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Análise da influência do gênero na argumentação

No processo argumentativo, o gênero tem significativa importância, pois os textos são condicionados pela necessidade de uso. De certa forma, entender as características e as particularidades de um determinado gênero discursivo possibilita a organização de estruturas que proporcionam a argumentação. No caso da Sessão Plenária, vimos que esse gênero sofre uma série de coerções externas ao texto, pois em muitos casos os acontecimentos externos é que proporcionam (impulsionam) as discussões e os debates a serem travados entre os parlamentares.

Obviamente, além desse fato, as características do gênero também influenciam a condução do texto e do seu uso. Não podemos deixar de mencionar um fator que faz com que o gênero discurso de Sessão Plenária seja diferenciado e cheio de particularidades: apenas pessoas eleitas pelo voto direto podem participar de uma Sessão Plenária. Dessa forma, esse gênero não tem o mesmo grau de comunicabilidade, por exemplo, de um artigo de opinião de uma coluna de jornal, cuja circulação é muito grande ou de um texto publicitário. Os sujeitos envolvidos no processo de comunicação da Sessão Plenária são, especificamente, cidadãos que representam outros cidadãos.

É inegável, contudo, que temos que reconhecer que o gênero discurso político em Sessão Plenária é eminentemente argumentativo. O objetivo do Locutor é convencer, persuadir, dizer que possui a razão e a verdade em seus argumentos; para isso, ele usa de uma série de estratégias argumentativas com propósitos claros e simples. Sobre essa essencialidade argumentativa, observemos o trecho a seguir:

Discurso 17:

“(...)Quero fazer referência a minha própria vida, quando estive no cárcere, no DOI-CODI, na época da ditadura. Os companheiros que aqui estão sabem muito bem que jamais fiz uso desse episódio da minha vida, que muito honra, lutando pela democracia. Nunca fiz uso, Deputado Silvio Costa, nunca pedi que os torturadores fossem identificados e punidos, embora sempre tenha apoiado que a anistia que foi feita, e não foi negociada com o povo brasileiro, deveria ser revista, para que eles fossem chamados à Justiça, para que fossem colocados face a face com suas responsabilidades. Nunca fiz disso uma bandeira pessoal. Mas faço referência a isso porque quero perguntar: onde está a Justiça? Fala-se que agora há justiça. Os órgãos de imprensa criaram um clima de linchamento prévio ao julgamento. O Tribunal, que se curvou a esses órgãos e fez julgamentos sem provas, agora, não como fato isolado, mas como consequência da sistemática maneira de tratar o Partido dos Trabalhadores e seus militantes, faz este espetáculo deplorável, leva presos que por ele mesmo foram condenados a regime

semiaberto a estarem fora de seus Estados em regime fechado. Um desses presos é o companheiro Genoíno (...)”.

O discurso 17, de um dos parlamentares do PT, representa um exemplo de como o discurso político é um gênero eminentemente argumentativo. Observando o trecho selecionado, um fragmento do discurso parlamentar proferido no dia 19 de novembro de 2013, percebemos a tentativa de empreender uma tese e de convencer os seus interlocutores de algo, no caso do Locutor em questão, de que Genoíno, um dos acusados de chefiar o esquema do Mensalão e que fora condenado à prisão, teria sido condenado de forma errônea pela corte máxima da justiça.

Para argumentar favorável a sua tese, o Locutor usa a estratégia de apresentar um exemplo real de sua vida para embasar seus argumentos. Assim, o trecho “Quero fazer referência a minha própria vida, quando estive no cárcere, no DOI-CODI, na época da ditadura” configura-se como um elemento capaz de proporcionar uma aproximação do Locutor com o fato a ser apresentado, além de indicar que ele reconhece o que será tratado no seu discurso. Adiante, ele acrescenta que “os companheiros que aqui estão sabem muito bem que jamais fiz uso desse episódio da minha vida, que muito honra, lutando pela democracia” para indicar que, em outros momentos da história, poderia ter usado esse episódio de sua vida como argumento, mas há um senso comum entre os pares de que “ele não usa argumentos de sua vida” para convencer o público ou causar comoção.

No caso da situação comunicativa do Locutor numa Sessão Plenária, o legislador deve cumprir uma série de protocolos que são exigidos pelos Locutores no momento da comunicação. Um deles é a questão do tempo. Os discursos devem ser breves, uma vez que a quantidade de Locutores é muito grande, o que acaba dificultando que as discussões possam ocorrer de forma mais intensa. Por causa disso, e é notório em nosso corpus, temos alguns textos bem curtos, como se fossem quase breves pronunciamentos, como o abaixo:

O SR. AFONSO FLORENCE (PT-BA. Pela ordem. Sem revisão do Locutor.) - Presidente, quero rapidamente registrar nossa preocupação com que, por falta de serenidade, de bom senso e de respeito à legislação brasileira, com base no domínio do fato, com coincidências de calendário de julgamento com calendário político e cívico nacional, chegamos a uma situação final de reclusão, com a privação de liberdade do Deputado José

Genoíno, de Delúbio Soares e de José Dirceu, que tinham direito a regime semiaberto. Ademais, há o caso grave, reconhecido por esta Casa, pelo sistema de saúde desta Casa, da situação do Deputado Genoíno, que devia estar sob cuidados médicos. Sua situação é gravíssima. Quero registrar que a falta de serenidade do Presidente do Supremo e do Relator pode levar a consequências muito danosas.

O texto a seguir é um dos discursos de um deputado do PT. Se observarmos bem, percebemos que o Locutor, ao estar na tribuna da Casa Legislativa, apresenta-se rapidamente, com o objetivo de demonstrar sua indignação quanto ao julgamento e ao processo de condenação em que os envolvidos com o “esquema do mensalão” estavam presentes. Desse modo, ciente de todos esses aspectos, passemos para as considerações deste capítulo e as indicações das informações centrais do nosso próximo capítulo.

Entender o gênero discurso político de Sessão Plenária em sua composição é indicar que os temas a serem abordados determinarão a construção de um determinado estilo a ser seguido. Por causa disso, constrói-se um padrão de linguagem a ser mantido como base e norma entre os deputados, o que impossibilita, por exemplo, o uso de expressões de baixo calão nas discussões e debates entre eles. Esse estilo pode ser estabelecido para todos os indivíduos que seguem uma determinada agremiação política.

Assim, é fundamental que o gênero seja entendido a partir de todos os aspectos socioculturais em que estão envolvidos. No próximo capítulo, trataremos de um componente ligado não ao gênero, mas ao modo de organização do texto que o materializa: o Componente Textual.

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O COMPONENTE SEQUENCIAL

O texto instaura sua própria realidade, seu próprio universo de discurso, dentro de uma visão interacional e praxeológica da linguagem, porque ele está imbricado nas práticas sociais em que se efetiva”. (Mônica Magalhães Cavalcante- Entrevista a Revista Revel)

Nesse capítulo, apresentaremos o modelo de análise da argumentação desenvolvido por Adam (1999; 2008), responsável por estabelecer critérios de análise com base na relação entre gênero, interdiscurso e formações discursivas. Essa perspectiva teórica é crucial para o desenvolvimento do Componente Sequencial que estamos propondo. Consideramos que todos os aspectos de cunho textual estão diretamente relacionados, para não dizer imbricados, a aspectos de natureza discursiva.