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6. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS

6.1 A PRESENTAÇÃO E A NÁLISE DOS D ADOS DA E TAPA E MPÍRICA I – C ONSULTA AOS

6.1.1 Análise Geral do Framework

Iniciando com o tema Análise Geral do Framework, foi gerada a matriz de co- ocorrência entre os códigos das suas respectivas categorias – “Validação Qualitativa e “Possibilidades e Desafios do Framework”, a fim de evidenciar a existência e a quantidade de associações, se fosse o caso. No Quadro 10 estão dispostos os resultados obtidos, sendo que os códigos em tom de verde mais escuro são as co-ocorrências de maior expressão.

Quadro 10 – Matriz de co-ocorrência entre Validação Qualitativa e Possibilidades e Desafios do Framework para a Etapa Empírica I.

Possibilidades e Desafios do Framework

Desafios do framework Possibilidades do framework Provocação

Va lid aç ão Q ua lit at iv

a Definição Constitutiva e Operacional 2 4 1

Validade de conteúdo 0 1 2

Validade de face 1 1 0

Confiabilidade 2 2 1

Validade preditiva 3 2 1

Fonte: Elaborado pela autora.

Conforme o Quadro 10, à exceção dos cruzamentos entre Validade de conteúdo, Desafio do framework e Validade de face e Provocação, percebe-se que todos os códigos de alguma maneira co-ocorrem nas transcrições das entrevistas dos especialistas. O maior volume de associações está entre Definição constitutiva e operacional e Possibilidades do framework e Validade Preditiva e Desafios do framework, conforme destacado em verde escuro.

Quanto ao código Definição constitutiva e operacional, seu objetivo consistiu em verificar se, na visão dos especialistas, os conceitos aplicados ao modelo apresentado seriam realmente capazes de medir aquilo que pretende. Com base na definição estabelecida sobre entrega e com exemplos possíveis para as competências componentes do modelo, os entrevistados discorreram sobre sua visão e todos consentiram quanto à sua pertinência para a gestão estratégica de sustentabilidade.

A conexão com o código Possibilidades do framework vai ao encontro destas assertivas cujos comentários remetiam não somente à visão positiva quanto à utilização da noção de entregas, mas também acerca da coerência na elaboração do framework, da simplificação de entendimentos que a abordagem de competências proporciona e sobre a lógica do alinhamento estratégico que permeia as conexões no framework. Um dos especialistas (AM) enxergou na abordagem das competências e na aplicação de entregas para a gestão da sustentabilidade, a possibilidade de expansão na organização dos entendimentos e comportamentos desejados para a sustentabilidade, em acordo com a estratégia organizacional, além da dinâmica sistêmica prevista.

Por outro lado, houve também comentários sobre a Definição constitutiva e operacional associadas aos códigos Desafios do framework e Provocação. Estas conexões mostram pontos de atenção quanto à abordagem conceitual utilizada, que podem se tornar desafios para a operacionalização do modelo. Os dois trechos, na sequência, exemplificam estas conexões, respectivamente.

“Então é isso que eu estou sentindo falta, desta especificação nesse modelo. Se eu vou fazer isso numa empresa tipo Gerdau, a Sustentabilidade Econômica tem um tipo de perspectiva. Se eu vou fazer no Senac, é outra coisa completamente diferente. Então, as competências são completamente diferentes”. (RR)

“Eu gosto da abordagem de competência (...). Mas, precisa ver se de fato o que se tá entregando é o que se entende que se deve entregar em uma empresa dentro de uma lógica sustentável. Aí você tem que pensar qual é a concepção de sustentabilidade que você tá trabalhando”. (JB)

A fala do especialista RR concerne à concepção das competências organizacionais e das entregas para diferentes contextos organizacionais – o que deve refletir também para as competências humanas. A preocupação do entrevistado encontra em partes reflexos na proposta apresentada, pois enquanto framework teórico, prioriza-se uma visão contextual para o conceito de sustentabilidade aplicado às diferentes organizações (Marrewijk & Werre, 2003), e essa prerrogativa irá permear as definições de competência – logo, também das entregas – constituintes no modelo. Os desafios para a operacionalização das ideias contidas no framework estão no estabelecimento dos limites para a flexibilização e ajuste às diversas realidades.

Por outro lado, é preciso esclarecer que as adequações às particularidades do negócio não necessariamente tornam as competências para a sustentabilidade “completamente diferentes”, conforme argumenta o especialista RR. De acordo com as prerrogativas do framework conceitual inicial, as competências organizacionais e humanas definidas são suficientemente genéricas para serem aplicadas de maneira pertinente em organizações de qualquer setor, porte, localidade, enfim. Sendo um modelo orientador da gestão baseado numa construção conceitual sólida, a costumização de entregas ou balanceamento estratégico no desenvolvimento de uma ou outra competência, por exemplo, devem cobrir as necessidades das organizações em termos de adequação.

Já o comentário da especialista JB chama a atenção para a atribuição dos significados dados aos membros da organização em relação às entregas definidas para as competências voltadas à sustentabilidade. Para este desafio, destaca-se a ênfase na comunicação objetiva e transparente sobre a concepção e o funcionamento do framework, considerada uma exigência inerente aos modelos de gestão por competência (Zarifian, 2003). Ainda assim, admite-se que disfunções podem ocorrer e fornecer garantias sobre a uniformização da linguagem, o repasse e compreensão das informações deve ser preocupação constante na incorporação e manutenção do framework nas organizações.

No que tange à Validade de conteúdo e sua co-ocorrência com o código Possibilidades do framework, indica que a abordagem das competências e seus descritores (conceitos e entregas) selecionados para compor o modelo representam uma amostra representativa do universo de interesse. Para a especialista GC, as competências propostas são não somente plausíveis e suficientes, como estão de certa forma estão/estavam faltando para a gestão da sustentabilidade:

“Eu acho que faz sentido ter essas competências e que também era necessária a discussão de competências humanas”. (GC)

Mas, provocações foram feitas a respeito da suficiência conceitual sobre sustentabilidade, como propõe o framework apresentado. A conexão entre os códigos Validade de conteúdo e Provocações é exemplificada no trecho abaixo:

“O que eu tenho um pouco de dúvidas, já que nós estamos pensando em competências em um nível mais humano e olhando lá na frente, é se o TBL vai ser suficiente” (VS).

Quanto a esta provocação, o argumento é pela escolha teórica que fundamenta o framework. Como já esclarecido, as críticas feitas ao TBL são admitidas, assim como as perspectivas mais abrangentes sobre pilares ou dimensões da sustentabilidade. Contudo, a abordagem do TBL continua a ser amplamente utilizada nos meios acadêmico e empresarial, uma inspiração para a prática da sustentabilidade nas organizações (Høgevold et al., 2015), mesmo após mais de uma década de sua criação. É possível que futuramente outras visões venham a receber destaque semelhante, mas não é o caso de dificultar a operacionalização do framework em pauta no momento.

Para a Validade de face, por um lado, as Possibilidades do framework enfatizam a simplicidade e “disposição didática” do modelo, interessante para sua operacionalização e assimilação nas organizações, segundo o entrevistado AM. Por outro lado, a conexão com Desafios do framework, diz respeito à incerteza que poderá surgir na incorporação da linguagem do framework por uma organização, pois apesar de fundar-se em uma construção lógica, ainda assim esta apropriação será uma “aposta”. É razoável, portanto, atribuir o desafio na identificação da linguagem do framework com a linguagem existente em determinada organização que poderá operacionalizá-lo.

O código Confiabilidade abarca reflexões acerca do nível de precisão com que os conceitos componentes do modelo são mensurados, principalmente para referenciar ganhos em desempenho. Em sua co-ocorrência com Possibilidades do framework, a assertiva quanto

a confiabilidade do modelo apresentado para o desempenho individual é inclusive transposta para o contexto de trabalho do entrevistado JS, conforme trecho a seguir:

“Então, eu creio que podemos melhorar com esse tipo de coisa que você tá sugerindo, sem dúvida, sem dúvida. Precisaríamos entender, como eu te falei, quais são as coisas que fazem sentido pra serem incorporadas”. (JS)

Outro especialista, apesar de concordar com a provável precisão das entregas indicadas na mensuração das competências, acrescenta que a questão dos “valores” poderia contribuir nesse aspecto. A passagem seguinte exemplifica a conexão entre um trecho vinculado à Desafios do framework com o código Confiabilidade:

“Acho que esses exemplos de entregas são interessantes pra tu poder ver o que tu tá falando e o que tu entrega mesmo. Acho que só tu ter uma outra coluna aqui, não sei como tu chamaria, mas assim, tipo a confirmação dos valores, se tu tem valores que tu diz que tem”. (LFN)

O entrevistado LFN, alerta para a questão do valor, como componente essencial na avaliação do desempenho individual em direção à sustentabilidade. Assim como Maggi (2006), considera-se o “valor” como constituinte da competência humana, sendo que sua avaliação resulta na verificação da aderência da pessoa em relação aos valores organizacionais (Fernandes, 2013). Além disso, do mesmo modo que Bonn a Fischer (2011) e Smith e Sharicz (2011), acredita-se em uma correlação entre sustentabilidade e valores, seja da organização ou do sujeito que dela faz parte.

No entanto, admite-se que no próprio embasamento teórico e desenvolvimento da proposta para a dinâmica do framework em ambiente empírico, este ponto referente aos valores organizacionais e pessoais não é abarcado em profundidade. Apesar de se compreender a razoabilidade dos argumentos do entrevistado, admite-se que a robustez exigida para contemplar tais noções fugiria à capacidade do escopo do trabalho no momento. Logo, esta é uma limitação reconhecida na proposta desta tese.

Quanto à associação com o código Provocação, o comentário da especialista JB é o de que mesmo a estruturação de um sistema de avaliação de competências humanas e organizacionais não garante objetivamente que elas irão acontecer do modo como previsto pela organização. Isso, em razão das disfunções entre o estabelecido e o discursado pela organização, entre o compreendido e o realizado pelas pessoas:

“... se percebe uma diferença muito grande entre o que a instituição diz que tem que ser as competências, ou como elas devem ser, e o que as pessoas entendem o que é a competência e o que elas realmente fazem. Há um gap enorme ali.” (JB)

Dutra (2001) já havia alertado que o fato de uma pessoa deter uma competência, não implica necessariamente que a organização se beneficie diretamente deles. Neste caso, o autor supõe que a pessoa não “aplique” a competência no trabalho, ainda que a detenha. O que a entrevistada chama a atenção é para a situação em que a pessoa acredite que tenha a competência especificada pela organização, quando na verdade isso não ocorre – a situação revela então uma incompreensão sobre tal competência – o que significa, o que se espera enquanto entrega. O estudo de Brunstein e Leite (2014) corrobora com esta provocação ao depararem-se com a incompreensão, a insegurança e hesitações de gestores em relação ao desenvolvimento de competências para a sustentabilidade. Admitidamente, a provocação apontada pela entrevistada poderá representar um desafio para a operacionalização do framework de gestão da sustentabilidade em proposição. No entanto, esta não é uma limitação exclusiva para esta proposta, mas provavelmente aos modelos de gestão articulados por competências, em geral.

Enfim, quanto à Validade Preditiva, cujo objeto de análise compreende a contribuição potencial do desenvolvimento dos conceitos que moldam o modelo para melhores desempenhos individuais e organizacionais, foram apontadas possibilidades, desafios e feitas provocações. Uma das assertivas no código Possibilidades do framework concerne à viabilidade de inserir as competências propostas nos subsistemas de gestão de pessoas e então orientar o desempenho do indivíduo desde seu recrutamento à sua progressão na organização, segundo o entrevistado JD. Outra possibilidade está na melhoria do desempenho de uma organização, em relação à sustentabilidade, que está em estágio inicial de sua adoção – o framework é uma referência adequada, pode ser um ponto de partida, na visão do especialista RR.

Os códigos Desafios do framework e Provocações, respectivamente, envolvem comentários justificados sobre a suficiência da gestão por competências como única ferramenta organizacional direcionada para a sustentabilidade, de acordo com o especialista JS, e sobre a abstração e generalização caracterizadas na elaboração do framework, de acordo com a entrevistada JB. Estes trechos são expostos na sequência:

“Agora, eu tenho uma dúvida se apenas a gestão de competências é capaz disso. Eu te diria que aqui, nós temos a gestão de competências – beleza, maravilha, é necessário para o desenvolvimento, etc.. Mas, em paralelo tem a nossa descrição de visão estratégica de longo prazo; em paralelo tem a discussão dos nossos objetivos de curto prazo e de médio prazo; tem processos existentes que facilitam a incorporação da sustentabilidade. Imaginar que só pelo lado de focar o desenvolvimento das competências de cada indivíduo será suficiente, eu não sei se será suficiente”. (JS)

“Então, de modo geral, a minha preocupação, olhando para o seu modelo, é que quando você chama isso aqui tudo de competência (...) eu posso tirar esse contexto de sustentabilidade e ele serviria pra N trabalhos! Elas são tão genéricas que eu não sei até que ponto elas contribuem para o desenvolvimento da organização em direção à sustentabilidade. Conceitualmente, sim. (...) Talvez esse modelo ajude. Pode contribuir para entregas melhores, pode contribuir para uma gestão melhor. Eu não tenho dúvidas que esse modelo vai contribuir de alguma forma. Mas, tem limitações”. (JB)

O primeiro comentário implica a ciência de que, embora a gestão por competências seja viável e relevante para a gestão da sustentabilidade, não é absoluta. Para o framework em pauta, há então o desafio de oportunizar a conjugação e sincronizar sua operacionalização com outras ferramentas de gestão. A trecho da entrevistada JB, por sua vez, ressalta o potencial do framework em contribuir para melhores desempenhos, desde que mais especificamente detalhado e explícito quanto às suas definições. O aprimoramento neste sentido, torna-se um desafio para ser superado.