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B IOBIBLIOGRAFIA E FORTUNA CRÍTICA

5. A RECEPÇÃO DO TEXTO DE HENRIQUETA LISBOA

5.5 Análise das respostas

Este conjunto de leitores conseguiu perceber no poema de Henriqueta Lisboa os seguintes índices relativos a esta dimensão inerente à natureza humana, que é a transcendência. Passemos à análise de cada uma delas.

As categorias de tempo, espaço e vida estão intimamente relacionadas.

O vocábulo tempo costuma ser definido como a sucessão dos anos, dias, horas etc., que envolve, para o homem, a noção de presente, passado e futuro; o curso do tempo.

Simbolicamente, o tempo é representado pela figura da roda, com o seu movimento giratório, pelos doze signos do Zodíaco, que descrevem o ciclo da vida. Os informantes foram unânimes a esse respeito e afirmaram: “a construção do poema remete ao nascimento, crescimento e à morte.” (SPM03) “O tempo representa a linha da vida.” (SPM04)

Vários se referiram à fugacidade, brevidade, da passagem do tempo “O texto trata da transitoriedade da vida, [...]” (SPM01). “[...] o tempo está aqui apresentado como a nossa vida, a nossa existência que é frágil, fina a toa escapa pela sua brevidade.” (SPF07). “[...] o tempo não espera, ele escorre, quando se vê, já foi. Não há retorno, nem segunda chance. É preciso sabermos e não sei como, já que é tão passageiro, a prolongarmos cada instante.” (CEF14). “O poema aponta para a brevidade do tempo. A modernidade chegou, (“Perdeu-se o tempo”), deixando a história no passado (“...o tempo que já se foi”). (DFF02). “Neste texto é retratada, de maneira enfática, a efemeridade do tempo e também há um apelo a atividades constantes e interessantes para que a vida não passe em vão. Carpe diem.” (MGM02).

Alguns informantes, olhando o tempo com uma perspectiva de futuro, declararam:“[...] tudo que fazemos no presente, refletirá no futuro, bem ou mal, refletirá.” (CEF03). “Nessa perspectiva ‘ainda há tempo’, pois novo ciclo virá e com ele mudanças que, acreditamos, serão para uma vida melhor.” (SPF06). Outros, abordaram a questão do aproveitamento do tempo e a ideia de movimento que ele denota:“[...] trata da relação entre o tempo que vivemos (aproveitando-o) plenamente e o tempo que não é aproveitado devidamente.” (CEF07). “O tempo é muito subjetivo [...] não desperdice a oportunidade de fazer do tempo que tem algo proveitoso para a sua vida ou para a vida do outro.” (CEF02). “O texto fala do tempo que passa sutilmente [...] No nosso dia-a-dia, é mister cuidar de nossas atribuições com carinho e a preocupação em comprometer-se com o que deixaremos para trás. Não deixemos poeira, mas rochas firmes capazes de dar continuidade aos projetos dos que virão depois de nós.” (CEF08). “[...] mas seja qual

for a situação não podemos parar pois o tempo passa, mas nossas ações permanecem.”(CEF11). “Devemos nos empenhar para construir coisas belas, seguras que valham a pena existir, pois esses serão os frutos que levaremos.” (CEF18)

Verifica-se, na declaração a seguir, a presença do leitor: “Ainda é tempo!”. Neste ponto, o leitor pode ter um reencontro de si mesmo com o tempo que já se foi: a reconciliação com o passado.” (DFF08) É possível observar a importância da idéia de construção e movimento estabelecida no texto, portanto, pode-se concluir que o tempo é movimento, construído e reconstruído.” (DFM08)

Santo Agostinho afirmou que o tempo é a imagem móvel da imóvel eternidade. Dessa feita, como já foi visto, todo movimento reproduz uma forma circular, em uma curva evolutiva entre um início e um fim, que recai na possibilidade da medida que é o tempo. Sair do tempo, portanto, é sair completamente da ordem cósmica para entrar em outra ordem, outro universo. Vejamos o que os informantes declararam referente ao supracitado. “O tempo também é algo complexo pois é um mistério de Deus.[...] E Henriqueta [...] é sutil tecedora de imagens capazes de dar uma dimensão metafísica a seu intimismo radical”. (SPF01). “[...] a maneira como o tecemos (vivemos) será consequência daquilo que esperamos “colher’, [...] o que se faz do tempo é o resultado de como se vive.” (SPF04) “É preciso libertar o indomável potro da juventude, semear aprendizes nos vários tempos e lugares, superar obstáculos e, enfim, tendo o fio-tempo se desenrolado do novelo da vida, pronto o Homem, é hora da passagem.” (SPF08). Constata-se aqui a utilização da linguagem metafórica no discurso dos informantes.

O tempo simboliza um limite na duração do ser humano na terra. Por definição (conforme já exposto com referência a Platão), o tempo humano é finito e o tempo divino infinito ou, melhor ainda, é a negação do tempo, o ilimitado. A unidade de medida do tempo humano é o século; a do tempo divino, a eternidade. Não há entre eles nenhuma medida comum possível. Todavia nem um informante sequer observou nem mencionou tais características.

Em Literatura, mais particularmente na narrativa de ficção, o tempo pode ser percebido como matemático ou cronológico e psicológico; ainda admite cronótropo, anacronia, anisocronia (pausa, sumário, extensão, elipse), frequência (repetitivo, iterativo, singulativo) e o da narração intercalada. Analisemos os exemplos a seguir, de dois informantes acerca do tempo cronológico. “Se pensarmos na idade do universo em termos de tempo cronológico, o que é a nossa vida? Um piscar de olhos? Algo frágil,

breve que não podemos e nem devemos deixar escapar pelas mãos.” (SPF07). “O texto ‘O tempo é um fio’, de Henriqueta Lisboa é uma metáfora utilizada para retratar o tempo cronológico.” (CEF12).

Outro mencionou os tempos cronológico e histórico: “Soltai os potros”... esta parte nos remete a uma busca incessante de libertação. ‘Potro’ – apesar da pequenez, faz-se necessária a coragem e a ousadia de ir aos quatro ventos. Assim é a vida, marcada pelo tempo histórico e pelo tempo cronológico.” (SPM01)

Aprofundando a análise, há os que preferiram usar o vocábulo vida, em vez de tempo. “O texto trata do tempo [...] como metáfora da vida.”(MGF01). “Trata do tempo comparado com as diversas fases de vida tecida no dia-a-dia.” (MGF08). Outros mencionaram o dialogismo existente entre os vocábulos tempo e vida: “O poema trata de um dialogismo, tempo e vida (fio). Ao longo de todo o poema, há a construção desse dialogismo e a definição de como estas duas razões se interfluenciam e de como uma depende da outra.”(DFM12)

Muitos outros abordaram a questão da inexorabilidade e da fragilidade da vida. Vejamos os exemplos: “O texto trata da inexorabilidade da vida.” (DFM03) “O poema trata da efemeridade da própria vida e com a memória que temos do vivido.” (DFM10). Já este, apontou para a visão de futuro: “Da fragilidade da vida [...] tecer com sonhos, pois são eles que nos inspiram no caminhar, a olhar um amanhã de possibilidades pautadas em cada ação do agora.” (CEF15)

Uma professora destacou a sutil barreira entre vida e morte: “A mim este poema reporta a linha tênue entre a vida e a morte, [...]”. (SPF09)

Tempo é ligado espaço, indissociavelmente. As dimensões tempo e espaço constituem limites para demarcar estágios e situações para a mente, nas faixas experimentais da evolução. Dessa feita, vejamos considerações acerca do vocábulo espaço.

O espaço, inseparável do tempo, não é somente o lugar dos possíveis – e, sob esse prisma, costuma simbolizar o caos das origens, bem como o das realizações; nessa perspectiva, simboliza o cosmo, o mundo organizado. É como uma extensão incomensurável, cujo centro se ignora e que se dilata em todos os sentidos; simboliza o infinito onde se move o universo, e é simbolizado pela cruz em três dimensões e seis direções, assim como a esfera em movimento e de expansão ilimitada.

Logo, o espaço engloba o conjunto do universo, com suas atualizações e suas potencialidades. De um modo geral, o espaço simboliza o meio exterior ou interior no

qual todo ser se move, seja ele individual ou coletivo. O espaço interior simboliza o conjunto das potencialidades humanas na via das atualizações progressivas, o conjunto do consciente, do inconsciente e dos imprevisíveis possíveis.

A seguir, alguns exemplos dos informantes referentes ao espaço. Analisemos as abordagens referentes a fazer a diferença no meio em que se vive: “[...] Que devemos aproveitar as oportunidades surgidas e fazer a diferença no que fazemos. Quando se faz com amor, dedicação e empenho, se torna duradouro para você e as outras pessoas. Se consegue deixar marcas, ser significativo.” (CEF10). “[...] No decorrer da vida, colhemos frutos e pescamos peixes, mas é no ânimo da aventura, da exploração, da expansão de nossos feitos, nossas vidas no espaço indeterminado que dá vida ao tempo[...]” (DFM10)

Outro entrevistado refere-se à importância de cada ser humano: “A metáfora do fio é empregada para demonstrar a relevância existencial de cada indivíduo, [...] (DFM11).“Na vida tudo é muito complexo, tudo é uma questão de oportunidades a ser abraçadas. Devemos tirar proveito do que já passou, (no bom sentido), acreditar que você pode, que você sabe e que você é grande em sua essência.” (CEF03)

Passemos, agora, à análise do vocábulo vida.

A vida é o conjunto de princípios que resistem à morte; é um dom da bondade infinita; pode ser entendida também como o conjunto das funções que distinguem os corpos organizados dos corpos inorgânicos. “É uma grande tecelã e nas suas malhas ajusta os sentimentos ao império da ordem, a fim de que o equilíbrio governe todas as ações entre as criaturas. A vida, na sua expressão terrestre, é como uma árvore grandiosa. A infância é a sua ramagem verdejante. A mocidade é constituída de flores perfumadas e formosas. A velhice é o fruto da experiência e da sabedoria. Perceber o sentido da vida é crescer em serviço e burilamento constantes.”78

Identifiquemos o posicionamento dos informantes acerca desse vocábulo. “a vida é o próprio tempo. Tecê-la é um risco.” (SPM01). Outros apontaram para a questão da brevidade da vida e da necessidade de ser bem aproveitada: “Que a vida é passageira, delicada, frágil que é preciso cuidá-la, para preservá-la e acima de tudo aproveitá-la, a prolongarmos a cada instante.” (CEF14). “O texto trata da nossa vida como ela é passageira e de como devemos fazer o possível para aproveitá-la. Nele percebemos

78 Essas afirmativas se encontram no verbete vida, colhido em O Espiritismo de A a Z. Geraldo Campetti Sobrinho. (coord.) 4 ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2010:892-3.

que algumas pessoas fazem pouco da sua vida e mal cuidam delas. A passagem da vida é como o fio fino que a qualquer hora pode se romper e daí em diante só Deus sabe.” (MGEF02). Estes dois exemplos servem de ponte para o tópico seguinte, o temor da morte.

Cada ser humano tem um tempo determinado de vida. E quando esse tempo se finda, é chegada a hora da partida: eis que a morte chega e nos transfere de plano. Muitos homens possuem o temor da morte. Este resulta de vários fatores inerentes à natureza humana e à existência corporal. Entre eles ressaltam-se: 1) o instinto de conservação da vida, que constitui força preventiva contra a intemperança, a precipitação e o suicídio, não obstante desconsiderados nos momentos de grandiosos desgostos, revoltas ou desespero. 2) o temporário olvido da vida espiritual donde procede. 3) o conteúdo religioso das doutrinas ortodoxas, que oferece uma visão distorcida que sucede após a ruptura dos laços materiais.4) o receio do aniquilamento da vida, por falta de informações corretas a respeito do futuro da alma e daquilo que lhe está destinado.

Em síntese, constatou-se que o nível geral das leituras, destacando aspectos acerca da transcendência, é PLENAMENTE SATISFATÓRIO, tendo em vista a grande

recorrência (em relação à diversidade dos informantes) dos níveis mais elevados. Apesar de o número de respostas parafrásicas e genéricas ser elevado, verificou-se um bom desempenho interpretativo e linguístico expressivo dos que responderam ao proposto. Não houve destacada supremacia em um grupo (segundo a procedência) perante outro. Todos se posicionaram, aproximadamente, na mesma frequência de desempenho. Assim também não houve (conforme pode ser observada ao longo desta parte) qualquer marca hegemônica comparando os sexos dos informantes.

Com isso, pode-se afirmar que a leitura deste poema (fato que ocorre em muitos da Autora) não se revelou inacessível a professores e alunos, de ensino médio ou superior, balançando as estruturas daqueles que consideram Henriqueta Lisboa uma poeta de configuração poemática hermética.