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3.2 Semiótica Organizacional

3.2.2 Análise Semântica

Na Análise Semântica (AS) o analista no papel de facilitador, especifica as funções requeridas em um diagrama de ontologia, que representa uma visão dos agentes responsáveis no domínio de negócio em foco e seus comportamentos e ações chamadas de affordances. O significado das palavras utilizadas no modelo semântico para representar o negócio é visto como o relacionamento entre os signos e as ações apropriadas. A Análise Semântica foca os agentes e seus padrões de comportamento para descrever a organização.

Os conceitos da AS adotados neste trabalho são baseados em Liu (2000). A seguir é apresentada uma descrição resumida de cada um destes conceitos:

O Mundo é socialmente construído através das ações dos agentes, tendo como base o que é oferecido pelo mundo físico para ele próprio;

Affordance é um conceito introduzido por Gibson (1968) que pode ser utilizado para expressar invariantes de repertórios de comportamento de um organismo possíveis pela estrutura do organismo combinada com a de seu ambiente. Na análise semântica, affordances (Liu, 2000) são construções sociais válidas em um certo contexto social. Neste ponto temos que distinguir os diferentes conceitos de affordance: o original de Gibson (1973), o conceito adotado na comunidade de IHC e o conceito utilizado no MEASUR. O conceito de Affordance foi introduzido originalmente por Gibson (1968) e pode ser utilizado para expressar invariantes de repertórios de comportamento de um organismo possíveis pela estrutura do organismo combinada com a de seu ambiente. “Eu quero dizer, ela (palavra

affordance) é alguma coisa que se refere para ambos o ambiente e o animal de uma maneira que nenhuma palavra existente o faz. Ela implica em

complementaridade do animal e o ambiente.” (1968, p. 127). Affordances

não são somente propriedades físicas, eles são relativos à postura e ao comportamento do animal. Para Norman (1999, 2002) no mundo do design, o termo affordance como adotado está a uma vida de distância de seu significado original. Segundo Norman (1999, p.38) ele próprio deveria ter utilizado o termo “perceived affordance” (ou affordance percebida) porque no design de interfaces nós estamos muito mais interessados sobre o quê o usuário percebe de determinado objeto. Em interfaces gráficas os designers têm algum controle sobre os “perceived affordances”, eles devem garantir, por exemplo, que o usuário perceba o significado associado ao ato de pressionar em uma determina região da tela (Norman, 1990). Na Semiótica Organizacional, mais particularmente no MEASUR a noção que Gibson introduziu foi estendida por Stamper para incluir invariantes que são percebidas no mundo social. Estas invariantes, no mundo social, são chamadas de normas sociais por Stamper (1996, p. 374): “Gibson deu maior

enfoque à percepção do mundo físico; entretanto, a noção de affordance pode ser generalizada para incluir invariantes que nós percebemos no mundo social. Se alguém tem uma patente de direitos autorais então deveríamos ser hábeis em supor um comportamento invariante das pessoas em direção a respeitar o seu trabalho. Um “copo” tem vários invariantes sociais que são válidos, por exemplo, para permitirmos beber algo de uma maneira aceitável em uma companhia refinada e ele pode ter também a invariante de posse, assim como a patente pode . . .”. Desta maneira, na

Análise Semântica, affordances (Liu, 2000) são construções sociais válidas em um certo contexto social. Neste sentido, Stamper (2000) argumenta que a realidade que conhecemos não foi construída de maneira individual, mas criada pelo desenvolvimento das culturas durante séculos ou milênios. Um copo é um artefato humano e sua utilização é possível não somente por causa de seus aspectos físicos, mas também porque ele tem affordances sociais (uma criança aprende que o copo não é para jogar em outras pessoas, mas para tomar água). Mesmo o mundo físico conhecido através das

ciências naturais neste sentido é predominantemente uma construção social e a ciência é a atividade social de construí-lo.

Agente é um tipo especial de affordance, que pode ser definido como alguma coisa que tem um comportamento responsável. Um agente pode ser um indivíduo, um grupo cultural, uma comunidade, sociedade, etc. (uma pessoa, um departamento, uma organização, etc. podem ser agentes);

Determinante é uma invariante de quantidade e qualidade de agentes e

affordances, pelos quais podemos diferenciar uma instância de outra;

Ontologia: Agentes devem criar significados comuns para os signos; por exemplo para a comunicação humana é necessário um vocabulário comum, ou seja, ter uma compreensão comum dos termos utilizados, este vocabulário sígnico é chamado de ontologia.

Dependência Ontológica é formada quando uma affordance só e possível se outros affordances existirem. Se o affordance “A” é ontologicamente dependente do affordance “B” significa que “A” somente será possível quando “B” também for possível. Por exemplo: para que uma pessoa tropece, primeiro ela deve andar; para duas pessoas se divorciarem elas devem estar casadas; assim existe dependência ontológica entre tropeçar e andar, e divórcio e casamento;

Especialização: agentes e affordances podem ser colocados em estruturas genérico-específicas de acordo com as propriedades que eles compartilham ou não;

Parte-todo, um agente ou affordance pode ser parte de outro agente ou

affordance. A parte possui todas as dependências ontológicas do todo;

Papel (Role-Name). Um agente pode desempenhar um papel específico em função de um affordance que ele possui;

Responsabilidade. Qualquer reconhecimento de affordances e seus períodos de existência são vinculados aos agentes. Ações e trocas de estados são

sempre decididas por um agente responsável de acordo com suas autoridades;

Os conceitos da AS podem ser representados por meio de diagramas de ontologia. A figura 3.5 exibe esta representação gráfica, onde agentes são representados por círculos, affordances por retângulos, dependências ontológicas por linhas da esquerda para a direita, papel (role-name) por parênteses e parte-todo por linhas com pontos pretos. Esta notação é baseada na NORMA, que é uma linguagem de representação de conhecimento desenvolvida como parte das técnicas do MEASUR (Stamper, 1992; Stamper, 1993; Stamper, R. K. e outros, 1988).

Figure 3.5 - Representação Gráfica de alguns conceitos da Análise Semântica

A análise semântica pode ser realizada em quatro fases principais conforme exibe a figura 3.6:

1. Definição do problema. Nesta fase é feita uma descrição do problema e ele é estudado. De maneira complementar à definição oficial do problema, podem

ser realizadas investigações através do estudo de documentos relevantes e entrevistas com usuários potenciais;

2. Geração de affordances candidatos. Os designers analisam o material da primeira fase para identificar affordances, possíveis agentes e outros tipos de relacionamentos. Uma lista com todas as palavras consideradas relevantes é construída durante esta fase, algumas palavras são deixadas de fora, mas isto não significa que elas não possam ser incluídas no modelo posteriormente;

3. Agrupamento de Candidatos. Primeiramente, os designers agrupam os candidatos da lista construída durante a última fase em categorias de acordo com os conceitos básicos da análise semântica (como agentes, affordances, determinantes, etc). O próximo passo é construir uma tabela com duas colunas: (1) as palavras candidatas a affordances, e (2) as classificações e alguma informação adicional explicando suas funções. Alguns candidatos novos podem ser incluídos na lista da fase 2. Em seguida pequenos diagramas ontológicos são construídos como fragmentos de um diagrama maior; estes fragmentos têm o propósito de exibir os efeitos dos agrupamentos nas unidades semânticas;

4. Diagramação Ontológica. Os fragmentos então são conectados para formar um único diagrama de ontologia, de acordo com as dependências existentes entre eles. Alguns erros cometidos durante a última fase são corrigidos nesta fase. O diagrama de ontologia deve ter um agente raiz único, a “sociedade” (se a sociedade não existir nada irá existir). Também é recomendado que cada agente deva ter no máximo dois antecedentes nas relações de dependências ontológicas (Stamper, 1979). Finalmente, o diagrama de ontologia deve ser lido várias vezes por analistas e verificado pelos usuários.

Definição do problema

Geração de affordances candidatos

Agrupamento de Candidatos

Diagramação Ontológica

Figura 3.6 - As principais fases da Analise Semântica (de Liu, 2000)

A figura 3.7 é um exemplo de um diagrama de ontologia. Nele:

“A sociedade é o agente raiz neste modelo, e tem dois

affordances: pessoa e coisa, onde pessoa é um agente e coisa é um affordance normal. Ambos são ontologicamente dependentes de sociedade. Se a sociedade não existir, então os conceitos de pessoa

e coisa ficam não definidos. Conseqüentemente, é a sociedade que tem os affordances para reconhecer pessoa e coisa e seus outros dependentes. Se a sociedade for vista como um agente modificado com a extensão dos affordances pessoa e coisa, é possível falar sobre “possuir”. De maneira mais direta, uma pessoa pode ter uma

coisa. Os agentes são colocados em círculos, como sociedade e pessoa. Os papéis são colocados em semicírculos, como dono, vendedor, comprador. Ações e outros tipos de affordances são

colocados em caixas retangulares. Note que a ação vende é ontologicamente dependente do Role-name dono e do affordance

possui, e a ação compra está construída sobre pessoa e possui. Isto

sugere que vender somente é possível para o dono que possui alguma coisa, enquanto comprar é para qualquer pessoa. Vender e comprar referem-se ao affordance possui, o que significa que quando pessoas estão negociando, estamos lidando com a “propriedade” e não com o artefato.” (Liu, 2000, p. 69-70)

Figura 3.7 - Uma ilustração da NORMA na forma Gráfica (de Liu, 2000)