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3.3 Análise da ressocialização na execução penal brasileira

3.3.1 Alternativas a pena de prisão

Com as inúmeras críticas realizadas à pena privativa de liberdade, que apontam o sistema carcerário como um sistema falido, sem recuperação, do qual alguém somente sairá ressocializado em razão de sua força de vontade, e não, porque cumpriu uma pena; com as críticas a um sistema que é considerado muito mais uma escola do crime do que um ambiente ressocializador e reformador de índoles é necessário, que se apresentem alternativas, soluções que sejam mais eficazes que a simples privação da liberdade de um sujeito que ficará vários anos estagnado, condenado ao ócio dia após dia.

Pensando ainda na pena privativa de liberdade, devemos considerar que alterações em seu sistema de execução e principalmente no tratamento para com o preso são urgentes, o cárcere não pode continuar sendo esta tortura legalizada que ocorre hoje, conforme assegura Ferrajoli (apud BOSCHI 2000, p. 127) ao legitimar a melhora da condição do preso, fica facilitado que o fim ressocializador da pena seja atingido:

[...] se abram e se desenvolvam espaços de liberdade e sociabilidade mediante a mais ampla garantia de todos os direitos fundamentais da pessoa. Que, enfim, se promova a abertura do cárcere – os colóquios, os encontros conjugais, as permissões, as licenças, etc. – não mediante a distribuição de prêmios e privilégios senão com a previsão de direitos iguais para todos.

Sobre a necessidade de alternativas a pena privativa de liberdade Bitencourt (2000, p. 3), argumenta que este instituto de controle da criminalidade pertence a um tempo passado, que a aplicação da pena deve evoluir assim com a sociedade e encontrar métodos atuais mais eficazes, e que, principalmente possam garantir os direito e garantias do preso:

Propõe-se, assim, aperfeiçoar a pena privativa de liberdade, quando necessária, e substituí-la, quando possível e recomendável. Todas as reformas de nossos dias deixam patente o descrédito na grande esperança depositada na pena de prisão, como forma quase que exclusiva de controle social formalizado. Pouco mais de dois séculos foi suficiente para se constatar sua mais absoluta falência em termos de medidas retributivas e preventivas.

Ele ainda complementa, demonstrando quão desnecessária é a aplicação de penas duras para crimes de autores que não apresentam alta periculosidade para a sociedade:

Recomenda-se que as penas privativas de liberdade limitem-se às condenações de longa duração e àqueles condenados efetivamente perigosos e de difícil reparação [...]. Caminha-se, portanto, em busca de alternativas para a privativa de liberdade.

A pena privativa de liberdade pode ter como alternativa a sua aplicação, a substituição por penas privativas de direitos, em mais sanções do que aquelas tipificadas no Código Penal, como por exemplo, para delitos culposos. Podemos ter aplicado de uma maneira mais efetiva a pena de multa, uma prestação pecuniária, que realmente irá alterar a situação financeira do infrator, principalmente aqui, nos delitos de trânsito.

Não se busca aqui, compartilhar do pensamento da Criminologia Crítica, a qual partilhava da ideia de um mundo sem prisões. Pensamento um tanto quanto ilusório, a sociedade não se encontra preparada para receber delinquentes, a

igualdade ainda não se encontra desmistificada, o preconceito é latente, a mudança, se levarmos em consideração esta teoria somente viria com uma alteração abrupta na essência social da população, ao compreender que ao fazer o bem estaria recebendo com retorno um bem, uma sociedade mais segura.

A pena restritiva de direito, é o meio mais adequado como alternativa a pena de prisão. A prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária são as duas alternativas a pena privativa de liberdade mais viável na atual conjuntura da execução penal brasileira. Mas para que estas funcionem, é necessário real fiscalização do Estado, e que este analise, também, a real situação do condenado facilitando assim, a aplicação da restrição de direitos.

Percebe-se que as penas das quais a substituição por restritivas de direitos são viáveis, não se oportuniza opções para o condenado flexibilizá-las. Na maioria das vezes o delinquente é pessoa pobre, não possui recursos para arcar com uma pena pecuniária de um salário mínimo, no outro tanto das vezes, além de ser pobre tem a felicidade de ter um emprego e não possui tempo viável para realizar o trabalho comunitário, e o pouco salário que recebe, encontra-se já, comprometido. Caso este não arque com o combinado tem como pena a prisão. Portanto, é necessário, para melhor efetivação dos institutos alternativos a pena privativa de liberdade, uma maior flexibilização do estado para com o infrator, que possui interesse em cumprir com a alternativa, e, não ser preso, mas não possui condições para isso.

Agora, analisando a alternativa a pena privativa de liberdade como um todo, e em nível de sociedade, chega-se a conclusão que a principal solução para a crise carcerária brasileira, não foge do contexto social. Os relatos dos presos transcritos para este trabalho referem claramente que a ineficácia da prisão se dá pela falta de oportunidades, eles não querem retornar para a prisão, mas não contemplam outra maneira de ganhar dinheiro que não seja por intermédio do crime. Ao saírem da prisão, encontram uma sociedade que busca combatê-los, que hostilizam a figura do ex-detento com atitudes de rejeição e intolerância, acreditando que o fato de que ele foi preso não possui nenhuma relação com a sua vida.

Este cenário, somente será efetivamente resolvido, com o respaldo de políticas públicas, juntamente com o apoio da sociedade, a qual deverá contribuir para a ressocialização do ex-detento, eliminando o preconceito, o acolhendo e proporcionando oportunidades de trabalho.

Os fatores da criminalidade tratados no primeiro capítulo também devem ser considerados para a aplicação de medidas alternativas de precaução a prática criminosa. O efetivo desenvolvimento educacional e social das comunidades, suas condições de habitação, oportunidades de emprego que promovam a digna subsistência de todos, e o acesso à saúde pública de qualidade, são condições legitimadoras do princípio da dignidade da pessoa humana. Este conjunto de garantias se, devidamente aplicadas distanciam população da criminalidade, a qual não necessita buscar meios ilícitos de sobrevivência, quando possui acesso às condições básicas necessárias a sua subsistência.

CONCLUSÃO

O presente trabalho, no enfrentamento da questão atinente à ineficácia da pena privativa de liberdade para o combate à criminalidade, abordou o crime, a pena, e a pena privativa de liberdade. A prática criminosa ocorre desde os primórdios da existência humana, com o surgimento da vida em sociedade estas ações foram compelidas pela comunidade, a qual acusava e punia o suspeito da contravenção, surgindo aqui o crime, e a aplicação da pena propriamente dita.

O trabalho abordou a evolução do estudo sobre a criminalidade e a inserção do Estado de Direito como autoridade legítima para o julgamento e a aplicação da pena ao sujeito. O Estado agia inicialmente de forma inquisitorial, visto que exercia o papel de acusador e julgador. Com a evolução da sociedade, principalmente sob influência do Iluminismo e da Escola Clássica, principalmente de Cesare Beccaria o Estado passou a ter três poderem distintos para formar um julgamento justo: um juiz, que por obrigação deveria e ainda deve ser imparcial em suas decisões, fundamentando a aplicação da pena, o órgão acusador e o órgão de defesa.

Após, buscou-se esclarecer o porquê e para quê existe a pena, e, como esta surgiu e quais eram e são os seus fins. Chegando-se à conclusão que a finalidade da pena, principalmente da pena privativa de liberdade é a retribuição ao causador de um mal, se aplica uma pena para que o indivíduo causador do prejuízo, sofra as consequências do se ato e sirva de exemplos para outros de que sua conduta é errada. Muito se criticou esta finalidade da pena, a simples retribuição de um mal, surgindo então o fim ressocializador da pena, no qual se busca a transformação o criminoso dentro da instituição carcerária um indivíduo recuperado e ressocializado

pelo Estado, incapaz de cometer crimes e capaz de conviver harmoniosamente com a sociedade.

A busca da ressocialização do condenado ganhou o mundo, a pena privativa de liberdade é hoje a principal pena. Todavia, a pena privativa de liberdade não atinge, sequer chega próximo de atingir o fim ressocializador para a qual foi criada. As prisões brasileiras também estudadas aqui, de forma sucinta, pioram o estado tanto físico como emocional do condenado, causando um efeito contrário ao buscado, efeito este na maioria dos casos, irreversível na vida do apenado.

Sendo a pena privativa de liberdade ineficaz quanto ao seu fim, conclui-se o quão necessário e urgente se faz a intervenção política, social e humanitária nas instituições carcerárias. Tão importante, senão mais, as alternativas a pena privativa de liberdade, principalmente para réus primários, condenados a crimes de menor potencial ofensivo e crimes culposos. Para estes a aplicação da pena privativa de liberdade é um erro. Quem comete os crimes ressalvados anteriormente precisa é claro, pagar por sua conduta criminosa, porém jamais, com a pena privativa de liberdade, a qual somente irá prejudicá-lo, como pessoa e cidadão de direitos, e o retorno que a sociedade terá deste indivíduo condenado a prisão é atualmente, alguém ainda mais envolvido com a criminalidade.

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