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Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, Projeto de Lei 5.139/2009 e termo

CAPÍTULO II. INQUÉRITO CIVIL

3.22. Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, Projeto de Lei 5.139/2009 e termo

De fato, o Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos prevê a revogação da Lei 7.347/85 (artigo 53) trazendo, no entanto, algumas inovações a respeito da estipulação do termo de compromisso de ajustamento de conduta, quais sejam: a) critérios de equilíbrio e de imparcialidade aos Membros do Ministério Público e dos órgãos públicos legitimados; b) fixação de modalidades e prazos para o cumprimento das obrigações assumidas, sob pena de multas em caso de inadimplemento; c) fixação da natureza jurídica de transação ao ajuste e d) possibilidade de homologação judicial do TAC.

Em que pese expressa previsão no anteprojeto a respeito na natureza jurídica de transação atribuída ao termo de compromisso de ajustamento de conduta, não é, todavia, uníssono tal pensamento perante a doutrina. Hugo Nigro Mazzilli242 preleciona que:

“O compromisso de ajustamento de conduta não tem natureza contratual, pois os órgãos públicos que o tomam não têm poder de disposição. Assim, diversamente do que vem previsto no ACBP, o compromisso de ajustamento de conduta não pode ser considerado uma verdadeira e própria transação, porque a transação importa poder de disponibilidade, e os órgãos públicos legitimados à ação civil pública ou coletiva, posto tenham disponibilidade do conteúdo processual da lide (como de resto é comum aos legitimados de ofício, como substitutos processuais que são), não detêm disponibilidade sobre o próprio direito material controvertido. Nesse sentido, o art. 841 do CC corretamente dispõe que “só quanto a direitos patrimoniais de caráter privado se permite a transação”.243

Poder-se-ia objetar que, em tese, mesmo no campo do direito público se pode admitir a transação, como já ocorre na área penal, tratando-se de infrações de menor potencial ofensivo (CF, art. 98, I). A comparação não seria, porém, adequada, porque o titular exclusivo do direito de punir é o Estado, que pode abrir mão dele; mas, no campo do processo cível coletivo, o titular dos direitos transindividuais não é o Estado, nem qualquer de seus órgãos públicos legitimados, de maneira que, se estes transigirem a propósito de direitos transindividuais, estariam abrindo mão do que não lhes pertence.

Assim, o compromisso de ajustamento de conduta é antes um ato administrativo negocial (negócio jurídico de direito público), que consubstancia uma declaração de vontade do Poder Público coincidente com a do particular (o causador do dano, que concorda em adequar sua conduta às exigências da lei). E essa qualidade deve ser mantida de lege ferenda”.

242MAZZILLI, Hugo Nigro. Compromisso de ajustamento de conduta: análise à luz do Anteprojeto do

Código Brasileiro de Processos Coletivos. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; WATANABE, Kazuo (Coords.). Direito processual coletivo e o anteprojeto de Código

Brasileiro de Processos Coletivos. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2007. p. 238.

243Id., loc. cit. “Nessa linha, o art. 17, § 1º da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa) veda a

Com efeito, o TAC pode prever quaisquer obrigações de fazer e de não fazer afetas à defesa dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos, garantindo-se o mínimo legal. Ante a indisponibilidade dos direitos tutelados em sede de ajuste de conduta, não poderá haver, por lógico, renúncia ou transação sobre os mesmos, por manifesta falta de legitimidade para tanto por parte daquele que propõe o compromisso.

Ocorre, todavia, que é bastante comum a hipótese de discordância dos abrangidos individualmente pelo termo de compromisso de ajustamento de conduta firmado por um dos órgãos públicos legitimados.

Como exemplo, menciona-se a seguinte situação bastante recorrente em que foi assinado termo de compromisso de ajustamento de conduta prevendo obrigação de determinado ente público dispensar empregados públicos admitidos sem concurso público, por inobservância ao disposto pelo artigo 37 da Constituição Federal, salvo as hipóteses de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público e as funções de confiança. Posteriormente, são ajuizadas diversas ações trabalhistas individuais em face do ente público subscritor do termo de compromisso de ajustamento de conduta em litisconsórcio com o Ministério Público do Trabalho, ambos na qualidade de co-réus, com pedido principal de anulação dos efeitos do ajuste firmado e de consequente reintegração ao cargo anteriormente ocupado. Muitas dessas ações supra referidas postulam antecipação dos efeitos da tutela na própria exordial a fim de suspender, de plano, os efeitos do ajuste de conduta celebrado.

Surge, ainda, outro problema de ordem prática, vez que o Ministério Público, como instituição, não teria personalidade jurídica para figurar como réu em juízo. Neste sentido, é a Advocacia Geral da União, na esfera Federal, que teria atribuição para defesa dos atos praticados por seus agentes públicos.

As hipóteses de impedimento e de suspeição aplicam-se, de igual maneira, aos Membros do Ministério Público, independentemente do ramo a que pertençam (artigo 135 do Código de Processo Civil). O fundamento de tal regra é, justamente, manter a imparcialidade do Membro que for titular da investigação. Ressalte-se, ainda, que o mesmo motivo também se aplica à atividade interveniente, realizada na qualidade de “custos legis” por ocasião de manifestação em autos judiciais (pareceres circunstanciados).

O Anteprojeto do Código Brasileiro de Processo Coletivo prevê regra expressa no que tange à necessidade de equilíbrio e de imparcialidade dos Membros do Ministério

Público e dos órgãos públicos legitimados que tomarem o termo de compromisso de ajustamento de conduta.

Humberto Theodoro Junior ensina que244:

“A incompetência refere-se ao juízo, como órgão jurisdicional; o impedimento e a suspeição, ao juiz, como pessoa física encarregada da prestação jurisdicional.

(…)

O impedimento e a suspeição devem ser, em regra, reconhecidos pelo juiz, de ofício, ao tomar conhecimento do processo (art. 137)”.

Na verdade, o impedimento tem causas objetivas e previstas na lei, enquanto a suspeição decorre de motivo de foro íntimo.

Recentemente, foi editada, pelo Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho, a Resolução 87, de 27 de agosto de 2.009. Especificamente no que tange à matéria relativa à imparcialidade, o Procurador que receber inicialmente a representação, deverá, na primeira oportunidade, manifestar, se for o caso, impedimento ou suspeição, indicando, nesta última hipótese e, se possível, o motivo.

No que tange aos demais órgãos públicos, a Lei 9.784 de 29 de janeiro de 1999245 disciplina as hipóteses de impedimento e de suspeição do servidor público incumbido da celebração do termo de compromisso de ajustamento de conduta.

Outra novidade prevista no Anteprojeto concerne à possibilidade de homologação do termo de compromisso de ajustamento de conduta pelo Poder Judiciário. Tal permissivo já existe atualmente e é utilizado de forma recorrente, no entanto, se aprovado, haverá previsão expressa da matéria.

Na prática, quando está em curso ação civil pública e o réu concorda em celebrar termo de ajuste de conduta, pode ser requerida ao juízo a homologação do acordo. Neste

244THEODORO JUNIOR, Humberto. op. cit., p. 383.

245“Art. 18. É impedido de atuar em processo administrativo o servidor ou autoridade que:

I - tenha interesse direto ou indireto na matéria;

II - tenha participado ou venha a participar como perito, testemunha ou representante, ou se tais situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou parente e afins até o terceiro grau;

III - esteja litigando judicial ou administrativamente com o interessado ou respectivo cônjuge ou companheiro.

Art. 19. A autoridade ou servidor que incorrer em impedimento deve comunicar o fato à autoridade competente, abstendo-se de atuar.

Parágrafo único. A omissão do dever de comunicar o impedimento constitui falta grave, para efeitos disciplinares.

Art. 20. Pode ser argüida a suspeição de autoridade ou servidor que tenha amizade íntima ou inimizade notória com algum dos interessados ou com os respectivos cônjuges, companheiros, parentes e afins até o terceiro grau.

momento, pelo texto do anteprojeto, altera-se a natureza jurídica do título executivo extrajudicial para judicial, o qual poderá apenas ser desconstituído, então, através da ação rescisória, se presentes os requisitos constantes do artigo 485 do Código de Processo Civil. O ajuste de conduta deverá observar, como mínimo, as disposições legais referentes à matéria pactuada, mediante fixação de modalidades e prazos para o cumprimento das obrigações assumidas e de multas por seu descumprimento.

As obrigações estipuladas no compromisso deverão prever tempo e modo para cumprimento, tudo mediante ajuste fixado no próprio título executivo extrajudicial.

Neste sentido, por ocasião da assinatura do termo, deverá ser estipulada cláusula prevendo multa em caso de descumprimento do avençado, a qual deverá ser fixada, por lógico, com base no princípio da razoabilidade, de forma que não seja excessiva, mas que também não instigue o causador do dano à prática do dano, por demasiadamente reduzida. A multa fixada, por lógico, deve ter o caráter sancionatório em caso de descumprimento, o que enseja a execução por obrigação de pagar, independentemente da execução por obrigação de fazer.

Quanto ao presente assunto, Hugo Nigro Mazzilli ensina que246:

“Quanto às cominações nele estipuladas, convém lembrar que a multa não pode ser compensatória como limite máximo de responsabilidade, porque os tomadores do compromisso não têm disponibilidade do direito material subjacente, e, assim a sanção eventualmente ajustada só valerá como garantia mínima. Por outro lado, caso se trate de multa cominatória, não poderá ser ínfima, sob pena de se tornar ineficaz como astreinte; caso contrário, se a multa for excessiva, será reduzida pelo juiz”.

No entanto, até a presente data, o Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos ainda não foi aprovado pelo Congresso Nacional.

É importante mencionar a existência do recente Projeto de Lei 5139/2009 que prevê a revogação da Lei 7.347/85 e estipula as seguintes cláusulas a respeito do compromisso de ajustamento de conduta (artigos 47 a 54), citando-se, dentre elas:

a) O valor da cominação pecuniária estipulada no ajuste de conduta deverá ser suficiente e necessário para coibir o descumprimento da medida pactuada, com previsão, inclusive, de execução imediata da cominação, sem prejuízo da execução específica.

246MAZZILLI, Hugo Nigro. Compromisso de ajustamento de conduta: análise à luz do Anteprojeto do

b) atribui-se a natureza jurídica de transação com eficácia de título executivo extrajudicial ao termo de ajustamento de conduta. Prevê-se, expressamente, a vedação quanto à transação no compromisso de ajustamento de conduta que verse sobre bem indisponível, salvo quanto ao prazo e ao modo de cumprimento das obrigações assumidas.

c) faculta-se a homologação judicial, transformando-se em título executivo judicial a natureza jurídica do ajuste de conduta.

d) admite-se a intervenção na empresa, quando necessária, para assegurar a execução das obrigações fixadas no compromisso de ajustamento de conduta.

e) faculta-se a propositura de ação de execução do compromisso de ajustamento de conduta por quaisquer dos co-legitimados à defesa judicial dos direitos ou interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, ainda que celebrado por outro órgão público.

f) permite-se, ainda, a propositura de ação individual, pelo próprio interessado, quando o termo de compromisso de ajustamento de conduta envolver direitos ou interesses individuais homogêneos.

g) institui-se o Cadastro Nacional de processos coletivos e de compromissos de ajustamento de conduta perante o Conselho Nacional de Justiça, com a finalidade de permitir que os órgãos do Poder Judiciário e os interessados tenham amplo acesso às informações relevantes relacionadas com a existência e o estado das ações coletivas.

De igual maneira, tal projeto de lei ainda não foi aprovado pelo Congresso Nacional.

Como conclusão, importa ressaltar que, embora o cenário brasileiro atual seja de grande discussão quanto ao microsistema da tutela coletiva em vigor em razão de projetos de lei que pretendem revogar a Lei da Ação Civil Pública, defende-se o posicionamento no sentido de que, tanto os direitos sociais mínimos, quanto todo o avanço alcançado pela Instituição do Ministério Público a quem incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis não pode retroceder à época anterior à Constituição Federal, cuja atividade consistia, basicamente, na elaboração de pareceres (atividade interveniente).

A celebração de termo de ajuste de conduta pelo Ministério Público do Trabalho, como forma extrajudicial de solução de conflitos, garante efetividade aos direitos sociais fundamentais em razão da resolução rápida e eficaz das demandas trabalhistas, do

atendimento à sociedade, da garantia da justiça social, dos valores sociais do trabalho e do pleno emprego, conciliando, portanto, os princípios fundamentais e basilares da República Federativa do Brasil e as atribuições Institucionais do “Parquet”.

CAPÍTULO

IV.

DESCUMPRIMENTO

DAS

CLÁUSULAS

PACTUADAS

NO

TERMO

DE

COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE

CONDUTA

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