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Data e horário da entrevista: 10 de setembro de 2012, às 11:25 horas Local da entrevista: escritório do entrevistado, em Porto Alegre – RS Entrevistador: André Javier Ferreira Payar

Amadeu de Almeida Weinmann nasceu em 3 de maio de 1935, na cidade de Ijuí, região Serrana/Missioneira, no Rio Grande do Sul. Até os 28 anos atuou como representante comercial. Em 1964 decidiu prestar vestibular para o curso de Direito. Bacharelou-se em 1969 pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUC/RS. Iniciou-se na advocacia criminal como advogado dativo no Tribunal do Júri de Porto Alegre, função que exerceu por aproximadamente dez anos. Durante esse período, passou a atuar também perante a Justiça Militar, tanto Estadual quanto Federal, como advogado particular de presos políticos. Em razão de sua experiência profissional, foi convidado, em 1972, a lecionar Di- reito Penal na Universidade Federal de Caxias do Sul. Também foi Pro- fessor da UniRitter, universidade da região da Grande Porto Alegre. Le- cionou, também, na PUC/RS e na Escola Superior da Magistratura da AJURIS – Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul. Em 1973, obteve o título de pós-graduação em Ciências Penais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Recebeu a Medalha Oswaldo Vergara pelos rele- vantes serviços prestados à advocacia. É membro da Academia Brasileira de Direito Criminal e sócio fundador da Comunidade de Juristas de Lín- gua Portuguesa. Autor das obras, “Princípios de Direito Penal”, “Recupe- ração Empresarial” (Nova Lei de Falências & Novo Direito Penal Fali- mentar em coautoria com Roberto Ozelame Ochoa), ambas editadas pela Editora Livraria do Advogado/Porto Alegre; “A História e a Vida das Prerrogativas da Advocacia”, em coautoria com Claudio Pacheco Prates Lamachia, então Presidente da OAB/RS; “A Pena de Morte e o Sistema de Penas no Brasil”, ambas pela Editora Pradense/RS. Escreveu também

a biografia do advogado criminalista “Voltaire de Bittencourt Pires”, impressa pela Editora da OAB, e a biografia de seu pai, “Doutor Ferreira Weinmann, Uma Vida Dedicada à Medicina de Ijuí”. Possui artigos pu- blicados em revistas nacionais. Atualmente reside e atua como advogado criminal na cidade de Porto Alegre.

Em que faculdade o senhor cursou direito? Em que ano o senhor ingressou? Quando o senhor se formou...?

Fui um advogado de vocação tardia. Ingressei, em 1964, na Fa- culdade de Direto da PUCRS. Era um dos alunos mais velhos da minha turma.

Quantos anos o senhor tinha?

Eu nasci em 3 de maio de 1935. Tinha, portanto, 28 anos. Já ti- nha uma profissão definida: era representante comercial. Escolhi o curso de Direito não pensando em advogar – isso tudo antes do Golpe de 1964. Já era casado, tinha filhos, e não tinha um curso superior. Fui fazer vesti- bular única e exclusivamente para botar um diploma na parede, pensando que amanhã ou depois se um filho meu me dissesse: “Pô, pai, tu tá bem de vida sem um curso superior”. Diria, então, “Não. Eu escolhi uma pro- fissão diferente, mas um curso superior eu tenho”. Foi a minha determi- nação.

Por que Direito?

É que naquela época o Direito tinha curso noturno e permitia um percentual maior de faltas, permitindo-me que continuasse trabalhan- do. Isso na Pontifícia Universidade Católica, em Porto Alegre.

Acontece que quando da aula inaugural – fui assisti-la à noite – o Professor era o João Leitão de Abreu. Esse cidadão fez uma palestra tão cativante que me abriu novas vistas para o curso de Direito. Era um ex- celente orador, com uma cultura vastíssima. Tinha sido seminarista Jesuíta, ao que me lembre. Suas aulas eram verdadeiras conferências, já que pro- fundo conhecedor da Filosofia de Direito. Encantava a todos nós. Foi Ministro Chefe da Casa Civil do Presidente Médici e depois Ministro do Supremo Tribunal Federal, tendo atingido sua presidência. Passei, então, a me interessar. A cadeira que ele ministrava era Introdução à Ciência do

Direito. Ao mesmo tempo, naquela época era seriada1, não era em se-

mestres, como hoje é. Então, havia professores extraordinários. O Profes- sor Elpídio Paes, que nos dava aulas de Direito Romano, era um verda- deiro romanista (era temido no vestibular por examinar Latim). O de Teoria Geral do Estado era um verdadeiro ‘gauchão’, o Prof. Darcy Azambuja. Além de sua Teoria Geral do Estado, possuía uma rica obra literária, versando sobre as tradições gaúchas. Seguidamente, ainda hoje, releio sua obra tradicionalista. Deu-nos poucas aulas, mas o suficiente para nos encantar. O Paulo Brossard, Ministro aposentado do STF, então advogado e deputado estadual, dava Direito Constitucional na turma da manhã. Embora não fosse meu professor, eu e outros alunos o assistíamos voluntariamente, pela manhã. Isso tudo me fez ficar encantado pelo curso de Direito.

Todos os professores se igualavam. Aquilo fez com que eu es- tudasse muito, não para tirar notas altas, e sim para apreender. A conse- quência foi que durante todo o curso tirei notas muito acima da média.

Havia uma ligação ideológica muito forte entre o Brossard e meu pai. Pertencíamos à terceira geração de maragatos, inimigos visce- rais dos ximangos2. Seguidores de Gaspar Silveira Martins, Joaquim

Francisco Assis Brasil e Raul Pilla, os criadores do Partido Libertador. Meu avô, meu pai e eu fizemos parte do saudoso PL. Inscrevi-me nele, antes mesmo de ter idade para votar3.

1 Refere-se ao regime seriado anual em que o curso de Direito era organizado.

2 No Rio Grande do Sul, logo nos primeiros anos da República Velha, os “maragatos”,

liderados por Gaspar Silveira Martins, enfrentaram os “pica-paus”, encabeçados pelo então presidente do Estado Julio Prestes de Castilhos, durante as Revoluções Federa- listas iniciadas em 1893. Os “maragatos” eram federalistas e, portanto, defendiam maior autonomia do Estado. Os “pica-paus”, que passaram a ser chamados de “xi- mangos” durante a Revolução de 1923, eram republicanos, e defendiam maior inter- venção do governo central.

3 O Partido Libertador foi fundado em 1928 por políticos do antigo Partido Federalista

do Rio Grande do Sul, composto especialmente por maragatos que propunham o for- talecimento do federalismo no período da República Velha. Dentre as políticas do plano de governo, estavam a proposta de reforma constitucional e a instituição do si- gilo absoluto do sufrágio eleitoral. Foi extinto na instauração do Estado Novo e, com seu término, refundado em 1945, vindo a ser extinto novamente em 1965, por força do AI-2. Durante o processo de abertura democrática, não foi refundado, pois seus ex- -integrantes migraram para outros partidos recém-criados. Para mais informações a respeito, v.: TAUFER, Paulo Roberto. Partido Libertador: formação e atuação políti-

ca (Dissertação de Mestrado em História, Universidade Vale do Rio dos Sinos, 2008);

Quando o senhor ingressou na faculdade, o senhor já era fi- liado ao partido?

Sim, e frequentava o partido junto com o meu pai. Eu estudava no Colégio Anchieta, que ficava na Rua Duque de Caxias, a uma quadra e meia da Assembleia Legislativa Estadual (interessante que o colégio fica- va ao lado da casa de Júlio de Castilhos, hoje museu, que vizinhava com a de Borges de Medeiros, à época ainda vivo). Terminavam as aulas e ia eu para lá encantar-me com os discursos de Brochado da Rocha (depois Primeiro Ministro do governo parlamentar de João Goulart), Mem de Sá (Ministro da Justiça de Castelo Branco), Henrique Fonseca de Araújo (Procurador Geral da República de Ernesto Geisel) e, mais tarde do Paulo Brossard (Consultor Geral da República e Ministro da Justiça de Sarney, Ministro do Supremo Tribunal Federal e Presidente do TSE).

Embora a diferença de idade, mereci sempre certa consideração do então deputado Paulo Brossard. Meu pai e ele foram deputados juntos. Como disse, tinha já uma profissão que bem me atendia às ne- cessidades minhas e de minha família. Ao resolver fazer o vestibular, não falei nada para ninguém, até porque na época o número de faculdades de Direito era pequeno e o número de candidatos era enorme. Mesmo por- que, homem feito, pai de família, caso não fosse aprovado, me sentiria muito mal perante os meus amigos. Por isso não comuniquei a ninguém.

Determinado dia, os jornais deram a lista dos aprovados e eu era um deles. O Brossard estava em sua fazenda em Bagé. À noite recebi um telefonema dele: “Mas o que é isso, Weinmannzinho?” (era como ele me chamava, porque para ele o meu pai era o velho Weinmann): “Mas, como é que fazes vestibular para Direito e não avisas a ninguém”. Disse que o fizera só por experiência. Ele redarguiu: “Bom, então quero te dizer que minha biblioteca está à tua disposição”. Passei cinco anos de Direito fre- quentando a casa e a biblioteca do Ministro Brossard.

Consequentemente... E digo isso para que saibam qual foi a mi- nha formação. Aliás, confesso que as coisas sempre deram errado na mi- nha vida. Criei-me junto ao consultório médico de meu pai, que desejava que eu fosse médico. Mas não podia ver sangue, desmaiava; fui ser co- merciante.

No Direito, o que me encantou foi o Direito Civil, o Processo Civil, o Direito Comercial, influência do Professor Paulo Brossard. Em nada me atraía o Direito Criminal. Eu o acompanhava nas audiências, no

Superior Eleitoral (TSE) <http://www.tse.jus.br/hotSites/registro_partidario/pl/arquivos/ programa.pdf>. Acesso em: 17 jan 2013.

seu escritório, etc. Acompanhei o período de sua preparação para a cáte- dra de Direito Constitucional na Federal e sua tese ‘O Impeachment’. De Penal, nada!

Em 1967, ele foi eleito Deputado Federal pela primeira vez, e foi para Brasília.

Faço um parêntesis: o Partido Libertador foi pioneiro no desejo de uma reforma política do País. Teve posições muito firmes desde a ditadura do Vargas, e depois em alguns posicionamentos, especialmente com a doutrinação de Raul Pilla pelo parlamentarismo.

Ficamos radiantes com a emenda parlamentarista que permitiu que o Doutor João Goulart assumisse a Presidência da República. Fica- mos muito sentidos quando o plebiscito o extinguiu. Gastou-se uma for- tuna incalculável dos cofres públicos contratando grandes artistas, canto- res, os grandes bailarinos, para fazer propaganda da extinção do parla- mentarismo (até hoje me pergunto se o Brasil não estaria bem mais evo- luído se continuasse sendo regido pelo sistema parlamentarista).

Fazíamos oposição. O Movimento Revolucionário nos agradou muito. Jamais renegaria o meu passado. Penso que, na ocasião, o Golpe foi oportuno. Era e sou homem de direita por convicção; como sou ho- mem cristão, por ter fé.

Assustava-me o paredão em Cuba, ou o que era a União dos Países Socialistas Soviéticos, nada democrático. Era exatamente o contrá- rio do que eu queria para uma revolução brasileira. Então, eu fui favorá- vel, e até confesso, porque não sou hipócrita, que, no dia 31 de março de 1964, eu estava dentro do Palácio Piratini, e vi quando o governador Ildo Meneghetti entrou num automóvel e foi refugiar-se em Passo Fundo. O motorista era o Cel. Jesus Linares Guimarães, depois comandante geral da Brigada Militar. Estava eu lá. Então, acompanhei e desejei a maior felicidade ao movimento da Fé pela Liberdade, com comícios tão nume- rosos quanto aos das ‘Diretas Já’. Eu achei que o Brasil iria caminhar por um bom caminho.

Em 1964, o senhor estava no segundo ano de faculdade? No primeiro ano.

Existia alguma vida política entre os alunos? Essas questões eram levadas para dentro da faculdade? E depois de 1o de abril de 1964, o senhor teve alguns colegas que foram perseguidos?

Tive. Tive colegas cassados. O movimento universitário, antes de 1964, era um movimento eminentemente intelectual, bipartido filoso-

ficamente. Existia um professor, que mais tarde foi cassado, o Professor Ernani Maria Fiori, que liderava a ala da esquerda, e um médico, Doutor José Fernando Carneiro, que liderava a ala da direita, de quem eu me tornei grande amigo até à sua morte. Era um grande sociólogo, além de um extraordinário médico. Mas, o meu verdadeiro líder era o Paulo Brossard.

O movimento de 1964 irrompeu com as nossas esperanças de um movimento restaurador da nossa então combalida democracia. Aderi a ela, plenamente.

Em seguida, alguns atos de violência fizeram com que nos tor- nássemos desiludidos.

A morte do sargento Raimundo, o chamado caso das “mãos amarradas”, fez com que o Deputado Brossard abrisse as baterias contra o regime recém-instituído.

Acompanhei-o. Depois, ele aceitou a sublegenda do MDB – e, a convite do Senador Pedro Simon – acompanhado de um grande número de ‘maragatos’ passou a lutar pela redemocratização nacional.

Mas, me inquiriste sobre alunos cassados. Um dos grandes líde- res da esquerda na minha época de estudante, o maior deles talvez, foi o Carlos Alberto Vieira, que depois veio a ser prefeito de Quaraí, uma ci- dade da fronteira.

Foi um homem de uma coragem cívica extraordinária. Tínha- mos debates os mais exarcebados possíveis, ambos em campos opostos, e terminávamos no bar da faculdade tomando um cafezinho. Lá pelas tantas veio o Decreto-Lei que o expulsou da faculdade.

A qual o senhor está se referindo?

Ao que dava direito à direção das Faculdades de expurgar alu- nos e professores tidos como subversivos ou comunistas4. Acho que o

Ministro da Educação era o Jarbas Passarinho5. Esse colega foi cassado.

4 O entrevistado se refere ao Decreto-Lei 447, de 26 de fevereiro de 1969. O objetivo

da norma era definir infrações disciplinares praticadas por funcionários, alunos e pro- fessores de instituições de ensino, tais como praticar atos de “organização de movi- mentos subversivos”, “distribuir material subversivo de qualquer natureza” e usar das dependências escolares para “fins de subversão ou para praticar ato contrário à moral ou à ordem pública”.

5 À época da publicação do Decreto-Lei 477, Favorino Bastos Mércio era o então Mi-

nistro da Educação, ocupando a função até 3 de novembro de 1969. Logo após, assu- me Jarbas Gonçalves Passarinho até 15 de março de 1974. Disponível em: <http://

Debatíamos no Conselho Estadual de Estudantes. Ele era da Universidade Federal e eu da PUC-RS.

Teve ele um êxito político tão grande, quanto fugaz. Foi dos estudantes de Direito mais talentosos que eu conheci. Diziam que era, como outros, profissional universitário. Alguns destes levavam até dez anos para se formar.

E o senhor levou quantos?

Eu completei no tempo mínimo. Eu não era estudante profissio- nal. Do Carlos Alberto eu não diria isso, porque senti nele, meu grande adversário, a mesma fé e convicção pelos seus princípios como eram os meus, apenas que em campos diversos.

A fé, as minhas convicções e os meus princípios, tão diferentes, eram tão honestos quanto os dele. Esse cidadão, ainda quando universitá- rio, teve uma atitude quase que heroica. O restaurante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul era o lugar de refeições dos alunos da UFRGS. Houve um movimento paredista, ao que me lembre, contra o aumento do preço da alimentação. Em razão disso, houve uma interven- ção federal. O restaurante seria invadido pelos militares. O Vieira disse: “Aqui eles não entram!” Apoiado com as duas mãos na porta de entrada do restaurante, Vieira gritou para o oficial que comandava o pelotão: “Os senhores não entram aqui!”. Vieram eles, armados, para cima dele. Ele firme com as duas mãos, levantou os pés e deu no peito do oficial, atiran- do-o longe, mas imediatamente o prenderam. Era um pelotão, né? Leva- ram-no, imediatamente, preso para o DOPS.

Eu fiquei sabendo 24 horas depois e imediatamente fui até lá. Lá, graças ao conhecimento que eu tinha com um Delegado conterrâneo meu, que estudara comigo na mesma aula no primário e no ginásio, Dele- gado Marco Aurélio dos Reis (era o delegado-chefe do DOPS), falei-lhe e ele me disse: “mas esse cara é o que mais cria problemas para nós. É um subversivo, é isso, é aquilo...”. Eu respondi: “Marco, ele só tem uma coi- sa diferente de ti e de mim: as nossas convicções é que são diferentes, (pensiero non paga gabella), pensamento não paga imposto, regra da economia italiana.

O Delegado Marco Aurélio está vivo, muito doente. Procurou- -me recentemente para que eu seja seu advogado. E eu o serei.

portal.mec.qov.br/index.php?option=comcontent&view=article&id=13462&ltemid=9 45>. Acesso em: 16 out 2012.

Nessa época do episódio com o Carlos Alberto Vieira o se- nhor já era formado?

Não, creio que estava me formando. O senhor chegou a fazer estágio?

No meu tempo não existia estágio... Fiz aqui esta homenagem ao Carlos Alberto, porque, segundo soube, está muito doente. Ele foi cassado naquela época e, depois, com a anistia, voltou à Faculdade, for- mou-se em Direito, e veio a se tornar um advogado de muito êxito na cidade de Quaraí, na fronteira sudoeste do Rio Grande. Lá ele teve uma votação significativa elegendo-se Prefeito Municipal. Não vou assegurar os números, mas foi eleito por uma maioria quase absoluta dos votos. Imediatamente, tomou determinadas posições... Quaraí tinha há pouco deixado de ser cidade de fronteira, onde os prefeitos eram indicados pelo Governo Federal. Passou a fazer programas de rádio, e... Eu tenho a im- pressão de que era no Governo Médici, isso. Ele terminou se incompati- bilizando com todos.

Nesse meio tempo, houve um homicídio em Quaraí. Tive que enfrentá-lo e pude aquilatar o valor de sua inteligência. Ele ganhou o Júri, na época em que eu era advogado dativo da Vara do Júri, acostumado a fazer Júris.

Vou fazer outros parênteses para dizer como é que eu caí na ad- vocacia criminal, tendo passado cinco anos no escritório do Brossard, só interessado em Processo Civil, Direito Civil e Direito Comercial.

O senhor se formou em 1968 para 1969? Formei-me em 1969.

E o senhor logo começou a trabalhar com advocacia criminal? Iniciei antes de formado. Naquela época, havia a figura do soli- citador. Concluído o terceiro ano e, já inscrito no quarto ano, se podia advogar. Recebíamos a carteira de solicitador, que nos autorizava a prati- car a maioria dos atos de advocacia. Comecei como generalista, fazia de tudo um pouco. O que caía na rede eu pegava.

Mas, em razão da minha amizade com um advogado da Vara do Júri, Rovirio Breda e, não existindo defensoria pública, passei a trabalhar com ele no Júri. Quanto à minha primeira experiência no Júri popular,

também foi obra do acaso. Recém-formado, fui procurado por uma cole- ga de turma. Tinha ela assumido a defesa de uma senhora que tinha ten- tado matar o marido. Havia pegado ele em flagrante adultério. Minha colega fizera uma excelente instrução. Mas nunca tinha falado em público e, como eu tinha sido do Centro Acadêmico, recebi dela o convite para fazermos juntos o plenário do Júri. Pensava com os meus botões: “Esse será o primeiro e o último Júri da minha vida”.

Foi um julgamento muito debatido. Começou às 9 horas da ma- nhã, terminando às 7 da manhã do outro dia. Naquela época, eram 3 horas para a acusação e 3 para a defesa, uma hora tanto para a réplica quanto para a tréplica. Foram quase 24 horas de julgamento. Testemunhas no Plenário... A ré foi absolvida.

A imprensa deu destaque à minha atuação, já que tinha contra mim o meu Professor de Processo Penal e o paraninfo da minha turma, o Prof. Paulo Cláudio Tovo. Eu, com um projeto de advogado civilista, me vi de novo às voltas com o destino (que, cá para nós, foi sempre muito generoso para comigo).

No outro dia, recebo um chamado da escrivã da Vara do Júri di- zendo que o juiz queria falar comigo. Disse-me ele que tinha gostado da minha maneira de argumentar e que, dos três defensores dativos, dois tinham pedido transferência para outras varas, sendo que, se eu aceitasse, me nomearia advogado dativo. Acho eu nisso tudo teve à mão do Prof. Paulo Cláudio Tovo, meu paraninfo, meu admirador e amigo.

Passei então a fazer júris açodadamente. Naquela época, a tele- visão engatinhava, e os noticiários pululavam nos jornais impressos. Porto Alegre tinha dez jornais de boa circulação. Então, eu passei a apa-