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O filósofo russo Mikail Bakhtin9, retomando muitos aspectos relacionados ao gênero já tratados por Aristóteles, foi o responsável por nos apresentar a problemática

9Ao abordarmos a temática dos gêneros, pensamos logo na influência que Bakhtin causou em diversificadas áreas da

linguagem (Linguística Aplicada, Linguística Textual, Análise do Discurso etc.). Na verdade, o interesse em se estudar, definir, estabelecer os componentes ligado à noção de gêneros de discurso explica-se pelo impacto que a leitura do texto Gêneros do Discurso, desse autor, que fez um rebuliço teórico significativo nos meios acadêmicos nas três últimas décadas. Esse texto, na verdade, é um manuscrito inacabado, escrito nos últimos anos de vida do pensador russo (em 1952-1953, de acordo com M. Holquist), publicado em 1979 após sua morte.

dos gêneros, limitada à época somente ao campo literário, para o campo linguístico. Para isso, o pensador trata o gênero sob uma ótica discursiva, fato que o fez um dos grandes pensadores das Ciências Humanas a partir de seus estudos da linguagem que, embora se baseassem em exemplos de textos literários, não se limitava a simples explicações dessa área.

Um dos pontos mais importantes na proposta desse autor é o fato de ele ter reivindicado traços básicos para a consideração dos Gêneros do Discurso. Para o autor, apenas a interação entre dois indivíduos socialmente organizados que pode dar origem à enunciação. Na verdade, ele vai além disso, ao propor que, embora não haja interlocutor real, este pode ser substituído por um representante do mesmo grupo social ao qual pertence o Locutor.

Falar da obra de Bakhtin10 é considerar, também, as polêmicas que se referem à constituição dela, principalmente com relação à autoria de alguns livros e artigos desse autor, já que há indícios (mesmo que não comprováveis em sua totalidade) de que os textos podem ter sido escritos por Voloshinov ou ainda outro teórico. Nosso objetivo não é entrar nessa questão polêmica e controversa, por isso, quando nos referirmos a Bakhtin, na verdade, estaremos nos reportando a todos os autores que constituíram o seu círculo teórico, pois o pensamento do autor, muitas vezes, constituiu-se de maneira pulverizada em várias obras e, com certeza, devemos considerar a participação de seus discípulos na lapidação do pensamento de gênero que se atribui (e sempre se atribuiu) ao mestre. A teoria dos gêneros do discurso empreendida pelo teórico encontra-se dispersa em duas obras: Marxismo e Filosofia da Linguagem e em Estética da criação verbal.

O fato é que a obra Marxismo e filosofia da linguagem, cuja primeira edição, em português, foi no ano 1979, configura-se como a responsável pelos primeiros contatos entre o pensamento do círculo de Bakhtin e as pesquisas sobre gênero no Brasil. No prólogo dessa obra, o autor nos apresenta as reais intenções de seu livro, que seriam: a) na sua primeira parte, situar “o lugar dos problemas da filosofia da linguagem dentro

10Bakhtin é formado em São Petersburgo, onde cursou estudos clássicos na Faculdade Filológico

do conjunto da visão marxista do mundo” e, b) na segunda, “resolver o problema da natureza real dos fenômenos linguísticos” (BAKHTIN, 1992, p. 27).

Já em Estética da criação verbal, o autor estabelece profundas reflexões sobre os gêneros e, além disso, apresenta algumas relações existentes entre eles e os tipos de enunciados. Em seu pensamento, o autor considera que os gêneros do discurso estão presentes em diversificadas esferas da atividade humana, que corresponderiam às condições e às formas de comunicação social. Ademais, sua proposta leva em conta também que, nos gêrenos, existe uma série de formas típicas de enunciado as quais já estariam em nossas práticas discursivas desde quando nascemos (os tipos do discurso) responsáveis diretamente por moldarem os gêneros.

Na verdade, uma das principais características do pensamento desse autor é quanto à consideração da linguagem como sendo produto de um complexo processo interativo. Em seus trabalhos, existe o pressuposto de que qualquer consideração da língua sempre deve ocorrer na relação dialética indivíduo/sociedade, em um universo em que se interpenetram o individual e o social.

Um ponto importante no pensamento de Bakhtin é com relação à palavra. Para ele, esta seria o território comum do Locutor e do interlocutor e, por causa disso, seria responsável por comportar duas faces: tanto procede de alguém, como se dirige para alguém. Ademais, ele defende que a palavra seria responsável por representar o produto da interação Locutor/ouvinte, servindo de expressão de um em relação ao outro. O pensador russo assevera ainda que é por intermédio da palavra que o sujeito se define em relação ao outro e, assim, tem-se o que ele define de coletividade. O que se evidencia é a preocupação dele com a interação. Na verdade, é a partir dela que a linguagem implica a realização de uma atividade discursiva, já que sempre se diz algo a alguém, em um determinado contexto sócio-histórico.

Assim, o conceito de gênero emerge a partir de uma espécie de dinamicidade, que seriam características deles, sempre resultantes de relações sociais, por isso sofrem as transformações que ocorrem na sociedade.

Essa dinamicidade nos é apresentada na obra Marxismo e filosofia da linguagem, quando o teórico discute sobre o tema da enunciação. Outrossim, o autor nos apresenta a importância do processo de evolução histórica e do contexto social para

se depreender um tema. Para ele, o tema, assim como o gênero em que está inserido, apresenta essa dinamicidade de modo muito frequente. Por causa disso, defende a existência de um espécie de componente estático e dinâmico.

O que Bakhtin toma por elemento estático seriam algumas formas de enunciados ou temas que caracterizam determinados gêneros e que, dessa forma, são transmitidas ao longo da história. Para o autor, é o gênero que dita uma série de articulações composicionais às quais os textos dessa formação genérica devem se acomodar. Sempre essas estruturas linguísticas se relacionam a um contexto sócio-histórico, a uma uma dada esfera da atividade humana e, juntos, vão condicionar certas escolhas eminentemente estilísticas. Assim, podemos apresentar o que o autor considera como componentes do gênero: o tema, as unidades composicionais e o estilo. Esses componentes que compõem o gênero fundem-se indissociavelmente no todo do enunciado, e todos eles são marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação. Por causa disso, o autor nos diz que os gêneros são compreendidos como tipos relativamente estáveis de enunciados quanto ao tema, ao estilo e à forma composicional, produzidos nos diversos campos ou esferas da atividade humana.