• Nenhum resultado encontrado

2 CAPÍTULO 1 PARADIGMA DOMINANTE, CRISE E

2.4 Algumas palavras sobre o paradigma flexneriano e o paradigma da

As comunidades científicas, segundo Khun (1997), são caracterizadas por seqüências de entendimentos tácitos compartilhados, que são os paradigmas. O verdadeiro progresso científico é descontínuo e só ocorre quando um paradigma é substituído por outro, que substitui o primeiro; no momento em que as explicações para os fenômenos não satisfazem, instaura-se uma crise paradigmática.

No pensamento crítico que vai desaguar na Reforma Sanitária, no Brasil, o termo paradigma vem sendo usado para explicitar o modelo hegemônico de educação médica, influenciado pelo relatório Flexner, e que vem sendo designado como paradigma flexneriano. Importante ressaltar que as recomendações de Flexner no que se refere à parte social e humana, não foram seguidas.

No Brasil, o modelo norte-americano aporta com toda a força em função do golpe militar de 1964, embora rondasse nosso país desde 1950, mas não era hegemônico; o modelo brasileiro na época era o europeu-eclético (ROS, 2004).

As pesquisas da medicina social contrariam a perspectiva hegemônica da medicina do capital, ao apontar para mudanças sociais, para o aumento de salários e para os direitos sociais trabalhistas, que se contrapõem à organização da produção desenvolvida no mundo desde o início do século XIX.

Chaves (2000) usa a noção de “transição paradigmática” como metáfora para a educação médica, pois a expressão paradigma flexneriano é de uso corrente, embora ciente de que os conceitos de Khun não se aplicam fora do mundo da ciência. Explicita que “não se pense que a transição paradigmática será tarefa fácil. Trata-se de uma desconstrução e reconstrução, a serem feitas sincronicamente. É como reformar uma casa que continua sendo habitada” (CHAVES, 2000, p.11).

No Brasil, predominava a influência da escola médica francesa; depois, a ibérica. A partir da Reforma Universitária de 1968 (Lei 5.540/68), passa-se a adotar oficialmente o modelo americano. Os departamentos contendo disciplinas substituem as cátedras; o ensino fica dividido em ciclo básico e ciclo profissionalizante (com disciplinas ditas profissionalizantes). Esse último ciclo é denominado profissionalizante por conter a especialidade e o Internato Curricular (estágio hospitalar). Desta forma os currículos médicos têm uma estrutura que propicia acrescentar conhecimentos, com o surgimento de novas disciplinas. A estrutura flexneriana acentua o que no mundo social se sedimentava: o

individualismo, o modelo hospitalocêntrico, a ambiência biologicista (que alijou filosofia e ética das possibilidades da ciência se pensar) e a fragmentação com as especializações.

Durante a década de 50, várias conferências e seminários discutiram as diretrizes da medicina preventiva, destacando-se, em l952 a de Colorado Springs, da Associação Americana de Colégios Médicos; em l953, a de Nancy, das Escolas Européias; em 1953, o Primeiro Congresso Mundial sobre Educação Médica, realizado em Londres; em 1955, a Conferência de Educação Médica na Índia; em l958, a Conferência Regional do Pacífico, em Manila; e a Conferência de Medicina Preventiva no Irã (LAMPERT, 2002).

As escolas médicas latino-americanas foram influenciadas por essas discussões, que gestavam a idéia de um novo paradigma capaz de se contrapor ao modelo flexneriano. Os seminários de Vinã del Mar (Chile),em 1955, e Tehuacán (México), em 1956, sob auspício da Opas/OMS (GARCIA, 1972), influenciaram também a idéia de um novo paradigma, com o advento da proposta da medicina preventiva.

No ano de 1978, vê-se um marco histórico relevante: a Declaração de Alma-Ata, sob o lema utópico “Saúde para todos no ano 2000”. Porém, só em 1986, na Conferência de Otawa, foi formulada, oficialmente a proposta Promoção da Saúde, ampliando o entendimento de saúde como qualidade de vida, identificando determinantes da saúde além da esfera do biológico.

No Brasil, os dois marcos históricos fundamentais na medicina preventiva e da promoção da saúde, foram a VIII Conferência Nacional da Saúde (1986) e o movimento da Reforma Sanitária (1988), que repercutiram na Constituição Brasileira de l988, artigo 196: Saúde é direito de todos e dever do Estado.

O campo da saúde está vinculado às disputas políticas e à construção do Sistema Único de Saúde, que tenta superações do modelo anterior, embora ainda obedecendo a uma visão de mundo fundada nas teorias do Estado de Bem-Estar Social, que resultou por anteceder as idéias neoliberais que marcaram os governos brasileiros da década de 90 (CORDEIRO, 2001).

Lampert (2002) relata a análise do paradigma flexneriano na escola médica, com as seguintes características:

[...] predominância de aulas teóricas, enfocando a doença e o conhecimento fragmentado em disciplinas; pelo processo ensino-aprendizagem estar centrado no professor em salas de aulas expositivas e demonstrativas; pela prática desenvolvida predominantemente no hospital; pela capacitação docente centrada unicamente na competência técnico-científica; e pelo mercado de trabalho no consultório tradicional.

Quanto à assistência primária, o problema não é somente o reduzido número de clínicos gerais, mas também a abordagem da assistência (super) especializada, fragmentada, centrada na doença. Deve-se lembrar que a dimensão biológica (o corpo físico do sujeito que adoece) é vivida por um sujeito concreto, multidimensional, cujas dimensões psicossocial, cultural, e também espiritual são constituidoras desse sujeito. Morin (1999), em suas reflexões sobre complexidade, mostra como este modelo é redutor, em especial porque ele coloca em pauta apenas um aspecto do sujeito: a dimensão biológica.

Com o modelo hospitalocêntrico, vê-se a legitimação do descaso com a atenção primária; nele, as ciências da saúde funcionam como um braço para a reprodução do capital. Também aí se reitera o domínio do branco colonizador, que alijou as contribuições do feminino e da sensibilidade, dando-lhes minoridade intelectual; nesse contexto, também a espiritualidade foi vista de uma forma redutora.

No bojo dos movimentos sociais, e com o advento da medicina preventiva nas décadas de 60/70, a Conferência de Alma Ata na Rússia, em 1978, e no âmbito de conferências mundiais de educação médica, delineou-se no ocidente a construção de um novo paradigma, denominado por alguns de Paradigma da Integralidade, para formar profissionais de saúde.

No Brasil, conforme mencionado anteriormente, a VIII Conferência Nacional de Saúde (1987), o movimento da Reforma Sanitária, a Constituição Brasileira (1988), e mais recentemente (2001) a homologação das Diretrizes Curriculares (MEC/CNE), dão uma seqüência de consolidação em leis e decretos ao encaminhamento para as mudanças nas ações de saúde e na formação de recursos humanos, com preparação adequada para prestar uma assistência de qualidade em saúde, com abordagem integral, interdisciplinar, multiprofissional e eqüitativa.

As contestações, reflexões acerca da exaustão do modelo tradicional no ensino médico (flexneriano) haviam ocorrido em nível mundial. A sociedade civil, claramente insatisfeita reivindicou mudanças na formação de profissionais voltados para suas necessidades e realidades. O Brasil acompanhou essa avaliação e o repensar do ensino médico. Na verdade, o que construiu o solo fundante dessas contestações e revisões paradigmáticas foram as pressões dos movimentos sociais pelo direito à saúde que, como vimos, explicita uma crise de legitimidade nas diretrizes que lhe dão suporte e às instituições que formam os profissionais.

O Paradigma da Integralidade é, assim, a perspectiva que denomina o novo enfoque assumido pelo curso médico da UFC, desde 2001, e que configura a necessidade de superação dos reducionismos do modelo biomédico. Esta perspectiva contextualiza o ser humano em seu meio ambiente e tenta contemplar a sua complexidade étnica, social e cultural. Ao apontar

para o processo saúde-doença, objetiva enfatizar mais a saúde do que a doença, visando à promoção, à preservação e à recuperação da saúde; concebe, desse modo, a doença como uma intercorrência da saúde, que deve ser evitada.

O processo ensino-aprendizagem propõe-se a estar mais centrado no aluno e em seu papel ativo na própria formação. O ensino da prática almeja ocorrer no sistema de saúde existente, em graus crescentes de complexidade, voltado para as necessidades básicas de saúde. A capacitação docente deverá ser voltada tanto para a competência técnico-científica quanto para a competência didático-pedagógica, de modo que a participação do estudante, desde a universidade fique comprometida com o sistema único de saúde.

Segundo Campos et al. (2001), o paradigma da integralidade tem como objetivo, no que se refere aos cursos de graduação do profissional da saúde, uma formação mais contextualizada, que leve em conta as dimensões sociais, econômicas e culturais da população; portanto, o profissional da saúde deverá estar capacitado para enfrentar os problemas do processo saúde-doença, de forma contextualizada. Também inclui uma atuação interdisciplinar e multiprofissional que respeite os princípios do sistema único de saúde. Esse paradigma visa o equilíbrio entre a excelência técnica e a relevância social. Para isso, o currículo médico deverá ser integrado numa relação de parceria entre a universidade e as comunidades, os serviços, os grupos comunitários e movimentos sociais. A educação não deverá se esgotar na graduação, e sim ser compreendida como um processo permanente. Como estão sendo construídos passos para alcançar esse devir? As contradições do capital mundializado se fazem presentes neste ambiente formador. Que aspectos apontam rupturas e preparam que novas perspetivas se instaurem na formação em medicina?

Novas orientações se fazem necessárias na área de pesquisa em saúde, pois além do aprimoramento tecnológico, deveremos, como docentes, responder às realidades da comunidade, na tentativa de fazer reverter um quadro de desigualdades sociais; também devemos pensar em termos de humanização das práticas médicas que incorpore novas referências da experiência social em curso.

Nesses tempos de reflexão e mudança de paradigma, deve-se compreender que para o processo ensino-aprendizagem no século XXI, há necessidade de um esforço transdisciplinar que seja capaz de rejuntar ciências e humanidades e romper com a oposição entre natureza e cultura. Morin (2003) em seu livro Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro, explana que toda sociedade e toda cultura, deve tratar segundo modelos e regras próprias a cada um dos seguintes aspectos:

As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão. É necessário introduzir e desenvolver na educação o estudo das características cerebrais, mentais, culturais dos conhecimentos humanos, de seus processos e modalidades, das disposições tanto psíquicas quanto culturais que o conduzem ao erro ou à ilusão. Os princípios do conhecimento pertinente. [...] É preciso ensinar os métodos que permitam estabelecer as relações mútuas e as influências recíprocas entre as partes e o todo em um mundo complexo. [...] Ensinar a condição humana. O ser humano é a um só tempo físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórioco. [...] Ensinar a identidade terrena.[...] Será preciso indicar o complexo de crise planetária que marca o século XX, mostrando que todos os seres humanos, confrontados de agora em diante aos mesmos problemas de vida e de morte, partilham um destino comum. [...] Enfrentar as incertezas. [...] A educação deveria incluir o ensino das incertezas que surgiram nas ciências físicas (microfísicas, termodinâmica, cosmologia), nas ciências da evolução biológica e nas ciências históricas. [...] Ensinar a compreensão. A compreensão é a um só tempo meio e fim da comunicação humana. [...] A ética do gênero humano. [..] A educação deve contribuir não somente para a tomada de consciência de nossa Terra-Pátria, mas também permitir que esta consciência se traduza em vontade de realizar a cidadania terrena. (MORIN, 2003, p.11-18).

Assim é que, observarmos, porém, que ao orientarmos e tentarmos caminhar na direção de executar, com os alunos do curso de medicina, essas diretrizes do novo paradigma, percebemos que o modelo biomédico necessita ser revisto e contextualizada a sua abordagem social; ainda, necessita-se ampliar nossa visão de sujeito das práticas de saúde, de modo a comportar um sujeito multidimensional.

Desse modo é que objetivo a estudar as narrativas que se dão nos percursos de adoecimento e cura tentando descrever como os sujeitos que vivem essas experiências tentam dar significado a elas, recorrendo à dimensão da Espiritualidade. Nessa perspectiva, devo ir problematizando as fendas e limites de nossa prática social calcada no modelo biomédico.

A Associação Nacional de Educação Popular em Saúde – ANEPS, constituída por grupos populares em todo o país, tem colocado, dentre suas temáticas mais discutidas, a Espiritualidade como dimensão fundamental nas práticas sociais em saúde. A Rede Unida, formada por educadores em saúde, técnicos da área em todo o território nacional e que influencia as políticas públicas e educacionais em saúde, vem discutindo de forma importante a Espiritualidade nas práticas de saúde.

O Sistema Único de Saúde está implantando técnicas alternativas em saúde, como Reike, massoterapia, meditação, rezadeiras e outras práticas, que dizemos situadas no contexto da Espiritualidade. Além disso, Ken Wilber, psicólogo e grande estudioso do assunto, desenvolve bases para novos paradigmas emergentes e tem sido referência para os trabalhos de Cipriano Luckesi e sua equipe da Universidade Federal da Bahia, que trabalha práticas lúdicas com um corpo de conhecimento mais largo, como visão de sujeito. Nomeadas estas práticas sociais de espiritualidade, podemos ver que são questões que ultrapassam o paradigma biomédico.

Por que não comportar a pergunta, que se gestou em especial no movimento popular em saúde, por essa dimensão esquecida, a espiritual, e dar consistência teórico – prática a essa questão, vital para a educação médica, no contexto em que nos encontramos, de consolidação do Paradigma da Integralidade?

2.5 Algumas reflexões sobre a espiritualidade e a bioética

Sabedoria absoluta, esta não existe senão em Deus. Paulo Freire (2006, p.16)

Nesta reflexão sobre ética, faço minhas as palavras de Incontri (1996), que em sua fala explicita que toda concepção de ética depende da concepção de ser humano que se tem. A concepção materialista, compreende o ser humano como um animal que tem racionalidade, herdeiro de sua carga genética, um “pacote” de células, regido por instintos que passa por um processo social no qual indivíduos adquirem habilidades, conhecimento, valores e os papéis consonantes com sua posição em um grupo ou sociedade. “A socialização é a transformação de um pacote de células em um ser social” (REGO, 2003).

Os marxistas dizem que o ser humano é produto de sua classe social. Vigostk diz que toda aprendizagem do ser humano vem de sua relação com o meio. As teorias nihilistas dizem que o ser humano não é nada, o ser e o nada de Sartre.

O materialismo é dogma, é um pressuposto filosófico, pois ninguém provou a inexistência da alma e a inexistência de Deus. E a população terrestre em sua grande maioria, tem algum tipo de religiosidade. A compreensão materialista sociológica diz que a religião é um fenômeno sociológico, uma convenção social (DURKHEIM, 1989). Para esta vertente de estudos, a ética é uma convenção social, os princípios éticos são produtos de uma sociedade numa determinada época. A conseqüência imediata deste entendimento é que podemos criar uma ética de acordo com nossos interesses, por exemplo, os nazistas tiveram ou têm sua ética, assim como a máfia possui sua ética.

Na perspectiva espiritualista, o ser humano é um ser espiritual, além de biológico, social, psicológico, cultural, ecológico e cósmico.

Frankl (2006), psiquiatra austríaco que passou por quatro campos de concentração diz que o ser humano além da impulsividade inconsciente, possui o inconsciente espiritual; “o

inconsciente não se compõe unicamente de elementos instintivos, mas também espirituais”. A dimensão espiritual nesta compreensão vai além do aspecto religioso; possui uma vertente valorativa, intelectual e artística. Como terapeuta experiente descobriu a religiosidade em estado latente no interior do sujeito, muitas vezes só revelada através da análise dos sonhos, inclusive de pessoas irreligiosas. Frankl (2006) denomina tendência inconsciente para Deus ou estado inconsciente de relação com Deus; e constatou em seus estudos que às vezes nossa relação com Deus pode ser inconsciente, ou reprimida, e assim oculta para nós mesmos.

Em seu trabalho terapêutico, Frankl (2006) fala do objetivo de tornar conscientes vários aspectos reprimidos, inclusive a religiosidade reprimida, que ocorre quando a relação com a transcendência está perturbada. Afirma que quando a fé na escala individual se atrofia, transforma-se em neurose e, na escala social, degenera em superstição. Mostra também que o sentimento religioso natural tem sido vítima da repressão por parte da razão instrumental ou da inteligência tecnicista.

A análise existencial de Frankl (2006) tem por objetivo o ser humano, não como ser impulsionado, mas como ser responsável, a sua existência espiritual, o eu se torna consciente de si mesmo; a autonomia da existência espiritual e descobriu dentro da espiritualidade inconsciente do homem, algo como religiosidade inconsciente no sentido de um relacionamento inconsciente com Deus, de uma relação com o transcendente que é imanente no ser humano, embora muitas vezes permaneça latente. Revela que sempre existiu no ser humano uma tendência inconsciente em direção a Deus, que sempre tivemos uma ligação intencional embora inconsciente com Deus.

Dr. Michael Persinger neurobiólogo canadense, através de estudos com tomografia com emissão de pósitrons, que permitem o estudo funcional do cérebro, constatou que no lobo temporal direito do ser humano, ocorre uma ativação sempre que a palavra Deus ou similar é pronunciada. A pesquisa foi realizada com pessoas de diferentes culturas, e essa região anatômica foi denominada pelo pesquisador de “ponto de Deus”. Os estudos sugerem que os seres humanos são programados genéticamente para acessar a divindade (ZOHAR, 2002). A atividade do lobo temporal tem sido ligada há anos às visões místicas de epilépticos e de indivíduos que tomavam LSD, porém em 1997 o neurologista Vilayanu Ramachandran e sua equipe na Universidade da Califórnia, demonstrou que a mesma área está ativa em pessoas normais, quando se menciona Deus. O ponto de Deus não prova a existência de Deus, mas demonstra que o cérebro evoluiu para fazer as perguntas finais, para ter e usar sensibilidade a sentido e valores mais amplos (ZOHAR, 2002). São indícios acerca da imanência divina no ser humano.

Zohar (2002) em seus estudos compreende que a inteligência total do ser humano se completa com o quociente espiritual. A pesquisadora explica o referido quociente como:

A inteligência com que abordamos e solucionamos problemas de sentido e de valor, a inteligência com a qual podemos pôr nossos atos e nossa vida em um contexto mais amplo, mais rico, mais gerador de sentido, a inteligência com a qual podemos avaliar que um curso de ação ou caminho na vida faz mais sentido do que outro. O Quociente Espiritual é a fundação necessária para o funcionamento eficiente do quociente intelectual e do quociente emocional. É a nossa inteligência final (ZOHAR, 2002).

Sócrates (470-399 a.C.), é o pai da ética no ocidente. Através da maiêutica, a filosofia do diálogo, um parto espiritual, compreendeu que todo ser humano tem a verdade dentro de si. Os princípios morais não são criações da sociedade; estão embutidos em nossa consciência, pois constituem a presença de Deus em nós. Trazemos todos uma imanência divina em nós. Rousseau dizia que a maior prova que temos princípios éticos em nós é a sensação de remorso. O Cristo nos disse que o “reino de Deus está em nós". Na perspectiva socrática, temos idéias inatas de moralidade, do bem, da justiça. Esta compreensão é uma inversão copernicana; a ética é algo que está dentro de nós, que sentimos. Todos os seres humanos possuem esses princípios, e essa idéia é libertária e igualitária. Todos os seres humanos podem ser bons, todos os seres humanos devem ser livres. A ética é imanente ao ser humano. Na perspectiva socrática, a educação favorece o desabrochar das potencialidades divinas da alma, o indivíduo é ignorante de si mesmo (INCONTRI, 1996).

O processo de formação na escola médica, que é o local de minha prática profissional específica, onde pode-se dizer que ocorre um fenômeno denominado “coisificação do ser humano”, resultante do modelo biomédico hegemônico, resultando na reificação do paciente como objeto.

Espiritualidade é um termo polissêmico, porém pode-se afirmar que nesta perspectiva o ser humano é um ser espiritual, com uma vertente, biológica, social, cultural, ecológica, psicológica e cósmica. Neste paradigma, a integralidade do ser humano é melhor explicitada.

É relevante a perspectiva da espiritualidade, é uma compreensão contra-hegemônica, que contribui para uma abordagem ampliada da vida pessoal e profissional, contribui para vivências de valores éticos capazes de gerar transformação na superação de si mesmo e da sociedade; a ética do ser, do bem, da fraternidade e melhores condições morais.

O século XX foi a época na história da humanidade em que mais se falou do ser humano e dos seus direitos. Sob domínio da economia e da política, também foi o tempo em que se verificaram as maiores violações desses mesmos direitos. Vive-se uma tão falada crise