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4. ANÁLISE DOS DADOS DE COMPREENSÃO DAS CRÔNICAS

4.2. ANÁLISE DOS DADOS DAS TAREFAS OBJETIVAS

A despeito das críticas relacionadas à má elaboração dos itens presentes nas avaliações ligadas à compreensão leitora e linguística, tais questões fazem parte do sistema avaliativo interno e externo educacional e tais quais as questões subjetivas, quando elaboradas adequadamente, auxiliam no processo de avaliação de desempenho dos estudantes. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) chega inclusive a disponibilizar aos gestores das redes estaduais e municipais de ensino os guias para a elaboração de tais modelos questões.

Assim, o roteiro de leitura e os exames trimestrais aplicados na unidade escolar em diálogo com o projeto contemplaram tais estilos de questões. Os mesmos não foram elaborados, necessariamente, segundo o guia. Porém, buscou contemplar, como já foi dito, os descritores que compõem a matriz de referência de língua portuguesa e as estratégias de leitura. Segue abaixo, o roteiro de leitura aplicado acerca do trabalho com a crônica O pintinho de Carlos Drummond de Andrade:

1. O que deu início à história foi o fato de:

a) as crianças terem assistido um filme de Walt Disney. b) a moda de enfeitar pintinhos.

c) a festa de aniversário do garoto.

d) o fato de garotos e garotas terem visto um pintinho. 2. De acordo com o texto, com o término do aniversário: a) as crianças queriam comer os pintinhos.

b) as mães tiveram que ensinar noções urgentes de Biologia para as crianças. c) a mãe do aniversariante ofereceu um pintinho a cada criança.

d) os pintinhos foram todos embora. 3. A finalidade desse texto é a) divertir.

b) convencer. c) estimular. d) informar.

4. No texto, a linguagem utilizada foi a) técnica.

b) literária. c) informal. d) jornalística.

5. No trecho, “... e queriam comê-lo...” a palavra destacada refere-se:

a) a dona de casa. b) aos garotos e garotas. c) ao pintinho.

d) ao aniversariante. 6. O tema desse texto é:

a) um relato de uma festa de aniversário.

b) uma descrição sobre os maus-tratos sofridos pelos animais. c) uma crítica ao modo como os pais educam as crianças.

d) uma apresentação de como são feitas as festas de aniversário nos dias de hoje.

Analisando cada uma das questões, verificamos que o primeiro e o segundo item tem por objetivo avaliar se o aluno é capaz de identificar os fatos que motivam as ações dos personagens, (D10); o terceiro quesito avalia se o aluno reconhece a finalidade do texto (D12); o quarto item se o aluno é capaz de identificar as linguagens relacionadas a determinados domínios sociais (D13); a quinta questão se avalia o reconhecimento da função dos elementos que dão coesão ao texto (D2); a última questão detêm-se na identificação do tema (D6).

O quadro abaixo apresenta, parcialmente, a estrutura da matriz de língua portuguesa. A mesma foi utilizada na elaboração das questões:

Tópico I – Procedimentos de Leitura

Descritor EF

Identificar o tema de um texto. D6

Tópico II – Implicações do Suporte, Gênero e/ou Enunciador na Compreensão do Texto

Descritor EF

Identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros. D12 Tópico IV – Coerência e Coesão no Processamento do Texto

Descritor EF

Estabelecer relações entre partes de um texto, identificando repetições ou substituições que contribuem para a continuidade de um texto.

D2 Identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa.

D10 Tópico VI – Variação Linguística

Descritor EF

Identificar as marcas linguísticas que evidenciam o locutor e o interlocutor de um texto.

D13

Se analisarmos as questões propostas tomando por base o uso das estratégias de leitura, percebe-se que basicamente enfatizou-se o trabalho com a seleção e decodificação do

material lido. Algo que percebi muito depois e me deixou profundamente incomodada, uma vez que essa proposta de trabalho buscou enfatizar o uso de estratégias de natureza inferencial e de verificação.

Por outro lado, ao construir essa atividade me ative nos setes níveis de conceitos linguísticos importantes ao processo de compreensão leitora proposto por Jolibert e Sraïki (2015, p.71):

E se nos ativermos aos tipos de perguntas pensadas para construção do roteiro, notaremos que existem questões objetivas que envolvem o conhecimento de dados informados pelo texto; perguntas objetivas que demandam o conhecimento relativo aos objetivos do texto; outras relacionadas ao conhecimento de índices morfológicos e coesivos, bem como uma pergunta que envolve o conhecimento sobre o tema. De maneira que o estudante, embora possa revelar sua aprendizagem em relação ao estudo linguístico do texto, não manifesta seu posicionamento mais crítico em relação ao material lido.

Para suprir esse aspecto relacionado ao estudo do texto, no processo de elaboração do roteiro, foi realizada oralmente a discussão do texto refletindo-se sobre os direitos que envolvem a proteção aos animais. Porém, por não ter tempo hábil, a legislação específica não foi trabalhada em sala, apenas citada.

Além desse roteiro, como já foi dito, realizou-se alguns exames previstos pelo calendário da unidade de ensino. Neles, buscou-se trabalhar as questões inferenciais (D4) e questões que envolvem a identificação da opinião do autor do texto (D7), bem como a identificação do efeito de sentido decorrente da escolha de uma determinada palavra ou expressão (D18) ou decorrente do uso da pontuação e de outras notações (D17). Segue

abaixo, algumas das questões que compuseram a prova da II unidade e avaliaram os aspectos acima mencionados:

Tópico IV – Coerência e Coesão no Processamento do Texto Descritor 1. De acordo com o primeiro parágrafo do texto, para Martha Medeiros:

a) As pessoas se preocupam mais em ser simpáticas que se esforçam para serem empáticas.

b) As pessoas se preocupam mais em compreender emocionalmente o outro. c) Empatia é a capacidade de nos identificar com alguém.

d) A empatia impede que entendamos as razões pelas quais as pessoas se comportam de determinado jeito.

D10

4. Todos os argumentos abaixo, presentes no texto, impedem as pessoas de serem empáticas, exceto:

a) ignorância. b) preconceito. c) mau-caratismo. d) simpatia.

D7

5. Constitui uma opinião da cronista a ideia expressa em

a) Empatia é a capacidade de se colocar no lugar do outro, de compreendê-lo emocionalmente.

b) A pessoa é tão autofocada que para ela só existem dois tipos de gente: os seus iguais e o resto [...].

c) É um assunto recorrente: precisamos de mais gentileza etc. e tal.

d) [...]colocar-se no lugar do outro não é uma gentileza que se faz, é a solução para sairmos dessa barbárie disfarçada e sermos uma sociedade civilizada de fato.

D7

Tópico V – Relação entre Recursos Expressivos e Efeitos de Sentido Descritor 2. O ponto de interrogação, no trecho: Nada impede?

a) é usado na formulação de uma pergunta direta. b) é usado para causar um efeito retórico.

c) a pergunta envolve dúvida. d) denota surpresa.

D17

3. No terceiro parágrafo do texto, a expressão que indica, de modo mais evidente o que impede as pessoas de serem empáticas é:

a) narcisismo. b) autofocada. c) retroalimenta. d) blinda.

D18

9. Em “Ele se retroalimenta de aplausos [...]”a palavra destacada pode ser substituída, sem alteração do sentido por:

a) alimenta. b) realimenta. c) nutre. d) sustenta.

D18

Tópico I – Procedimentos de Leitura Descritor 6. A leitura do texto permite afirmar corretamente:

a) Pessoas que não circulam, não têm amigos, não se informam, não leem são D4

maus-caracteres.

b) Os narcisistas têm medo do desconhecido, e o evitam.

c) A solução para sairmos da barbárie disfarçada é sermos empáticos. d) Colocar-se no lugar do outro é uma gentileza que se faz.

10. Observe a frase:

Narciso acha feio o que não é espelho.

Considerando-se o intertexto que se constrói através da frase, em uma retomada da canção Sampa de Caetano Veloso, é correto inferir:

a) Resgata-se a representação da necessidade de valorização e louvor à imagem do próprio eu.

b) Há uma comparação entre a postura do narcisista e as pessoas empáticas. c) Cria-se, através de uma comparação voltada para a adoração da própria imagem, uma reflexão sobre as condutas egocêntricas.

d) Observa-se a intertextualidade como uma forma de consolidar uma ironia para criticar a postura dos indivíduos simpáticos.

D4

Como os descritores foram empregados no processo de elaboração das atividades e exames internos, é importante destacar como a sua formulação pode e tem auxiliado o professor na elaboração das perguntas, mas também, tem dialogado com uma concepção da compreensão leitora sob o aspecto processual.

Não bastasse isso, “Esses descritores dão margem a um trabalho inferencial, o que é um avanço em relação àquele que só se ocupa da informação objetiva e direta.” (MARCUSCHI, 2008, p.276) o que contribui para realização de um trabalho a partir da perspectiva da leitura crítica do texto.

Essa é uma preocupação, como se pode observar nesses últimos anos, guardada a devida proporção, presente na elaboração do material didático a ser utilizado pelo professor em sala de aula.

O livro com o qual trabalhei em sala revela em sua proposta de trabalho um diálogo com os pressupostos teóricos e metodológicos que norteiam meu trabalho com a leitura. Isso se deve, a meu ver, não apenas como uma forma de atender as regras definidas pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), mas também, pelas contribuições teóricas que foram e estão sendo oferecidas nessa área do conhecimento.

Certamente, há muito ainda a ser avaliado, ajustado e alterado. Porém, os avanços propiciados por uma reflexão sistemática sobre os conhecimentos na área de linguagens, códigos e suas tecnologias tem favorecido a produção de materiais melhores e aprofundado a necessidade de uma reflexão sobre o trabalho a ser realizado pelo docente quer seja em oralidade, leitura, literatura e produção textual.

A matriz de referência em língua portuguesa vem sendo utilizada para elaboração de exercícios objetivos nesses materiais. Todavia, o cuidado que se deve tomar está diretamente relacionado ao uso do instrumento norteador como fórmula para o trabalho com a língua portuguesa em sala. Dito de outra maneira, seja o professor ou o autor do livro didático necessitam desenvolver um trabalho em que a matriz pode auxiliar na elaboração das atividades, mas não serem tomadas como fórmulas prontas, inacabadas e inalteráveis.

Afinal, mesmo a matriz sendo tomada como um modelo hoje para o desenvolvimento de trabalhos em sala de aula, elas não dão conta da realidade com a qual temos de lidar. Falantes, leitores e escritores modelares não correspondem aos falantes, leitores e escritores reais. Existe uma multiplicidade de formas de se usar a língua, assim como diversos são os contextos socioculturais de seus falantes.

Se a noção de língua adotada nesses materiais e na prática docente contempla a heterogeneidade na comunidade linguística, a diversidade de estilos e registros e a dinâmica no sistema linguístico é inviável a realização de um trabalho que desconsidere esses deslocamentos e variações. Como afirma Marcuschi (2008, p.207) quanto à questão dos gêneros textuais existentes:

Deve ter ficado claro que há muito mais gêneros na escrita que na fala, o que é de certo modo surpreendente, mas explicável pela diversidade das ações linguísticas que praticamos no dia-a-dia na modalidade escrita. [...] Essa tendência torna de algum modo difícil a vida do cidadão comum, que já não consegue dominar com facilidade essa verdadeira selva textual. Por isso é importante que nos dediquemos a entender melhor essa questão.

E esse entendimento perpassa, certamente, pelo funcionamento social da língua. Segue abaixo uma das questões presentes no livro didático que confirmam esse diálogo do material com a matriz de referência. O mesmo apresenta como numa mesma questão podem ser articulados um ou mais descritores ligados aos procedimentos de leitura.

Como se pode verificar, a formulação do item exclui o trabalho com a leitura nos moldes de copiação e permite que a interpretação de um texto seja compreendida enquanto processo.

Em suma, é possível perceber que existem modificações no realizar o estudo do texto. Interpretar assume outro sentido, uma vez que o sujeito-leitor não só deve captar o significado explícito do material lido, mas também, construir um olhar particular e mais subjetivo acerca das leituras realizadas. Ademais, hoje, ler um texto significa ser capaz de compreender o

mundo, bem como as formas de retratá-lo, entendê-lo e modificá-lo. Os manuais didáticos, nesse sentido, têm demonstrado alguns avanços em sua abordagem. Os mesmos têm estabelecido diálogos com essa proposta, ainda que mantenham algumas limitações no ato de questionar e estimular um juízo sobre o material escrito.

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