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4 ABORDAGEM DO TEXTO LITERÁRIO NO LIVRO DIDÁTICO

4.1 UNIDADE 1: NO MUNDO DA FANTASIA

4.1.4 Análise do quarto capítulo

O Intervalo, de acordo com o Manual do Professor (2012, p. 5, grifo dos autores), ―[...] contém um projeto e propõe a realização de um conjunto de atividades que diversificam as formas de abordagem do tema da unidade [...]‖. Nele, os autores sugerem que os alunos montem um livro de histórias inventadas por eles, em seguida, propõem uma exposição sobre os contos maravilhosos. Neste capítulo, os estudantes podem encontrar orientações de como

preparar um livro de histórias e de como montar a exposição.

O projeto é nomeado Histórias de hoje e sempre e possui duas propostas para novas produções textuais, com os respectivos nomes: Errando histórias e História ao contrário. Na primeira proposta do LDP, na seção, Intervalo, encontramos:

Vamos errar de propósito algumas histórias conhecidas para ver do que nossa imaginação é capaz? Então, mãos à obra! Em grupo, escolham um dos inícios de contos maravilhosos abaixo, dêem asas à fantasia e escrevam a continuação da história.

 Era uma vez uma menina que se chamava Chapeuzinho Amarelo e morria de medo de lobo.

 No meio de uma floresta densa e escura, viviam felizes quatro porquinhos que eram músicos e cantores (CEREJA; MAGALHÃES, 2012, p. 71).

Para a segunda sugestão, deparamos com a seguinte abordagem:

Vamos inverter os papéis das personagens e escrever uma história ao contrário?  Cinderela é tão má e desobediente que deixa a madrasta enlouquecida: não ajuda

em casa, vai mal na escola e ainda tenta roubar os namorados das irmãs.

 Branca de Neve é feia e tem raiva danada da rainha por esta ser tão bela e bondosa. Não houve seus conselhos e fez amizade com uma turma da pesada (CEREJA; MAGALHÃES, 2012, p. 72, grifos dos autores).

Após observação das propostas textuais, nota-se que os autores buscaram inovar nas atividades e fazer com que os alunos usem a imaginação, tendo como ponto de partida as suas leituras, supostamente lidas na infância, de contos maravilhosos renomados, como: Chapeuzinho Vermelho, Os Três Porquinhos, Cinderela e Branca de Neve e os Sete Anões. Essas atividades, se bem exploradas e trabalhadas pelo professor, proporcionam um encontro com a literatura. Podem-se criar momentos para retomar as leituras dos contos maravilhosos e propor novas leituras, sendo uma perfeita ocasião para inserir o livro literário na sala de aula e uma ótima abertura para o letramento literário.

A partir das análises da primeira unidade do LDP do 6º ano, é possível depreender que ele não possibilita a formação de leitores literários, pois a aproximação realizada pelo livro na maioria das atividades é superficial. Há pouca motivação para que os alunos se envolvam com a obra e pouquíssimas vezes, há uma abordagem sobre os autores ou sobre as obras e a leitura. Muitas vezes, esta abordagem fica comprometida por haver apenas fragmentos dos textos ou tratamento inapropriado para o texto literário. Quanto às atividades de interpretação de texto, elas não permitem que os alunos façam uma análise mais aprofundada e/ou façam suas próprias interpretações, o que confirma os escritos do PNLD:

Por outro lado, ao menos metade das coleções aprovadas já confere aos textos literários uma presença significativa, proporcionando ao jovem leitor um contato efetivo com obras e autores representativos, principalmente da literatura brasileira contemporânea. Clássicos nacionais e estrangeiros, entretanto, ainda são pouco presentes, dificultando a percepção, pelo aluno, da dimensão histórica da produção literária (GUIA..., 2010, p. 31, grifos dos autores).

No Manual do Professor, encontra-se um texto, Historicidade literária ou leitura de textos literários?, em que são abordados o ensino de literatura, o percurso de pelo menos oito anos de leitura de textos variados no ensino fundamental, o estudo sistematizado de literatura brasileira no ensino médio e o pouco tempo que é disponibilizado para as aulas de literatura e as aulas voltadas para a historicidade literária, ao invés do aluno aprender a ler o texto literário.

Considera-se, no artigo, que a literatura é um fenômeno artístico e cultural vivo, dinâmico, complexo, que não caminha de forma linear e isolada. Propõe-se uma perspectiva dialógica para o trabalho da literatura brasileira, sem desprestigiar nossas tradições, nossa cultura, nem nossas formações étnica e linguística, mas perseguir diálogos por nossa literatura, com ela mesma e com outras literaturas, a fim de compreendê-la melhor e respeitá- la em sua historicidade.

Neste prisma, a literatura dialoga com outras artes e linguagens, cabendo na aula de literatura: a música popular, a pintura, o cinema, o teatro, a televisão, o cartum, o quadrinho e a internet. Cabem, enfim, todas as linguagens e todos os textos e mídias, ou seja, cabe a vida que com a literatura dialoga. Porém, isso só confirma a constatação de Cosson (2009, p. 21): ―No ensino fundamental, a literatura tem um sentido tão extenso que engloba qualquer texto escrito que apresente parentesco com ficção ou poesia.‖.

Após análise da unidade 1 do LDP, Português: linguagens, 6º ano: língua portuguesa, podemos perceber que em alguns textos da unidade é possível motivar os alunos para o tema proposto. Segundo Cosson, é o início para o processo de letramento literário e consiste em preparar o aluno para entrar no texto. Porém, quanto à introdução, ou seja, apresentação do autor e da obra, o livro deixa muitas lacunas. A impressão que se tem é que os autores do livro selecionaram apenas alguns autores para fazer uma breve apresentação.

Nos casos de alguns textos, não é possível contemplar a leitura na sua totalidade pelos alunos, visto que há presença de reticências, como aquelas presentes em Peter Pan, do terceiro capítulo, estando em desacordo com o que afirma Cosson (2009, p. 26): ―Não é possível aceitar que a simples atividade de leitura seja considerada atividade escolar de leitura literária.‖.

Quanto aos exercícios de interpretação, podemos considerar que o uso de ilustrações sobre as histórias abordadas no livro, se bem exploradas pelo professor, podem contribuir para a sua compreensão. Algumas questões de interpretação de texto apresentam os aspectos dos textos literários, como acontece na abordagem dos contos; entretanto, muito se assemelham a fichas de leitura.

A reflexão que os alunos devem fazer sobre os textos é direcionada até atingir as conclusões prévias induzidas pelas questões e são atividades que podem ser consideradas cansativas. Caso não haja a intervenção do professor, o interesse dos alunos não será despertado, não se alcançando, destarte, o objetivo da interpretação sugerida por Cosson (2009, p. 64), que deixa claro ―[...] que a interpretação parte do entretecimento dos enunciados, que constituem as inferências, para chegar à construção do sentido do texto, dentro de um diálogo que envolve autor, leitor e comunidade.‖.

Sendo assim, podemos concluir que, após levantamento das atividades propostas na unidade 1 do LDP, é constatada a presença de textos literários nos três capítulos da unidade, encontrando-se, no terceiro capítulo e no Intervalo, atividades mais significativas para o manuseio da literatura. A unidade possui muitas atividades para habilidades de compreensão e interpretação. Algumas exploram os processos estéticos e literários dos textos, entretanto, na maioria das vezes, elas são utilizadas como justificativa para estudo de ortografia, gramática e aquisição de vocabulário.

A presença de fragmentos de textos desfigura o sentido da obra e, por vezes, estes servem apenas para uma simples leitura, o que tira a oportunidade do aluno conhecê-los na sua totalidade, conforme afirma a avaliação do Guia dos Livros Didáticos (GUIA..., 2010, p. 116, grifos dos autores): ―O trabalho com os textos literários precisa ser aprofundado com a indicação de novos textos e com atividades que contribuam mais efetivamente para a formação do leitor de literatura.‖.

Dessa forma, pela abordagem da unidade 1, depreendemos que o LDP é ineficiente para a formação do leitor literário e, em sua totalidade, não contempla as etapas de letramento literário propostas por Cosson.