Análise da peça da Companhia das Letras

A edição número 2055 da Veja, de 9 de abril de 2008, traz uma peça publicitária da Companhia das Letras39, divulgando o lançamento da Coleção Jorge Amado, um projeto de reedição da obra completa deste grande escritor brasileiro.

Jorge Amado nasceu em 10 de agosto de 1912, na fazenda Auricídia, em Ferradas, distrito de Itabuna, Bahia. A região cacaueira seria um dos cenários preferidos do autor, atravessando toda sua carreira literária, em livros como Terras do sem-fim, São Jorge dos

Ilhéus, Gabriela, cravo e canela e Tocaia Grande, nos quais relata as lutas, a crueldade, a

exploração, o heroísmo e o drama associados à cultura do cacau que floresceu na região de Ilhéus nas primeiras décadas do século XX.

Segundo o site da editora, a Coleção Jorge Amado conta com a participação de importantes escritores e intelectuais brasileiros e com um esmerado trabalho editorial, que inclui a cuidadosa revisão dos textos a partir dos originais do autor e a criação de uma nova linguagem gráfica para a obra. Uma série de atividades educativas e culturais ligadas aos livros e à vida do escritor baiano também faz parte do projeto, visando trazer Jorge Amado de volta ao cenário cultural do país40.

A peça encontrada na revista Veja reflete a participação de outros nomes da literatura no trabalho de editoração da obra. No anúncio, feito em página única, observa-se, ocupando boa parte dele, uma fotografia em preto e branco. Nesta foto o fundo está desfocado e visualiza-se apenas o primeiro plano, no qual um homem faz a leitura de uma das obras da coleção. Ele usa óculos de grau e veste um suéter de cor clara sobrepondo uma camisa listrada, da qual só se vê a gola. Este homem é José Saramago, escritor português, nascido em 1922 na província do Ribatejo, que ganhou o Prêmio Nobel de Literatura de 1998, o primeiro para a língua portuguesa.

Na parte inferior do anúncio, há doze livros da coleção, colocados um em seguida do outro com simetria, de modo que lê-se em cada um deles o primeiro nome do autor, com exceção do último, que, por estar a frente de todos os outros, permite uma visualização maior. Cada livro é de uma cor e eles formam juntos no anúncio uma linha horizontal de 3,5

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A Companhia das Letras é uma editora brasileira fundada em 1986. Segundo seu site, nos primeiros doze meses de existência, lançou 48 títulos; em 2007, foram mais de 200. Em vinte anos, publicou quase 2 mil títulos, de 1300 autores, incluindo os lançamentos dos outros três selos da editora: Companhia das Letrinhas, Cia. das Letras e Companhia de Bolso.

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Dados retirados do site http://www.jorgeamado.com.br/ , site este criado e assinado pela Companhia das Letras para oferecer informações exclusivamente sobre esta coleção especial. O acesso ao site foi realizado no dia 22 de agosto de 2008.

centímetros de altura bastante colorida, que chama a atenção devido ao grande contraste estabelecido com a foto em preto e banco.

O titulo do anúncio foi colocado na parte superior do mesmo. Nele lê-se: “Por que Jorge é amado.”. Logo abaixo do título, pode-se ler: “Em Jorge, a arte de fazer-se amar era espontânea, nunca premeditada.” José Saramago.

Ainda compõem o anúncio: uma frase colocada em seu canto esquerdo superior, que diz “Já nas livrarias”; no canto superior direto e com orientação vertical, a assinatura da AlmapBBDO, a agência que criou a peça; na parte inferior esquerda, logo acima da faixa colorida criada pela coleção de livros, a assinatura da empresa anunciante, a Companhia das Letras; e na mesma linha desta, porém no outro canto, o endereço do site criado pela editora para a coleção – “www.jorgeamado.com.br”. Todos estes elementos descritos compõem a mensagem plástica do anúncio. Sendo que a fotografia de José Saramago é o que ocupa maior espaço dentro desta composição.

Em relação a esta imagem, percebe-se que o plano utilizado para fotografar foi o plano médio, pois o escritor foi enquadrado da cintura para cima. A partir deste enquadramento, e considerando que o fundo da imagem foi desfocado, entende-se que o local em que ele está sentado e o ambiente que ele usa para a leitura, pouco importam. O que têm relevância é o seu ato de ler e a obra que está sendo lida.

Todos os livros que compõem a faixa colorida localizada na parte inferior do anúncio servem como uma espécie de base, suporte para o restante da composição. E percebe-se que o corte feito pelo enquadramento da fotografia proporcionou uma maior aproximação entre livro que está sendo lido por José Saramago e as demais obras que formam esta faixa, demonstrando que ele também faz parte daquela mesma coleção.

Apesar de formar uma faixa pequena em relação ao restante da página, foram atribuídas cores aos livros que a compõem. Isto significa que, apesar de estarem na parte inferior do anúncio, e em tamanho menor, eles têm grande relevância dentro deste. Além de serem os produtos anunciados, o destaque dado pelas cores demonstra a preocupação em mostrar ao público que a coleção proporcionou a criação de uma nova linguagem gráfica para as obras, rica em imagens e cores.

Em relação à mensagem lingüística da peça, o título “Por que Jorge é amado.” é onde verifica-se a presença de outro elemento colorido no anúncio, pois o termo “amado” foi colocado na cor vermelha, chamando a atenção do leitor para a polissemia41 existente no jogo

41 _{Segundo Cereja e Magalhães (1999, p. 386), “polissemia é a propriedade de uma palavra apresentar vários}

de palavras estabelecido entre o sobrenome do autor e o adjetivo correspondente. Há, entre os termos Amado - enquanto sobrenome - e amado - enquanto adjetivo - distinções gramaticais, já que se atribui iniciais maiúsculas a nomes próprios. Porém, foneticamente os termos são idênticos, de modo que a polissemia existente torna o título mais interessante.

A cor vermelha, que dá destaque ao termo, traz consigo toda a sua a carga simbólica, remetendo justamente à paixão e ao amor.

Como foi dito na descrição, logo abaixo do título, verifica-se uma fala assinada por José Saramago: “Em Jorge, a arte de fazer-se amar era espontânea, nunca premeditada.”. Ou seja, tem-se aí a citação de uma fala do escritor que aparece na fotografia que ilustra o anúncio. Este trecho aparece em letras menores do que as utilizadas no título (ocupa um espaço que corresponde àquele ocupado pelos termos “que” e “Jorge”), e em formatação alinhada à esquerda.

Percebe-se que a imagem vem ilustrar esta composição textual, demonstrando que José Saramago é leitor de Jorge Amado e aprecia sua obra. Deste modo, a mensagem lingüística tem função de revezamento em relação à imagem. O texto não apenas designa o nível correto de leitura da fotografia, como, por si só, já traz toda uma riqueza de significações, podendo até substituí-la sem causar grandes problemas à compreensão do anúncio.

Por meio desta composição, observa-se um anúncio que é capaz de valorar ainda mais a Coleção Jorge Amado, pois os leitores, diante desta peça, podem observar um dos maiores nomes da literatura atual em um momento de contemplação de uma obra que está sendo oferecida a eles.

Neste sentido, verifica-se aí uma estratégia que, de certo modo, assemelha-se à utilização de grandes ídolos em anúncios diversos como forma de chamar a atenção do público-alvo. Porém, observa-se não uma busca por gerar apenas maior visibilidade, sem considerar a situação e o contexto. Neste caso foi feita a utilização de uma personalidade que tem total pertinência com a situação representada, com o produto anunciado e com o seu público-alvo, pois trata-se de um ícone do mesmo universo do que se anuncia: a literatura.

José Saramago é um escritor de renome mundial, ganhador inclusive de um Prêmio Nobel de Literatura, e ao apresentar-se para o público-alvo como um leitor e admirador de Jorge Amado, fornecendo um depoimento sobre a obra deste brasileiro, demonstra que ele é, de fato, amado, como afirma o título do anúncio.

De forma que se agrega à peça publicitária um testemunho de grande pertinência que realmente transmite verdade ao leitor. E, além disso, agrega-se à Coleção Jorge Amado um

valor de contemplação ainda maior, demonstrando que tratam-se de obras de um escritor que tem, além de grande talento e importância, reconhecimento por parte de seus pares.