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5 METODOLOGIA

5.4 Análise das informações construídas

A análise das informações construídas neste estudo (através da observação participante, das oficinas e entrevistas com os/as jovens) foi orientada por referenciais teóricos a partir da literatura sobre juventude, gênero, geração, raça/etnia, classe, sexualidade e território, pois nos pautamos a partir de um olhar interseccional desses marcadores (NOGUEIRA, 2013). Assim, observamos a interseccionalidade nos discursos dos/as jovens quilombolas e urbanos/as, a fim de compreender os efeitos produzidos por esses marcadores nas vivências dos/as jovens de ambos os territórios. Desse modo, temos o intuito de não reproduzir concepções arraigadas e, por vezes, que estigmatizam as juventudes, para isso,

observamos nos discursos as expressões de poder, naquilo que resultam em desigualdades e que são hegemônicos nos grupos pesquisados; os movimentos que se apresentam contra a hegemonia, e os processos de resistência dos/as jovens.

Como princípio organizador do material para análise das informações, buscamos subsídios na análise de conteúdo temática. Nesse tipo de análise, o foco é o tema e suas possíveis relações, esse pode ser expresso em uma palavra, frase, resumo. O tema “é a unidade de significação que se liberta naturalmente de um texto analisado segundo critérios relativos à teoria que serve de guia à leitura” (BARDIN, 1979, p. 105). Assim buscamos os subsídios na análise temática para organizarmos o material e seguimos alguns procedimentos: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados/inferência/interpretação. A seguir apresentamos como foi realizado cada uma dessas etapas:

1º momento – pré-análise do material: As informações construídas durante as observações registradas no diário de campo foram digitadas pela pesquisadora. As oficinas e as entrevistas foram transcritas na íntegra. Na pesquisa feminista e interseccional, o processo de análise não é realizado de forma independente de toda a condução da pesquisa. Então nossa análise começou antes mesmo de organizarmos esse material.

2º momento – exploração do material – diário de campo: Para análise do diário de campo realizamos várias leituras do mesmo, que nos ajudou a refletir sobre o contexto da pesquisa (local de moradia dos participantes, experiências de vida, relações na escola e com a escola, lazer, saúde e outras) e também sobre a segunda etapa da mesma: as oficinas. Quais temas a partir dos nossos objetivos iniciais seriam pertinentes para abordarmos no grupo que estávamos pesquisando? O que foi construído no período das observações na interação com os/as jovens? Como poderíamos iniciar as discussões e reflexões nas oficinas?

3º momento – exploração do material - oficinas: Após várias leituras das transcrições das oficinas construímos tabelas abordando os objetivos da pesquisa e temas novos construídos com os/as participantes. As tabelas possuíam dupla entrada, na coluna vertical os marcadores que estamos trabalhando: gênero, classe, raça, geração, sexualidade, território, na parte superior horizontal cada coluna iniciava com um objetivo da pesquisa.

Analisamos cada oficina, uma a uma, e depois relacionamos as análises, buscando compreender e refletir sobre o conjunto de informações construídas. A análise está relacionada aos objetivos da pesquisa e à perspectiva teórica que compõe a mesma. Assim, o foco está na operação dos marcadores sociais gênero, classe, raça/etnia, geração, sexualidade e território, no efeito que essas relações incidem sobre os/as jovens e no modo como os/as

mesmos/as lidam com as diversas situações de desigualdade e opressão.

De acordo com os trabalhos com grupo realizados por Brigagão et al (2014, p.85), nos grupos

alguns/mas participantes buscam convencer os/as outros/as de seus pontos de vista, enquanto outros/as questionam, duvidam, pedem explicações ou as fontes de onde tal informação foi retirada. Alguns/mas permanecem com a mesma perspectiva durante o grupo; outros/as formulam novas opiniões à medida que a conversação se desenvolve; alguns/mas passam a questionar os modos como pensavam antes do grupo. Além disso, é possível observar que as relações de poder permeiam as relações entre os/as participantes durante todo o tempo.

Buscamos observar também essas relações entre os/as participantes em nossas análises. Nos grupos, é possível observar as tensões e os/as participantes que buscam convencer os outros fazendo uso de diversos argumentos, e estivemos atentas também a esse fato nas nossas intervenções enquanto facilitadora e co-facilitadoras. Consideramos aqui os discursos não como individuais, mas como construções coletivas do contexto em que os mesmos estavam acontecendo.

4ª momento – exploração do material - entrevistas: Após as leituras das transcrições das entrevistas, também realizamos tabelas com o material construído, com o mesmo objetivo de análise que foi realizada com as oficinas.

5º momento – tratamento das informações construídas: Depois do percurso descrito no 1º, 2º, 3º e 4º momento, foram construídos tópicos analíticos. A análise foi direcionada às questões de desigualdades e resistência vivenciadas por jovens quilombolas e da periferia urbana. A construção de cada tópico analítico se deu a partir da interseccionalidade, em cada um deles um dos marcadores foi destacado com maior relevância, mas entendendo que a constituição de todos é interseccional. Assim, foi possível construirmos reflexões sobre as situações de desigualdades e resistências vivenciadas pelos/as jovens. O esforço que fizemos para olhar e refletir sobre os marcadores sociais pode ser exemplificado no diagrama abaixo. Todos os marcadores interseccionados, em alguns momentos, tem o que se sobressaí de acordo com as experiências juvenis e os contextos em que são vivenciadas, e os demais marcadores continuam presentes constituindo e sendo constituídos:

Ressaltamos que o conhecimento construído na pesquisa é parcial e situado; isto é, específico às situações e não universalmente aplicável. Durante todo o processo de pesquisa estivemos atentas as informações construídas e refletimos sobre a narrativa realizada por Marques e Genro (2016), sobre a experiência com o Cacique Vherá Poty, quando este explicava aos/as alunos/as e funcionários da UFRGS, as distintas raízes de alma que poderiam ter os seres humanos, nesse momento todos/as acenavam com as cabeças em sinal de que estavam compreendendo. Ao perceber esse movimento, Vherá não hesitou em suspender a fala e dirigir-se ao grupo com os seguintes termos:

Parem de dizer que entenderam. Estamos falando de algo difícil, profundo, que não pode ser entendido assim tão rápido. Escutem uma vez e pensarão que entenderam. Escutem outra e verão que há um elemento fora do lugar. Escutem uma terceira e perceberão que há mais coisas que não se encaixam. Na quarta vez verão que não haviam entendido nada. Talvez na quinta possam começar de novo (Idem, p.332).

Com isso as autoras mencionadas acima ressaltam a importância de uma pesquisa “cuidadosa”, em que a atitude com que escutamos é primordial. Fizemos esse movimento de uma escuta cuidadosa, mas cientes do que afirmou o cacique: que alguns elementos podem ficar fora do lugar da nossa compreensão. A seguir apresentaremos os capítulos de análise das informações construídas, que abordaram: as vivências das desigualdades sociais por jovens de diferentes territórios; as experiências dos/as jovens frente às situações de preconceito e discriminação racial; as experiências dos/as jovens diante das vivências sexuais; os usos de álcool como uma faceta das desigualdades de gênero, classe, raça e sexualidade; e as formas de enfrentamento/resistência às desigualdades nas vivências juvenis.

Raça território sexualidade Gênero classe Geração

6 JOVENS DE DIFERENTES TERRITÓRIOS E AS VIVÊNCIAS DAS