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Alterações politico-institucionais e a vertente política da integração Euro-

Capitulo II O processo de integração económica e monetária na UE

1.4. Alterações politico-institucionais e a vertente política da integração Euro-

No cenário Europeu e internacional pós Guerra Fria e perante os novos desafios que se colocavam decorrentes da profunda e inesperada alteração no mapa politico Europeu e na quebra dos equilíbrios geopolíticos e geoestratégicos da lógica bipolar da Guerra Fria, a Europa através do Tratado UE, ao mesmo tempo que procede à segunda revisão dos Tratados constitutivos das Comunidades Europeias irá procurar um maior equilíbrio no modelo de integração Comunitário ao estabelecer uma nova arquitectura na construção Europeia através da coexistência de duas vertentes de integração distintas.

Uma primeira vertente de natureza económica e social, com uma dominante Comunitária, correspondendo à Comunidade Europeia, que em Maastricht substitui a

218 Cf. Idem 219 Cf. Ibidem

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Comunidade Económica Europeia, e que integra o acervo dos Tratados constitutivos das Comunidades Europeias (CECA, CEE e CEEA) com as alterações entretanto introduzidas, nomeadamente com a criação do mercado interno e da UEM.

Uma segunda vertente, de natureza política, configurava uma área de cooperação intergovernamental entre os Estados-membros tendo em vista uma “união cada vez

mais estreita entre os povos da Europa, em que as decisões serão tomadas ao nível

mais próximo dos cidadão” e como missão “organizar de forma coerente e solidária as

relações entre os Estados-membros e entre os respectivos povos”220.

Os objectivos da vertente política complementavam aqueles já contidos na vertente Comunitária, especialmente nos aspectos da “afirmação da sua identidade na

cena internacional, nomeadamente através da execução de uma política externa e de segurança comum, que inclua a definição a prazo de uma política de defesa comum (…); (…) a instituição de uma cidadania da União; o desenvolvimento de uma estreita cooperação no domínio da justiça e dos assuntos internos; a manutenção da integralidade do acervo Comunitário e o seu desenvolvimento (…)”221.

Ao mesmo tempo que se consolidava um modelo de integração caracterizado pela dinâmica expansionista própria da associação funcional e sectorial, que a UEM e a moeda única eram o corolário, procurava-se estender essa dinâmica expansionista também à vertente politica do projecto Europeu por forma a que a uma identidade económica e monetária se associasse uma identidade também politica que pudesse introduzir uma maior coerência no plano interno e uma maior capacidade de afirmação e de projecção da UE no contexto internacional.

Neste sentido a distinção entre uma vertente económica e social e uma vertente política, ao mesmo tempo que vincava as diferenças entre estádios de integração distintos, consubstanciava por outro lado um compromisso entre uma abordagem integracionista que perspectivava e ambicionava um maior aprofundamento político no projecto de construção Europeia através da criação de instituições supranacionais que conduziriam num último estádio à constituição de uma Comunidade Politica Europeia, e uma segunda abordagem, que perspectivava o projecto Europeu no âmbito da

220 Cf. Artigo A, Tratado UE 221 Cf. Artigo B, Idem

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cooperação intergovernamental entre os Estados-membros e que se opôs a uma maior Comunitarização, sobretudo em áreas que envolviam prerrogativas tradicionais da soberania nacional, como eram as áreas da política externa e segurança e da justiça e assuntos internos.

Deste compromisso resultou a União Europeia com uma estrutura institucional dualista, onde o modelo Comunitário coexiste com o modelo intergovernamental numa arquitectura evocativa de um templo Grego constituído por três pilares em que o pilar central corresponde aos Tratados Comunitários integrados em Maastricht na Comunidade Europeia – o pilar Comunitário - coexistente com dois pilares de cooperação intergovernamental que abrangem as áreas da Politica Externa e de Segurança Comum (PESC) – segundo pilar - e Justiça e Assuntos Internos (JAI) – terceiro pilar - procurando-se um equilíbrio entre o elevado nível de integração económica, com uma dominante Comunitária e a ainda superficial integração politica, com uma dominante intergovernamental222.

Não obstante o estabelecimento de um novo modelo institucional assente no equilíbrio entre uma vertente de integração Comunitária para o primeiro pilar e uma vertente de cooperação intergovernamental para o segundo e terceiro pilar, o Tratado UE não deixa no entanto de assinalar um momento de maior importância do sistema Comunitário relativamente ao sistema intergovernamental e um importante salto qualitativo no sentido da obtenção de uma maior profundidade e identidade ao projecto Europeu num contexto regional e internacional em profunda transformação e onde a UE procura reposicionar-se de modo a assumir um maior protagonismo na ordem internacional que então se formava.

Se a separação entre high politics e low politics exerceu um papel essencial e necessário para a dinâmica expansionista do processo de integração Europeia, com o Tratado UE e com a procura de alargar o âmbito de integração para a vertente de high

politics, a Europa depara-se com forte resistência ao nível da cedência de soberania dos Estados-membros para o nível Comunitário, ao contrário do que aconteceu com a partilha de soberania ao nível monetário, que apesar de configurar um dos atributos

222 Nas palavras de Roy Pryce o modelo institucional estabelecido em Maastricht configura mesmo “a curious hybrid, which is even more sui generis than the community itself”. Cf. Camisão, Isabel e Lobo- Fernandes, Luis – Op. Cit., p. 70

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essenciais da soberania nacional era entendida como a consequência natural de um longo processo de integração em áreas de low politics, como são aquelas que respeitam à associação económica e sectorial que marcaram o processo de construção Europeia até Maastricht.

De alguma forma a estrutura de pilares estabelecida em Maastricht procurava acolher no âmbito da UE novas áreas de integração que pudessem contribuir para a criação de uma identidade política ao nível da UE, em complemento de uma identidade económica e monetária que se consolidava com o Tratado UE, fazendo-o de forma progressiva e remetendo em primeira instância para a experiência e para os procedimentos da cooperação ao nível do segundo e terceiro pilares antes de serem sujeitas aos procedimentos de Comunitarização no primeiro pilar, num equilíbrio dinâmico cooperação versus integração que o princípio da subsidiariedade, consagrado em Maastricht, procurava materializar e dar coerência223.

Neste contexto, o Tratado UE constituiu-se como precursor de um processo de integração política, que deveria ser objecto de novos avanços no aprofundamento político institucional na UE tendo como objectivo final a consolidação de uma efectiva união política que pudesse complementar e equilibrar a união económica e monetária, com o que isso implicava ao nível da cedência de soberania dos Estados-membros para o nível supranacional e a comunitarização do processo de tomada de decisão.

Reconhecendo a natureza inovadora e o carácter transitório de algumas das suas disposições o próprio Tratado UE convocava para uma nova CIG para analisar essas disposições, prevendo a própria revisão das mesmas224 e abrindo caminho para um processo de revisão do Tratado, que teria sequência com o Tratado de Amesterdão em 1997, do Tratado de Nice em 2000 e do Tratado Reformador da UE assinado em Lisboa em Dezembro de 2007, na sequência da não ratificação do Tratado Constitucional que tinha sido aprovado pelo Conselho Europeu em Junho de 2004.

223

“O princípio da subsidiariedade implica que os Estados-membros mantêm as competências que sejam capazes de gerir de forma mais eficaz ao seu nível, transferindo para a Comunidade os poderes que não se encontrem aptos a exercer convenientemente”. Cf. Definição do Parlamento Europeu citado em Camisão, Isabel e Lobo-Fernandes, Luís – Op. Cit., p. 81. Cf também Covas, António – Op. Cit., p. 58

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