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Capítulo 2 – Os encontros com os adolescentes

2.1 A entrevista com E

2.1.4 Análise do Sentido das Medidas Sócio-Educativas para E

A análise deste trabalho foi desenvolvida por meio do método da fenomenologia-existencial. Assim, a seguir, apresentaremos uma última compreensão analítica que busca conhecer qual o sentido das medidas sócio- educativas para E..

Podemos considerar que o que esteve mais presente, ainda que por muitas vezes tenha sido abordado por caminhos indiretos, foi a medida de Internação pela qual ele passou. Diversas questões relacionadas a ela atravessam outros aspectos de sua vida e a maioria das relações que menciona durante a entrevista. Podemos dizer que a medida de internação e seu impacto sobre a vida de E. são pontos cruciais no desvelamento do sentido das medidas sócio-educativas para este adolescente.

O que salta aos nossos sentidos a partir desta entrevista é a vivência de um caráter puramente coercitivos da medida, que deixou marcas profundas na existência deste adolescente. Atualmente, já em liberdade, ainda convive intensamente com a experiência que mostrou-se traumática por sua fala e maneira de falar (e de evitar falar); bem antes que as situações tomassem forma pelo relato do educador.

Essa experiência solitária influenciou diretamente outros aspectos de sua vida. A boa relação que compartilhava com sua irmã foi uma das características que se alterou. A relação foi rompida, pois ela era uma pessoa

bastante próxima que foi visitá-lo apenas no Natal, sendo que passou tantos outros dias comemorativos e comuns requisitando sua presença.

Vemos outra drástica mudança no que diz respeito à sua relação com os outros. Definia-se como uma pessoa bem relacionada – quantitativamente falando – em diferentes espaços, como sua comunidade e a escola. Atualmente, opta por permanecer mais tempo em sua casa, tendo diminuído drasticamente o número de pessoas com quem convive.

Tal opção lhe parece uma boa alternativa para manter-se afastado da vida infracional. No entanto, parece necessitar de apoio para manter a convicção de que não se relacionar com as suas antigas companhias – mesmo que sinta vontade de participar de algumas atividades que realizam, como andar de moto ou carro pelo bairro – é, realmente, a melhor das alternativas.

Uma das pessoas que tem, dentre outros papéis, o de apoiá-lo nessa decisão é sua namorada T., que durante seu período de internação fez um elo entre o interno – a Febem, onde ele estava – e o externo – a vida em liberdade – através de cartas que trocavam. Em liberdade, E. aproximou-se ainda mais de T. que, além de ser uma presença diária em sua vida, assumiu uma posição de controle e cuidado em relação ao namorado.

T., no início, colocou-se num lugar de tentar exercer controle ou vetar as saídas de E. – considerando, inclusive, que logo que voltou da Febem “todo mundo” chamava-o para ir roubar novamente. E. reclama dessa posição, mas afirma que hoje a namorada está mais tranqüila e que ele próprio lhe delega o papel de informar, a quem o chama, que estão juntos e que ele não irá sair. Fala com carinho e calma dessa possibilidade de ficar “quieto” junto à namorada.

Antes de abordarmos outra das figuras que apóiam E. – desta vez sue pai – cabe falarmos de sua relação com a medida sócio-educativa de da liberdade assistida.

Por trabalhar em período integral, o que também pode ser considerado um aspecto positivo de quem cumpre uma medida sócio-educativa, o desenvolvimento de seu Programa Individual de Atendimento previa apenas sua acompanhamento semanal pelo educador e seu retorno à escola. Além disso, deveria atender às determinações do juiz, como a de entrar em sua residência até às 22 horas.

E. freqüenta regularmente o Núcleo para seu acompanhamento, mas, como discutido anteriormente, não havia retornado à escola. Quanto ao horário, está mais relaxado do que no início de sua LA, mas quando sai ainda tem medo de ser preso e retornar para a Febem. Observamos, novamente, a medida de internação fazendo-se presente em outros campos, o que fica ainda mais claro se lembrarmos da resposta dada pelo adolescente quando questionado quanto ao que achava da medida de LA: “Melhor do que ficar lá dentro né?! O sofrimento lá acho que é bem maior!”.

Essa resposta ilustra o lugar que a LA tem para ele e a marca da internação que se dissemina para diversos lugares e aparece como ponto de comparação e de repulsa.

Um último ponto, também muito importante no desvelamento do sentido para E., que deve ser analisado é o lugar de seu pai nessa sua experiência. Julgamos interessante apontar neste momento outra frase emblemática, extraída da entrevista: “Meu pai me controlava mais que a LA!”. É importante pontuar que esta sentença não foi pronunciada como uma reclamação, mas como uma constatação.

O pai além de dar-lhe apoio e incentivo enquanto cumpria a primeira medida sócio-educativa, assumiu uma postura bastante ativa junto ao filho em LA. Passou a cobrar posturas que julgava adequadas, horários e posicionamentos de E. frente à sua nova situação, seu futuro e suas relações.

E. fala de seu pai como alguém aberto ao diálogo e disposto a dar continência ao filho adolescente em conflito com a lei, como forma de cuidado e proteção. É interessante dizer que, nesses aspectos, o pai tomava para si a responsabilidade sobre o filho, que, por sua vez, reconhece nele uma ação mais presente do que a ação sócio-educativa da liberdade assistida. Um aspecto que ressalta certa autonomia e empenho dessa família (ou de parte dela) para dar conta de suas questões.

O adolescente mostra-se convicto do que quer para sua vida futura, excluindo a carreira infracional de seus planos. É dessa forma que reconquista a confiança de seu pai: buscando um trabalho, mudando de posturas e atitudes; e podendo expor tudo isso para ele. No entanto, durante todo o tempo que dialogamos com E., defrontamo-nos com as questões que viveu na internação.

A medida, de acordo com seu discurso, mobilizou-o pelo medo; sentimento que se sobrepõe a outros possíveis aspectos. Afirma com convicção que não quer reincidir no ato infracional, mas não apresenta uma reflexão ou elaboração a respeito dessa prática. Mostra que sua convicção está em saber que não deseja retornar a um lugar solitário e amedrontador e, para que isso não ocorra, vai buscando recursos em si e apoio naqueles capazes de estarem ao seu lado.

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