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As alterações no mapa político Europeu e o novo modelo de estabilidade

Capitulo II O processo de integração económica e monetária na UE

1.2. As alterações no mapa político Europeu e o novo modelo de estabilidade

Como afirmámos atrás os trabalhos que antecederam a assinatura do Tratado UE decorreram em simultâneo e são marcados pelo processo de transição política verificado nos países do centro-leste Europeu que veio a conduzir à queda dos regimes comunistas do antigo bloco Soviético, à queda do muro de Berlim e à reunificação da Alemanha e que culminou com o próprio colapso do regime político da URSS. Este período de transição política, que Samuel Huntington identifica na continuidade de uma terceira

vaga de democratização203 iniciada em Portugal com o golpe de Estado de 25 de Abril

de 1974 e prosseguida com o contágio democrático aos então regimes autoritários do sul da Europa - Grécia e Espanha – e mais tarde à América Latina, tem na sua origem o processo de regeneração do próprio regime Soviético iniciado por Mikhail Gorbachev após a sua eleição como Secretário Geral do Partido Comunista da URSS em 1985.

Este processo regenerativo conduzido por iniciativa do próprio regime Soviético e alicerçado na glasnost (transparência) e na perestroika (reestruturação) consubstanciava já o reconhecimento das deficiências, do insucesso e da decadência do regime Comunista que se manifestava a nível político, económico e na falta de apoio popular, vindo a conduzir à focalização da politica da URSS no plano interno e dando sinais claros aos regimes que integravam a sua esfera de influência, nomeadamente aos regimes Comunistas do centro-leste Europeu, que a URSS não voltaria a intervir ou a utilizar a força na manutenção desses regimes contra a vontade das suas populações204.

Estes sinais de abertura rapidamente começaram a produzir efeito nos países Europeus do então ainda bloco Soviético, que iniciam movimentos de ruptura com os regimes comunistas até aí vigentes vindo em poucos meses e de forma vertiginosa a substituir os antigos dirigentes da Nomenklatura comunista por figuras dissidentes, sem que da parte da URSS e ao contrário de movimentos democráticos anteriores se verificasse uma reacção que contrariasse essa revolução reformista205. Apesar da

203 Cf. Huntington, Samuel P. – The Third Wave: Democratization in the Late Twentieth Century. 1ª Edição. University of Oklahoma Press, 1993, p. 21-26

204 Cf. Gaddis, John Lewis – A Guerra Fria. 1ª Edição. Lisboa: Edições 70, 2007. P. 231-238

205 Cf. Gaspar, Carlos - A Guerra Fria acabou duas vezes. [Consultado em 2010.12.21]. Disponível em: http://www.ipri.pt/search/search.php

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importância e amplitude das mudanças ocorridas no centro-leste Europeu o movimento de ruptura com o anterior status quo viria no entanto a ter o seu momento mais simbólico com a queda do muro de Berlim, que viria a criar as condições para a reunificação da Alemanha206 e a precipitar a própria implosão e fim do regime soviético, conduzindo à mudança de ciclo histórico, à alteração na distribuição de poder entre as potências e de uma forma mais global ao fim da ordem internacional da Guerra Fria.

Com o colapso do regime Soviético e a desagregação do bloco político por si controlado o Ocidente, enquanto pólo ideológico, político e económico oposto ao bloco soviético, sai vitorioso no confronto bipolar da Guerra Fria e os EUA afirmam-se como a única superpotência global, assumindo uma preponderância unipolar no contexto internacional, que a alguns pareceu corresponder ao fim da história enquanto momento final da evolução ideológica da humanidade e a universalização da democracia liberal ocidental como modelo definitivo de governação207.

Perante uma nova conjuntura internacional marcada pelo fim do equilíbrio e da

simplicidade que caracterizada o relacionamento entre as duas superpotências da Guerra Fria, a Europa depara-se com um quadro de instabilidade e imprevisibilidade decorrente do fim dos regimes Comunistas pró-soviéticos nos países do centro-leste Europeu e da quebra dos mecanismos de articulação que os ligavam à URSS, conduzindo ao ressurgimento de movimentos nacionalistas e de tensões de fragmentação que vieram a eclodir com variável intensidade nos países que até aí constituíam a esfera de influência Soviética 208.

Neste contexto, ao mesmo tempo que as jovens democracias pós comunistas do centro-leste Europeu procuravam restaurar a sua soberania, procuravam também afirmar a sua identidade Europeia através de um modelo de transição democrática assente nos valores ocidentais do Estado de direito, da democracia pluralista e da economia de mercado tendo em vista a futura integração nas instituições Europeias e Ocidentais209.

206 Oficializada a 3 de Outubro de 1990

207 Tal como preconizado em 1992 por Francis Fukuyama. Cf. Fukuyama, Francis – O Fim da História e

o Último Homem. 1ª Edição. Lisboa: Gravida, 1992.

208 De que são exemplos opostos na variabilidade de intensidade a violenta fragmentação da Jugoslávia e o conflito étnico e militar a ela subjacente e a fragmentação pacifica da Checoslováquia.

209 Cf. Gaspar, Carlos– “Notas sobre o alargamento da União Europeia”. In O Desafio Europeu: Passado,

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Este movimento de regresso à Europa dos países do centro-leste Europeu põe fim a um ciclo de 40 anos de divisão forçada do continente Europeu imposta pela lógica e pelos interesses geoestratégicos e geopolíticos das principais potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial e representou para a UE uma oportunidade única e inesperada para ver cumprido um dos objectivos fundadores dos movimentos integracionistas Europeus – uma Europa democrática e voluntariamente unida210.

Ao mesmo tempo, o desarranjo geopolítico decorrente do fim da Guerra Fria introduz de novo a questão Alemã na agenda Europeia tornando-se urgente a definição do quadro político e institucional que pudesse acomodar a sua reunificação e dissipar os receios que uma Alemanha unida e economicamente hegemónica suscitava nos restantes países Europeus211. Perante um novo paradigma na ordem internacional e pela primeira vez desde a criação das Comunidades Europeias, a Europa confronta-se com a necessidade de um reposicionamento estratégico e da construção de um modelo de estabilidade regional que garantisse o sucesso dos processos de democratização nos países do centro-leste Europeu, a integração da Alemanha reunificada e a criação de um novo quadro de relacionamento com uma Rússia pós-Comunista212.

Este novo modelo de estabilidade regional irá fundamentar-se em dois momentos cruciais do processo de integração Europeia. Um primeiro momento com a fórmula encontrada para a reunificação da Alemanha, que ficaria condicionada à sua participação na NATO e nas Comunidades Europeias, e um segundo momento com a assinatura do Tratado UE em Fevereiro de 1992 que veio a estabelecer o calendário e os procedimentos conducentes à criação de uma moeda única que deveria decorrer em paralelo com os processos de aprofundamento da integração Comunitária e de

alargamento aos países da Europa Ocidental que ainda não integravam a UE213 e às novas democracias pós comunistas no centro-leste Europeu.

210 Cf. Idem

211 A reunificação da Alemanha viria a ser reconhecida na Conferência que ficaria conhecida como 2+4 realizada em Berlim a 17 de Julho de 1990 e onde participaram a República Federal e Republica Democrática da Alemanha e os países vencedores da Segunda Guerra Mundial (EUA, URSS, França e GB). Cf. Patricio, Raquel de Faria – Op. Cit., p. 324

212 Cf. Gaspar, Carlos - “Notas sobre o alargamento da União Europeia” – Op. Cit.

213 Áustria, Finlândia, Suécia, Suíça, Noruega e Islândia. Os três primeiros viriam a aderir à UE a 1 de Janeiro de 1995. A Suíça viria a não apresentar a sua candidatura e na Noruega foi recusado por referendo os termos do Tratado de adesão que inviabilizou a sua adesão à UE. A Islândia, que fazia depender a sua

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