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Castells conta a história da Internet, não fazendo propriamente uma resenha histórica, mas fazendo referência a alguns ensinamentos importantes, que, de forma aprazível, dá a conhecer através de episódios que designa por lições.

Na primeira lição sobre a Internet, é referido pelo autor que ela resulta de uma curiosa combinação entre a ciência, a investigação universitária, os programas de investigação militar nos Estados Unidos e a contracultura radical libertária. No seguimento, Castells (2004b) refere que “o programa da Internet nasce como programa de investigação, sem, na realidade, ter tido qualquer aplicação militar.” (p. 223) Segundo o autor, não houve aplicação militar da Internet, mas houve financiamento militar, que foi utilizado pelos cientistas nos seus estudos informáticos e na criação de redes tecnológicas. A esta combinação associou-se a cultura dos movimentos libertários, contestatários, que procuravam na Internet um instrumento de liberdade e de autonomia perante o Estado e as grandes empresas. (Castells, 2004b)

Na sua segunda lição, o autor diz que a origem da Internet não reside no mundo empresarial, pois ela não foi criada como um projecto de investimento empresarial. O autor refere que, em 1972, a primeira vez que o Pentágono tentou privatizar a ARPANET, a antecessora da Internet, ofereceu o projecto gratuitamente à ATT4 para que o desenvolvesse. A ATT, após estudar o projecto, concluiu que este nunca poderia ser rentável

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e não viu qualquer interesse em comercializá-lo. Isto aconteceu mais ou menos na altura em que o presidente da Digital (uma grande empresa de informática) afirmava que não havia razões para alguém querer um computador em casa. Pouco tempo depois, Watson, presidente da IBM, também proferiu que em 2000 apenas existiriam cinco computadores no mundo e que seriam todos IBM Mainframe. (Castells, 2004b)

Na sua terceira lição, o autor refere que a Internet evoluiu, desde a sua fase inicial, através de uma arquitectura informática aberta e de livre acesso, os protocolos centrais da Internet TCP/IP5, constituídos em 1973-78, eram gratuitos e de livre acesso.

Na quarta lição, o autor diz que quem produziu a tecnologia da Internet foram principalmente os seus utilizadores. Embora tenham sido os inovadores a produzir a tecnologia numa fase inicial, os utilizadores foram modificando constantemente as aplicações, originando novos desenvolvimentos tecnológicos, que se desenrolaram através de um processo de retroactividade constante. Castells dá como exemplo da situação atrás referida o que se passou com os inventores da ARPANET. Segundo o autor, a ARPANET foi criada para os seus utilizadores estabelecerem a comunicação entre os seus centros de informação, os supercomputadores de que dispunham, mas fizeram-no com a ideia de que, ao compartilhar tempo, poderiam aumentar a capacidade de utilização dos computadores. Mas, ao perceberam que tinham uma capacidade de processamento informático maior do que necessitavam, procuraram encontrar outras aplicações. Com esta intenção, trocaram várias mensagens entre si, apercebendo-se então que tinham criado o que procuravam, isto é, o correio electrónico. O correio electrónico é uma aplicação que foi descoberta quase por acaso e que se converteu a partir de 1970 na principal utilização da Internet. (Castells, 2004b)

No que concerne à quinta lição, o autor refere que a Internet se desenvolveu a partir de uma rede internacional de cientistas e técnicos que trabalhavam em estreita colaboração no desenvolvimento das tecnologias e que, contrariamente ao que muitos pensam, a Internet

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TCP/IP – Conjunto de protocolos Internet que definem como se processam as comunicações entre os vários computadores. Estes protocolos pode ser implementados em virtualmente qualquer tipo de computador, porque não é uma tecnologia proprietária (i.e., em termos de concepção, é independente do hardware e dos sistemas operativos).

não é uma criação norte-americana. Refere o autor que a tecnologia-chave da Internet, o packet switching, foi criada por Paul Baran da Rand Corporation, na Califórnia, e por Donald Davis da National Physics Laboratory, na Grã-Bretanha, em simultâneo, sem que houvesse qualquer comunicação entre os dois. Esta tecnologia-chave teve o seu desenvolvimento portanto, em paralelo, na Europa e nos Estados Unidos. O desenvolvimento dos protocolos TCP/IP foi efectuado por Vinton Cerf, nos Estados Unidos, em estreita colaboração com Gérald Lelan do grupo francês Cyclades. Também o desenvolvimento da Internet, assente em redes livres comunitárias, que criaram todo um conjunto de novas aplicações (conferência, boletins ou listas de correio electrónico), tem a sua origem em grupos libertários organizados através e em torno das redes da Internet e não no Departamento de Defesa. (Castells, 2004b)

Na sexta lição, o autor menciona que a Internet, desde o início, é auto-regulada por indivíduos ligados informalmente em rede, que se encarregam do seu desenvolvimento sem que haja grande interferência por parte do Governo, pelo que o governo da Internet está, actualmente, nas mãos de uma sociedade de carácter privado, que é apoiada pelo governo norte-americano e por governos internacionais, chamada ICANN6, e que tem a particularidade de eleger o seu conselho de administração executivo por votação global, contando para tal com a participação de qualquer pessoa que queira juntar-se à ICANN através de correio electrónico. A ideia de que a Internet é livre reside na sua tecnologia, ela foi concebida com essa intenção, ela é um instrumento de comunicação livre criado por pessoas que queriam que assim fosse. (Castells, 2004b)

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A ICANN - é o organismo mundial responsável por estabelecer regras para o uso da Internet; é uma entidade sem fins lucrativos e de âmbito internacional, responsável pela distribuição dos números de “Protocolo de Internet”, pela designação de identificações de protocolo, pelo controle do sistema de nomes de domínios de primeiro nível com códigos genéricos e de países e com funções de administração central da rede de servidores. Esses serviços eram inicialmente prestados mediante contrato com o governo dos EUA, pela Internet Assigned Numbers Authority (IANA) e outras entidades. A ICANN actualmente cumpre as funções da IANA.