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2. SUSTENTABILIDADE NAS ORGANIZAÇÕES

2.2 G ESTÃO E STRATÉGICA DA S USTENTABILIDADE NAS O RGANIZAÇÕES

2.2.1 Implicações Conceituais para a Sustentabilidade em meio Organizacional

No tocante às questões conceituais, tanto no âmbito dos debates acadêmicos, quanto no cenário empresarial, inúmeras definições e abordagens são propostas para se fazer menção a processos de gestão que incorporem a sustentabilidade. Por conseguinte, assim como ocorre com o DS, ainda não há – e talvez não haverá – um conceito singular ou consensual para a sustentabilidade em contexto organizacional, ou termo semelhante. “Sustentabilidade” pode significar coisas diferentes para as organizações.

Nas várias áreas do conhecimento que tangenciam esta incorporação, observam-se tendências distintas quanto à sua abordagem, algumas com maior ponderação

antropocêntrica/tecnocêntrica ou ecocêntrica, e outras buscando uma integração mais equilibrada entre a utilização e a preservação dos recursos econômicos, sociais e ambientais (Egri & Pienfield, 1998; Gladwin, Kenelly & Krause, 1995; Ketola, 2009).

Com relação à lente paradigmática utilizada para a compreensão da sustentabilidade em contexto organizacional, corrobora-se com a visão Gladwin et al. (1995), Egri e Pinfield (1998) e Ketola (2009), de que as visões mais integradoras, menos radicais, parecem mais pertinentes na incorporação de aspectos sociais e ambientais para uma sociedade que busca a sustentabilidade e, principalmente, para o contexto de gestão das organizações (Kassel, 2011). E esta constatação encontra alicerce não somente na academia, mas também entre as empresas. Segundo Valente (2012), é possível visualizar evidências de modelos e práticas de gestão que parecem interagir de maneira consoante a esta visão, denominada sustencentrismo (Gladwin et al., 1995).

Segundo Gladwin et al. (1995), o sustencentristmo – ou paradigma centrado na sustentabilidade – é responsável por articular o conhecimento e as discussões em uma abordagem interdisciplinar, capaz de operacionalizar um modelo que melhor entenda e promova a sustentabilidade nas organizações. Valente (2012) afirma que o sustencentrismo preconiza a inclusão dos sistemas econômico, social e ambiental e a interdependência dos mesmos, sem que haja privilégios de qualquer sistema sob o outro. Tais sistemas se encontram em uma relação de causalidade em que são previstos efeitos de diversas decisões sob os ciclos ambientais, formas socioculturais de vida e sistemas econômicos.

Esta visão aproxima-se da abordagem reconhecida na literatura como Triple Bottom Line – TBL (Elkington, 1999), a qual tem sido aplicada em uma significativa quantidade e variedade de estudos sobre o assunto (por exemplo, Dillyck & Hockerts, 2002; Hansmann; Miegb & Frischknechta, 2012; Høgevold et al., 2015; Smith & Sharicz, 2011; Valente, 2012; Vithessonthi, 2009; Santos et al., 2013). Pode-se considerar o TBL uma perspectiva de análise da sustentabilidade amplamente aceita não só pela academia, mas pela sociedade e pelas organizações (Høgevold et al., 2015). Por esta visão, compreende-se que as ações organizacionais devam se desenvolver contextualmente e condicionadas pela qualidade, temporalidade e disponibilidade de recursos, de forma a permitir uma gestão integrada de três elementos/pilares fundamentais: o econômico, o ambiental e o social.

Almejando jogar luz na necessidade de integração dos pilares, bem como dar-lhes mais evidência conceitual e prática, convencionou-se aqui, utilizando as bases referenciais estudadas, converter os pilares da sustentabilidade organizacional em três sustentabilidades: Sustentabilidade Econômica, Sustentabilidade Ambiental e Sustentabilidade Social. As três

sustentabilidades são consideradas sustentadoras e viabilizadoras da sustentabilidade organizacional. Estudos que se utilizam da mesma terminologia (Bonn & Fischer, 2011; Dillick & Hockerts, 2002; Jamali, 2006; Krajnc & Glavic, 2005), permitem concluir que os três pilares estão implícitos nas três sustentabilidades propostas, contudo, em proporções diferentes.

A sustentabilidade econômica de uma organização indica que ela possui a capacidade de realizar suas atividades de maneira responsável com lucratividade considerável, sem a qual ela não se perpetuaria (Dyllick & Hockerts, 2002). Esta sustentabilidade é peça central do desenvolvimento sustentável, pois, a partir do lucro são promovidos empregos, por meio dos quais é proporcionada à comunidade a possibilidade de alcançar melhores condições de vida (Azapagic, 2003). Incorpora, dessa forma, o desempenho organizacional econômico no longo prazo, assim como a abordagem pela qual organização opera e os impactos sobre o contexto econômico em que atua (Bonn & Fischer, 2011).

A sustentabilidade ambiental refere-se à conservação e ao manejo dos recursos naturais. É necessário que a organização, observando os impactos de suas operações e produtos sobre os sistemas naturais vivos e não vivos, procure minimizar os efeitos negativos e amplificar os positivos, tanto em processos de entrada quanto de saída (Krajnc & Glavic, 2005). A responsabilidade sobre o meio natural abrange mais do que cumprimentos legais ou iniciativas como reciclagem ou uso eficiente de recursos energéticos. Envolve, antes, uma abordagem compreensiva sobre as operações organizacionais (Jamali, 2006).

A sustentabilidade social concerne ao impacto causado pelas organizações no sistema social onde operam, em níveis local, nacional e global. Diz respeito às atitudes organizacionais em relação aos funcionários, fornecedores, comunidade e consumidores, além de impactos na sociedade em geral, para além de seus domínios (Krajnc & Glavic, 2005). Em síntese, significa a preocupação e ação das empresas em relação aos impactos sociais por elas causados nas comunidades humanas dentro e fora da organização, tais como o desemprego, a exclusão social, a pobreza, a diversidade organizacional, etc. (Barbieri; Vasconcelos; Andreassi & Vasconcelos, 2010). Central para a noção da sustentabilidade social é o conceito de justiça social (Bonn & Fischer, 2011).

Reforça-se a ideia de que as sustentabilidades social, ambiental e econômica devem confluir de forma articulada para a realização da sustentabilidade na organização e, por conseguinte, de um desenvolvimento sustentável mais amplo (Hansmann et al., 2012). É possível inferir que uma visão equilibrada a respeito de como articular e fazer uso dos recursos provenientes destas três esferas é essencial para se garantir às gerações futuras uma

sociedade economicamente próspera, regida por princípios de justiça e com melhores qualidades ambiental e de vida.

A abordagem do TBL não é isenta de críticas e as contestações referem-se basicamente às dificuldades ou ainda impossibilidade de sua aplicação na vida real (Hubard, 2009; MacDonald & Norman, 2007; Norman & MacDonald, 2004; Wasiluk, 2013). Questiona-se ainda a priorização ou dissociação da dimensão ambiental das demais atividades organizacionais (Hahn & Scheemesser, 2006) Reconhece-se que o TBL constitui uma abordagem necessária de ser incrementada, principalmente no sentido de sua operacionalização. Muitas são as aplicações isoladas ou dissimuladas (Norman & MacDonald, 2004). Isso acontece, entretanto, por razões geralmente alheias à tratativa conceitual e prática do TBL, como o próprio cinismo do comportamento organizacional em adotar a sustentabilidade – o que independe da abordagem utilizada.

Sendo assim, advoga-se que o TBL é uma das poucas abordagens que consegue tornar a sustentabilidade presente nas organizações. Sem colocar em demérito abordagens que defendem a inserção de um quarto ou um quinto pilar (Hacking & Guthrie, 2008), acredita-se que a abrangência alcançada pelo TBL é suficiente para comportar a complexidade inerente ao fenômeno. Ao mesmo tempo, sua “simplificação” em três dimensões proporciona maior facilidade no entendimento e nos desdobramentos práticos da gestão. Segundo Pava (2007), o TBL representa uma nova visão para os negócios, reforçando a ideia de que a atuação e o desempenho organizacional são multidimensionais. Além de imputar uma visão sistêmica sobre a sustentabilidade em três dimensões interdependentes, o TBL propõe que sua operacionalização seja simultânea e interativa. Enfatiza-se esta abordagem, portanto, como uma inspiração para a prática da sustentabilidade nas organizações (Høgevold et al., 2015).

Mediante estas considerações, define-se que a sustentabilidade em contexto organizacional representa o agir da organização3 que integra de forma sistêmica e balanceada

dos aspectos sociais, econômicos e ambientais. Para desenvolver-se em conformidade à sustentabilidade, portanto, nessa estrutura conceitual, uma organização deve antes desenvolver suas sustentabilidades econômica, ambiental e social, de maneira equilibrada e conforme a sua realidade de contexto.

Em consequência desta definição, tem-se que a sustentabilidade deve representar um novo modo de agir da organização. Insere-se holisticamente na organização e permite a construção de uma plataforma de aprendizagem (Cheng et al., 2010), propulsora da e

3 Por agir da organização ou agir organizacional, compreende-se os processos de ações e decisões contínuos e

proporcionada pela inovação (Castiaux, 2012; Smith; Voß & Grin, 2010), a partir da interação com toda sua cadeia de stakeholders (Hörisch; Freeman & Schaltegger, 2014; Valente, 2012). Sua incorporação, considerada pelo contexto em que se encontra a organização (Marrewijk & Werre, 2003), admite trade-offs intertemporais nos processos (Bansal & DesJardin, 2014; Hahn; Figge; Pinkse & Preuss, 2010) e contribui com o desenvolvimento sustentável da sociedade como um todo (Mohrman & Worley, 2010).

A partir das implicações conceituais da compreensão da sustentabilidade, percebe-se uma severa ampliação de complexidade no processo decisório organizacional. Agora, em um contexto que tradicionalmente prioriza o fator econômico, duas novas variáveis foram inseridas, se um dia foram realmente separadas, ambiente e sociedade. A natureza dos relacionamentos com variados grupos de interesse também recebe indicativos de ser modificada, de uma relação tradicionalmente unilateral, em geral, para uma de compartilhamento e colaboração. Emergem novas perspectivas para a gestão da inovação, tendo em vista que suas demandas acabam por implicar a extrapolação da inovação sistematicamente integrada em todas as atividades organizacionais. Além disso, a dimensão temporal de gerações e cenários socioambientais também recebem posições de maior relevância na tomada de decisões estratégicas.

A despeito do razoável volume da literatura científica dedicado a questões conceituais acerca da sustentabilidade, pouco diz respeito a como ela deve ser alcançada e gerenciada no dia a dia organizacional. De acordo com Glavas & Mish (2015), já não se discute se as organizações irão incorporar a sustentabilidade ou o TBL, mas intenta-se compreender as razões e os modos como irão fazê-lo. Assim como ocorre com o conceito de sustentabilidade, em que não há uma uniformização, mas diretrizes gerais orientadoras como o Relatório de Bruntland e o próprio TBL, há alguns pontos de consensualidade entre diversos autores acerca de sua prática, observados não somente no âmbito teórico, mas empírico também. A convergência sobre a associação das práticas de sustentabilidade à estratégia organizacional é um deles. O item seguinte irá abordar este tema.