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O significado geopolítico da instituição da UEM e da moeda única

Capitulo II O processo de integração económica e monetária na UE

1.3. O significado geopolítico da instituição da UEM e da moeda única

No quadro geopolítico pós Guerra Fria a instituição da UEM e da moeda única, ao mesmo tempo que representou um ponto culminante no processo de integração económica e monetária desenvolvido no contexto das Comunidades Europeias, assumiu também um papel decisivo na coesão e na manutenção dos equilíbrios internos entre os Estados-membros e para a continuidade do projecto Europeu, assente naquele que foi definido por Schuman e Monnet como o motivo fundador das Comunidades Europeias: a preocupação com a preservação da paz entre os países Europeus.

Neste sentido e mais uma vez por via da associação funcional própria de uma dinâmica neofuncionalista, a Europa irá através da UEM e da moeda única, mitigar as preocupações de vários Estados-membros, nomeadamente da França e da Grã-Bretanha, com a reunificação da Alemanha e com o que isso representava em termos de desequilíbrio geográfico, económico e demográfico, e por decorrência também politico, ao vincular a Alemanha a um projecto fundamental e estruturante do projecto Europeu e que implicou a transferência para o nível supranacional da condução da politica monetária, com o significado simbólico, material e institucional que encerra, e a instituição de um modelo de governação económico nas vertentes orçamental e estrutural assente na cooperação e coordenação entre os Estados-membros214.

Apesar da forte influência da Alemanha na definição dos objectivos, do modelo organizacional e das instituições criadas para a condução da politica monetária e apesar de a sua moeda nacional e o seu Banco Central se terem constituído como modelos a seguir na União Monetária Europeia era percebido pelos restantes Estados-membros que no contexto geopolítico então vigente e numa perspectiva de equilíbrio de poderes e de coesão interna, a introdução da moeda única e a condução centralizada e supranacional da politica monetária era preferível à dominação do SME pelo marco Alemão e pelo

Bundesbank, como na prática se verificou durante a vigência do SME215.

candidatura da adesão da Noruega, veio assim também a não se candidatar à adesão à UE. Cf. Idem, p. 149-150

214 Cf. Risse, Thomas – To Euro or Not to Euro? – Op. Cit. 215 Cf. Idem

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A partilha de soberania ao nível da política monetária e a instituição de um modelo de governação económico com vista à prossecução de objectivos comuns, onde a moeda única Europeia desempenha um papel central em todas as vertentes das políticas económicas, constituíram-se, no contexto Europeu pós Guerra fria, como factores dissuasores de eventuais impulsos hegemónicos ou directórios ao nível económico, ou do receio de que essa hegemonia ou direcção pudesse vir a observar-se, com as consequências que inevitavelmente dai resultariam no que concerne à própria coesão e equilíbrio do projecto de integração Europeia.

Para a própria Alemanha a vinculação à UEM e á moeda única e a aceitação de transferir para o BCE a condução da política monetária na área do Euro, cedendo para a esfera Comunitária e para a gestão supranacional a sua soberania monetária216, manifestou, na nossa interpretação, uma opção clara em conduzir o seu processo de reunificação, num contexto histórico único após a Segunda Guerra Mundial, numa perspectiva integracionista e orientado para a participação no projecto Europeu que com Maastricht e com a UEM e a moeda única ganha uma nova dimensão e profundidade.

De acordo com Thomas Risse, no caso particular da Alemanha, a cedência da sua soberania monetária e a substituição da sua moeda nacional por uma moeda comum Europeia revestiu-se mesmo de um particular significado político e de identificação com o projecto Europeu, enquanto elemento constituinte da própria identidade Alemã construída após a Segunda Guerra Mundial, atenta a importância do Marco Alemão na formação dessa identidade nacional, ao personificar simbolicamente o seu ressuscitar

das cinzas e o sucesso das políticas económicas e do modelo económico e social construído pela Alemanha no pós Guerra, fundado na denominada economia social de

mercado217.

Neste quadro a instituição da UEM e o estabelecimento do calendário e dos procedimentos para a introdução da moeda única e a sua adopção por parte dos Estados- membros, transportaram a moeda única para uma dimensão superior à dimensão económica que lhe está intimamente associada exprimindo para além de um evidente significado material e funcional, também um significado político e identitário que

216 Que pela solidez e estabilidade da sua moeda nacional e pelo rigor e eficácia do seu Banco Central exerciam uma posição de domínio sobre as políticas monetárias na Europa.

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concorreu, num quadro Europeu e internacional em profunda transformação, para a coesão e o equilíbrio de poderes no contexto Comunitário e para o estabelecimento de um sentimento de unidade entre os cidadãos e entre os Estados-membros da UE.

A este propósito e de acordo ainda com Risse o projecto da moeda única Europeia mais do que um projecto económico é um projecto essencialmente politico que agrega uma visão comum de integração Europeia que procura a superação das divisões históricas do continente Europeu na convicção que num contexto internacional em que a Europa perde protagonismo político e económico (perante a emergência de novas potências regionais suportadas no fenómeno da globalização e na rápida ascensão económica), as soluções nacionais para os problemas económicos, políticos e sociais da Europa deixaram definitivamente de existir218.

Neste contexto o Euro tornou-se a pedra angular da política Europeia de integração constituindo-se como um veículo para o aprofundamento de uma perspectiva de integração política e simbolizando uma identidade colectiva Europeia que se constrói na partilha de uma moeda comum que substituiu as moedas nacionais dos Estados- membros e com um modelo de governação independente e supranacional constituído a partir da cedência voluntária e efectiva de soberania dos Estados-membros para a esfera Comunitária219.