interação no dias de hoje. Com este objetivo, reforçamos o caráter dinâmico, flexível (relativamente estável, segundo BAKHTIN (2003)) das molduras interacionais e, ao mesmo tempo, o caráter de estabilidade. Segundo Miranda (2005, p. 169), “flexibilidade e estabilidade se conjugam na preservação de qualquer organismo vivo ou social e, assim, toda e qualquer ordem discursiva implica um conjunto de regras culturais, de condições e práticas que governam a interação lingüística.” Desta forma, atentamos para as mudanças, mas reivindicamos, também, a legitimidade de padrões interacionais e lingüísticos que regulam as molduras comunicativas, sem os quais, não há nem mesmo como reconhecer um gênero como resultado de uma convencionalização de uma prática.

3 UM RECORTE TEÓRICO SOCIOCOGNITIVISTA

Conforme anunciado na introdução e reiterado no segundo capítulo, o foco investigativo da presente pesquisa, seu objeto de análise, é o discurso produzido pelos sujeitos investigados: alunos do sexto e nono ano da rede pública municipal de ensino de Juiz de Fora – Minas Gerais. O objetivo é buscar entender, através do discurso produzido pelos alunos em um instrumento investigativo, a forma como estes sujeitos concebem o frame Aula e os papéis dos atores nesta cena. Desta forma, faz-se necessário explicitarmos, inicialmente, o que entendemos por discurso e, ainda, por análise do discurso; perspectiva que será apresentada na primeira parte deste capítulo com base, principalmente, nos estudos de van Dijk (1997) e nas contribuições da Lingüística Pragmática.

Em seguida, serão expostos os pressupostos teóricos nucleares que guiam essa análise do discurso dos alunos/sujeitos da pesquisa: uma vertente dos estudos cognitivos da linguagem, principiada nas pesquisas lingüísticas desenvolvidas na Califórnia, no final da década de setenta, por Lakoff (1987), Lakoff e Johnson (1999, 2002), Fauconnier e Turner (2002), Fillmore (1977, 1979, 1982 e 2006), entre outros. Na afirmação da tese do caráter interacional e cultural da cognição humana e da linguagem, nos apoiaremos, ainda, nas contribuições de Tomasello (1999, 2005), Clark (1996) e outros.

No documento fernandaraqueloliveiralima (páginas 48-50)