• Nenhum resultado encontrado

Alteração da base de cálculo com Lei nº 9.718/1998 128

O artigo 3º, §1º da Lei nº. 9.718/1998 alterou a extensão do termo faturamento. Como apontado acima, até 31 de janeiro de 1999 o termo faturamento era entendido como a receita ou a soma das vendas de mercadorias e serviços de qualquer natureza. Era a soma dos valores da fatura. Ou seja, era um conceito advindo do direito privado, em especial do Código Comercial de 1850.

129

Desta forma, estavam excluídos do faturamento os valores originados das receitas provenientes de operações financeiras, alugueres, doações, indenizações, etc..

Diferentemente do tradicional conceito do termo faturamento, a Lei nº. 9.718/1998, em seu artigo 3º, §1º alargou a base de cálculo da COFINS, identificando o faturamento com receita bruta.

Receita bruta, de acordo com o §1º, do artigo 3º da Lei nº. 9.718/1998 é a totalidade das receitas auferidas pelas pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas exercidas e a classificação contábil adotada.

A alteração da base de cálculo através da referida lei ordinária ensejou alegações de violação do artigo 110 do Código Tributário Nacional, assim redigido:

“A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”

Conforme salientado pela doutrina, essa alteração “foi alvo de inúmeras insurgências judiciais quando, em seu art. 3º, §1º, equiparou o faturamento à receita bruta para fins da base de cálculo da COFINS e, após anos de discussão, o STF acabou reconhecendo em sede difusa a inconstitucionalidade da majoração da base de cálculo levada a cabo pelo art. 3º, §1º, da Lei nº. 9.718/98, justamente pela ausência de permissivo constitucional para tanto quando da aludida equiparação, e por isso porque, a rigor, a EC nº. 20/98 somente foi editada após a publicação da mencionada lei ordinária, de modo que, tecnicamente, não haveria como sanar o vício originário daquela lei, segundo o entendimento do Pretório Excelso.” 154

Considerando a redação do artigo 110 do Código Tributário Nacional acima transcrito, entendemos que de fato a alteração do conceito de faturamento pela Lei nº. 9.718/1998 afrontava referido dispositivo, uma vez que o termo faturamento compreendia os valores oriundos do exercício da atividade econômica da empresa,

154 CARNEIRO, Daniel Zanetti Marques. Ob. cit., p. 123. O autor destaca os seguintes precedentes: RE 357950/RS (leading case) e RREE 346084/PR, 358273/RS, 390840/MG, 473565/SP, 476071/SP e 527602/SP.

130

coincidido com a modalidade de receita prevista no artigo 187, I, da Lei de Sociedades Anônimas (receita bruta de vendas e de serviços).155

Com a Emenda Constitucional nº. 20 de 16 de dezembro de 1998, que alterou o artigo 195 da Constituição Federal de 1988, houve entendimento de que passou a existir a possibilidade de instituição de contribuição social sobre a receita. Todavia, há um intervalo de tempo entre a promulgação da Lei nº. 9.718/1998 e a Emenda Constitucional nº. 20.

José Eduardo Soares de Melo pondera que a Emenda Constitucional nº. 20/1998 caracteriza a inconstitucionalidade da Lei nº. 9.718/1998, sendo que as alterações advindas com referida Emenda Constitucional “evidenciam que desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 até o início de vigência da Emenda Constitucional 20/1998 não havia embasamento constitucional para possibilitar a exigência da COFINS de quaisquer empresários e entidades; bem como ser calculada sobre receitas de qualquer natureza (distintas da exclusiva receita de operações mercantis e prestação de serviços) e estabelecer excepcional tratamento ao princípio da isonomia.” 156

Assim, firmou-se o entendimento de que antes do advento da Emenda Constitucional nº. 20 a alteração do conceito de faturamento violava o artigo 110 do Código Tributário Nacional, sendo nulos e ilegítimos os preceitos conflitantes com o ordenamento jurídico. Após a promulgação da aludida Emenda, estaria sanada tal violação.157

Eis o entendimento do Colendo Supremo Tribunal Federal:

“Constitucionalidade superveniente – Art. 3º, §1º, da Lei n. 9.718, de 27.11.1998 – Emenda Constitucional n. 20, de 15.12.1998. O sistema jurídico brasileiro não contempla a figura da constitucionalidade superveniente.

155 JORGE, Tarsis Nametala Sarlo. Ob. cit., 381. 156 Ob. cit., p. 201.

157 ADIN 2777/SP, Relator Ministro Cesar Peluso. É importante destacar que os Ministros Gilmar Mendes e o Ministro Maurício Correa divergiram desta posição, entendendo que desde a Lei Complementar 70/1991 houve o abandono do conceito tradicional de faturamento.

131 Tributário – Institutos – Expressões e vocábulos – Sentido. A norma pedagógica do art. 110 do CTN ressalta a impossibilidade de a lei tributária alterar a definição, o conteúdo e o alcance de consagrados institutos, conceitos e formas de direito privado utilizados expressa ou implicitamente. Sobrepõe-se ao aspecto formal o princípio da realidade, considerados os elementos tributários.

Contribuição social – PIS – Receita bruta – Noção – Inconstitucionalidade do §1º do art. 3º da Lei n. 9.718/1998. A jurisprudência do Supremo, ante a redação do art. 195 da Carta Federal anterior à Emenda Constitucional n. 20/1998, consolidou-se no sentido de tomar as expressões ‘receita bruta’ e ‘faturamento’ como sinônimas, jungindo-se à venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. É inconstitucional o §1º do art. 3º da Lei n. 9.718/1998 no que ampliou o conceito de ‘receita bruta’ para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação contábil adotada. ”158

Desta forma, as diferenças recolhidas a título de COFINS, considerando a apuração da base de cálculo de acordo com a Lei nº. 9.718/1998 seriam indevidas durante o período compreendido entre janeiro de 1999 a janeiro de 2004 (Lei nº. 10.883/2003, válida desde fevereiro de 2004, validando os efeitos da Medida Provisória 135/2003).159

Logo, até janeiro de 2009 os contribuintes poderiam ingressar com ações de repetições de indébito, conforme disposto no artigo 165, I c/c 168, do Código Tributário Nacional.

Cumpre notar que o polêmico artigo 3º, §1º, da Lei nº. 9.718/1998 foi revogada pela Lei nº. 11.941/2009. Assim, essa revogação “tende a frustrar eventual controle abstrato de constitucionalidade da norma ali outrora contida, justamente pela perda do objeto da ação, conforme entendimento do STF. Remanesce, todavia, a possibilidade de controle difuso (concreto) e incidental quanto aos efeitos ou reflexos de eventual inconstitucionalidade produzidos ao tempo em que vigorou a norma mencionada.” 160