CAPÍTULO 4 ANÁLISE DOS DOCUMENTOS E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
4.1 Currículo em Movimento dos Anos Finais do Ensino Fundamental do DF
4.1.2 Análise De Conteúdo Do Currículo Em Movimento Dos Anos Finais Do
Por meio da Análise de Conteúdo (CHIZZOTTI, 2008, 2008; LUDKE e MENGA, 1986), buscamos as palavras referentes às terminologias utilizadas nos estudos do conceito de letramento, como por exemplo, “letramento”; “letramentos”; “novos” e “multi”; “prática(s) de leitura” e “prática(s) de escrita”, assim como definições do conceito de letramento e as
56 Disponível em: http://www.qedu.org.br/estado/107-distrito-federal/censo-
escolar?year=2014&localization=0&dependence=2&education_stage=0&item=matriculas-no-ensino- fundamental. Acesso em 10/04/2016.
concepções abordadas e obras e autores citados pelos documentos a fim de, posteriormente, relacioná-los aos eixos de ensino (leitura, escrita, oralidade e análise linguística).
Nos pressupostos teóricos do Currículo em Movimento do DF não foi encontrada nenhuma categoria de análise acerca das terminologias referentes ao conceito de letramento (“letramento”; “letramentos”; “novos” e “multi”) tampouco “prática(s) de leitura” e “prática(s) de escrita” e, consequentemente, também não foi encontrada nenhuma menção a definições e concepções de letramento e, portanto, nenhuma obra e autor sobre o conceito são citados.
Acreditamos que isso se deve ao fato de os pressupostos teóricos do Currículo em Movimento do DF abodarem questões educacionais amplas e que dizem respeito a todo o processo de ensino-aprendizagem em todas as disciplinas, como por exemplo, a teoria crítica e pós-crítica do currículo, a educação integral, a pedagogia histórico-crítica e a psicologia histórico-cultural e os eixos transversais – educação para a diversidade, cidadania e educação em e para os direitos humanos e educação para a sustentabilidade.
Já no documento que aborda os anos finais do EF, na introdução e na parte que cabe à LP, a categoria de análise “letramento” foi encontrada três vezes e “letramentos” duas vezes; já a categorias “novos” e “multi”, relacionados ao letramento, não foram encontradas nenhuma vez.
A primeira aparição de “letramentos” é na parte introdutória do documento, na página quatorze, quando os eixos integradores do currículo são apresentados: “alfabetização, somente para o Bloco Inicial de Alfabetização (BIA), letramentos e ludicidade para todo o Ensino Fundamental” (BRASÍLIA, 2014c, p. 14).
A segunda aparição de “letramentos” está na mesma página como parte de um dos objetivos do EF que, por sua vez, segundo o documento, estão pautados nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica e foram “ressignificados pelas Diretrizes Pedagógicas desta Secretaria de Educação” (idem): “promover as aprendizagens tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo e da formação de atitudes e valores, permitindo vivências de diversos letramentos” (idem).
Já a primeira aparição de “letramento” está já na parte referente à LP em uma espécie de retrospectiva história desta disciplina na escola brasileira no seguinte trecho:
Até meados do século XX, o ensino da Língua Portuguesa valorizava o estudo da gramática desvinculado de textos e de situações comunicativas. A partir da segunda metade do século, quando os estudos linguísticos lançaram novos olhares sobre a linguagem, a Sociolinguística trouxe reflexões que repercutiram na concepção de ensino. Nesse período, surgem várias pesquisas discutindo e refletindo sobre práticas discursivas e de letramento, valorizando
o papel fundamental da Língua de promover a comunicação (LUZ, 2009) (BRASÍLIA, 2014c, p. 17).
A concepção de letramento aqui mencionada é a no singular, a tradicional e a da letra que, como dissertamos no Capítulo dois desta dissertação, chegou ao Brasil no final dos anos 80 do século XX. Porém, o documento insere “letramento” como práticas de letramento ao lado de “práticas discursivas” e, assim, refere-se às práticas representativas de “uma concepção cultural mais ampla de formas de pensar e realizar a leitura e a escrita em contexto culturais” (BEVILAQUA, 2013, p. 104), ou seja, instâncias sociais culturais, discursivas e ideológicas.
A segunda aparição do termo “letramento” surge quando o documento menciona que os PCN de 1998 enfatizam os gêneros textuais e, ao fazer isso,
(...) práticas de análise linguística, leitura/escuta e produção de textos constituem-se como eventos de letramento que perpassam todos os anos/séries/ciclos, considerando níveis de dificuldade de estudantes e progressão da aprendizagem. Assim, diante das demandas sociais contemporâneas e das políticas públicas de educação em vigor, o ensino de Língua Portuguesa deve estar vinculado a Eixos Transversais que fundamentam todo o Currículo da Educação Básica do Distrito Federal, a saber: Educação para a Diversidade, Cidadania e Educação em e para os Direitos Humanos, Educação para a Sustentabilidade (BRASÍLIA, 2014c, p. 18).
Eventos de letramento representam “qualquer ocasião em que a escrita desempenha papel fundamental nos processos interativos e interpretativos entre os participantes, bem como atividades em que o letramento tem uma função passível de ser observada” (BEVILAQUA, 2013, p. 104) e por isso perpassam todos os anos, séries e ciclos da escolaridade.
O mesmo trecho admite a existência de novas demandas públicas e sociais que requerem práticas de letramento nas quais os eventos de letramento estão inseridos, já que, de acordo com Bevilaqua (2013), as práticas de letramentos encapsulam os eventos de letramentos.
Neste mesmo trecho encontra-se a única aparição, nesta parte do documento, dos termos de busca “prática(s) de leitura” e “prática(s) de escrita” que, neste caso, podem ser entendidas em “práticas de análise linguística, leitura/escuta e produção de textos constituem-se como eventos de letramentos” (BRASÍLIA, 2014c, p. 18) (grifos nossos). Assim sendo, o Currículo em Movimento admite que prática(s) de leitura” e “prática(s) de escrita” são eventos de letramento.
A terceira aparição de letramento está no quadro dos objetivos e conteúdos almejados no ensino de Língua Portuguesa do 6º ano do Ensino Fundamental; mais especificamente, trata- se de um objetivo: “desenvolver o letramento, utilizando o texto sua diversidade no processo
de construção de significados, assim como a expressão do pensamento” (BRASÍLIA, 2014c, p. 19):
Tabela 3: Quadro de objetivos e conteúdos do 6º ano do Currículo em Movimento do DF. (BRASÍLIA, 2014c, p. 19) (grifos nossos).
É interessante notar que “desenvolver o letramento” aparece como objetivo apenas no 6º ano do EF, isto é, no início deste ciclo escolar, e não aparece nos demais anos. Além disso, por estar no singular, não faz referência a nenhuma outra concepção de letramento que não seja a tradicional.
Também é fundamental pensarmos que este documento não apresenta ao leitor nenhuma definição do conceito letramento, não diferencia o conceito escrito no singular do escrito no plural tampouco conceitua práticas e eventos de letramento ou sequer fornece exemplos práticos do cotidiano da sala de aula. O documento parece pressupor que o professor saiba sobre qual conceito de letramento está sendo utilizado.
As obras e os autores citados ao longo do texto e na bibliografia que se relacionam com os estudos do letramento são, em ordem alfabética:
• FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 2011.
• LUZ, A. R. A língua portuguesa na escola: revendo construções históricas para “transver” a ação docente e as práticas de leitura e escrita. Campinas: UNICAMP, 2009 (comunicação oral).
Assim, nenhuma obra referente ao letramento digital, aos multiletramentos e aos novos letramentos compõe as referências bibliográficas do referido documento; aliás, nem obras relacionadas ao letramento tradicional são citadas, reforçando, assim, ainda mais a impressão de que está pressuposto que o professor está ciente sobre tudo o que é mencionado a respeito do conceito de letramento.